A drástica decisão de suspender o programa Jimmy Kimmel Live! na última quarta-feira (17) pode ter sido motivada por muito mais do que um monólogo controverso. Nos bastidores da indústria, a atitude da Nexstar Media, o grupo de emissoras que iniciou a revolta contra o apresentador, está sendo vista como uma manobra estratégica para agradar a Comissão Federal de Comunicações (FCC). O motivo? A empresa precisa desesperadamente da aprovação do órgão regulador para concluir uma fusão de US$ 6,2 bilhões que a tornaria a maior proprietária de emissoras de TV locais nos Estados Unidos.
A suspensão de Kimmel, portanto, se torna uma peça central em um complexo xadrez corporativo, onde a liberdade de expressão de um dos maiores apresentadores do país pode ter sido sacrificada em nome de um negócio bilionário.
O ‘timing’ perfeito para agradar o regulador
A crise foi iniciada pela Nexstar. Após o presidente da FCC, Brendan Carr, criticar duramente os comentários de Kimmel sobre o assassino de Charlie Kirk, a empresa de Perry Sook foi a primeira a anunciar que tiraria o programa do ar em suas afiliadas da ABC. A atitude pró-regulador acontece em um momento crucial: a Nexstar anunciou a aquisição da rival Tegna, mas o negócio enfrenta um grande obstáculo legal. A fusão faria a empresa ultrapassar em muito o limite de participação de mercado permitido pela FCC.
Para que o negócio de US$ 6,2 bilhões seja aprovado, a Nexstar precisará que o presidente da FCC, Brendan Carr — um crítico de Kimmel e nomeado por Donald Trump —, flexibilize as regras. A decisão de tirar do ar um programa que desagrada o regulador é vista por analistas da indústria como um claro aceno em busca de favores.
‘Tendência perigosa de corporações’, diz sindicato
A possível conexão entre a suspensão e a fusão não passou despercebida. Órgãos de fiscalização e sindicatos já se manifestaram. O sindicato Hollywood Teamsters “condenou” a iniciativa, afirmando que está testemunhando “uma tendência perigosa de corporações tentando acelerar fusões pela porta dos fundos”.
“Quando você tem conglomerados com fusões (…) que precisam ser aprovados por órgãos reguladores, isso dá aos reguladores um poder que este governo parece muito disposto a usar”, alertou Samuel G. Freedman, professor emérito da Escola de Jornalismo de Columbia.
A cronologia da crise
Apesar de a Nexstar ter afirmado em comunicado que a decisão foi tomada “unilateralmente” e sem contato com a FCC, o timing dos eventos levanta suspeitas. A crise se desenrolou em menos de 48 horas:
- Segunda-feira: Jimmy Kimmel faz o monólogo polêmico.
- Quarta-feira (início da tarde): O presidente da FCC, Brendan Carr, critica Kimmel e ameaça as afiliadas.
- Quarta-feira (fim da tarde): A Nexstar, que precisa da aprovação de Carr para sua fusão, anuncia que vai suspender o programa.
- Quarta-feira (noite): Com a revolta de suas parceiras, a Disney/ABC suspende o Jimmy Kimmel Live! em todo o país.
O caso se tornou um estudo de caso sobre como os interesses comerciais bilionários podem influenciar decisões editoriais e potencialmente criar um “efeito inibidor” sobre vozes críticas na mídia.