Ah pois é, nem se faz tanto tempo atrás em que podíamos ir ao cinema sem receio e ter a chance de assistir alguns filmes com tanta coragem em serem originais em seus conceitos e possuírem uma marca de autor dos cineastas que o comandavam. Sem medo algum de serem julgados por críticas sensacionalistas ou o gosto convencional popular da massa. E sim apenas buscar agradar aos espectadores com tanta criativa e boa qualidade em tela.
E no que se refere à ficção científica, encontramos exemplos como Blade Runner; Ghost in the Shell; Matrix; Planeta dos Macacos; Cidade das Sombras; filmes que se agarraram em ricos conceitos do gênero e o exploraram em formas que o o público geral talvez não esperava, e desfrutaram do lucro em serem reconhecidos hoje por legiões de fãs, mesmo que tenha demorado para certos críticos engolirem o ego e aceitarem algo novo e original.
Um filme assim que poderia vir facilmente de um diretor de nome solidamente renomado como Luc Besson. Reconhecido hoje por muitos por ser talvez o maior diretor Francês do gênero de ação, mas que nunca se ateve a só esse gênero e sempre se mostrou ser um alguém criativo no uso da linguagem cinematográfica escapista, mas com um polimento refinado Europeu como sua assinatura de autor.
Senhor diretor esse que infelizmente hoje parece se ausentar dos holofotes e buscar produzir mais por detrás dos bastidores escrevendo e produzindo alguns vários filmes bem conhecidos, e a maioria não tão boa. Busca Implacável 3, Colombiana Carga Explosiva 3; pra nomear algumas vergonhas. E raramente voltando ao posto de direção e trazendo consigo algumas boas idéias, mas aquém de sua gloriosa qualidade passada. Pegue por exemplo Lucy, um divertido e visualmente interessante filme de ação sci-fi, mas inevitavelmente esquecível.
Mas eis que aqui se encontra um filme como O Quinto Elemento, um perfeito lembrete da sua passada promissora fase, um lembrete do quanto ALTAMENTE original e criativo Luc Besson conseguia ser em sua concepção de roteiro e criação de um universo próprio com sua própria e rica mitologia, e sem medo algum de ter suas peculiaridades um tanto bizarras.
Quando uma nave alienígena do povo pacífico dos Mondoshawans é atacada, um misterioso artefato que é usado para reconstruir uma mulher humanóide, “Leeloo” (Milla Jovovich), que é descrita como o “ser perfeito”. Com medo de seus captores desconhecidos, ela escapa do complexo e dá consigo com Korben Dallas (Bruce Willis), um taxista divorciado e ex-major nas forças especiais. Que mais tarde descobre que Leloo é uma arma viva conhecida como Quinto Elemento, um ser capaz de unir os quatro elementos em uma luz divina capaz de derrotar o grande mal, um planeta em forma de fogo que ameaça destruir todo o universo.
Talvez uma trama quase fantasiosa e com ambições épicas dignas de um verdadeiro filme de ficção científica. Não a toa que o seu nível de detalhes, que refletem o expansivo universo utópico futurista que forma este mundo, carrega em si imensa originalidade. Besson já visionara Quinto Elemento desde sua adolescência como jovem cineasta sonhador, e mostra na tela o cumprimento de um sonho realmente sendo-se realizado.
E ainda assim é notável vermos como ele consegue conceber na narrativa principal certos bizarros e interessantes traços de familiaridade com grandes filmes do gênero como o próprio 2001 – Uma Odisséia no Espaço, no que se diz respeito aos questionamentos científicos e éticos da criação humana presente em suas breves entrelinhas da trama que lida com as origens da criação e da busca da salvação do universo galáctico quando departimos na mirabolante e excitante jornada de Dallas para salvar sua nova amada e todo o universo.
Com familiares conceitos semelhantes de certa forma com o próprio Blade Runner de Ridley Scott, no que se refere principalmente à criação de um futuro utópico que reflete multi-urbanização em sua megalópole imensa, e a intensa dependência tecnológica. Conceitos esses que são sempre apresentados de forma muito sutil na caracterização da cidade e dos ambientes dos personagens, como o estreito cubículo en que Dallas vive, ou os inúmeros aparelhos tecnológicos que o vilão Zorg de Gary Oldman possuí em seu escritório, por aparente razão alguma.
E claro, da trama tomar esse formato de um bizarro thriller de ação, que ironicamente quase não possuí ação por assim dizer. Há uma boa, e inventiva, perseguição inicial entre prédios, e o grande tiroteio na ópera com direito a uma icônica breve luta Kung Fu intercalada com um soneto pop extremamente divertido. Essa é a ironia de Besson, pouco entrega de cenas de ação em seus filmes, mas quando entrega, consegue ser um ESPETÁCULO! Mas deve se dar crédito ao homem! Poucos são os diretores que conseguem ter um apuramento visual tão rico e conceitual como ele. Até mesmo em seus filmes mais fracotes, o visual é sempre um grande destaque aparte de tudo.
Aqui não é uma exceção. Com Besson mais uma vez usando e abusando de seu bom e velho parceiro Thierry Arbogast na fotografia, dando ao filme um formato cênico digno dos melhores épicos já feitos. Onde cada milimétrico espaço de cenário, grandes ou pequenos, possuem essa imersão nível 70mm capaz de trazer o espectador para dentro do filme. Não é nem uma necessidade lusófona de querer arrebatar ou impressionar, apenas algo que faz parte do estilo visual do diretor em querer imergir seu público para dentro do universo que ele cria. Algo que posso dizer que tanto faz falta em blockbusters genéricos de hoje.
Ainda mais com o filme sendo completamente certeiro em tudo que o compõe, sem perder tempo com tanta exposividade explicativa e sabendo bem equilibrar tudo isso em um sempre fluído e perfeito ritmo. E ainda trazer consigo esse tom humorado e bizarro tão espalhafatoso que, surpreendentemente, nunca cruza a linha do caricato bobo, e sim se mostrar ser constantemente engraçado e altamente divertido. É como um filme da Marvel hoje, só que melhor e que convence genuínas emoções dentro dos personagens.
Estes que são formados aqui por um elenco nada menos que altamente carismático onde claramente todos estão se divertindo, contando com um sempre ÓTIMO Iam Holm com sua fé e seriedade inabaláveis, convencendo ainda como um alívio cômico de ouro. Ainda mais que o birrento Chris Tucker como o apresentador famoso que só faz é gritar por socorro quando o caos se instala. Mas ele consegue arrancar umas boas risadas também. E ter Gary Oldman como vilão é apenas um convite de ser alguém memorável e intimidante, e é exatamente o que tem aqui!
E claro, a jovem Milla Jovovich rouba-cenas, com sua rica e surpreendente complexa heroína do universo. E também a um sempre ótimo Bruce Willis em sua versão John McClane taxista. Na época que ele ainda mostrava em se entregar aos papéis, mostrado aqui como um perfeito representante da falta de fé na humanidade mundana, mas com um olhar de pureza que no final lhe permite se tornar um verdadeiro herói inspirado pelo seu amor pela pureza de Leloo. E olhem só isso, um romance entre protagonistas dentro de um blockbuster que realmente funciona. Não é impossível de se fazer!
Tudo isso que formam aqui esse clássico Cult oras amado e apreciado ou apenas esquecido e injustamente depreciado por muitos em ambos os lados. E que hoje é capaz de nos fazer lembrar não só da boa época em que tínhamos Luc Besson se provando ser um dos diretores mais promissores e criativos no ramo (o que ainda é de certa forma, e que fez com tanta paixão esse que é um de seus filmes mais pessoais e autorais. Um filme que nos lembra de uma boa época onde podíamos ver filmes originais, criativos, e extraordinariamente divertidos com esse polimento Europeu tão admirável, realizando um rico entretenimento tão habilmente concebido e que tanta falta faz nos dias mundanos de hoje.
O Quinto Elemento (Le cinquième élément, França – 1997)
Direção: Luc Besson
Roteiro: Luc Besson, Robert Mark Kamen
Elenco: Bruce Willis, Milla Jovovich, Gary Oldman, Ian Holm, Chris Tucker, Luke Perry, Brion James
Gênero: Ação, Aventura, Ficção Científica
Duração: 126 min