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Crítica | Westworld – 1ª Temporada: Trilha Sonora Original

Na tarefa de criar uma série da mesma escala e qualidade da mega produção Game of Thrones, a HBO usou para Westworld algumas das mesmas estratégias que fizeram da adaptação da obra de George R.R. Martin um grande sucesso. Desde um elenco afinado, direção cinematográfica e cenas de ação de primeira, um dos elementos em comum entre as duas séries é a presença do talentoso compositor Ramin Djawadi, que serviu à série de Jonathan Nolan e Lisa Joy de forma absolutamente memorável.

A começar que Djawadi é um mestre no quesito criação de tema. A música de abertura de Game of Thrones virou praticamente um hino, enquanto suas contribuições para o cinema renderam peças memoráveis, como Círculo de Fogo, o remake de A Hora do Espanto e até o deplorável Warcraft beneficia-se de um tema musical memorável. Felizmente, Djawadi oferece algo tão belo e marcante como esses temas para a música de abertura de Westworld, sendo eficiente em transportar todos os diferentes gêneros e elementos da série na composição: o violão que infere o western, o piano que traz o drama e as cordas que sugerem as diferentes narrativas da história, que sabiamente tocam durante a porção da abertura onde vemos as linhas do sistema circulatório sendo construídas no esqueleto dos Anfitriões. Todos os elementos se misturam e rendem uma faixa absolutamente memorável, e cuja melodia já encontra-se tatuada em nossas mentes.

Djawadi segue fielmente essa mistura de instrumentos ao longo da temporada, desenvolvendo diferentes temas que acabam marcados por seus personagens. “Sweetwater” adota a pianola para nos introduzir ao primeiro ciclo narrativo da história, ao passo em que o violão ao fundo deixa sempre presente o ar de western da série, sendo algo digno de um filme de John Ford. A entrada de violinos e cellos aumenta o suspense e o mistério, ao passo em que torna a peça musical moderna e quase anacrônica – esse é um assunto no qual chegaremos em breve. Mas o mais interessante é que Sweetwater surge como um som de rotina fechada graças à repetição das notas e temas, sendo uma melodia deliberadamente repetitiva e que ajuda na identificação geográfica da cidade de Sweetwater durante o decorrer da narrativa.

Temas de personagens também garantem faixas memoráveis, com “This World” sendo uma melancólica – mas esperançosa – composição de piano que traduz musicalmente o arco de Dolores Abernathy. De forma similar, “MIB” traz uma gaita marcante e uma orquestra pesada para conferir o tom de ameaça e perigo ao Homem de Preto, e o fato do sopro assemelhar-se com o barulho do chocalho de uma cobra é algo muito sensato para o personagem. Já o complexo Dr. Robert Ford ganha um longo tema que aposta em uma pesada e dramática orquestra de violinos e cellos, conferindo ainda mais peso à fantástica criação de Anthony Hopkins.

Porém, quando a série toma rumos mais sombrios e abraça completamente o aspecto ficção científica de sua proposta, a música de Djawadi também transforma-se. Os instrumentos mais tradicionais dão espaço a composições inteiramente eletrônicas, como ouvimos em “Freeze All Motor Functions “e “Violent Delights”, ambas associadas ao núcleo da fuga da Anfitriã Maeve das instalações de Westworld. A pulsação e a distorção de sons abstratos garante uma atmosfera tensa e imprevisível, além de conferir um senso de ameaça ainda maior para a implacável Maeve.

E, finalmente, os anacronismos. Através da pianola no saloon Mariposa, Djawadi tem a oportunidade de se divertir ao trazer diversas músicas pop convertidas para o instrumento característico do Velho Oeste. Ouvimos hits como “House of the Rising Sun”, “Black Sun Hole”, ‘Fake Plastic Trees”, “Back to Black” e ‘No Surprises”, o que conferem um ar de modernidade à série – nos lembrando constantemente de que o parque é ambientado no futuro, garantindo um dinâmico anacronismo. Por exemplo, observar a triunfante caminhando pelo cenário western de Sweetwater ao som de um clássico de Amy Winehouse em forma de piano é um pequeno e poderoso momento.

Além da pianola, Djawadi oferece versões de orquestra para duas grandes canções em cenas memoráveis: “Exit Music (For a Film)” do Radiohead para o discurso final de Ford no último episódio, garantindo uma catarse emocional profunda, e a imortal “Paint it, Black” dos Rolling Stones para a apresentação do bandido Hector Escaton durante o assalto ao saloon. Esta última em particular talvez seja um dos momentos musicais mais memoráveis da série, graças a imponência das cordas, pianos e trompetes que Djawadi oferece à canção dos Stones, e confesso que o resultado é quase tão bom quanto a original, sem falar que transformou-se no tema não oficial do personagem de Rodrigo Santoro.

Ainda sobre o anacronismo, vale mencionar como Djawadi pegou duas canções melancólicas e as deixou ainda mais impactantes com seu cover de violinos. “Motion Picture Soundtrack”, também do Radiohead, ganha uma versão tristíssima e digna dos músicos do Titanic para a pesada seqüência em que Maeve descobre a natureza artificial de seu mundo, e as cordas de Djawadi passam quase que rasgando a garganta do espectador. Já “Something I Can Never Have”, do Nine Inch Nails, substitui o piano e a voz suave de Trent Reznor por uma percussão de cordas agudas e graves que garantem um tom místico e cerimonial para a orgia onde William, Dolores e Logan encontram em Pariah. É um efeito muito similar ao de Jocelyn Pook na trilha sonora original de De Olhos Bem Fechados.

Westworld foi um espetáculo tanto em sua narrativa quanto em sua trilha sonora original. Pelas mãos de Ramin Djawadi, a série western sci-fi ganhou uma identidade única e anacrônica, graças a um misto de composições criativas e covers de canções modernas. Mal posso esperar para ouvir o que a pianola do Mariposa vai tocar na segunda temporada…

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Publicado por Lucas Nascimento

Estudante de audiovisual e apaixonado por cinema, usa este como grande professor e sonha em tornar seus sonhos realidade ou pelo menos se divertir na longa estrada da vida. De blockbusters a filmes de arte, aprecia o estilo e o trabalho de cineastas, atores e roteiristas, dos quais Stanley Kubrick e Alfred Hitchcock servem como maiores inspirações. Testemunhem, e nos encontramos em Valhalla.

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