BGS 2025 - Evento encolhe e perde qualidade

Com o tempo, o evento cresceu e se tornou o maior da América Latina, mas parece que a BGS segue em frente mais pela força do seu nome e pelo que representou no passado do que, de fato, por trazer grandes novidades.

A Brasil Game Show, ou BGS, como é popularmente conhecida, teve sua origem em 2009 com a proposta de apresentar as principais novidades da indústria de jogos, exibindo lançamentos e títulos inéditos em primeira mão para o público.

Quando falo em “novidades”, não me refiro apenas a acessórios ou PCs gamers de última geração, nem a jogos que ainda serão lançados, mas também de experiências imersivas que acompanhem as tendências do mercado — como simuladores super-realistas e conteúdos voltados à inteligência artificial, que são o tema do momento no mercado tech.

O que presenciei na BGS 2025 foi uma mistura de estandes nada interessantes, o que apenas reforça a sensação de que o evento vem perdendo sua essência e seu poder de atrair o público.

Tudo na edição deste ano precisa ser repensado — tudo mesmo. Os brindes foram fraquíssimos, as filas nos estandes eram enormes, os balcões de informação estavam mal localizados e, o pior de tudo: decidiram realizar a edição de 2025 no Anhembi, um espaço pequeno que simboliza o quanto a BGS vem diminuindo e perdendo força nos últimos tempos.

Como em todas as edições, a BGS 2025 contou com a presença de convidados internacionais, entre eles Naoki Hamaguchi (Final Fantasy VII) e Hideo Kojima (Metal Gear). Este último causou um grande alvoroço no sábado (11) e evidenciou a falta de organização do evento: centenas de pessoas esperaram por horas sem conseguir uma pulseira para tirar foto com o criador japonês.

Estandes como os da TCL, Nintendo, Samsung e Konami foram um verdadeiro oásis de qualidade em meio a tantas atrações irrelevantes. A Samsung apresentou suas novas tecnologias — com destaque para as TVs QLED voltadas ao Mundial de 2026 —, enquanto a Konami apostou no eFootball como principal atração.

A BGS precisa se reinventar — e com urgência. As próximas edições dirão muito sobre o que o evento realmente quer transmitir ao público e qual é o seu foco, especialmente agora que a concorrência vem crescendo, com a Gamescom ganhando cada vez mais força. A verdade é uma só: ou a BGS se reestrutura e evolui, ou acabará virando apenas parte da história.


Crítica | Uma Sexta-Feira Mais Louca Ainda é uma comédia familiar na medida certa

Está em alta a tendência de filmes lançados há décadas receberem continuações após um longo hiato, como os casos recentes de Top Gun: Maverick (2022) e Eu Sei o que Vocês Fizeram no Verão Passado (2025). Esse movimento vem ganhando cada vez mais espaço, e é exatamente o que acontece agora com Sexta-Feira Muito Louca, que recebe uma sequência intitulada Uma Sexta-Feira Mais Louca Ainda.

Após 22 anos, o longa ganha um novo capítulo, agora dirigido por Nisha Ganatra, conhecida por seus trabalhos em séries de TV, e com roteiro assinado por Jordan Weiss. Apesar da expectativa, a sequência não traz nada realmente original — o tema da troca de corpos, afinal, já foi amplamente explorado no cinema, como nos bem-sucedidos De Repente 30 (2004) e 17 Outra Vez (2009).

A própria Disney já tentou replicar o sucesso de Sexta-Feira Muito Louca em outras produções lançadas nos anos seguintes, mas sem grande êxito. Vale lembrar que o conceito nasceu com Se Eu Fosse Minha Mãe (1976), a versão original inspirada na obra de Mary Rodgers, que deu origem à franquia.

Se na versão original de 2003 Anna (Lindsay Lohan) trocava de corpo com sua mãe, Tess (Jamie Lee Curtis), agora algo semelhante acontece: Tess Coleman, uma autora e psicóloga consagrada que está lançando um novo livro, troca de corpo com a jovem Lily (Sophia Hammons), de 15 anos. Ao mesmo tempo, Anna troca de corpo com sua própria filha, Harper (Julia Butters), também de 15 anos.

Como já mencionado, não há nada de realmente novo. A nova versão é praticamente um "copia e cola" da original, apenas atualizando para os dias de hoje a clássica história de conflitos familiares — um tema que costuma funcionar bem no cinema. Anna e Tess continuam se desentendendo, com Tess agora tendo que lidar com a rotina da neta surfista, Harper, enquanto Anna enfrenta conflitos com a filha, que repete muitas das mesmas peripécias vividas pela mãe na juventude.

É um filme sobre mulheres de temperamento forte, decididas sobre o que querem e os caminhos que desejam seguir. Por isso, o conflito dramático entre Harper e sua mãe, Anna, funciona tão bem e acrescenta emoção à trama. O elo entre mãe e filha é poderoso e é explorado com sensibilidade pela narrativa.

Por isso, é um acerto ter Nisha Ganatra à frente da direção. Com experiência em séries, a cineasta explora de forma acertada as relações familiares, que são fundamentais para a história — um elemento que já havia sido bem trabalhado no passado e que, agora, mantém sua essência.

Quanto ao humor, ele está presente, mas em doses mais contidas. Os conflitos internos das personagens e o drama pessoal de cada uma das protagonistas são mais explorados do que as situações cômicas. Claro que a história nunca perde o tom leve — até porque a ideia de troca de corpos sempre funciona bem —, mas Ganatra opta por uma abordagem mais sensível e dramática, em vez de focar exclusivamente na comédia.

Uma Sexta-Feira Mais Louca Ainda funciona como entretenimento. Mesmo sendo repetitivo em algumas cenas e contendo algumas piadas bobinhas, ainda assim é um filme familiar que sabe trabalhar bem as relações humanas e intrapessoais. A grande dúvida é se teremos que esperar mais 22 anos para uma próxima sequência. Tomara que não.

Uma Sexta-Feira Mais Louca Ainda (Freakier Friday, EUA – 2025)
Direção: Nisha Ganatra
Roteiro: Jordan Weiss, baseado na obra de Mary Rodgers
Elenco: Jamie Lee Curtis, Lindsay Lohan, Julia Butters, Sophia Hammons, Mark Harmon, Manny Jacinto, Maitreyi Ramakrishnan, Christina Vidal, Haley Hudson
Gênero: Comédia, Fantasia
Duração: 111 min.

https://www.youtube.com/watch?v=7TbMrU5cAfA&ab_channel=WaltDisneyStudiosBR

Crítica | Os Caras Malvados 2 é divertido e mantém o nível de qualidade

Os Caras Malvados estreou em 2022, arrecadando mais de 200 milhões de dólares ao redor do mundo — sucesso suficiente para fazer com que a DreamWorks Animation logo aprovasse uma sequência.

No primeiro filme, Sr. Lobo, Sr. Cobra, Sr. Tubarão, Sr. Piranha e Sra. Tarântula viviam grandes aventuras juntos, cometendo assaltos a bancos e roubando artefatos de luxo. Já em Os Caras Malvados 2, o grupo passa por uma transformação completa — algo que antes parecia impensável.

Após os eventos do primeiro longa, Sr. Lobo e seus amigos passam por uma fase de transição nesta sequência, tentando abandonar a vida criminosa de vez. Logo no início da nova trama, Lobo aparece procurando emprego — e é recusado justamente por um banco que ele havia assaltado várias vezes.

Escrito por Yoni Brenner e Etan Cohen, o roteiro aposta em uma história com toques adultos, mas sem perder o apelo para os mais jovens. O tom é menos sério do que no primeiro filme, com uma trama mais leve, divertida e recheada de piadas — como as cenas de peidos do Sr. Piranha — que, mesmo bobas, conseguem arrancar boas risadas do público.

Esse arco de evolução do protagonista e sua turma, proposto pelo roteiro, em que deixam de ser vilões para se tornarem mocinhos que dão um toque de amadurecimento à história e que poucas animações recentes, principalmente as lançadas pela Pixar nos últimos anos, conseguiram alcançar.

A direção da dupla Pierre Perifel e JP Sans é um acerto, trazendo uma ótima dinâmica ao longa, com cenas mais grandiosas e bem executadas. O destaque vai para o novo grupo de vilãs — Kitty Kat, Doom e Pigtail — que funciona como um gatilho para testar os protagonistas, incentivando-os a voltar ao caminho do mal. 

Esse arco de evolução do protagonista e da sua turma, proposto pelo roteiro — em que eles deixam de ser vilões para se tornarem mocinhos — adiciona um toque de amadurecimento à história, algo que muitas animações recentes vêm deixando de lado — inclusive alguns títulos da própria Pixar, como Lightyear e Elementos, que apostaram mais em visual e mensagem direta do que em um desenvolvimento emocional mais profundo.

Como sequência, Os Caras Malvados 2 cumpre com competência a missão de divertir e entreter, apostando em uma trama que foge do convencional e que deve gerar identificação no público que acompanhou o primeiro filme.

Os Caras Malvados 2 (The Bad Guys 2, EUA – 2025)
Direção: Pierre Perifel e JP Sans
Roteiro: Yoni Brenner e Etan Cohen. Baseado na obra de Aaron Blabey
Elenco: (vozes originais) Sam Rockwell, Marc Maron, Craig Robinson, Anthony Ramos, Awkwafina, Danielle Brooks, Natasha Lyonne, Maria Bakalova
Gênero: Ação, Animação, Comédia
Duração: 104 min.

https://www.youtube.com/watch?v=DccewDgXihs&ab_channel=UniversalPicturesBrasil

Crítica | M3GAN 2.0 é uma sequência feita para a geração Tik Tok

Quando M3gan estreou, em meados de 2023, logo ficou claro o potencial da boneca, que conquistou fama antes mesmo do lançamento graças aos vídeos virais no TikTok — fator que contribuiu para que o longa arrecadasse US$ 181 milhões em bilheteria mundial.

Com o sucesso confirmado, não demorou para que uma sequência fosse anunciada: o tão aguardado — ou não — M3GAN 2.0. Entretanto, o longa acabou escorregando em erros clássicos de continuações, daqueles que muitas vezes enterram franquias com potencial de ir longe.

Em M3GAN 2.0, Gemma (Allison Williams) e Cady (Violet McGraw) retornam após escaparem da boneca assassina. Agora, Cady parece lidar de maneira menos intensa com o luto pela morte dos pais, enquanto Gemma, transformada em autora de sucesso, dedica-se não apenas à criação de um novo projeto e à proteção da sobrinha, mas também à luta pública pela regulamentação e pelo uso responsável das tecnologias avançadas, como as IAs.

A tecnologia como vilã

No primeiro filme, a tecnologia já era apresentada como uma força capaz de se voltar contra a humanidade ao receber “inteligência” e desenvolver uma espécie de consciência.

Já nesta sequência — também dirigida por Gerard Johnstone, assim como o longa de 2022 — fica claro que o cineasta tentou criar uma atmosfera menos assustadora, optando por suavizar elementos que haviam funcionado bem no primeiro filme, como a matança generalizada que M3GAN cometia contra todos que cruzavam seu caminho.

Sim, ainda há violência em M3GAN 2.0, mas ela se torna praticamente irrelevante para a trama — e, em muitos momentos, beira o ridículo. Grande parte das cenas de ação se assemelha mais a filmes de ação ruins e genéricos do que ao terror tenso e horripilante que se esperaria de uma continuação.

O horror, antes, realmente transmitia a noção de quão perigosa M3gan era. Nesta nova versão, porém, a "M3GAN do bem" — sim, agora ela é boazinha — se aproxima mais de uma justiceira, o que faz com que o filme perca aquela atmosfera de terror que mantinha o público preso à cadeira. O horror agora está mais ligado à tecnologia e aos perigos das inteligências artificiais.

A própria mensagem sobre a tecnologia se esvazia a partir do segundo ato, após um início carregado de temas em que o diretor desenvolve melhor a vida de Gemma e Cady, mostrando como as duas, além de unidas por um propósito, mantêm uma relação constante com a tecnologia — especialmente Gemma, que luta pela regulamentação das IAs. 

Porém, essa mensagem sobre os perigos tecnológicos não é aprofundada, tampouco desenvolvida com consistência. Havia diversos caminhos que a narrativa poderia explorar, mas tudo acaba se tornando superficial e pouco relevante.

M3GAN 2.0 não será o último capítulo da franquia, mas escancara o quão desesperada por dinheiro está a indústria de Hollywood, a ponto de apelar e descaracterizar um produto que havia funcionado, transformando-o em algo completamente diferente. Abordar os perigos da tecnologia é sempre um tema válido — afinal, trata-se de algo atual e presente em nosso dia a dia —, mas isso, por si só, é pouco diante do que o longa se propôs a explorar. Fica a lição para que as próximas sequências não sejam tão decepcionantes quanto esta.

M3GAN 2.0 (idem, EUA – 2025)
Direção: Gerard Johnstone
Roteiro: Akela Cooper e Gerard Johnstone, baseado na personagem criada por James Wan
Elenco: Allison Williams, Jemaine Clement, Violet McGraw, Jenna Davis, Amie Donald, Ivanna Sakhno, Aristotle Athari, Timm Sharp
Gênero: Ação, Thriller
Duração: 119 min.

https://www.youtube.com/watch?v=kX8yjM09qLQ&ab_channel=UniversalPicturesBrasil

Crítica | Como Treinar o Seu Dragão (2025) é uma das melhores adaptações live-action já feitas

Os Estúdios Walt Disney (The Walt Disney Studios) lançaram, nos últimos anos, diversas adaptações live-action de suas clássicas animações — algumas de bom gosto, como Aladdin (2019) e Cruella (2021), e outras verdadeiras decepções, como Mulan (2020).

Já a DreamWorks Animation ainda não havia se aventurado nesse cenário, sem nenhuma produção adaptada, até que a Universal Pictures decidiu levar Como Treinar o Seu Dragão para as telonas em versão live-action.

Adaptada da obra da escritora britânica Cressida Cowell, cujo primeiro volume foi lançado em 2003, a série é composta por 12 livros e recebeu três adaptações em formato de animação.

A nova versão em live-action, dirigida por Dean DeBlois — o mesmo que comandou a franquia animada —, é uma bela releitura do megassucesso lançado em 2010. É possível afirmar que se trata de um dos melhores live-actions já produzidos, por manter o carisma dos personagens e preservar muitos dos elementos que funcionaram no original, como as cenas de ação e os embates entre Soluço (Mason Thames) e seu pai, Stoico (Gerard Butler).

Uma adaptação de primeira

Mais do que uma simples adaptação da animação para o live-action, o filme acerta ao manter a força da história original. O elo de amizade entre Soluço e Banguela continua sendo o centro da narrativa, assim como os conflitos internos do protagonista, que ainda luta pelo reconhecimento do pai como um verdadeiro guerreiro. O núcleo cômico, formado pelos amigos de Soluço, também está presente e garante momentos leves e divertidos, equilibrando bem o tom da aventura

Há de se elogiar a escolha de Dean DeBlois para a direção e o roteiro do longa — e isso não apenas por já estar familiarizado com a franquia animada, mas também por ter construído uma sólida carreira no universo das animações, especialmente como roteirista, sendo responsável por sucessos como Mulan (1998) e o live-action de Lilo & Stitch (2025).

Outro acerto da animação está na forma como explora os conflitos pessoais de Soluço — especialmente sua relação conturbada com o pai e a conexão que se forma com o lendário dragão Fúria da Noite. Esses dramas internos do protagonista são preservados com inteligência e que contribuem para a força narrativa da produção.

DeBlois, além de explorar com sensibilidade as relações entre os personagens, demonstra competência na direção das cenas de ação, especialmente no último ato, quando os Vikings enfrentam o Dragão Rei na Ilha do Dragão.

Mesmo com essas sequências de ação sendo bem executadas, elas são poucas — uma escolha feita para privilegiar o desenvolvimento da história em vez de focar exclusivamente na ação, seguindo a mesma linha da versão animada de 2010.

Muito além da Nostalgia

O fator mais importante e provavelmente o que dá mais força para a trama é a questão da nostalgia. Já faz seis anos desde que o último longa animado da franquia estreou, com Como Treinar o Seu Dragão 3 (2019) não tendo a mesma repercussão que as duas versões anteriores tiveram. Mesmo que algumas cenas sejam praticamente idênticas às da animação — sem trazer grandes novidades —, o longa ainda funciona e deve conquistar o espectador mais saudosista.

Quando assisti, esperava que fosse mais emocionante do que realmente foi. Faltou algo para trazer a carga emocional que a animação consegue explorar tão bem. A relação entre Soluço e Banguela, por exemplo, não tem o mesmo impacto — talvez pela escolha do ator, que não transmite o carisma necessário para um personagem tão marcante quanto Hiccup, ou até pela própria versão digital de Banguela, que carece de expressividade para sustentar a conexão emocional com o público.

O design, a edição de som e a caracterização dos personagens estão impecáveis — praticamente do jeito que fãs imaginavam que deveria ser uma adaptação cinematográfica. Os cenários apresentam uma qualidade visual rara em filmes do gênero, reforçando o quanto esta versão se destaca das demais do gênero.

Como Treinar o Seu Dragão é uma história de amizade, autoconhecimento e crescimento pessoal, que consegue preservar a magia e o encantamento da animação original. Trata-se de um acerto que, sim, merece futuras continuações — e que elas estejam à altura da qualidade apresentada nesta bela adaptação.

Como Treinar o Seu Dragão (How to Train Your Dragon, EUA – 2025)
Direção: Dean DeBlois
Roteiro: Dean DeBlois, adaptado da obra de Cressida Cowell
Elenco: Mason Thames, Nico Parker, Gerard Butler, Nick Frost, Gabriel Howell, Julian Dennison, Bronwyn James
Gênero: Fantasia, Ação
Duração: 125 min.

https://www.youtube.com/watch?v=CWTy1ukPoYY&ab_channel=UniversalPicturesBrasil

Crítica | Novocaine: À Prova de Dor é um desperdício de potencial

Espera-se que um filme que tem como premissa principal a história de um homem com uma síndrome extremamente rara, conhecida como Insensibilidade Congênita à Dor, que faz com que a pessoa não sinta dor nem tenha outras reações, como sentir frio ou calor, seja razoavelmente divertido.

Em Novocaine: À Prova de Dor, longa dirigido pela dupla Dan Berk e Robert Olsen, o resultado obtido é um retrato de como Hollywood estraga boas ideias com roteiros genéricos e histórias sem desenvolvimento e aprofundamento da trama.

Acompanhar a rotina de Nate (Jack Quaid) é uma experiência cansativa e entediante. O astro praticamente repete seu personagem de The Boys, interpretando o bom mocinho que, por acaso, se torna um herói.

A trama acompanha Nate, um homem que trabalha em um banco e é apresentado como um bom samaritano, ajudando as pessoas a não perderem suas casas. Ele começa a se relacionar com sua colega de trabalho, Sherry (Amber Midthunder), até que assaltantes invadem o banco e a sequestram. A partir daí, é fácil imaginar o que acontece, com Nate indo atrás dos sequestradores para resgatar sua amada.

Só de ler essa sinopse, já dá para perceber que o roteiro de Lars Jacobson não traz nada de novo — e de fato, não traz. Embora tente se aprofundar na vida pessoal do protagonista, tudo é tão superficial e clichê que fica a sensação de já termos visto isso em alguma outra produção, seja na franquia John Wick ou Anônimo (2021), longas de ação recheados de pancadaria.

As obras mencionadas acima apresentam cenas de ação bem construídas e coreografadas, enquanto em Novocaine, as sequências de luta são fracas. Elas se concentram mais no fato de Nate não sentir dor e na violência extrema, sem o mesmo cuidado com a construção das cenas.

A direção de Dan Berk e Robert Olsen falha ao repetir diversos momentos, como as várias cenas em que Nate machuca a mão. Além disso, as inúmeras piadas, que às vezes funcionam, em outros acabam quebrando o ritmo da ação.

É verdade que a dupla de cineastas se esforça para prender o espectador na tela, mas Novocaine é tão chato e sem sentido que pouco se pode aproveitar dele. Se a premissa seguisse um rumo diferente, que não fosse a corrida para salvar a mocinha dos vilões, certamente teria um resultado melhor, algo que a produção ficou bem distante de alcançar.

Novocaine - À Prova de Dor (Novocaine, EUA – 2025)
Direção: Dan Berk e Robert Olsen
Roteiro: Lars Jacobson
Elenco: Jack Quaid, Amber Midthunder, Ray Nicholson, Jacob Batalon, Betty Gabriel, Matt Walsh
Gênero: Ação, Comédia
Duração: 110 min.

https://www.youtube.com/watch?v=gmgZVKRyQTw&ab_channel=ParamountBrasil

Crítica | Sem Chão - Conflito sem fim

Toda história tem dois lados, e geralmente há relatos diferentes de ambos sobre os acontecimentos. No caso do conflito entre Israel e Palestina, especificamente entre Israel e o Hamas, quem sofre é a população inocente que fica no meio do fogo cruzado.

Nos acostumamos a assistir pela TV a vários relatos de violência praticada pelos dois lados, sendo o mais recente o ataque do Hamas, que matou e sequestrou colonos israelenses, algo que fez com que Israel retaliassse com bombardeios.

Em Sem chão (em uma tradução genérica para o título original), produção vencedora do Oscar 2025 na categoria de Melhor Documentário, a história é contada do ponto de vista dos palestinos, mais especificamente na vila de Masafer Yatta, na região sul da Cisjordânia.

Basel Adra, o homem que aparece com frequência no documentário, começou a filmar aos 15 anos o avanço de Israel sobre o território palestino. Adra, junto com o cineasta palestino Hamdan Ballal e o jornalista israelense Yuval Abraham, mostra como o avanço das tropas israelenses se intensificou na região nos últimos anos.

Na produção, é possível acompanhar o cotidiano dos moradores que perderam suas casas devido a uma lei que permitia a demolição das residências para a realização de treinamentos militares pelo exército israelense. Porém, os documentos oficiais mostravam que os palestinos eram retirados da área e enviados para assentamentos irregulares criados por Israel.

As filmagens são bastante amadoras e não recorrem ao sensacionalismo barato que muitas vezes é visto em documentários do gênero. Por ser uma denúncia e apresentar imagens fortes de como o exército de Israel agia na região, é natural que cause revolta, como quando o exército israelense enche poços com cimento, demole casas com tratores e expulsa os moradores com rispidez e violência.

O documentário se perde um pouco ao tentar fazer uma conexão entre os anos 1980 e a atualidade, faltando profundidade ao mostrar o avanço de Israel ao longo dos anos. Fica até confuso em alguns momentos entender se o que está sendo retratado é do passado ou do presente, e também não há uma contextualização mais detalhada sobre o tempo que transcorreu, se foram dias, semanas ou meses.

Sem Chão é um bom documentário que retrata a realidade a partir de outra perspectiva, mas se apoia bastante no relato dos moradores e nas cenas do cotidiano deles. É uma produção que, apesar de ter suas limitações técnicas, supera essas questões, que acabam sendo secundárias diante da mensagem que transmite.

Sem Chão (No Other Land, Palestina, Noruega – 2024)
Direção: Yuval Abraham, Basel Adra, Hamdan Ballal, Rachel Szor
Roteiro: Basel Adra, Rachel Szor, Hamdan Ballal, Yuval Abraham
Elenco: Yuval Abraham, Basel Adra
Gênero: Documentário
Duração: 92 min.

https://www.youtube.com/watch?v=7AS6v3hC86Q&ab_channel=Berlinale-BerlinInternationalFilmFestival

Crítica | Flow já é uma das melhores animações do ano

Não é errado dizer que Flow é uma das grandes surpresas da temporada de premiações, sendo indicado nas categorias de Melhor Filme Internacional e Melhor Animação no Oscar 2025.

O longa animado da Letônia era pouco conhecido, mas sua qualidade como obra audiovisual e o boca a boca fizeram com que a animação se tornasse um fenômeno global.

Flow conta a surreal e incrível jornada de um gatinho que se vê forçado a sobreviver em um mundo à beira do apocalipse (pelo menos é o que parece), enfrentando um dilúvio de proporções bíblicas que cobre, além de montanhas, também uma simbólica estátua do gato preto, que era cultuada algum povo desconhecido.

Dirigido por Gints Zilbalodis e com roteiro assinado por ele, em parceria com Matiss Kaza e Ron Dyens, o filme é um espetáculo à parte. Não apenas pela qualidade gráfica, mas, principalmente, pelo seu roteiro, que nos revela muito mais do que parece implícito na história.

A construção da narrativa nos oferece uma verdadeira odisseia do carismático gatinho por lugares inóspitos, sendo obrigado a seguir a jornada do herói, enfrentando desafios que o testam constantemente e revelam toda a sua coragem.

Animação de qualidade

A simplicidade com que a trama se desenvolve só prova o quão original ela é. Não há um único diálogo na história, o que torna a produção ainda mais bela, pois a maioria dos acontecimentos é mostrada através da interação dos animais uns com os outros e dos perigos que enfrentam, sem a necessidade de falarem, como ocorre na maioria dos longas animados do gênero.

Outra característica interessante do roteiro é o fato de o longa não se preocupar em explicar absolutamente nada sobre a calamidade envolvendo os animais. Esse aspecto, não afeta a narrativa, pois a história se sustenta por si só através da jornada de sobrevivência dos animais.

Na trama, não há menção a humanos; é como se eles tivessem desaparecido da Terra ou sido extintos. Existem apenas indícios de que os humanos estiveram por lá, o que mostra novamente como a animação consegue desenvolver a narrativa utilizando apenas elementos surrealistas. Isso fica bastante claro na cena em que os personagens emergem em direção ao céu do nada.

Gints Zilbalodi é animador e editor, e, por isso, a qualidade de Flow está, além do roteiro, na parte gráfica. Gints utilizou o software Blender para editar o filme, o que é um diferencial, já que grandes estúdios como Pixar e DreamWorks utilizam softwares próprios.

O uso do Blender por parte de Gints nos mostra que a qualidade não está apenas relacionada ao uso de tecnologias de ponta. É justamente essa simplicidade em fazer muito com menos que faz de Flow um dos grandes filmes do ano.

Flow (idem, Letônia – 2024)
Direção: Gints Zilbalodis
Roteiro: Gints Zilbalodis, Matiss Kaza e Ron Dyens
Gênero: Animação, Aventura
Duração: 85 min.

https://www.youtube.com/watch?v=lBPG_31yEOk&ab_channel=MARESFILMES