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Crítica | Game of Thrones – 1ª Temporada

A HBO sempre foi conhecida por sua ambição. Do sucesso estrondoso de crítica de Família Soprano e A Sete Palmos até produções avassaladoras como Band of Brothers e Roma, a emissora de TV fechada é uma das responsáveis por conferir aspecto cinematográfico à telinha e forçar a competição a igualmente igualar seu jogo e apostar ainda mais em tramas originais e desafiadoras. Porém, nada poderia preparar o mundo do entretenimento para o hit sem precedentes que vinha pelo horizonte. Começava o reinado de Game of Thrones.

A série é uma produção caríssima que adapta a saga literária Crônicas de Gelo e Fogo, do americano George R. R. Martin. Ambientada na fictícia e medieval terra de Westeros, acompanhamos as intrigas políticas e os jogos de interesse que movem os personagens desse universo, todos interessados no poder absoluto e na conquista do imponente Trono de Ferro. Logo somos apresentados à Família Stark, guardiões do Norte e habituados ao inverno, o patriarca Ned (Sean Bean) é surpreendido pela chegada do Rei Robert Baratheon (Mark Addy), seu velho amigo que o recruta para um cargo importante como seu braço direito (ou, no caso, Mão do Rei) após a morte misteriosa de seu antecessor. Um dos homens mais honrados de Westeros, Ned é casado com Catelyn (Michelle Fairley) e pai de Robb (Richard Madden), Bran (Isaac Hempstead Wright), Sansa (Sophie Turner), Arya (Maisie Williams), Rickon (Art Parkinson) e o bastardo Jon Snow (Kit Harington).

Robert mantém uma aliança matrimonial com a Família Lannister, os mais ricos e influentes dos Sete Reinos. Ao seu lado, temos a nada confiável Rainha Cersei (Lena Headey), seu irmão Sir Jaime Lannister (Nikolaj Colster-Waldau) e os filhos Joffrey (Jack Gleeson), Tommen (Callum Wharry) e Myrcella (Aimee Richardson). Claro, temos também o anão Tyrion Lannister (Peter Dinklage), cujo desprezo que sofre de sua família só não é maior do que sua sabedoria.

Do outro lado do mar, acompanhamos outra narrativa fundamental para o desenrolar dos eventos: Daenerys Targaryen (Emilia Clarke) e seu irmão Viserys (Harry Lloyd) sobreviveram ao massacre de sua outrora poderosa família ancestral e agora planejam tomar o poder de volta com a ajuda do brutal exército Dothraki, liderado pelo ameaçador Khal Drogo (Jason Momoa).

Acrescente alguns dragões e a crescente ameaça de uma raça de criaturas glaciais e você tem Game of Thrones. Mas é justamente pelo motivo contrário que a série adaptada por D.B. Weiss e David Benioff surpreende: o fator humano. O grande barato desse mundo criado por Martin é por nos levar a um lugar que fora tocado pela magia e grandes realizações: dragões voaram por ali, mas foram extintos. Batalhas heróicas foram travadas por homens imponentes, agora todos moribundos e gordos. Ouvimos histórias arrepiantes sobre um Inverno que durou dezenas de anos e despertou criaturas sombrias, mas nunca temos um vislumbre sobre isso.

Esse setting torna o mundo de Westeros mais realista, e garante uma trama muito mais política e engenhosa do que, digamos, O Senhor dos Anéis (sem desmerecer o trabalho de J.R.R. Tolkien, claro), aproximando a estrutura da série e seu desenrolar de acontecimentos com algo mais perto de House of Cards ou The West Wing. Esse crédito vai todo para Martin e os produtores “D&D”; o primeiro por criar figuras tão carismáticas e apaixonantes, a dupla por lhes garantirem diálogos maravilhosos e um elenco perfeito – vale apontar que esta primeira temporada é uma adaptação muito fiel do primeiro livro da série.

Ao longo de 10 episódios de aproximadamente 1 hora, temos um ritmo favorável e uma sequência de eventos lógica e que entretém, com raríssimos momentos de “barriga” ou fillers de história. Claro que a narrativa protagonizada por Daenerys mal interage com a trama maior envolvendo as famílias em Westeros e o Trono de Ferro, mas é uma história contada com excelente precisão e que o espectador entende ser o mero começo de algo gigantesco; sendo realmente empolgante quando os primeiros sinais do retorno de um mundo místico e mágico possam estar em andamento. Você sabe, Rainha dos Dragões. Khaleesi e Dracarys. É divertido e genial ver como D&D foram trazendo diversas pistas sobre o destino de Daenerys, desde um inofensivo banho quente até o aparecimento de um crânio gigantesco de dragão.

Mas é mesmo com o núcleo familiar que a série se sobressai. Principalmente, é claro, com o excepcional Peter Dinklage que dá vida ao anão Tyrion Lannister de forma inebriante e digna de todos os prêmios que sua performance vem colecionando desde 2011. Seus diálogos são maravilhoso e a imponência e sagacidade do ator ao proferi-los transformam o caçula Lannister em um personagem clássico quase que instantaneamente

No núcleo Stark, Sean Bean garante uma presença agradável e leve como Ned Stark, sendo uma figura clássica de herói de bom coração pelo qual adoramos torcer – e que vibramos quando inesperadamente é jogado em uma batalha. Os arcos de seus filhos acabam misturados ao longo da temporada, mas garantem um ótimo trabalho de Richard Madden e Sophie Turner, mas é mesmo a jovem Maisie Williams e o novato Kit Harington quem roubam a cena – seja por suas atuações, seja pelo carisma de seus personagens.

Voltando aos Lannister, a irmã Cersei também se beneficia de textos memoráveis, que ganham força com a performance cínica e traiçoeira de Lena Headey, sempre uma figura que sabe muito mais do que aparenta – o que a torna friamente ameaçadora e calculista. O irmão Jaime também revela-se um antagonista asqueroso, praticamente a versão sombria e fanfarrona do Príncipe Encantado, e Nikolaj Colster-Waldau nitidamente se diverte com essa figura maliciosa. E ainda que tenha tido pouco destaque nessa primeira temporada, Charles Dance oferece uma amostra de sua masterclass na pele de Tywin, o patriarca da família Lannister. Já é um leão que mostra-se afiado nesse final de temporada.

A começar pela audácia de matar seu protagonista (se você não tinha recebido esse spoiler ainda, já passou da hora) antes mesmo da conclusão da temporada. A decapitação de Ned Stark em Baehlor foi a confirmação de que estávamos diante de uma série sem medo de tomar rumos sombrios e garantir um senso de perigo e alarmismo presentes até agora, na atual sexta temporada. Tal reviravolta também consagra o Joffrey do excelente Jack Gleeson como um dos vilões mais odiados e sanguinários de todos os tempos.

Então chegamos ao motivo de Game of Thrones ser tão marcante na História da Televisão: sua escala. Rodada em mais de 5 países, a série faz uso de lindas paisagens na Islândia, Espanha, Marrocos e diversos outros ambientes naturais para criar um mundo vasto e imersivo, ao passo em que os preenche com um design de produção  fascinante e figurinos que oferecem uma diversidade histórica e cultural (GOT transita entre o medieval clássico e até algo mais contemporâneo, no mix perfeito de realismo e fantasia) até os efeitos visuais que são mais ambiciosos do que qualquer coisa que já vimos na televisão. Isso porque a primeira temporada é mais centrada em ação visceral, trazendo uma computação gráfica pontual aplicada em duplicação de figurantes e preenchimento de cenários.

A ação também tem momentos primorosos, com destaque especial para o momento no qual a vida de Tyrion deve ser decidida em um julgamento de combate entre dois lutadores sobre uma portinhola que periga uma queda livre vertiginosa ou quando Khal Drogo enfrenta um espadachim com as próprias mãos – com resultados nada bonitos, diga-se de passagem. Obviamente, é decepcionante que o grande clímax da temporada tenha sido cortado por motivos de orçamento (Tyrion desmaia na batalha e só voltamos quando este acorda), mas é uma decisão que D&D jamais fariam novamente… 

Game of Thrones representa um dos passos mais ousados e grandiosos que a televisão já deu, criando um universo gigantesco e complexo com um orçamento incrível se considerarmos sua escala de produção. Mas ainda que seus cenários e locações sejam estonteantes, é mesmo na inteligência e criatividade de seus personagens e na imprevisibilidade da história que a série encontra sua maior força.

E não seria exagero dizer que a televisão americana se divide entre Pré-GOT e Pós-GOT.

Game of Thrones – 1ª Temporada (Idem, EUA – 2011)

Criado por: David Benioff, D.B. Weiss
Direção: Alan Taylor, David Petraca, David Nutter, Alik Sakharov, Neil Marshall
Roteiro: David Benioff, D.B. Weiss, George R.R. Martin, Bryan Cogman, Vanessa Taylor
Elenco: Peter Dinklage, Emilia Clarke, Kit Harington, Sophie Turner, Nikolaj Coster-Waldau, Richard Madden, Maisie Williams, Charles Dance, Lena Headey, Michelle Fairley, Rose Leslie, Alfie Allen, Isaac Hempstead-Wright
Emissora: HBO
Gênero: Ação, Fantasia, Drama
Duração: 60 min

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Publicado por Lucas Nascimento

Estudante de audiovisual e apaixonado por cinema, usa este como grande professor e sonha em tornar seus sonhos realidade ou pelo menos se divertir na longa estrada da vida. De blockbusters a filmes de arte, aprecia o estilo e o trabalho de cineastas, atores e roteiristas, dos quais Stanley Kubrick e Alfred Hitchcock servem como maiores inspirações. Testemunhem, e nos encontramos em Valhalla.

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