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Crítica | Satã Disse Dance – Uma típica obra do seu tempo

*Este filme foi visto na 41ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo

No pôster de Satã Disse Dance, está escrita a seguinte frase: “Sexo, drogas e Instagram”. Sucinta, ela descreve perfeitamente o conteúdo do novo longa-metragem da polonesa Katarzyna Roslaniec, já que acompanharemos – por uma hora e meia! – a protagonista transando, cheirando cocaína, frequentando festas, bebendo e, obviamente, interagindo nas redes sociais enquanto luta para escrever o seu segundo livro. A estética empregada para captar todo esse hedonismo – tão característico das novas gerações – será a do celular, onde a câmera é posicionada verticalmente, a razão de aspecto, consideravelmente reduzida, e a lógica visual, de uma selfie estendida.

Deixando claro logo nos primeiros minutos o despudor com que abordará o assunto, a diretora e roteirista inicia o filme com uma legenda que diz ser possível montar a ordem dos eventos de qualquer outra maneira e, ainda assim, a história seria idêntica. De fato, a vida levada por Karolina (Magdalena Berus) é um círculo vicioso. Ao longo dessa trajetória de corrupção moral, o principal mérito de Roslaniec é enxergar nas idas e vindas da protagonista um caminho de perdição, do qual ela deseja se desprender, mas não consegue, tanto em razão do visível prazer que sente quanto pela influência das pessoas e do ambiente externo.

No entanto, a cineasta incorre no grosseiro erro de transformar a obra em um típico produto do seu tempo, o mesmo que ela denuncia ser superficial e narcisista. Ao construir uma narrativa idêntica ao estilo de vida da personagem principal, a diretora produziu uma experiência cinematográfica degradante, repetitiva e dramaticamente nula, em que somos obrigados a testemunhar cenas de sexo, consumo de drogas e vômito e na qual não há subtramas, diálogos reveladores, grandes momentos ou até mesmo um conflito, uma vez que a tentativa de conhecer um pouco mais o íntimo de Karolina culmina sempre em becos sem saída, todos decorrentes das evidentes incapacidades dramáticas de Roslaniec como roteirista.

A estética do celular, por sua vez, revela ser um recurso desprovido de qualquer impacto ou justificativa plausível. O espaço reduzido do quadro não transmite claustrofobia nem é usado para estabelecer um trabalho complexo do extra-campo (sobre este último aspecto, a cena no hospital é a única bem-sucedida); a nitidez e estabilidade da câmera passam a sensação de um filme calculado (se a intenção era recriar o despojamento imagético da contemporaneidade, o resultado não foi obtido); e a encenação é evidentemente demarcada e pensada. Além disso, existem planos inexplicáveis (a transa que é  registrada em preto e branco por… câmeras de segurança?) e as dispensáveis leituras feitas à frente de um fundo criado digitalmente.

Dessa maneira, o possível  porto seguro argumentativo da diretora – e que seria constituído a partir do raciocínio de que a ausência de conflitos genuínos e a repetição temática estariam a serviço de uma abordagem semi-documental e objetiva – é sabotado pela própria estética e as várias ferramentas de linguagem que ela emprega, que vão afastando Satã Disse Dance de seu caráter documental e aproximando-o de uma experimentação simples, confusa sobre as suas intenções e completamente desinteressante. 

Satã Disse Dance (Szatan Kazal Tanczyc, Polônia – 2017)

Direção: Katarzyna Roslaniec
Roteiro: Katarzyna Roslaniec
Elenco: Magdalena Berus, Tygo Gernandt, Bartosz Gelner, Danuta Stenka
Gênero: Drama
Duração: 97 min

Redação Bastidores

Publicado por Redação Bastidores

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