No recém-lançado filme “Maria”, dirigido por Pablo Larraín e estrelado por Angelina Jolie no papel da lendária soprano Maria Callas, o designer de produção Guy Hendrix Dyas recebeu uma missão singular: criar um cenário que refletisse a vida grandiosa e ao mesmo tempo solitária da artista. Conforme Dyas revelou, a instrução inicial do diretor foi clara: “Ela [Callas] é a joia, e eu tive que criar a caixa de joias”.

O longa, disponível na Netflix, acompanha Callas em suas últimas semanas de vida. Por meio de flashbacks, são retratados momentos importantes de sua carreira, como seu relacionamento com Aristóteles Onassis e apresentações icônicas no La Scala, na Itália. Paralelamente, o filme mostra suas lutas internas, agravadas pelo uso de medicamentos e pelo impacto de memórias dolorosas enquanto tenta voltar aos palcos pela última vez.

O apartamento parisiense de Maria Callas: um cenário fundamental

Grande parte do filme se passa no apartamento de Callas, em Paris, localizado na Avenue Georges Mandel, onde a soprano viveu seus últimos dias. Embora o proprietário atual do imóvel tenha proibido Dyas de fotografar o local, ele fez esboços detalhados durante sua visita. Com base no roteiro, ficou claro que o ambiente precisava refletir tanto a glória do passado quanto o isolamento e a solidão da personagem.

Dyas utilizou uma abordagem fluida para o design dos cômodos, fazendo com que cada espaço representasse diferentes aspectos da vida de Callas. O quarto, por exemplo, foi idealizado de forma que lembrasse um palco de ópera, enquanto o camarim era repleto de bustos gregos e romanos, simbolizando seu fascínio pela arte clássica.

Além disso, Dyas trabalhou cuidadosamente as transições entre os ambientes privados, como o quarto caótico, e os espaços sociais, onde Callas recebia convidados e concedia entrevistas.

Inspiração nas cores da moda dos anos 70

Para criar uma atmosfera autêntica da década de 1970, Dyas buscou inspiração nas coleções de moda da época, especialmente de estilistas franceses como Yves Saint Laurent, Dior e Sonia Rykiel. A paleta de cores incluía tons terrosos, marrons, ferrugem e detalhes em laranja, verde e turquesa, aplicados nos papéis de parede, cortinas e tapetes do cenário.

Segundo Dyas, a ideia era transportar o público diretamente para o período, já que grande parte da narrativa se desenrola dentro do apartamento. Esse trabalho minucioso com as cores também refletia o gosto pessoal de Callas, que tinha preferência por tons elegantes e atemporais.

Detalhes artísticos e o dilema do camarim

Maria Callas tinha uma forte conexão com a arte renascentista e não apreciava obras modernas ou paisagens. Assim, Dyas encheu o cenário com reproduções de pinturas clássicas, muitas delas com temas de Madonnas e bebês, refletindo a sensibilidade artística da soprano.

O camarim foi um dos maiores desafios enfrentados pelo designer de produção. Na vida real, Callas possuía mais de 10.000 itens de vestuário e mais de 1.000 pares de luvas de seda. Dyas queria transmitir essa opulência visual sem que o ambiente ficasse sobrecarregado. Para isso, ele colaborou com o figurinista Massimo Cantini Parrini e criou um espaço que expusesse as roupas e acessórios de forma harmoniosa.

Foram acumulados mais de 4.850 peças de vestuário, entre chapéus, sapatos, luvas e vestidos, adquiridos em brechós e casas de fantasias. Essa vasta coleção incluía itens que lembravam os figurinos utilizados por Callas em suas apresentações operísticas mais icônicas.

Simbolismo dos bustos danificados

Os bustos espalhados pelo camarim foram escolhidos por seu simbolismo. Dyas explicou que alguns estavam quebrados ou danificados, com olhos faltando ou com apenas metade da cabeça. Esses detalhes refletiam o estado emocional de Callas, uma mulher que, apesar de seu grande sucesso, carregava marcas profundas de sua vida pessoal conturbada.

Para Dyas, esses bustos eram uma representação melancólica do preço pago por Callas ao longo de sua trajetória artística:

“Tivemos que promover essa ideia de uma mulher que teve grande sucesso e foi um ser humano sortudo por ter vivido a vida que viveu. Mas havia um preço a pagar em sua vida privada e seu sacrifício.”Bastidores de “Maria”: designer de produção revela detalhes da criação visual do filme

Mostrar menosContinuar lendo