No inicio dos anos 1980, John Landis estava em alta. No final da década passada ele dirigiu a inovadora comédia Clube dos Cafajestes, filme precursor do gênero ” besteirol americano”, e que teria o estilo copiado por diversas outras obras seguintes, além de dar fama as fraternidades das universidades americanas. Depois, em 1980, dirigiu a obra Irmãos Caras de Pau, protagonizado pela dupla Dan Aykroyd e John Belushi, na época famosos pela participação no programa de humor Saturday Nigh Live. O sucesso financeiro e de crítica dessas duas películas deu prestígio para Landis, e fez com que a Polygram Pictures bancasse um projeto que era desejo de diretor desde o fim dos anos 60, um filme sobre lobisomens.
Landis teve a ideia desse filme quando estava na antiga Iugoslávia trabalhando como assistente de produção da comédia/guerra Os Guerreiros Pilantras do diretor Brian G. Hutton. Ele estava em um carro com membros de equipe em um carro quando de repente viu um grupo de ciganos fazendo um ritual sobre o corpo de um homem falecido, com o intuito de que ele não ” ressuscitasse da sepultura”. John pensou naquele dia que nunca seria capaz de encarar um morto vivo, e foi a parti dessa ideia que ele redigiu o primeiro rascunho do roteiro. Mas na época, como ainda era um nome desconhecido, teve que arquivar seu projeto por tempo indeterminado até que aparecesse a oportunidade de fazê-lo. E graças aos sucessos adquiridos em seus filmes anteriores, ele poderia finalmente realizar o seu trabalho.
Na Trama, acompanhamos dois jovens mochileiros americanos, David Kessler (David Naughton) e Jack Goodman (Griffin Dune) que estão viajando por uma pequena cidade do interior da Inglaterra, e acabam se perdendo em um pantano. De repente, são atacados por um monstro desconhecido e que se parece com um lobo. O animal é morto pelos aldeões, mas antes consegue retalhar Jack e ferir David, que é levado para o hospital. Lá, ele não se lembra do acontecido, e começa a ser visitado pelo espírito do amigo falecido, que avisa que ele foi amaldiçoado,e que na próxima lua cheia irá se transformar em um lobisomem. Acreditando ser um pesadelo, David tenta voltar a viver sua vida, e começa um relacionamente com a enfermeira do local em que está internado, Alex Price (Jenny Agutter). Porém, a lua cheia se aproxima, e o jovem pode acabar por descobrir que aquilo que ele pensava ser um sonho, é mais real do que ele imagina.
John Landis decidiu filmar a sua obra na Inglaterra, devido ao fato que o clima do local favorecia ao tom que ele queria criar, e dava um charme especial para a obra. A escolha também teve como fato o Eady Levy, que era um imposto sobre a bilheteria, que era usado para subsidiar produções cinematográficas que eram filmadas na Inglaterra. Isso atraiu diversos diretores americanos. Landis ainda conseguiu fazer com que o seu filme fosse o primeiro em 15 a ter cenas gravadas na Piccadilly Circus, uma das praças mais famosas de Londres, e que devido ao grande fluxo de carros, não se permitiam filmagens no local. O diretor teve que ser bem persuasivo, e mostrar o que estava fazendo para a Policia Metropolitana da cidade, que adorou o trabalho, e permitiu os trabalhos entre 1 a 4 da manhã em duas noites.
Landis aqui nos apresenta uma trama bastante simples e que não tem nada de revolucionário. A grande sacada do diretor, é conseguir fazer um filme que ao mesmo tempo conseguir divertir com suas cenas de comédia, e que consegue assustar e chocar com as suas cenas de terror e violência. É extremamente arriscado quando você tenta trazer para um filme dois gêneros que são quase como água e óleo, e essa junção muitas vezes pode acabar sendo desastrosa. Ou pode acabar sendo um grande acerto se for bem feito. Temos exemplos clássicos disso como por exemplo Dança dos Vampiros de Roman Polanski, Uma Noite Alucinante de Sam Raimi, entre outros. E é certo dizer que Um Lobisomem Americano Em Londres faz parte desse seleto grupo. John consegue muito bem trafegar entre o terror e entre uma comédia mais voltada para o humor negro, e hora nenhuma ultrapassa a tênue linha que separa esses dois.
Pelo inicio do filme, já é possível ver qual a intenção do diretor. Na cena do primeiro ataque, Landis consegue criar uma boa atmosfera de suspense e tensão, que vai anteceder a chegada da criatura, e ao mesmo tempo que traz diálogos com um tom mais voltador ao humor negro. Inclusive, já de inicio já vemos referências a cultura britânica, algo que seria constante na obra. Ai então temos as cenas dentro do hospital, onde David começa a ter pesadelos que envolvem a sua maldição. John aqui constrói sequências que ao mesmo tempo que são perturbadoras, são extremamente ridículas, que ao mesmo tempo que ficamos afetados, também nos divertimos com tais alucinações. É difícil saber se o diretor ao fazer esse filme estava tentando homenagear os clássicos, ou fazer uma sátira a eles, ou as duas coisas. Mas é interessante ver que ele quis fazer algo fora da caixa.
O roteiro do diretor consegue fazer com que a narrativa mantenha seu ritmo do inicio até o fim, e hora nenhuma fica arrastado ou perdendo tempo com alguma inutilidade. Landis consegue fazer uma boa construção da personalidade de David, fazendo dele um personagem bastante carismático, e tem um bom timing para o humor, o que facilita com que o público sinta uma afeição,e que se solidarize com a situação que esse enfrenta. Ele é apenas uma vítima que estava no lugar errado e na hora errada, e por causa disso se tornou um amaldiçoado, destinado a se transformar e matar inocentes, e que provavelmente só irã escapar da sua sina quando sua vida. O roteiro ainda cria diversos momentos memoráveis, como os encontros entre o protagonista e o espírito de Jack, que potencializaram ao máximo o nível thrash da obra em questão
Por um lado, se traz bom humor e mantém uma trama dinâmica, o fato do roteiro ter sido construído apenas com o intuito de ser uma boa diversão, fez com ele se tornasse rápido demais, e isso acaba sendo o lado negativo da obra. O romance entre David e Alex parece ser algo extremamente forçado, que fica quase que insuportável os dois juntos em tela. Nada nos é revelado sobre a maldição do lobisomem, e como que ela se procedeu, e qual sua relação com a pequena vila onde Jack e David foram atacados. E Landis deixou de fora uma das principais partes da mitologia dos lobisomens, que é a bala de prata, e isso seria extremamente prejudicial a narrativa. Não posso revelar como, porque seria um spoiler.
Agora é hora de falar do ponto alto da obra, que são seus pontos técnicos. Para trabalhar no filme, Landis chamou o famoso maquiador e especialista em efeitos especiais Rick Baker, que tinha trabalhado em filmes como O Exorcista, King Kong e Star Wars-Episodio IV. John tinha a intenção de mudar a maneira como os efeitos de filmes de terror eram feitos, por isso buscou fazer a transformação de David em um lobisomem totalmente diferente do original, que era basicamente o ator estático e as próteses sendo colocadas. A metamorfose orquestrada por Baker e Landis, é uma cena de total agonia e dor, e que usa de apenas alguns efeitos. Acabou por se tornar a cena mais lembrada do filme, a para muitos a melhor mudança de homem para criatura de todos os filmes sobre licantropia.
A maquiagem também é bastante pesada. As vitimas do Lobisomem são mostradas totalmente dilaceradas, e é impressionante como Baker foi detalhista no seu trabalho. Vale dizer que muito do que foi feito por Rick nesse filme, seria imitado por diversos filmes de terror thrash que surgiriam na mesma década, e que rendeu um Oscar para o maquiador em 1982. Vale falar ainda falar dos efeitos sonoros da obra, que conseguem trazer uma realismo aos ataques do monstro, e também da trilha sonora, que traz vários clássicos da música americana e que tem como temática a lua, e que também contribuem para a mistura maluca que Landis fez no filme.
Um Lobisomem Americano Em Londres não é uma obra prima do gênero, mas tem seus méritos por saber trazer uma boa mistura de terror e comédia, e por efeitos técnicos excepcionais. Cumpre bem a sua missão de entreter, e é bastante diferente dos vários filmes sobre lobisomem que foram feito ao longo dos anos. Vale a pena.
Um Lobisomen Americano Em Londres (An American Werewolf in London) – EUA, 1981
Direção: John Landis
Roteiro: John Landis
Elenco: David Naughton, Griffin Dune, Jenny Agutter, Frank Oz, John Woodvine
Duração: 97 min.