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Crítica | Vingadores: Guerra Infinita – Você não está preparado para isso

Desde que o Homem de Ferro alçou voo pela primeira vez há dez anos atrás, a Marvel Studios realizou um feito notável em suas produções. Baseando-se no modelo das histórias em quadrinhos e no padrão televisivo, os filmes eram todos integrados no mesmo universo, com personagens e narrativas compartilhando participações e eventos. E ao final do primeiro filme dos Vingadores, em 2012, o produtor Kevin Feige estabelecia qual seria a narrativa principal por trás dessa grande história: a busca do vilão Thanos pelas Joias do Infinito. E é justamente nessa proposta que Vingadores: Guerra Infinita se baseia, apostando em uma escala megalomaníaca para entregar uma culminação de todos esses personagens e filmes ao longo da década. O resultado? Estranho e desconjuntado, mas definitivamente grandioso.

Como dito, a trama enfim coloca Thanos (Josh Brolin) ativamente indo atrás das Joias do Infinito para completar sua poderosa Manopla, o que lhe concederia a habilidade de eliminar metade da existência no universo – seu objetivo a fim de encontrar o “equilíbrio” perfeito. A fim de impedir a catástrofe definitiva, todos os Vingadores unem forças entre si, contando também com o auxílio dos Guardiões da Galáxia e dos Magos liderados pelo Doutor Estranho (Benedict Cumberbatch).

Season Finale Maquiavélico

É um filme dificílimo de se estruturar, até mesmo resumir sua sinopse. Essa talvez seja a questão central no longa, que é sua ausência de estrutura. A clássica progressão de três atos? Esqueça. Não há nada neste filme que possa ser visto sob uma óptica sequencial lógica, mas sim como diferentes núcleos narrativos amarrotados sob o mesmo fio condutor: de um lado temos Homem de Ferro (Robert Downey Jr.), Homem-Aranha (Tom Holland) e Estranho responsáveis pela proteção de uma joia específica, enquanto Capitão América (Chris Evans), Viúva Negra (Scarlett Johansson) e Falcão (Anthony Mackie) ajudam Hulk (Mark Ruffalo), Feiticeira Escarlate (Elizabeth Olsen) e Máquina de Combate (Don Cheadle) a proteger Visão (Paul Bettany) e a Joia que este guarda em sua testa, contando também com o auxílio do Pantera Negra (Chadwick Boseman) e toda a nação de Wakanda. E por fim, paralelamente, ainda temos Thor (Chris Hemsworth) separando os Guardiões da Galáxia para duas missões diferentes, na busca de uma arma poderosa o suficiente para derrotar Thanos.

Fica claro que é uma quantidade absurda de núcleos narrativos, ambos de mesma importância. Nunca houve um filme tão grande e com tantas linhas narrativas, e o primeiro reconhecimento vai para o setor de montagem. Jeffrey Ford e Matthew Schmdit fazem trabalho admirável em juntar todos eles, e o mero fato de este filme existir e se sustentar em menos de 3 horas já merece um carinho. Porém, não é o bastante para garantir a coerência que uma história dessas requer: sempre que nos concentramos demais uma das jornadas, outra de igual importância acaba sendo deixada de lado por tempo considerável, o que contribui para a sensação de se estar vendo não um filme, mas uma série de episódios dentro do mesmo pacote. Cada núcleo narrativo gera ramificações, e ainda temos o próprio Thanos em sua jornada pessoal para encontrá-los, adicionando mais caldo à panela.

Uma comparação ideal é aquela com a sequência do aeroporto em Capitão América: Guerra Civil, que de certa forma é uma audição para Guerra Infinita: diversos personagens juntos na mesma luta, mas com núcleos e combinações diferentes que acompanhamos um de cada vez, e que eventualmente se misturam. Não me entendam mal, nem mesmo Thelma Schoonmaker poderia organizar essa narrativa de forma melhor.

Inevitável, mas os roteiristas Christopher Markus e Stephen McFeely (nomes de poder na casa após O Soldado Invernal e Guerra Civil) são eficientes ao manter os estilos particulares de todos os diferentes personagens, então Stark permanece irônico e egocêntrico e os Guardiões mantém a mesma veia cômica que conhecemos nos longas de James Gunn. E assim como fora interessante ver super-heróis diferentes interagindo entre si no primeiro Vingadores, a noção de se ter Thor e o Senhor das Estrelas (Chris Pratt) em uma competição de egos, ou as mentalidades de Strange e Stark trabalhando juntas é algo que causa uma animação, especialmente pelo investimento a longo prazo nessa franquia. Todo o gigantesco elenco que mal cabe no cartaz principal do filme também funciona muitíssimo bem, ainda que Pratt mereça destaque por conter algumas das mudanças mais emotivas dentre todos os personagens, e Cumberbatch surpreende por trazer um Strange mais maduro e sábio.

E, claro, temos o grande vilão Thanos. Em uma decisão curiosa e que faz sentido dentro da lógica narrativa, o Titã Louco é o protagonista da história, afinal é sua busca pelos “macguffins” que acaba movendo as engrenagens e entregando as resoluções mais definitivas nesta parte da história. Dessa forma, Markus e McFeely escrevem o personagem maravilhosamente bem, onde o espectador entende seu raciocínio radical, e também sua noção de misericórdia – jamais haveria assassinato sob sua visão, metade do universo simplesmente deixaria de existir, sem dor alguma. É uma figura complexa, e Josh Brolin se excede ao oferecer tanto o lado sinistro e maquiavélico de Thanos, quanto sua tristeza no “dever espiritual” de garantir equilíbrio ao Universo, e como este fardo lhe fere e rende consequências inesperadas. E fujam dos spoilers, pois a conclusão deste filme é a mais corajosa e impactante que um longa da Marvel (talvez todo o cinema de super-heróis) já teve até hoje.

Os Russos estão chegando!

Com as chaves do reino marvete nas mãos desde o sucesso inesperado de O Soldado Invernal, os irmãos Anthony e Joe Russo têm a gigantesca responsabilidade de comandar o espetáculo. Já tendo experimentado unir diversos personagens em um único filme em Guerra Civil, os Russo elevam a proposta e estilo daquele filme a níveis mais grandiosos. Tendo rodado toda a produção com câmeras IMAX, a dupla mantém o estilo nervoso e rápido das cenas de luta pessoal (como Capitão América e Viúva Negra enfrentando os lacaios de Thanos em um hangar), mas também aproveitam mais o espaço e a escala em sequências amplas. Tudo envolvendo o Thor e os Guardiões é de se encher os olhos, e os irmãos sabem bem como combinar as habilidades dos diferentes personagens, como Estranho projetando plataformas holográficas para o Senhor das Estrelas se movimentar ou até mesmo Homem-Aranha e Stark mesclando seus movimentos para combater um oponente.

Só é uma pena que os Russo ainda mostrem-se um tanto deficientes nos efeitos visuais, já que nenhuma das armaduras digitais convencem, sendo necessário treinar o olhar para ver as cabeças flutuantes de Downey Jr, Holland e Don Cheadle a cada aparição. De forma similar, o CGI no exército alienígena de Thanos é mais um exemplo dos “antagonistas genéricos e descartáveis”, assim como o trabalho de motion capture na Ordem Negra de Thanos, que acaba desperdiçando talentos como os de Carrie Coon e Terry Notary em bonecões digitais. Só mesmo o trabalho em Thanos rende algo digno de nota, ainda que o Titã também tenha seus momentos de artificialidade, especialmente ao interagir com elementos reais – reparem na estranheza da cena em que este levanta um certo personagem humano logo na primeira cena.

Mas são queixas menores. No fundo, Vingadores: Guerra Infinita é o resultado de uma década de histórias e personagens, consolidadas em uma pseudoconclusão que definitivamente representa algo corajoso e diferente para a Marvel nos cinemas. Talvez o cinema de quadrinhos não esteja pronto para esse filme, e isso é algo que definitivamente deixará uma marca duradoura.

Vingadores: Guerra Infinita (Avengers: Infinity War, EUA – 2018)

Direção: Anthony Russo e Joe Russo
Roteiro: Christopher Markus e Stephen McFeely, baseado nos personagens da Marvel Comics
Elenco: Robert Downey Jr., Chris Evans, Chris Hemsworth, Benedict Cumberbatch, Scarlett Johansson, Mark Ruffalo, Chadwick Boseman, Tom Holland, Benedict Wong, Don Cheadle, Sebastian Stan, Anthony Mackie, Josh Brolin, Tom Hiddleston, Paul Bettany, Elizabeth Olsen, Letitia Wright, Danai Gurira, Winston Duke, Chris Pratt, Zoe Saldana, Dave Bautista, Pom Klementieff, Karen Gillan, Paul Rudd, Jeremy Renner, Linda Cardellini, Bradley Cooper, Vin Diesel, Carrie Coon, Peter Dinklage, Terry Notary, Benicio del Toro, Gwyneth Paltrow
Gênero: Aventura
Duração: 149 min

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Publicado por Lucas Nascimento

Estudante de audiovisual e apaixonado por cinema, usa este como grande professor e sonha em tornar seus sonhos realidade ou pelo menos se divertir na longa estrada da vida. De blockbusters a filmes de arte, aprecia o estilo e o trabalho de cineastas, atores e roteiristas, dos quais Stanley Kubrick e Alfred Hitchcock servem como maiores inspirações. Testemunhem, e nos encontramos em Valhalla.

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