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Crítica | 7 Dias em Entebbe – Ofuscado pela Egolatria

José Padilha é certamente um dos nomes mais conhecidos do cenário mundial e nacional. O diretor e produtor é responsável por trazer em grande parte de suas obras temas que permitam uma abertura reflexiva no tocante à situação socioeconômica e política de diferentes realidades – não é à toa que tenha realizado obras como a franquia fílmica Tropa de Elite e a série O Mecanismo, além de ter entrado como produtor executivo de um dos maiores sucessos da Netflix, Narcos. Todas as obras com as quais trabalhava são carregadas de perspectivas críticas e é justamente essa manutenção de seu legado que tenta trazer em 7 Dias em Entebbe.

O longa-metragem, mais uma vez baseado em fatos reais, cede à própria egolatria e não consegue lidar com o fato de não ter sido realizado de forma interessante. O resultado quase catastrófico é por vezes salvo pelos breves momentos de glória e percepção estética de seus personagens e sua equipe de produção, mas mesmo assim se respalda demais numa egolatria sem tamanho que quer transformar água em vinho.

A história é baseada em fatos reais e gira em torno de um dos momentos de grande decisão da questão política em território palestino, o qual discorre acerca do sequestro de um avião da companhia Air France pela Frente Popular para a Libertação da Palestina e das Células Alemãs Revolucionárias que lutavam por um protagonismo étnico em meio a tantos conflitos sanguinolentos. A ambiência já nos é dada pelo próprio título do filme, visto que Entebbe foi o nome do aeroporto desativado no qual os reféns e os terroristas permaneceram durante sete dias e sete noite até que a operação de contra-investida fosse colocada em prática pelo governo israelense.

Apenas com tal sinopse, é possível deduzirmos uma sequência de fatos tão inesperada quanto qualquer outro clichê dos filmes de ação e drama. Temos os dois lados delineados com diferenças gritantes, seja pelo nacionalismo, pela rebeldia, pela busca à segurança, pela justiça e inúmeros outros temas. Cada um desses blocos terá, teoricamente, o seu protagonismo cênico e, através da gradativa junção das duas linhas narrativas, encontraremos um desfecho romantizado com um vitorioso e um derrotado. E, bom, é exatamente isso o que ocorre durante toda a obra: percepções exageradas e quase intangíveis de um fato real que parece jogado no ar sem explicação ou sem motivação envolvente o suficiente para interagir com o público.

Se Padilha alcançou um status consideravelmente alto por pequenas pérolas da indústria cinematográfica contemporânea, ele se perde em meio a tentativas frustradas de elevar o nível de suas histórias, a começar por uma montagem que não faz o menor sentido. Tudo bem, a cronologia tem como base flashbacks de ambos os lados, mas emergem em momentos de puro vazio, no qual o roteiro orquestrado por Gregory Burke encontra um beco sem saída e apela para o emocional como forma de desviar tais obstáculos – e é claro que, pela visibilidade de equívocos estruturais, isso não funciona.

Os personagens também não tem muito espaço de credibilidade ou evolução – e infelizmente isso se alastra até para as interpretações. Daniel Brühl encarna o líder militante alemão Wilfried Böse, cujo pacífico plano vai de encontro à mentalidade anarquista e violenta de sua parceira Brigitte Kuhlmann (Rosamund Pike), também pertencente à Célula Revolucionária. Entretanto, os dois atores de grande renome no cenário do entretenimento atual não têm sequer um resquício de química entre si, mantendo-se em posições defensivas que desenlaçam momentos vergonhosos e contraditórios ao que deveriam ser – e isso inclui as breves peças de escape cômico que são varridas inteiramente para debaixo do tapete. Pike ainda possui um pico momentâneo ao ter uma crise de ansiedade e protagonizar uma sequência em plano fechado que revela sua personalidade marcada pela angústia e pelo trauma, mas esse ápice logo se dissipa.

Nem mesmo o cuidado estético tem lugar de fala na obra. A opção pela câmera na mão, por enquadramentos claustrofóbicos e planos-sequência discordam da visão crítica de seu diretor em vários momentos, ainda mais se levarmos em conta sua tentativa de transformar uma ficcionalização em uma investida documentária que procura emular obras do gênero. A consequência como produto final é arrasadora é decepcionante, como se pode prever.

7 Dias em Entebbe é simplesmente errado. Uma mancha complicada na carreira de Padilha assim como Trem para Paris o é para a filmografia de Clint Eastwood. E o mais triste talvez seja que um momento decisivo para a história mundial tenha sido retratado de modo tão bruto, perdido e egocêntrico.

7 Dias em Entebbe (7 Days in Entebbe – Reino Unido/ EUA, 2018)

Direção: José Padilha
Roteiro: Gregory Burke
Elenco: Rosamund Pike, Daniel Brühl, Eddie Marsan, Nonso Anozie, Ben Schnetzer, Mark Ivanir, Juan Pablo Raba
Gênero: Drama
Duração: 107 min.

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Publicado por Thiago Nolla

Thiago Nolla faz um pouco de tudo: é ator, escritor, dançarino e faz audiovisual por ter uma paixão indescritível pela arte. É um inveterado fã de contos de fadas e histórias de suspense e tem como maiores inspirações a estética expressionista de Fritz Lang e a narrativa dinâmica de Aaron Sorkin. Um de seus maiores sonhos é interpretar o Gênio da Lâmpada de Aladdin no musical da Broadway.

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