Um estigma que virou status
Por muito tempo, ser canhoto foi motivo de punição e superstição. Expressões como “instrumento do diabo” ou “filho do capeta” acompanharam canhotos por gerações — e não era incomum que crianças fossem forçadas a usar a mão direita, muitas vezes com violência. Esse passado sombrio, no entanto, deu lugar a uma reputação quase glamourosa. Hoje, a canhotice é frequentemente associada à genialidade, à criatividade e à originalidade. Mas será que essa percepção tem base científica?
A ciência tenta (e falha) em uma resposta definitiva
Canhotos representam cerca de 10% da população mundial e, ao longo das décadas, pesquisadores têm buscado entender o que os torna diferentes — ou se são diferentes, de fato. Estudaram-se relações entre canhotice e inteligência, doenças mentais, criminalidade e até expectativa de vida. O resultado? Uma série de conclusões contraditórias que refletem mais a complexidade do cérebro humano do que qualquer verdade absoluta.
Há estudos que apontam para uma leve vantagem cognitiva entre canhotos, sugerindo que o constante esforço para se adaptar a um mundo feito para destros poderia estimular a flexibilidade mental e, por consequência, a criatividade. Outros, porém, não encontraram qualquer correlação significativa.
O segredo pode estar no espectro da dominância
Mais recentemente, a ciência tem deixado de lado a dicotomia canhoto versus destro e adotado uma visão mais ampla: a da destreza manual como um espectro. Pesquisas indicam que poucas pessoas são puramente destras ou puramente canhotas. Na verdade, muitos de nós usamos mãos diferentes para tarefas distintas — escrever com uma, escovar os dentes com outra, por exemplo.
Esse “meio do caminho”, chamado de destreza inconsistente, parece revelar algo interessante. Pessoas com dominância mista tendem a ter pensamento mais flexível, empatia elevada e maior sensibilidade ao risco — características associadas à criatividade e à inteligência emocional. Até o padrão de sono dessas pessoas pode ser diferente, segundo algumas análises.
Criatividade canhota: mito confortável ou verdade incômoda?
Apesar de todos os dados, a resposta à pergunta “canhotos são mais criativos?” continua vaga. A ciência ainda não chegou a um consenso — e talvez nunca chegue. A mente humana é complexa demais para ser explicada por uma única variável, como a mão dominante.
Portanto, se você é canhoto e gosta de acreditar que isso o torna especial, a ciência ainda não tem argumentos sólidos para discordar. E se você for destro, talvez o segredo não esteja na mão que você usa, mas na flexibilidade com que pensa.