Critica | Crimes do Futuro traz David Cronenberg de volta ao body horror
Um dos grandes nomes do cinema de ficção científica finalmente está de volta. Após quase uma década afastado das telas, David Cronenberg retorna às telas, e ainda o faz ao retomar suas raízes no body horror grotesco com Crimes do Futuro.
Protagonizado por Viggo Mortensen, Léa Seydoux e Kristen Stewart, o filme imagina um futuro onde a humanidade é incapaz de sentir dor, e encontra prazer e entretenimento em artes performáticas de cirurgia; com direito a autópsias e órgãos sintéticos.
Definitivamente é um filme raíz de Cronenberg, explorando novamente o niilismo humano e muitos efeitos práticos para criar algumas das imagens mais marcantes do cinema em 2022, onde Viggo Mortensen mais uma vez entrega uma grande performance ao lado do cineasta.
Infelizmente, só faltou uma história mais envolvente em Crimes do Futuro para colar todos esses conceitos, personagens e cirurgias nada ortodoxas. É, essencialmente mais um ensaio de tese do que um filme.
Confira o comentário completo no canal de YouTube do Lucas Filmes.
https://www.youtube.com/watch?v=gR66HfB0YvQ&t=3s
Crítica | Ms. Marvel começa muito bem, mas cai no lugar comum
Desde que a Marvel Studios tem se aventurado em produções seriadas no Disney+, basicamente levando sua premissa de universo compartilhado para o streaming, esperei por alguma mudança radical. No cinema, o modelo bilionário implementado por Kevin Feige rendeu boas experiências e easter eggs divertidos, mas quase 20 anos depois, já se mostra esgotando a criatividade autoral de seus realizadores.
Passando por WandaVision, Falcão e o Soldado Invernal, Loki, What If...?, Gavião Arqueiro e Cavaleiro da Lua, é um processo torto para o MCU. Alguns acertos, muitos erros e, só agora, um real investimento em novos personagens. Após o vigilante perturbado de Oscar Isaac, é a vez da heroína paquistanesa Kamala Khan ganhar as telas em Ms. Marvel, uma série que realmente começa com muita promessa, mas infelizmente cai no mesmo lugar comum do MCU.
A trama nos introduz à carismática adolescente Kamala Khan (a estreante Iman Vellani), filha de uma família paquistanesa que mora em Nova Jersey, e obcecada pelos atos grandiosos dos Vingadores e todos os heróis que habitam o universo - em especial a Capitã Marvel. Quando Kamala recebe um bracelete misterioso de sua avó, ganha poderes sobrenaturais que logo a colocam na mira de vários inimigos perigosos; ao mesmo tempo em que parte em uma jornada para entender a origem de suas habilidades.
De início, Ms. Marvel realmente encanta por seu enfoque no coming of age. Mais preocupado em drama adolescente e as pressões do colegial, a série comandada por Bisha K. Ali gasta bastante tempo construindo as relações humanas de seus protagonistas, enfim dando espaço para o cidadão comum, o literal "mundo" que os heróis estão sempre salvando, mas que nunca eram banhados pelo holofote. Seja nas amizades de Kamala e seus amigos de escola, ou nas dóceis cenas envolvendo sua carismática família paquistanesa, o coração de Ms. Marvel bate muito forte.
Fica ainda melhor graças às realizações estéticas da produção. Preenchendo a tela com mais cor, fumaça e neon do que qualquer outra obra do MCU, toda a paisagem visual de Ms. Marvel é de se encher os olhos, especialmente porque seu piloto é ditado pela talentosa dupla belga Adil El Arbi e Bilall Fallah (que conquistaram Hollywood após Bad Boys para Sempre), que injetam energia e emoção nas situações mais cotidianas - é um estilo maravilhoso e digno do que esperamos de uma adaptação de histórias em quadrinhos.
O problema da série começa a aparecer na metade. Ms. Marvel bem que se sairia muito melhor se os grandes perigos envolvessem provas da escola ou castigos dos pais, mas infelizmente o lado MCU fala mais alto e não demora para que vilões de conceitos macarrônicos, lutadores extradimensionais, viagem no tempo e sociedades secretas comecem a estragar o belíssimo tom e contexto perfeitamente estabelecido em seu terço inicial. É uma decisão que ainda acarreta em cenas de ação medianas, efeitos visuais de qualidade duvidosa e mudanças de comportamento apressadas em diversos personagens.
Em uma franquia tão colossal e que satura-se a cada ano que passa, Ms. Marvel tinha o segredo para reinventar a roda: apostar em sua própria simplicidade. Uma verdadeira pena que essa ingenuidade criativa e vibrante troque espaço para a velha fórmula do MCU em sua metade final. Quase uma ótima série.
Confira mais comentários sobre a série no canal de YouTube do Lucas Filmes.
https://youtu.be/s0WUBG54-wQ
Crítica | O Telefone Preto é o melhor e mais sinistro filme de terror do ano
Em um mundo de terror moderno dos anos 2000 dominado por James Wan, o cineasta Scott Derrickson sempre foi uma sombra interessante. Apesar de um estilo similar ao do criador das franquias Jogos Mortais e Invocação do Mal, Derrickson sempre trouxe um olhar curiosamente religioso e estudioso acerca do horror, como bem mostram O Exorcismo de Emily Rose e Livrai-nos do Mal.
Se aventurando pelo cinema mais comercial, Derrickson ousou refilmar o clássico O Dia em que a Terra Parou e então foi abraçado pela nerdice cinematográfica ao dirigir o primeiro Doutor Estranho. Após diferenças criativas com o modelo de universo de Kevin Feige, Derrickson deixou a direção de Doutor Estranho no Multiverso da Loucura e voltou à sua origem no terror, mirando bem mais agora em seu filme mais celebrado, A Entidade.
Ao lado da competente Blumhouse e de seu mais frequente colaborador, o roteirista C. Robert Cargill, Derrickson volta-se para uma conto de Joe Hill, e o resultado está em O Telefone Preto, uma das mais intensas e satisfatórias experiências cinematográficas de 2022 até agora.
Ambientada na década de 1970, a trama mostra uma uma vizinhança familiar assombrada por um maníaco raptador de crianças conhecido como Sequestrador (Ethan Hawke). Quando o jovem Finn (Mason Thames) é levado pelo mascarado, ele fica em cativeiro em um porão desolado, com apenas um telefone preto na parede. À medida em que ele recebe ligações misteriosas, que parecem ser das vítimas mortas do Sequestrador, o Finn precisa achar um jeito de escapar.
Ou seja, trata-se de um clássico filme de cativeiro. Seguindo à risca o subgênero em que o espectador acompanha a vítima durante quase todo o processo, mas O Telefone Preto conta com o brilhante diferencial de seu peculiar elemento sobrenatural, com as vítimas se comunicando através do telefone. Isso rende uma faceta ao mesmo tempo sinistra, já que Derrickson aposta em aparições fantasmagóricas em tais momentos, mas também reconfortantes - vide a tocante cena em que Finn consegue falar com um amigo querido.
Há um bom equilíbrio nessas cenas, que remete muito ao clima dúbio de O Sexto Sentido, onde o protagonista se assusta primeiro, mas acaba sendo receptivo e emotivo à presença sobrenatural; e o filme carrega isso bem com uma mensagem batida, mas convincente, de amadurecimento. Visto que Joe Hill é filho de Stephen King, não é difícil encontrar inúmeras semelhanças entre Hill e seu pai, seja nas metáforas de adolescência, a camaradagem do coming of age e, especialmente entre O Telefone Preto e It: A Coisa, assassinos de crianças com sorrisos malignos e balões de ar.
O filme é bem seguro na construção do suspense, já que Derrickson e seu diretor de fotografia Brett Jutkiewicz aposta nas cenas que ilustram a rotina do Finn, seu pensamento, o raciocínio e também como o jovem pode improvisar pra usar o ambiente a seu favor; às vezes em momentos inteiramente visuais, sem diálogos. São sequências muito bem montadas e, mesmo com um orçamento pequeno, garantem à produção uma ótima recriação de época, especialmente com o uso de fotografia em 8mm para representar os flashbacks e sonhos de uma personagem específica.
Nesse sentido, o jovem Mason Thames é um ator competente e segura diversas dessas cenas sozinho, mas é mesmo a presença assustadora de um transformado Ethan Hawke que rouba a cena em O Telefone Preto. Mesmo não aparecendo de rosto completo por muitas porções da trama, já que Hawke passa grande parte do tempo usando diferentes máscaras, Hawke cria um vilão perturbador e cuja presença constantemente gera uma sensação incômoda, principalmente pela postura, pela voz e pelos olhares.
Porém, a grande surpresa do filme está mesmo na novata Madeleine McGraw. Na pele de Gwen, a irmã mais nova de Finn, a atriz surpreende pela excepcional mistura de drama e humor em sua performance, oferecendo um contrabalanço perfeito para a atuação mais silenciosa de Thames. McGraw protagoniza uma subtrama, por sinal, que é um tanto tola no papel, mas que ganha força graças ao ótimo trabalho da atriz - que tem a entrega de fala do ano, ao questionar uma presença divina durante uma oração. Definitivamente o ponto alto do elenco, e só tenho a lamentar que McGraw nunca contracene com Hawke.
Todo o retrato de McGraw, inclusive, é bem representativo do tipo de mundo que Derrickson parte para criar. Inspirado por suas próprias experiências de infância, o mundo adolescente de O Telefone Preto é bem verossímil e brutal; se nas décadas de 70 e 80 tínhamos um efeito suavizado ao assistir marmanjos de 30 anos interpretando colegiais, o elenco do filme é excepcional ao realmente trazer pré-adolescentes xingando, se batendo e até acertando uns aos outros com pedras. Um cenário mais robusto e violento, e que fornece um bom cenário para o desenrolar da trama.
O único ponto mais frágil da trama também está ligado a esse cenário. Novamente atrelado a arquétipos típicos da obra de Stephen King, O Telefone Preto aposta em uma subtrama bem artificial envolvendo o pai alcoólatra de Finn e Gwen (vivido por Jeremy Davies), que também garante alguns momentos bem mais engessados e de mão pesada. Felizmente, estão mais restritos ao primeiro ato, e o longa compensa o lado emocional ao investir mais na relação de irmão e irmã dos protagonistas.
No geral, O Telefone Preto é mais um grande acerto da Blumhouse e um dos melhores trabalhos que Scott Derrickson já fez na vida. Curiosamente, é um filme essencialmente de Stephen King, algo ainda mais curioso de se constatar visto que seu criador é justamente o filho do autor de terror. No fim, de tudo certo: Sam Raimi fez um ótimo filme do Doutor Estranho e Scott Derrickson nos entregou um ótimo terror. Às vezes a realidade se escreve sozinha.
O Telefone Preto (The Black Phone, EUA - 2022)
Direção: Scott Derrickson
Roteiro: Scott Derrickson e C. Robert Cargill, baseado no conto de Joe Hill
Elenco: Ethan Hawke, Mason Thames, Madeleine McGraw, Jeremy Davies, E. Roger Mitchell, Troy Rudeseal, Miguel Cazarez Mora
Gênero: Terror, Suspense
Duração: 143 min
https://www.youtube.com/watch?v=30RSX5KhDVU
Thor: Amor e Trovão tem estreia gigante nas bilheterias dos EUA
Como já era esperado, Thor: Amor e Trovão teve uma estreia expressiva nas bilheterias norte-americanas neste final semana. O novo filme da Marvel Studios abriu com US$143M no último final de semana, tornando-se a maior estreia de um longa da franquia do Deus do Trovão.
Mundialmente, a nova comédia dirigida por Taika Waititi já traz o valor de US$302M juntando com os principais mercados internacionais, incluindo o Brasil.
Em segundo lugar, o sucesso animado Minions: A Origem de Gru segue forte com US$45M, já trazendo seu total internacional para o valor expressivo de US$400M.
Ainda no top 5, o sucesso de Top Gun: Maverick é incapaz de ser controlado, enquanto até mesmo a cinebiografia musical Elvis segue atraindo um público mais velho de volta às salas de cinema.
Confira a análise completa da bilheteria americana no canal de YouTube do Lucas Filmes.
https://www.youtube.com/watch?v=sfCFyoIppSE&t=82s
Top Gun 3 vai acontecer? Confira nossas ideias!
Com o sucesso estrondoso de Top Gun: Maverick nas bilheterias mundiais, onde já passa da marca de U$1 bilhão de arrecadação, a pergunta começa a surgir: haverá um Top Gun 3?
Naturalmente, seria uma decisão puramente mercadológica, afinal Top Gun: Maverick é um perfeito fechamento de saga. Mas, em Hollywood, o que dá muito dinheiro sempre rende mais continuações - e o produtor Jerry Bruckheimer certamente já deve estar batendo na porta do atarefado Tom Cruise para discutir ideias.
Dito isso, resolvemos analisar algumas possibilidades de história para esse hipotético terceiro filme de Top Gun, através das pistas que o segundo filme deixa na mesa.
Confira o pitch completo no canal de YouTube do Lucas Filmes.
https://youtu.be/tnyWmrpB7Gg
Crítica | Star Wars: Clone Wars é a melhor série baseada na saga - e está no Disney+
Muito antes de Kathleen Kennedy e os executivos da Disney investirem em um grande universo compartilhado de séries de Star Wars com The Mandalorian, e também alguns anos antes de Dave Filoni salvar a franquia de George Lucas animações em 3D, havia o Star Wars: Clone Wars original.
Desenvolvida pelo brilhante Genndy Tartakovsky (Samurai Jack, O Laboratório de Dexter), a série de animação em 2D acompanha as aventuras dos Cavaleiros Jedi durante as intensas Guerras Clônicas entre a República e os Sistemas Separatistas.
O foco da série, que durou apenas dois volumes, é em Anakin Skywalker e Obi-Wan Kenobi enfrentando uma variedade de inimigos, mas também dá espaço para diversos personagens coadjuvantes em diferentes episódios, cenas de ação arrebatadores e um estilo único.
Após anos perdidas no limbo entre propriedades da LucasFilm e Cartoon Network, todos os episódios da série finalmente chegam ao catálogo do Disney+, sob o selo Star Wars Vintage.
Confira a crítica completa no canal de YouTube do Lucas Filmes.
https://www.youtube.com/watch?v=8o2qRQtofp0
Crítica | Elvis ressuscita o Rei do Rock no melhor filme de Baz Luhrmann
Eu tenho uma relação um tanto complicada com Baz Luhrmann. Um dos cineastas australianos mais celebrados de todos os tempos em Hollywood, Luhrmann é dono de um estilo bem particular: festeiro, escandaloso e regado a purpurina são boas características de seu cinema, que certamente não é para todos. Eu pessoalmente não sou fã de sua radical adaptação de Romeu + Julieta, simplesmente não suporto a histeria descontrolada de Moulin Rouge! Amor em Vermelho e nunca nem consegui passar dos primeiros 20 minutos de seu épico melodramático Austrália.
Mas ao mesmo tempo… Sou um grande defensor de sua excelente adaptação em 3D de O Grande Gatsby, o que me deixou um pouco mais curioso quando foi anunciado que ele faria um filme sobre a vida do Rei do Rock, Elvis Presley. E mais especificamente, da vida de Elvis e seu misterioso empresário, o Coronel Tom Parker. Após quase uma década afastado do cinema, visto que Luhrmann é um diretor que passa muito tempo na concepção visual e musical de seus projetos, o australiano emerge completamente evoluído: Elvis é certamente o melhor filme de sua enxuta carreira.
Totalmente aos moldes de um biopic musical, a trama do filme analisa os eventos da ascensão e queda de Elvis Presley (Austin Butler), mas pela perspectiva do asqueroso e enigmático Coronel Tom Parker (Tom Hanks), que repensa todos os acontecimentos importantes da vida dos dois, em seu leito de morte.
Heróis e vilões
Justamente pela premissa baseada em querer cobrir a vida inteira do biografado, você já tem uma noção básica de como será este Elvis. É um filme que ainda está preso nessa caixinha bem formulaica e travada que é o subgênero da cinebiografia - cuja vertente musical tem encontrado uma nova vida, vide os sucessos de Bohemian Rhapsody e Rocketman. Justamente por isso, é impossível para Elvis escapar de alguns clichês, a básica e previsível estrutura da ascensão e queda, os pontos baixos e todos os percalços que o roteiro assinado por Luhrmann, Craig Pearce, Sam Bromell e Jeremy Doner precisa enfrentar se realmente quer cobrir a vida inteira de Elvis Presley. A diferença aqui, no entanto, é a forma como o projeto encontra seu protagonista.
Apesar de trazer Elvis em seu título, o roteiro toma a decisão criativa de narrar toda a história do ponto de vista do Coronel. Olhando sob uma perspectiva de dramaturgia clássica, Parker é o vilão da história, e sua frequente narração tenta justificar suas ações, mostrar como ele era o real visionário por trás do sucesso de Elvis Presley e como sua imagem foi tremendamente brutalizada pela mídia. O efeito é curioso, já que o filme em si mostra justamente o oposto disso, quase como se Luhrmann apostasse em uma “contradição intencional”, rivalizando o texto com a imagem de forma intrigante e fazendo o próprio espectador questionar os conceitos de protagonista e antagonista.
Não deixa de ser uma ideia essencialmente metalinguística, já que Parker é retratado no filme como o “mercador das ideias”. O sujeito responsável por encontrar o talento e apresentá-lo ao mundo, e colocá-lo na função de narrador praticamente estende seu papel de showman para através da quarta parede, como se o “fantasma de Tom Parker” estivesse tentando convencer o público sobre a realidade dos eventos e subvertê-los à sua vontade. Uma ideia fascinante e que, claro, serve à interpretação do roteiro de Luhrmann e seus colegas sobre os eventos discorridos.
Canalizando as energias em Elvis
No aspecto de direção, nunca antes vi Baz Luhrmann colocando seu estilo em uma dose tão apropriada. Um filme do cineasta nunca é uma experiência normal, sendo um universo à parte e com um estilo bem particular, necessitando um estado de mente específico e, principalmente, a necessidade de deixar qualquer sutileza de lado. Nesse caso, Luhrmann usa toda aquela energia vibrante pra criar ótimas transições de cena, uma velocidade bem dinâmica na passagem de tempo, nas diferentes locações e também na forma como cria-se o contexto na época: seja político, cultural ou econômico, o longa sempre retrata a mudança no mundo ao redor de Elvis Presley, e como o cantor fez esse mix do gospel, country americano e o blues da música negra.
Esse é um dos pontos altos do filme, inclusive. A música sempre foi um fator bem importante nos filmes de Baz Luhrmann, desde a popularização do jukebox musical no cinema com seu Moulin Rouge!, ou até quando transformou jazz em rap para O Grande Gatsby. Em Elvis, Luhrmann e sua equipe analisam como o rock n’ Roll de Elvis Presley está bem enraizado ao rhythm & blues, e é um grande destaque a performance de "Hound Dog", quando a sequência vai se entrecortando entre três momentos diferentes da vida do cantor: com o jovem Elvis vendo uma culto na igreja, uma gravação de disco e uma performance ao vivo. É uma forma bem sucinta, e com excelente montagem e mixagem de som, de mostrar como o estilo de Elvis Presley se concretiza.
Todas essas sequências de shows e apresentações musicais são especialmente vibrantes, já que Luhrmann é bem preciso nesse retrato sobrenatural de como a música de Elvis impactava as plateias. Usando um background do apreço de Elvis por quadrinhos de super-heróis, a câmera de Luhrmann retrata o rebolado e os passos de dança do cantor como verdadeiros super-poderes - literalmente capazes de provocar gritos orgásticos de todas as garotas na plateia. É o melhor uso das habilidades cênicas de Baz Luhrmann, com sua câmera em travelling por constante, uma excelente fotografia da australiana Mandy Walker, que sempre mantém uma influência de luzes coloridas do circo pelo filme inteiro, e também da ótima montagem assinada por Matt Villa e Jonathan Redmond.
Sobre o trabalho de Mandy Walker em especial, destaco uma ótima cena, com um uso muito inteligente de luz. É quando Elvis e o Coronel têm uma discussão no escritório de um estacionamento, e Walker aposta em luzes de holofote nada realistas para simular faróis de carro, passeando pela janela fechada desse escritório durante a discussão dos dois. Uma maneira muito inteligente de ilustrar esse “show” dos bastidores, de como a vida de Tom Parker e Elvis Presley ainda é o grande circo de onde emergiu o grotesco empresário. Um trabalho realmente formidável.
Nasce Uma Estrela
E, claro, todas essas sequências se sobressaem também graças ao excelente Austin Butler. Saído de diversas produções originais do Disney Channel e papéis ocasionais em longas como Era Uma Vez em Hollywood, Butler explode para dominar com perfeição o sotaque de Elvis Presley e também sua contagiante energia durante o palco. Não é o tipo de performance exagerada em que o ator mostra-se obcecado em ser uma cópia da pessoa real, mas sim uma interpretação de quem era seu biografado. Butler faz um trabalho realmente notável e imersivo, apresentando um retrato bem verossímil, e ainda que dentro de um filme bem gigante e espetacular, também muito íntimo.
Em contrapartida, Tom Hanks realmente faz um personagem de desenho animado. Remetendo bastante ao show de horrores que foi a caracterização de Anthony Hopkins como o Mestre do Suspense em Hitchcock, Hanks cria uma figura bem cartunesca e exagerada, mas que acaba se mesclando bem nesse universo, que é completamente desgarrado de realismo. Repito: é um filme do Baz Luhrmann que lhe pede para aceitar o exagero; e na medida do possível, Hanks faz um contraponto interessante para o Elvis Presley mais ingênuo e rebelde de Austin Butler.
Ainda que preso a todos os clichês e convenções da batida fórmula cinebiográfica musical, Elvis se beneficia da precisa visão de Baz Luhrmann, seja na forma como desconstrói a noção de protagonismo e antagonismo, ou em seu sempre afiado apuro estético e musical. É o melhor filme do cineasta, que ainda transforma Austin Butler em uma estrela digna do Rei do Rock n'Roll.
Elvis (EUA/Austrália)
Direção: Baz Luhrmann
Roteiro: Baz Luhrmann, Craig Pearce, Sam Brommel e Jeremy Doner
Elenco: Austin Butler, Tom Hanks, Olivia DeJonge, Helen Thomson, Richard Roxburgh, Kelvin Harrison Jr., Kodi Smit-McPhee, Xavier Samuel, David Wenham, Luke Bracey, Dancre Montgomery, Gary Clark Jr, Leon Ford
Gênero: Drama
Duração: 159 min
https://www.youtube.com/watch?v=RQ5Elw-WGu0
Crítica | Thor: Amor e Trovão é mais bobo e surtado do que Ragnarok
Que curiosa e peculiar jornada de bastidores teve o Thor da Marvel Studios. Sendo apresentado em um filme subestimado e com caráter fantasioso forte, o Deus do Trovão ganhou as telas pelas mãos de Kenneth Branagh em 2011, apenas para ser reinventado como um guerreiro medieval e sério por Alan Taylor em Thor: O Mundo Sombrio e, posteriormente, ser despido de toda nobreza e pretensão por Taika Waititi ao se transformar em comediante com o bem-sucedido Thor: Ragnarok.
Apesar de eu pessoalmente não ser nada fã daquele filme de 2017, o longa foi um sucesso gigantesco, e ajudou a revitalizar o interesse de Kevin Feige em seu Vingador Mais Poderoso ao garantir o primeiro “quarto filme” de um personagem do estúdio. Trazendo Taika Waititi e toda a mentalidade cômica que funcionaram tanto para os fãs com Ragnarok, o ainda mais espalhafatoso e abobalhado Thor: Amor e Trovão chega com a potência elevada - e certamente não vai agradar aqueles que não compraram a reinvenção radical do personagem.
A trama começa algum tempo depois de Vingadores: Ultimato, com Thor (Chris Hemsworth) atuando agora ao lado dos Guardiões da Galáxia, que seguem realizando diferentes missões ao longo do universo. Quando uma antiga aliada aponta para a chegada de uma perigosa ameaça, Thor precisa viajar a Nova Asgard para enfrentar o temível Gorr, O Carniceiro dos Deuses (Christian Bale), um ser vingativo que planeja dar cabo a todos os seres divinos. Além disso, Thor também se reencontra com sua ex-namorada Jane Foster (Natalie Portman), que agora magicamente também tem os poderes do Deus do Trovão.
Desequilíbrio tonal em Thor: Amor e Trovão
Uma diferença vital entre Ragnarok e Amor e Trovão é o fato de este filme ser ainda mais Taika Waititi. Afinal, o oscarizado cineasta neozelandês apenas assumiu o trabalho do terceiro filme, dirigindo um roteiro que não era de sua autoria. Com o novo longa, ele mesmo concebeu a história desde o início, contando com a estreante Jennifer Kaytin Robinson como co-roteirista. Dessa forma, Amor e Trovão é ainda mais irreverente e voltado para o humor pastelão, usando e abusando de piadas, gags visuais e um estilo irônico típico do Saturday Night Live para praticamente todos os personagens ali - com exceção de Gorr, naturalmente.
Como humor é algo completamente relativo, vai depender de cada um se o resultado é funcional ou não. No meu caso, é uma experiência dolorosamente sem graça - ainda que eu tenha dado um sorrisinho com o estúpido "triângulo amoroso" envolvendo Thor, seu machado e seu antigo martelo.
O que se torna ainda mais curioso quando o filme, que bebe bastante da fonte de uma das HQs mais famosas do personagem, resolve se arriscar nos elementos dramáticos. No mesmo filme em que temos gigantescos bodes berrantes e piadas com surubas envolvendo deuses, há também a presença de uma pesada trama envolvendo o câncer terminal de Jane Foster - que não escapa de algumas piadas ou interjeições bem-humoradas, o que só escancaram o gritante desequilíbrio tonal da projeção. Todo o humor pastelão e bobo simplesmente não compactua com a (tentativa de) melancolia e jornada mais emotiva de Jane Foster, que tem seu câncer fortalecido a cada vez que faz uso do mítico Mjolnir do Deus do Trovão.
Essa transformação, por sinal, é um dos grandes pecados do filme. Apesar de ser excelente no papel, ainda mais por finalmente dar a Natalie Portman algo melhor a fazer nessa franquia, toda a mudança ocorre de forma abrupta e sem sentido, contando com uma transformação mágica fora da tela e, pior, frases do tipo: “a ciência não estava me ajudando, então eu recorri a magia viking espacial”. Um gigantesco desperdício de potencial, que Waititi ainda gasta com uma piada recorrente de Jane tentando encontrar uma boa “frase de efeito”.
Porém, o retorno de Jane Foster ao menos garante uma boa sequência romântica na trama. Em uma breve montagem narrada pelo gigante de pedras Korg (vivido pelo próprio Waititi), acompanhamos o desenrolar e o final do namoro de Thor e Jane após os eventos de O Mundo Sombrio, revelando um olhar raro e divertido sobre um deus vivendo ao lado de uma mortal. É quase com o Harry & Sally: Feitos um para o Outro do MCU, e fico realmente triste que a montagem dure tão pouco tempo, oferecendo ecos de um filme que poderia ter sido muito melhor - e bem mais digno de seu título.
Tons de cinza
Por falar em personagens fora de tom, o Gorr de Christian Bale é um caso à parte. Visualmente bem diferente e mais sombrio do que a paleta de cores mais alegre do filme, o vilão traz uma presença ameaçadora e uma boa motivação, mas infelizmente parece focado em estar em um filme completamente diferente; muito mais sério e ambicioso, e que parece dolorosamente deslocado quando colocado ao lado de um Thor sorridente que lhe manda “procurar um dentista” durante uma batalha.
A forma como o roteiro de Waititi e Robinson caminha para o desfecho de Gorr é outro ponto fora da curva, culminando em uma solução dramática tola e que não faz o menor sentido - como se os roteiristas tivessem sido encurralados em um canto, desesperadamente buscando por uma forma de amarrar todas as pontas narrativas em um único nó.
Como diretor, Taika Waititi demonstra os mesmos erros do anterior. Sua decupagem é pouco inspirada e burocrática, pintada pela fotografia tediosa de Baz Idoine (em sua estreia nos cinemas após The Mandalorian) e com efeitos visuais estranhamente finalizados. O único truque que Waititi tem (e que já era saturado em Ragnarok) é mesmo o uso de alguma música de rock facilmente identificável para “distrair" o público de sua mise en scène preguiçosa, que curiosamente só ganha algum brilho quando Idoine aposta em uma sequência em preto e branco; ilustrando um planeta onde "as cores têm medo de aparecer", o que não deixa de ser uma metáfora irônica para o trabalho visual do próprio MCU.
E se no anterior Watiti abusava da repetição de “Immigrant Song” do Led Zeppelin, aqui ele praticamente toca um álbum inteiro do Gus N Roses, que estão presentes na trama até mesmo através de múltiplos diálogos com personagens diferentes discutindo integrantes da banda. Alguém com certeza recebeu um cheque a mais.
Sou suspeito para analisar Thor: Amor e Trovão parcialmente, já que o estilo de humor usado por Taika Waititi para reinventar o Deus do Trovão realmente não é do meu agrado. O que sobra neste quarto filme, porém, é um claro desequilíbrio de tom, em um filme que é incapaz de separar a linha do que considera engraçado e do que é mais dramático. Uma mistura azeda, mas que ao menos garante alguns bons momentos.
Thor: Amor e Trovão (Thor: Love and Thunder, EUA - 2022)
Direção: Taika Waititi
Roteiro: Taika Waititi e Jennifer Katyrin Robinson
Elenco: Chris Hemsworth, Natalie Portman, Christian Bale, Tessa Thompson, Taika Waititi, Russell Crowe, Jamie Alexander, Kat Dennings, Chris Pratt, Dave Bautista, Karen Gillan, Sean Gunn, Bradley Cooper, Vin Diesel
Gênero: Comédia
Duração: 119 min
https://www.youtube.com/watch?v=-LilhIibpUE
Crítica | Stranger Things 4 traz muita ação e ritmo rápido em segundo volume
Não contém spoilers
Após um hiato de mais de um mês, simplesmente em motivo de efeitos visuais inacabados, a quarta temporada de Stranger Things enfim chegou ao fim. Mantendo a tradição dos episódios absurdamente longos de seu primeiro volume (todos passavam da marca de 1 hora), o volume 2 traz praticamente dois longas-metragens para terminar o quarto ano de Hawkins na Netflix.
Diversos dos meus comentários do primeiro volume se aplicam a esta segunda parte: ainda tenho problemas com o número maciço de personagens, com a defeituosa montagem paralela que tenta manter o interesse em diferentes núcleos - os mais fracos e descartáveis deles envolvendo a aventura de Hopper (David Harbour) na União Soviética e, claro, todo o desvio narrativo com o sonolento Mike (Finn Wolfhard), o enrustido Will (Noah Schnapp), o sonâmbulo Jonathan (Charlie Heaton) e o maconheiro Argyle (Eduardo Franco).
Ao menos, agora já focados em um desfecho narrativo, todos os personagens parecem melhor posicionados, com o grupo liderado por Dustin (Gaten Matarazzo), Nancy (Natalia Dyer), Steve (Joe Keery), Robin (Maya Hawke), Lucas (Caleb McLaughin), Max (Sadie Sink) e Eddie (Joseph Quinn) novamente assumindo o grande destaque em sua batalha contra o tenebroso Vecna. Todas as cenas envolvendo esse núcleo são as mais interessantes e empolgantes, especialmente o momento musical em que o carismático Eddie usa de “Master of Puppets” do Metallica; garantindo uma imersão tão boa e divertida quanto o agora emblemático uso de “Running Up that Hill”, de Kate Bush, no primeiro volume.
Vale apontar que os irmãos Matt e Ross Duffer apresentaram, no geral, uma grande melhora como diretores nessa quarta temporada como um todo. Apesar da frágil estrutura de núcleos quebrados, tudo parece valer a pena quando a dupla aposta em uma série de montagens paralelas, onde personagens diferentes enfrentam inimigos diferentes em locações distintas, tudo muito bem amarrado e com a sempre vibrante trilha sonora de Kyle Dixon e Michael Stein. Uma excelente evolução visual, especialmente quando o grupo de Max enfim adentra na casa de Vecna, gerando uma cena toda iluminada por belíssimas luzes azuis.
O tão prometido embate entre Onze (Millie Bobby Brown) e Vecna também finalmente acontece, e é eficiente. Apesar de carecer em formas visualmente criativas de mostrar os poderes de Onze e de não trazer uma versão tão ameaçadora e poderosa do antagonista, que é o mais próximo de Freddy Krueger que eu pude ver nos últimos anos, seu desfecho é suficientemente apropriado para uma série que - pelo visto - está apenas preparando o terreno para seu grande capítulo final, que acontecerá na já anunciada quinta temporada. Curiosamente, o acerto de contas entre Onze e "Papai" (Matthew Modine) conseguiu ser mais épico e marcante do que o próprio embate com Vecna, já que tal momento se beneficiou de uma escala gigantesca e maior do que qualquer coisa que a série já fez, novamente remetendo a alguns momentos da filmografia de Steven Spielberg.
Porém, é preciso falar sobre a falta de coragem dos produtores. Sim, esta crítica não traz spoilers, mas para uma série que tem tantos personagens, núcleos diversos e tanta coisa em tela, era de se esperar ao menos um pouco de coragem para descartar personagens. Há uma cena de morte em especial que, em essência dramática, certamente se encaixaria melhor com um outro personagem veterano, mas cujo impacto é diminuído justamente por ser aplicada a uma figura que só passamos a conhecer de fato nesta quarta temporada. O mesmo também serve para o desfecho confuso e que grita “vamos decidir depois” envolvendo a personagem que, de longe, foi o destaque dentre o elenco deste ano.
Ainda assim, olhando para o todo nesta quarta temporada, acho inegável que Stranger Things 4 seja a melhor fase da série da Netflix desde sua simpática primeira temporada. Apesar do inchaço narrativo e do número incontrolável de personagens a se seguirem em episódios desnecessariamente longos, a série se beneficia de um excelente antagonista e um final muito promissor
Stranger Things 4 - Vol. 2 (EUA, 2022)
Showrunners: Matt Duffer, Ross Duffer
Direção: Matt Duffer, Ross Duffer
Roteiro: Matt Duffer, Ross Duffer
Elenco: Millie Bobby Brown, Winona Ryder, Finn Wolfhard, Gaten Matarazzo, Caleb McLaughlin, David Harbour, Maya Hawke, Joe Keery, Natalia Dyer, Sadie Sink, Noah Schnapp, Charlie Heaton, Matthew Modine, Paul Reiser, Eduardo Franco, Joseph Quinn
Streaming: Netflix
Episódios: 2
Duração: 90 min e 140 min
https://www.youtube.com/watch?v=otutSrxYpa4
Minions 2 quebra recordes e afunda Lightyear nas bilheterias dos EUA
Chegando aos cinemas após diversos atrasos e adiamentos, Minions 2: A Origem de Gru quebrou recordes de bilheteria nos EUA, durante o agitado feriado do Dia da Independência.
A animação da Illumination, lançada pela Universal Pictures, estreou com expressivos US$127.9 milhões no final de semana, tornando-se a maior estreia de um feriado de 4 de Julho de todos os tempos; destronando o então campeão Transformers: O Lado Oculto da Lua, filme de 2011 que tinha a marca de US$ 115 milhões.
O derivado de Meu Malvado Favorito também apresentou um resultado muito melhor do que Lightyear, animação da Disney/Pixar que tem, mundialmente, apenas US$187 milhões em sua terceira semana em cartaz. Mundialmente, Minions 2 já passa de US$200 milhões.
Ainda nas bilheterias, Top Gun: Maverick (US$32 milhões) e a cinebiografia Elvis (US$19 milhões) continuam trazendo ótimos números, enquanto Jurassic World: Domínio entra para a casa dos US$800 milhões mundialmente.
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