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Oscar 2019 | Kevin Hart e o telhado de vidro em Hollywood

No início da semana passada, foi anunciado pela mídia especializada em entretenimento que a Academia de Ciências e Artes Cinematográficas de Hollywood cogitava a possibilidade de não haver apresentador fixo na cerimônia do Oscar 2019 após a saída de Kevin Hart, pouco tempo depois do comediante ter sido convidado e oficializado para o trabalho. O motivo do desligamento de Hart está relacionado com a divulgação de antigos tweets do ator que traziam suposto conteúdo homofóbico, o que levou a Academia a exigir de Hart desculpas pelas publicações, algo que o artista se recusou a fazer, preferindo abrir mão da apresentação da cerimônia.

Embora a possibilidade estudada pela entidade máxima do cinema estadunidense ainda não tenha sido oficializada – ainda é possível que um(a) novo(a) apresentador(a) seja anunciado(a) –, fica evidente que Hollywood assumiu sua imperfeição. Com a perspectiva do resgate das bobagens que qualquer um postou alguma rede social num longínquo momento, assume-se que não há ninguém suficientemente imaculado para comandar a noite mais glamourosa do cinema mundial. Isto posto, Kevin Hart acertou ao dirigir, pouco tempo depois do seu afastamento, por livre vontade e não por imposição da Academia, suas desculpas às pessoas possivelmente ofendidas com seus comentários. Afinal, se não há santos na Cidade dos Anjos, por que Hart teria que se rebaixar diante da hipocrisia dos astros e estrelas de Hollywood?

O ocorrido com o ator de Jumanji: Bem-Vindo à Selva é mais um dos sintomas de uma epidemia terrível, o politicamente correto, que vem corroendo as relações sociais e exigindo uma cautela absurda das figuras públicas, obrigadas a omitir suas visões pessoais de mundo e seus valores sob o risco de terem suas reputações arruinadas pelos ativistas virtuais – uma alcunha mais delicada para os miseráveis stalkers. O absurdo chegou ao ponto de Hart, pai de três meninos, ter sido atacado por expor um temor natural que todo pai responsável, fiel aos seus valores e preocupado com o destino dos filhos tem – ou deveria ter. Nas palavras do próprio comediante, publicadas em um tweet de 2010: “One of my biggest fears is my son growing up and being gay. That’s a fear. Keep in mind, I’m not homophobic. . . . Be happy. Do what you want to do. But me, as a heterosexual male, if I can prevent my son from being gay, I will” (“Um dos meus maiores medos é que meu filho cresça e se torne gay. É um receio. Observe, eu não sou homofóbico… Seja feliz. Faça o que você quiser. Mas se eu, como homem heterossexual, puder evitar que meu filho se torne gay, eu farei isso”).

Focando no que foi dito e não indo além disso, o que há na fala de Kevin Hart nada mais é do que a preocupação de um pai com o amanhã dos seus garotos. Como pai, é direito dele temer pelas escolhas dos herdeiros e empenhar-se, tendo como referências seus valores, na condução da criação de sua prole para o que considera um futuro seguro e feliz, mesmo que tal futuro seja apenas uma esperança. Aliás, isso é mais do que um direito: é um dever. Cabe a todo pai ser um modelo de masculinidade aos seus filhos – o que nada tem a ver com machismo – , independente de sua orientação sexual, e a crítica a Hart por tal postura mostra como a sociedade deste início de século XXI é invasiva e desrespeitosa diante dos direitos individuais.

Acabar com reputações criadas a partir de determinação, trabalho duro e talento fazendo uso do passado registrado num passatempo infrutífero (a meu ver, as redes sociais não passam disso), que apenas imbecis levam a sério, é a nova moda em Hollywood e já está causando estragos (lembram-se da demissão de James Gunn da Disney exatamente pela mesma razão?). Concordar ou discordar do posicionamento de uma celebridade sobre qualquer assunto deve voltar a ser algo natural e não ir além disso. Afinal, por trás da imagem artificialmente perfeita dos astros e estrelas do entretenimento, há pessoas, indivíduos, todos sujeitos a erros, livres para pensarem como bem entenderem, gostemos disso ou não. Levando-se em conta a chance de um Oscar 2019 com vários apresentadores, a Academia pode ter entendido que, sobre ela, o teto também é de vidro.

Redação Bastidores

Publicado por Redação Bastidores

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