O nome de Arlindo Cruz se confunde com a própria história do samba moderno. O cantor, compositor e multi-instrumentista, que morreu nesta sexta-feira (8), aos 66 anos, no Rio de Janeiro, deixa um legado imensurável como um dos maiores poetas do povo, um revolucionário sonoro e um cronista da vida suburbana carioca. Sua partida, após uma corajosa batalha de oito anos contra as sequelas de um AVC, silencia uma das vozes mais importantes da música brasileira, mas sua obra garante sua eternidade.
Nascido em 14 de setembro de 1958, em Madureira, Arlindo viveu e respirou samba desde a infância, transformando sua paixão em uma das carreiras mais sólidas e respeitadas do gênero.
O revolucionário do Fundo de Quintal
A trajetória de Arlindo Cruz explodiu no final dos anos 70, no berço do samba que era a quadra do bloco Cacique de Ramos. Lá, ele se juntou a mestres como Jorge Aragão e Almir Guineto. Sua genialidade o levou ao lendário grupo Fundo de Quintal, onde ajudou a estabelecer uma nova estética para o samba, introduzindo instrumentos como o banjo, do qual se tornou um dos maiores mestres.
O poeta do povo
Após 12 anos no grupo, Arlindo partiu para uma carreira solo de ainda mais sucesso, consolidando-se como um dos compositores mais geniais de sua geração. Sua “caneta” era precisa e poética, capaz de traduzir a alma do subúrbio e os sentimentos universais em versos inesquecíveis. Ele é o autor de hinos como “Meu Lugar”, “O Bem”, “Fim da Tristeza” e, claro, o emblemático “O Show Tem Que Continuar”. Sua obra foi reconhecida internacionalmente, com indicações ao Grammy Latino entre 2008 e 2016.
Sua paixão pelo samba também o levou ao Carnaval, onde compôs sambas-enredo vitoriosos para escolas como sua amada Império Serrano, Vila Isabel e Grande Rio.
A luta pela vida e a biografia definitiva
A carreira de Arlindo nos palcos foi brutalmente interrompida em 17 de março de 2017, quando um AVC grave o deixou com sequelas significativas. Desde então, ele viveu sob os cuidados da família, especialmente da esposa, Babi Cruz, e dos filhos, Arlindinho e Flora.
Mesmo longe dos shows, sua música continuou mais viva do que nunca. Em julho de 2025, poucas semanas antes de sua morte, foi lançada sua biografia, “O Sambista Perfeito”, do jornalista Marcos Salles. A obra, que reúne depoimentos do próprio Arlindo antes do AVC e de 120 personalidades como Zeca Pagodinho e Maria Bethânia, serve como um testamento final de sua imensa contribuição.
Como descreve o livro, entre fé, batuque, poesia e luta, Arlindo foi o retrato do samba de raiz: fiel às origens, firme nas convicções e generoso. Seu nome e sua música jamais serão esquecidos.
Editor-geral do Bastidores, formado em Cinema. Jornalista, assessor de imprensa.
Apaixonado por histórias que transformam. Todo mundo tem a sua própria história e acredito que todas valem a pena conhecer.
Contato: matheus@nosbastidores.com.br