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Crítica | Meu Malvado Favorito 3

Não é de hoje que repito que Chris Meledandri é um gênio da animação infantil muito embora geralmente desgoste de quase todos os seus filmes ou os ache apenas irrelevantes. Nitidamente o produtor tem uma abordagem nada comum na indústria de anunciar seu nome logo nos primeiros minutos de filme: Uma produção de Chris Meledandri. É algo que lembra a Hollywood clássica dos anos 1930, 40 e 50.

Isso aconteceu em Pets e Sing. Agora com Meu Malvado Favorito 3, a história se repete… Em todos os sentidos. Novamente temos um filme de alto valor de produção, com tecnologia de animação, iluminação e texturas equiparável às da Pixar e Disney, mas preservando o mesmo roteiro preguiçoso de sempre. Nisso, já dá para inferir que, no quarto filme dessa franquia, Meledandri está deixando o ego comer bom-senso: Gru e seus Minions estão trilhando um caminho bem parecido ao que aconteceu com Shrek.

Maleficamente medíocre

Não é novidade para ninguém que os roteiros das produções da Ilumination deixam bastante a desejar. Em sua maioria, contam histórias divertidas, com mensagens razoáveis, mas facilmente esquecíveis. O que é mais celebrado até agora são os minions e suas piadas que flertam com screwball e o nonsense. De resto, não há muito há destacar além das quantias exorbitantes de dinheiro que eles rendem na bilheteria.

A última vez que tínhamos visto Gru salvar o mundo de outro super-vilão foi em 2013 com a primeira sequência do original. A terceira incursão traz exatamente a mesma fórmula, expandido razoavelmente o universo da franquia.

Aqui, Ken Daurio e Cinco Paul trazem um declínio de Gru após ele causar a demissão dele próprio e da esposa, Lucy, ao falharem na captura de um novo vilão chamado Balthazar Bratt. Desempregado e sem planos de retornar à vilania, Gru não sabe o que fazer para sustentar sua família. Porém, sua vida sofre uma radical reviravolta quando descobre a existência de um irmão gêmeo ricaço até então desconhecido, Dru.

Com ele, Gru descobrirá mais sobre seu pai e tentará reaver o bem roubado por Brett na tentativa de resgatar seu emprego. Enquanto isso, o vilão favorito ainda tem que conciliar seu tempo para dar atenção à sua família e aos minions que preparam um motim.

Além de Minions, esse é nitidamente o primeiro filme dessa franquia que mostra uma junção de núcleos diversos para conseguir sustentar a narrativa ao longo de seus 90 minutos. Isso, na verdade, é um baita problema, pois confere um ar de episódio de seriado para um longa-metragem.

Não demora nada para abandonarmos o núcleo concentrado em Gru e Dru para encontrarmos outros focados em exibir Lucy tentando ser uma verdadeira mãezona para Agnes, Margo e Edith, elaborar a motivação recalcada do antagonista Balthazar Brett ou para inserir as gags totalmente deslocadas dos minions amotinados liderados por Mel. Mas não se engane, no meio do filme, outro arco surge focando na busca de Agnes por um unicórnio nas florestas do condado onde Dru mora.

É absolutamente normal termos animações com narrativas interpoladas como, por exemplo, Procurando Nemo. Mas na grande maioria dos casos, a interpolação serve para mostrar os diferentes núcleos seguindo objetivos semelhantes, para a conquista da jornada. Já aqui, como você pode ter percebido, as tramas são totalmente independentes em sua maioria. Não adicionam nada relevante ou uma passagem dramática de crescimento desses personagens que já estão nas telas há três filmes. Trata-se da velha e fraca “encheção” de linguiça. Puro filler fraco já que não a mínima atenção dedicada para os personagens da obra. Eles terminam exatamente do mesmo modo que começam – com exceção de Dru que também é escrito na base da mediocridade.

Ao menos, a adição dos novos personagens traz algum vigor a uma história natimorta. Apesar da atenção completamente rudimentar para as Agnes, Margo e Edith que servem apenas para virar donzelas em perigo (pela terceira vez seguida), Dru, o irmão cabeludo e afeminado de Gru, tem bons momentos. O personagem possui alguma motivação e o jogo de conquista para tentar atrair Gru de volta para a vilania rende passagens cheias de ação que tiram a obra de certo marasmo.

O problema é que as sequências de “maldades” são pouco inspiradas. Dru também, gradativamente, vai ficando mais idiota se comportando como um minion “crescido” durante outra invasão ao covil caricato do vilão da vez. Fica claro que essa troca de natureza para Dru existe apenas por causa da ausência dos minions que embarcam em uma aventura sozinhos mais se assemelhando a diversas esquetes cômicas de curtas-metragens envolvendo números musicais em um show de talentos e na prisão.

Porém, mesmo com essas constantes interrupções, pelo caráter bastante descompromissado da obra, dificilmente a audiência infantil ficará perdida. As histórias sempre carregadas com cores fortes e direção simplória, permite que a experiência de ver esse longa seja tão simples quanto sua narrativa. Não há grandes pretensões aqui, além do alto faturamento. Ao menos, no resquício mínimo de maturidade que a franquia desenvolveu, não temos tantas piadas escatológicas dessa vez. O humor é sim levemente refinado, mas passa longe de envolver – piadas repetidas têm a tendência de perder a graça.

Recalque Favorito

O que é mais estranho em Meu Malvado Favorito 3 talvez seja sua maior qualidade: o vilão Balthazar Bratt. O filme já é iniciado com um breve panorama sobre o passado tragicômico do personagem. Bratt era uma pequena estrela-mirim de um seriado de mal gosto dos anos 1980, porém, quando atingiu a puberdade, a audiência caiu levando o cancelamento da obra – tudo isso é jogado em tela através da exposição bastante preguiçosa de um apresentador de telejornal.

Porém, o menino não ficou contente com a destruição de seu sonho e trabalhou muito até se tornar um super vilão. Apesar do plano maléfico não fazer o menor sentido, Bratt segue uma jornada de vingança pessoal contra Hollywood. E, justamente por isso, é possível associar certo recalque ou ressentimento de Meledandri com a indústria em si.

Isso é jogado em evidência na tela com referências agressivas nada sutis à Pixar – um peixe-palhaço é destroçado pelo motor do jet ski de Gru para você terem uma ideia. Bratt também declama a todo momento que seu seriado deveria ter ganhado um Oscar ou um Emmy – Meledandri foi indicado ao Oscar de Animação por Meu Malvado Favorito 2. Enfim, são diversas menções odiosas à indústria como um todo. Não é preciso ter meio miolo para associar uma coisa à outra, ainda mais devido a força que o produtor impõe sobre esses filmes.

Rapidamente o personagem vira um vilão de uma nota só e perde o interesse do público já na metade da obra – principalmente por conta da repetição exaustiva da frase de efeito pedigree de Bratt. Uma pena, pois apresentação dele é um show à parte rendendo o melhor momento da obra embalada ao som de Bad! de Michael Jackson. A proposta principal é mostrar como Bratt é traumatizado pelo fim abrupto da fama e, por consequência, ficou preso na década de 1980 ainda adotando cortes de cabelo e moda pertencentes àquela geração.

Todas as canções ou riffs que embalam as ações do personagem são sucessos disco como Take On Me e Sussudio o que traz uma boa dose de piadas para os mais velhos. Mas as boas ideias se esgotam rapidamente nos levando, de novo, para uma espécie de minions robóticos que ajudam Bratt na vilania – algo mais rudimentar do que havíamos visto no filme anterior. Já as armas do vilão despertam bastante interesse também pela criatividade. Sejam os chicletes de bola ou o robô mecha, sempre há algo muitíssimo coerente para a característica oitentista do vilão. Aliás, a temática seria um prato cheio para os diretores, caso usassem a linguagem cinematográfica da época em passagens especiais – ao menos, utilizam a linguagem televisiva brega que se popularizou nessa década para mostrar trechos do seriado juvenil protagonizado pelo vilão.

Mesmo com uma narrativa tão insossa que adora desperdiçar boas ideias e negar qualquer desenvolvimento para personagens novos e antigos, Meu Malvado Favorito 3 merece muitos elogios pela técnica da direção de arte. Desde sempre, destaco que os filmes da Ilumination têm uma soberba criatividade para criação de cenários diversos e também para os designs encantadoramente caricatos dos personagens que figuram nas suas histórias.

Nesse exemplar, há diversos cenários memoráveis e novas armas e veículos para Gru usar em suas missões deixando as sequências de ação bastante dinâmicas e visualmente atraentes – destaque para o domínio dos diretores em tornar todo o trabalho visual fluido e coerente. Uma dessas grandes passagens envolve uma confusão na cidadezinha franco-germânica que Dru mora. Basicamente é a melhor cena do filme por, enfim, deixar os personagens evoluírem um pouco, além do encanto visual provocado pela criatividade da arquitetura do lugar.

Outro bom destaque é o covil ridículo que Bratt mora no qual existem mais referências de traquitanas dos anos 1980 que você pode absorver em apenas uma visita ao filme.

Nada de Novo no Front

Enquanto, Meu Malvado Favorito 3 passa longe de ser um desastre perfeito, Meledandri conduz a produção novamente em um terreno seguro ignorando o fato que o público-alvo desses filmes tem envelhecido e, logo, aptos para histórias mais interessantes e ricas. Claro, sempre há uma nova audiência de criancinhas muito novas que apreciarão as palhaçadas de Gru e companhia, mas ainda assim trata-se da segunda sequência de uma franquia muito bem-sucedida.

Esperava-se, no mínimo, alguma evolução. Mas o que ocorre é justamente o contrário. A narrativa regride após lançar suas cartas de maior interesse optando por caminhos convencionalmente patéticos até mesmo para crianças de sete anos. Ao menos, Meu Malvado Favorito, o primeiro, importava-se em contar uma narrativa convencional, mas valorizando a alma dos personagens que iam se apaixonando e formando uma família gradativamente. Aqui, fica claro, pelo formato bastante quebradiço da historinha, que pouco disso importa enquanto a máquina estiver saudável.

Mas, sendo bastante sincero, como entretenimento inocente e descompromissado, mesmo diante de todos esses “problemas” que pontuei ao longo do texto, Meu Malvado Favorito 3 funciona e diverte. Apenas tenha em mente que encontrará doses cavalares da mesma coisa que já consumiu três vezes antes. Pode ser que, nessa aventura, o sabor da rápida e enlatada experiência seja mais insatisfatório.

Meu Malvado Favorito 3 (Despicable Me 3, EUA – 2017)

Direção: Kyle Balda, Pierre Coffin, Eric Guillon
Roteiro: Ken Daurio, Cinco Paul
Elenco (vozes no original): Steve Carrell, Kristen Wiig, Trey Parker, Miranda Cosgrove, Dana Gaier, Pierre Coffin, Julie Andrews, Nev Scharrel
Gênero: Animação Infantil, Aventura
Duração 90 min.

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Publicado por Matheus Fragata

Editor-geral do Bastidores, formado em Cinema seguindo o sonho de me tornar Diretor de Fotografia. Sou apaixonado por filmes desde que nasci, além de ser fã inveterado do cinema silencioso e do grande mestre Hitchcock. Acredito no cinema contemporâneo, tenho fé em remakes e reboots, aposto em David Fincher e me divirto com as bobagens hollywoodianas.

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