Em 2018, nos históricos estúdios da Paramount, a decisão de dar luz verde a mais dois filmes da saga “Missão: Impossível” com Tom Cruise, após o estrondoso sucesso de “Efeito Fallout”, parecia promissora, mas tudo mudaria em questão de meses. Uma matéria do THR explica como os filmes atuais dificilmente conseguirão trazer lucro para seus estúdios.

Bastidores de uma crise: o impacto da pandemia, greves e inflação nos cofres dos estúdios

Uma confluência de fatores transformou a produção cinematográfica em um desafio financeiro sem precedentes. Atrasos provocados pela pandemia de COVID-19, paralisações devido a greves de roteiristas e atores, a necessidade de refilmagens e o aumento generalizado de custos impulsionado pela inflação inflaram drasticamente os orçamentos. Títulos aguardados como “Missão: Impossível – O Julgamento Final”, “Superman” da DC Studios/Warner Bros., e “Jurassic World: Renascimento” da Universal/Amblin, lutam com cifras que exigem retornos de bilheteria monumentais para justificar o investimento. Mesmo “Renascimento”, que buscou reduzir seu orçamento em relação ao antecessor, ainda representa um investimento considerável. Estratégias como filmar fora de Los Angeles e buscar incentivos fiscais em outros estados ou países tornaram-se mais cruciais do que nunca.

Radiografia dos gigantes: Missão Impossível, Superman, Jurassic World e F1 na berlinda financeira

“Missão: Impossível – O Julgamento Final”, um dos filmes mais caros já produzidos, exemplifica essa tendência. Embora os números exatos do sinal verde original para os dois últimos filmes da franquia sejam guardados a sete chaves, estima-se que “O Julgamento Final” rivalize com gigantes como “Star Wars: O Despertar da Força” (US$ 447 milhões em 2015) e “Jurassic World: Reino Ameaçado” (US$ 432 milhões em 2018). Assim como ele, “Avatar: O Caminho da Água” (2022) e “Jurassic World: Domínio” (2022) também viram seus custos ultrapassarem a marca dos US$ 400 milhões líquidos, antes dos gastos com marketing.

A polêmica em torno do orçamento de “Superman” ilustra bem a nebulosidade dessas cifras. Documentos submetidos em Ohio para incentivos fiscais apontavam um custo bruto de US$ 363,8 milhões para o filme de julho, número veementemente contestado pelo diretor James Gunn, que também lidera a DC Studios. Posteriormente, a DC sugeriu um valor líquido de US$ 225 milhões. Contudo, um financiador veterano e fontes do mercado consideram o valor bruto plausível, especialmente ao somar uma campanha de marketing global que pode alcançar US$ 200 milhões, catapultando o investimento total para o clube dos US$ 400 milhões.

“Jurassic World: Renascimento”, que estreia em nove dias antes de Superman, no feriado de 4 de julho, com um elenco renovado encabeçado por Scarlett Johansson, teria um orçamento líquido de US$ 180 milhões, segundo fontes. Outros contestam, sugerindo que os custos totais, incluindo marketing, podem variar entre US$ 330 milhões e US$ 400 milhões. Até mesmo “F1”, da Apple Original Films, com lançamento nos cinemas pela Warner Bros., gera burburinho com um orçamento que, segundo uma fonte, chega a US$ 300 milhões – valor contestado pelos cineastas, que pode ser significativamente menor após deduções fiscais, ou inflar para US$ 400 milhões com marketing.

A sede por bilhões: quando o ponto de equilíbrio desafia a lógica do mercado

Com orçamentos tão inflacionados, a pressão por um desempenho excepcional nas bilheterias é imensa. “Não há como defender esses orçamentos, porque quando você chega ao ponto de equilíbrio de US$ 700 milhões a US$ 900 milhões em termos de bilheteria e receita auxiliar, não faz sentido”, avalia um financista veterano. Apesar do ceticismo, há otimismo para alguns. “Superman”, por exemplo, está com forte engajamento nas redes sociais, com seu primeiro trailer completo ultrapassando 250 milhões de visualizações, um recorde para a Warner/DC. Métricas como essa sustentam projeções de arrecadação que poderiam superar US$ 1 bilhão globalmente. “Missão: Impossível – O Julgamento Final”, que estreou no Memorial Day há menos de duas semanas, deve cruzar a marca de US$ 400 milhões globais nos próximos dias, com expectativas de superar significativamente seu predecessor, “Missão: Impossível – Acerto de Contas Parte Um”, que sofreu com a concorrência de “Barbie” e “Oppenheimer”.

O valor além do ingresso: franquias como ativos estratégicos e fontes contínuas de renda

Contudo, a análise do sucesso de um filme, especialmente de uma franquia, transcende a arrecadação imediata. “Ao analisar o desempenho de um filme que é um segmento de uma franquia, é preciso analisar a franquia holisticamente”, afirma um veterano de estúdio. Cada novo filme não apenas gera receita própria, mas também impulsiona o valor de toda a propriedade intelectual, estimulando vendas de licenciamento para TV, merchandising, home entertainment (como edições especiais em DVD) e streaming. Como exemplo, a campanha de relançamento digital dos filmes anteriores de “Missão: Impossível” em antecipação a “O Julgamento Final” foi um sucesso, com vendas de pacotes e filmes individuais aumentando expressivamente. Propriedades como “Missão: Impossível” e “Jurassic World” são ativos cobiçados que podem ser cruciais na avaliação de um estúdio para uma possível aquisição.

O legado de Cruise e o horizonte da IA: um ponto de inflexão para as superproduções?

A era dos orçamentos estratosféricos e das produções épicas com estrelas realizando suas próprias cenas de ação, como Tom Cruise em “Missão: Impossível”, pode estar se aproximando de um ponto de inflexão. “Nunca mais veremos um filme em que um ator faz suas próprias cenas de ação e com tão pouco CGI”, prevê uma fonte próxima à produção de M:I. “A inteligência artificial assumirá o controle.” Essa perspectiva, somada à pressão financeira, sinaliza um futuro incerto e potencialmente transformador para a forma como os blockbusters são concebidos e realizados em Hollywood.

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Matheus Fragata

Editor-geral do Bastidores, formado em Cinema. Jornalista, assessor de imprensa.

Apaixonado por histórias que transformam. Todo mundo tem a sua própria história e acredito que todas valem a pena conhecer.

Contato: matheus@nosbastidores.com.br

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