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Tecnologia | Análise: Bamboo Spark

Em qual momento uma das principais artes deixou de ser apenas um hobbie para se tornar o maior instrumento de registro histórico? Bom, creio que desde sempre. Mesmo que nossos ancestrais não tivessem a menor ideia que rabiscos e pinturas em pedra e argila se tornariam elementos cruciais para decifrar a nossa História. Nascia ali, a escrita como a documentação histórica.

Em tempos, a pedra deu lugar ao papiro que deu lugar ao papel que deu lugar para texto digital. Sim, esse mesmo que você lê agora através de um instrumento eletrônico seja smartphone, tablete, notebook, computador ou até mesmo em seu televisor smart.

O íntimo contato da tinta com o papel que fora preservado por milênios parece ter encontrado sua nêmese: a consolidação da computação doméstica. As teclas da máquina de escrever, ainda cravando a tinta no papel, deram lugar para as teclas do computador que geram palavras em um documento virtual.

Entretanto, em pleno século XXI, ainda existem pessoas que escrevem no papel? Claramente que sim e é justamente visando atender uma demanda carente que a Wacom se aventurou a criar o Bamboo Spark.

O Bloco de Notas ‘Smart’

É evidente que o produto se direciona a um nicho específico de consumidor. Digamos que você faça a mesma coisa que eu, seja um jornalista de cultura e faça algumas críticas de cinema por semana. Nas cabines, é comum levarmos um bloco de anotações para apontar elementos importantes do filme que podemos esquecer em um futuro próximo.

Uma das coisas mais chatas é justamente transcrever as anotações para o documento no computador – esse é um ritual meu, há quem nem transcreva as anotações. Ou digamos que você entreviste alguém e escreva as respostas da pessoa e precise levar tudo ao documento no Word?

Certamente seria uma chatice incrível e realmente é. Por isso que o Bamboo Spark tem uma proposta tão intrigante: levar tudo o que você escreveu no papel diretamente como uma imagem ou um arquivo de texto virtual para seu smartphone onde você poderá encaminhar o texto para onde quiser.

Realmente, é bastante abstrato para entender, mas é isso mesmo: você escreve em um papel com uma caneta e o equipamento sincroniza via bluetooth com seu smartphone transferindo tudo o que foi escrito naquela página para um documento virtual.

Para alunos de cursinho, parece a realização do sonho de uma vida. Mas como raios a Wacom conseguiu tornar ficção científica em realidade? Afinal, não é a caneta que é inteligente, nem o papel A5 que é apenas um bloco normal que pode ser substituído por qualquer outro A5 que encontre na papelaria, mas sim o fundo da pastinha que agrega todos os instrumentos.

O fundo sensitivo eletromagnético fica atrás do bloquinho A5 padronizado em 30 páginas – é recomendado usar blocos de até 50 páginas, maior que isso, é possível que o aparelho não consiga reconhecer seus desenhos e textos por conta da espessura do papel. Já a caneta é insubstituível, pois ela conversa diretamente com o pad. Ou seja, não dá para usar aquela Bic que está sempre à mão. A boa notícia é que a Wacom disponibiliza pacotes com 4 cartuchos por R$ 50,00 em diversas lojas.

Diferentes públicos, diferentes possibilidades

A graça do equipamento é esse diálogo excepcional que ele possui com consumidores nem tão familiarizados com tecnologia. Temos apenas dois botões físicos no aparelho: um para ligar o pad e outro para sincronizar a página rabiscada com seu smartphone ou tablete. A conexão é feita através bluetooth que sincroniza a memória do pad com o aplicativo da Wacom. São dois apps que conversam com o aparelho: Bamboo Paper e Inkspace – recomendo o último.

A configuração do aplicativo é simples: pede um registro no servidor da Wacom e algumas configurações básicas como idioma e um pedido de pareamento com o Spark – outro processo simples.

Para transferir o que você escreve no bloco de notas para o aplicativo é preciso ligar o pad antes com o botão físico da base da coluna da pasta. Nisso, se acenderá um led verde indicando que o aparelho está ligado. Assim que tocamos a caneta no papel para começarmos a escrever, esse led ficará azul para informar que está recebendo as informações corretamente.

Para transferir o conteúdo escrito para o app, só é preciso apertar o botão do meio, logo abaixo do led, que o processo é feito com notória rapidez. O dispositivo também sincroniza com o app a cada cinco minutos quando em uso.

Agora, sobre a sensibilidade do pad. De fato, ele reconhece traços duros e médios, mas se a pressão da caneta for muito leve, o aparelho não reconhecerá o que foi escrito ou desenhado. No geral, o pad se sai melhor com anotações curtas e desenhos que não exijam traços leves.

Colcha de Retalhos

Para textos grandes, redações ou anotações de atas enormes, o melhor a se fazer é escrever um ou dois parágrafos e já enviar para a nuvem transmitir no seu celular. O que ocorre é que o pad muitas vezes se confunde com textos longos, misturando frases ou sobrepondo o que foi escrito antes deixando a página uma verdadeira bagunça quando checamos a imagem gerada no aplicativo.

Não é uma má ideia enviar o texto por trechos para o aplicativo, pois há uma opção que permite colar diversas imagens em uma só. É basicamente um processo de “costura”. Com os desenhos ou textos, podemos enviar a imagem para praticamente todas as redes sociais existentes ou para o e-mail e dropbox.

No inkspace há a proposta revolucionária do Bamboo Spark: o recurso ‘ink to text’. Ou seja, ele lê as palavras que escreveu no papel através da imagem e converte diretamente para texto digital que também pode ser compartilhado de diversas formas. O problema é o preset de idioma. Mesmo havendo a opção de português de Portugal, o app falha diversas vezes em reconhecer o que foi escrito. Testei com diferentes caligrafias, mas somente parte do conteúdo que era convertido de modo correto.

O cenário já muda quando escrevemos em inglês com o app conseguindo transcrever 90% do que foi escrito no papel. Certamente ele se dá melhor com frases ou anotações curtas e desenhos de traços mais grossos como rascunho digital. A proposta do produto incentiva seu uso como um porto seguro para salvar ideias inesperadas.

O problema é o certo anacronismo que há por trás de seu propósito. Dificilmente vejo um mercado mais jovem aderindo um produto que busca fazer a ponte entre o analógico e o digital, já que possuem diversos aplicativos que realizam tarefas parecidas nos celulares. Ainda que nada substitua a firmeza e a sensação de escrever no papel com uma caneta e ter essa facilidade de transcrever recados e desenhos para a nuvem, ainda é um produto de uso específico.

Nosso próprio teste aqui na redação. Repare no sombreamento mais delicado do desenho. O pad, infelizmente, não reconhece os traços. Porém, traz uma versão digital bem próxima do desenho real.

Um Natal cheio de histórias

Para quem ama escrever e desenhar nas ruas ou até mesmo em casa, é uma boa pedida para colocar na lista de desejos neste Natal. A proposta é bem-vinda e deve conversar bastante com pessoas que passam por situações similares as minhas ou até mesmo com estudantes que desejam transcrever suas anotações em sala de aula.

Fora a efeciencia, em parte, em entregar o que promete, o produto possui muita qualidade na construção. A caneta é elegante e tem o peso certo, o acabamento da pasta é ótimo contendo um porta-caneta e uma case embutido disponível em 2 versões no Brasil: para tablets de até 8” ou para acoplar smartphones. A bateria tem boa autonomia, durando de 8 a 10 horas. Mas é preciso ficar atento. O produto não tem um modo stand by como um Kindle, por exemplo. Sempre é preciso ligar e desligar o pad antes de escrever qualquer coisa e é fácil se esquecer desse pequeno, mas crucial detalhe.

A Wacom segue um caminho interessante com o Spark, mas ainda é preciso melhorar o reconhecimento e sensibilidade do pad para permitir a escrita de textos mais longos ou de desenhos com traços gentis. Há espaço para a evolução e espero que um próximo dispositivo aperfeiçoe os poucos defeitos que o aparelho tem.

Por hora, o Spark consegue revolucionar a relação entre escrita digital e física ao unir o melhor e a praticidade de dois mundos.

P.S.: a introdução deste texto foi escrita com o Bamboo e transcrita pelo recurso ink to text do aplicativo.

Prós: ótimo acabamento, facilidade de encontrar cartuchos de tinta no mercado, aceita blocos de papel A5 de diferentes marcas, boa autonomia, bom reconhecimento em língua inglesa e satisfatório na digitalização de pequenas notas em português, digitalização bastante fiel de esquetes, rascunhos ou protótipos de desenhos de traços médios, indicado para uma infinidade de consumidores de diferentes profissões, design discreto e elegante, bolso para tablets ou celulares, confortável, acompanha cabo USB para recarga de bateria, facilidade de uso, casamento do analógico com o digital, sincronização veloz com o aplicativo, comunicação via bluetooth com tablets e celulares, opções diversas para compartilhamento.

Contras: pad se atrapalha em preservar textos longos, ink to text deixa a desejar em português, falta de sensibilidade para reconhecer traços mais delicados – não tente substituir uma mesa digitalizadora por uma Spark, ausência completa de modo stand by, só funciona com a caneta do kit.

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Publicado por Matheus Fragata

Editor-geral do Bastidores, formado em Cinema seguindo o sonho de me tornar Diretor de Fotografia. Sou apaixonado por filmes desde que nasci, além de ser fã inveterado do cinema silencioso e do grande mestre Hitchcock. Acredito no cinema contemporâneo, tenho fé em remakes e reboots, aposto em David Fincher e me divirto com as bobagens hollywoodianas.

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