Crítica | Uma Natureza Violenta - Quase que uma cópia de Sexta-Feira 13
Uma Natureza Violenta é tudo o que os fãs de filmes de terror não estão habituados a ver nos slashers, que geralmente seguem a fórmula clássica de um assassino mascarado perseguindo jovens e matando-os um a um com mortes criativas.
A história acompanha um assassino chamado Johnny, responsável pelo massacre de White Pines, que ressurge da terra em busca de um medalhão que o mantinha preso ao local. Ele retorna para matar todos em seu caminho na tentativa de recuperar o objeto e descansar em paz.
Dirigido por Chris Nash, o cineasta apresenta sua versão de Jason Voorhees e utiliza claramente a franquia Sexta-Feira 13 como referência para conceber sua história. Até a forma como Johnny é visto a todo instante e os enquadramentos que o mostram dão a impressão de que ele seria uma versão moderna de Jason.
O longa se destaca ao descaracterizar o formato clássico dos slashers, ao filmar o vilão de costas e apresentar seu ponto de vista dos acontecimentos, mostrando-o observando suas presas de longe e percorrendo a floresta em busca de vítimas.
Nash foi mais ousado do que parece ao adotar essa abordagem, pois pouquíssimos diretores topariam contar os crimes de um assassino sádico através de sua perspectiva. Tal prática permite revelar a outra parte do enredo que geralmente é ofuscada, que é a visão do serial killer. A câmera é colocada em cena de um jeito que lembra as obras de Terrence Malick, com ritmo lento e exploração de paisagens naturais.
Essa é apenas uma das quebra de expectativas que o longa realiza. Os personagens não são apresentados e nem desenvolvidos, o papel da final girl não está definido desde o princípio, com a protagonista só ganhando destaque no ato final, e mesmo assim, não temos ideia de quem ela é ou por que está ali no meio do mato.
Essa falta de drama é algo que sentimos na trama; a narrativa é muito séria e direta ao ponto. O drama geralmente enriquece o roteiro, e a falta dele muda completamente a narrativa. Outro aspecto que sentimos ausência é da falta de sustos, devido à visibilidade do antagonista e à previsibilidade de seus próximos passos. Essa falta de sustos provavelmente irá frustrar parte do público, mas, em contrapartida, o longa é bastante violento, para não dizer brutal.
Uma Natureza Violenta possivelmente vai frustrar muitos espectadores que estão procurando um slasher convencional, mas encontrarão um projeto de terror quase experimental, que segue uma direção oposta ao habitual do subgênero, e por esse motivo deve ser visto.
Uma Natureza Violenta (In a Violent Nature, EUA – 2024)
Direção: Chris Nash
Roteiro: Chris Nash
Elenco: Ry Barrett, Andrea Pavlovic, Cameron Love, Reece Presley, Liam Leone, Charlotte Creaghan
Gênero: Drama, Terror, Suspense
Duração: 94 min.
https://www.youtube.com/watch?v=4BVW7axwtQk&ab_channel=Shudder
Crítica | Twisters é uma ótima surpresa que vale conferir nos cinemas
Lançado originalmente em 1996, o primeiro Twister foi um tremendo sucesso comercial e cultural. Sob produção de Steven Spielberg e direção do talentoso Jan de Bont, o filme ainda navegava pela empolgação de Hollywood em seus recém descobertos efeitos visuais - frutos do sucesso de Jurassic Park, também de Spielberg. Twister foi concebido meramente pelo entusiasmo da equipe ao perceber o que era possível fazer com a tecnologia: “por que não fazer um filme de tornados?”.
Corta para quase 30 anos depois e Hollywood simplesmente não demonstra mais o mesmo entusiasmo. A tecnologia avançou tanto que literalmente mais nada é capaz de impressionar o público: tudo pode ser feito com efeitos visuais. É por um sentimento inversamente proporcional que Twisters existe: não por artistas imaginando o que pode ser possível, mas sim um desejo desesperado de voltar ao passado e recapturar uma magia difícil de ser replicada.
Apesar de sentimentos pouco nobres, que certamente têm mais interesse no retorno financeiro, é com grata surpresa que este Twisters seja tão bom e divertido, e maior triunfo resida justamente em um saudosismo natural e nada forçado.
Sem nenhuma conexão aparente com o universo ou mitologia do original, o novo Twisters troca a trama de divórcio pendente entre Bill Paxton e Helen Hunt do original por algo mais batido, mas sempre eficiente se contando com o elenco certo: o casal improvável e de polos opostos que acabam se atraindo, aqui representados pela meteorologista correta e segura da ótima Daisy Edgar-Jones e o bad boy aventureiro caçador de tornados Tyler Owen, vivido pelo carismático Glen Powell - em meteórica ascensão após Top Gun: Maverick e Assassino por Acaso.
A dinâmica do casal é pura e divertidíssima, daquelas que marcavam grandes clássicos dos anos 1990, e que raramente vemos funcionando na Hollywood contemporânea. Através de uma dinâmica leve e até sensual, o roteiro bem correto de Mark L. Smith é capaz de trazer surpresas e reviravoltas interessantes, que funcionam graças ao investimento nesses dois excelentes personagens.
No sentido de direção, o coreano Lee Isaac Chung faz um grande salto de seu drama oscarizado Minari: Em Busca da Felicidade para uma produção gigantesca de US$200 milhões. Ao lado do diretor de fotografia Dan Mindel (com um lindo uso de película 35MM), a dupla é bem feliz ao emular o estilo nervoso e destrutivo de Jan de Bont para uma série de sequências mirabolantes e intensas de tornados, cujos efeitos visuais e práticos garantem uma imersão profunda; exacerbada também pela ótima trilha sonora de Benjamin Wallfisch.
Ao contrário de diversas “sequências legado” que apostam em resgatar de forma desengonçada elementos que só funcionavam no passado (seja personagens, figurinos ou objetos), Twisters é mais inteligente ao mirar na “sensação” de seu filme original, e não necessariamente em sua mitologia. O resultado é certeiro e proporciona uma das diversões mais desavergonhadamente pipocas de 2024, perfeitamente bem representada por um momento chave: onde os personagens acabam se refugiando de um tornado gigantesco no clímax?
Em uma sala de cinema, onde mais?
https://www.youtube.com/watch?v=q1OOPPe24uc
Crítica | Rebel Moon - Parte 2: A Marcadora de Cicatrizes - A Decadência de Zack Snyder
Zack Snyder se destacou no cinema com o ótimo Madrugada dos Mortos, o que lhe rendeu contratos para dirigir os aclamados filmes 300 e Watchmen. No entanto, nos últimos anos, o cineasta tem realizado trabalhos bastante fracos, para não dizer irrelevantes.
Sua parceria com a Netflix tem rendido frutos; ele já havia dirigido Army of the Dead: Invasão em Las Vegas e, em 2023, estreou outra obra que liderou: o fraquíssimo Rebel Moon - Parte 1: A Menina do Fogo. A segunda parte desta produção, Rebel Moon - Parte 2: A Marcadora de Cicatrizes, estreou em 2024 e é, sem dúvida, um sinal de que suas produções estão piorando com o tempo, mostrando que o diretor está em franca decadência e sem sinais de que vá fazer algo bom à vista.
A sequência de Rebel Moon é uma das piores coisas já vistas nos últimos anos. Sem dúvida, irá figurar na lista dos piores filmes de 2024. Quase nada se salva dessa bomba produzida pela Netflix, destacando-se apenas os efeitos visuais, que, pode-se afirmar com certeza, foi um grande gasto de tempo e dinheiro. Afinal, ter efeitos digitais bonitos geralmente não salva um roteiro ineficaz e caótico.
A trama continua a batalha entre o bem e o mal, com o Reino tentando encerrar a rebelião ao invadir outro planeta em busca de grãos. Esses homens que aparecem em naves espaciais são claramente inspirados em oficiais nazistas, e o jeito caricato como esses vilões agem não desperta nenhum sentimento no público. O mesmo vale para os heróis que surgem na história, especialmente Kora (Sofia Boutella), uma personagem sem carisma e sem profundidade.
Snyder teve seu projeto para Star Wars deixado de lado quando a Disney adquiriu os direitos da franquia, e é óbvio que o cineasta quis fazer sua aventura espacial no mesmo estilo. Isso fica evidente em todos os cenários possíveis. A diferença é que o roteiro é péssimo, as atuações são ruins e o ritmo é lento, tornando-o um filme de ação entediante e chato.
Apesar de ter bons efeitos digitais, ainda assim é feio visualmente. Muito disso se deve à péssima fotografia, assinada pelo próprio Snyder. Em seus trabalhos anteriores, o diretor de fotografia era Larry Fong, que realizou a tarefa em Batman vs Superman e Watchmen. Em várias cenas de Rebel Moon, a iluminação parece amadora e desfocada, deixando claro que uma das marcas registradas dos filmes de Snyder não foi aplicada nesta produção.
Rebel Moon: Parte 2 é um fracasso do início ao fim. As cenas de ação, que já são fracas, ficam ainda piores com a câmera lenta excessiva que Snyder insere nas sequências. É um filme para assistir, dormir e talvez dar algumas risadas de algumas cenas ridículas.
Rebel Moon - Parte 2: A Marcadora de Cicatrizes (Rebel Moon - Part Two: The Scargiver, EUA – 2024)
Direção: Zack Snyder
Roteiro: Zack Snyder, Kurt Johnstad, Shay Hatten
Elenco: Sofia Boutella, Djimon Hounsou, Ed Skrein, Michiel Huisman, Bae Doona, Ray Fisher, Anthony Hopkins
Gênero: Ação, Aventura, Drama
Duração: 122 min.
https://www.youtube.com/watch?v=REmhJOdVmLI&ab_channel=NetflixBrasil
Crítica | Entrevista com o Demônio - Um filme que foge do convencional
Possessões demoníacas sendo mostradas no cinema já são algo comum, com a franquia Invocação do Mal popularizando esse subgênero que conta com grandes clássicos, como O Exorcista (1973) e O Exorcismo de Emily Rose (2005). Entrevista com o Demônio é uma dessas produções que tratam do assunto, mas que provavelmente não irá conquistar boas notas de uma parcela do público.
A nota no Rotten Tomatoes, onde o longa atualmente aparece com 97% da crítica e 81% da audiência, já é um indício de que os espectadores ou não entenderam o conceito do filme ou simplesmente não gostaram da trama. Se sustos, gritos e sangue aos montes são o que você procura ao assistir a esta produção, não é isso que encontrará; pelo contrário.
Late Night With the Devil (título original) foi dirigido e roteirizado pelos irmãos Cameron e Colin Cairnes. O filme conta a história de Jack Delroy (David Dastmalchian), um apresentador de programa de auditório nos anos 1970 que aspira superar a audiência de seu concorrente Johnny Carson e, para isso, decide apelar para o sensacionalismo, convidando figuras ligadas ao ocultismo para o especial de Halloween de seu programa.
Se pararmos para pensar, a ideia do roteiro é bem simples, mas, nas mãos dos irmãos Cairnes, revela todo o seu potencial, indo além do ocultismo e entrando na esfera da possessão demoníaca. O primeiro ato é arrastado, pois precisa apresentar Jack, seu programa noturno Night Owl e suas ambições pessoais, além de seu trauma particular envolvendo a morte de sua esposa.
Filmado no estilo found footage, mas não no formato convencional de câmera na mão. Em vez disso, utiliza as câmeras do programa de TV para criar a impressão de que se trata da única cópia de uma fita master e de que aquele conteúdo é real. O filme intercala entrevistas do apresentador com os convidados e conversas de bastidores entre Jack e o produtor, causando uma maior imersão do público com a trama.
Com todo o falatório nas redes sociais sobre esse filme, é natural que se crie uma grande expectativa ao seu redor. No entanto, isso provavelmente frustrará aqueles que procuram uma história de possessão demoníaca convencional, algo que o longa não oferece. Somente em seu último ato é revelado todo o horror envolvendo a garota de 13 anos, Lilly (Ingrid Torelli). É quando o verdadeiro mal se manifesta que entendemos o que os diretores pretendiam com todo o suspense construído até então.
A mensagem que o roteiro quer transmitir não é óbvia, mas é possível captar seu sentido. Jack entrevista, em seu programa especial de Halloween, um médium, um homem cético em relação às artes ocultas e uma parapsicóloga que está tratando a garota de 13 anos, que alega estar possuída pelo demônio. O debate não se limita à espetacularização dos programas de TV que trazem tantas bobagens para as telas, mas também à escuridão envolvida na criação desses programas e à indiferença dos produtores em relação às consequências de seus atos, focando apenas na audiência.
Entrevista com o Demônio lembra bastante os curtas amadores da bizarra franquia de terror V/H/S, que simula fitas de vídeo perdidas. Os irmãos Cairnes utilizaram o terror atmosférico para dar um ar de realidade à trama, o que funciona bem e cria uma rápida conexão com o público, situando-os no ambiente onde a ação acontece. O jeito de pensar um programa de TV foge do óbvio, proporcionando uma experiência imersiva e original.
Entrevista com o Demônio (Late Night with the Devil, EUA – 2023)
Direção: Cameron Cairnes, Colin Cairnes
Roteiro: Cameron Cairnes, Colin Cairnes
Elenco: David Dastmalchian, Laura Gordon, Ian Bliss, Fayssal Bazzi, Ingrid Torelli, Rhys Auteri
Gênero: Terror
Duração: 93 min.
https://www.youtube.com/watch?v=7pzCItd7FRs&ab_channel=DiamondFilmsBrasil
Crítica | Meu Malvado Favorito 4 - Uma franquia que perde o fôlego
Quando o primeiro longa animado de Meu Malvado Favorito estreou em 2010, foi um sucesso instantâneo, principalmente entre o público infantil, que logo se encantou com a animação que trazia Gru como um vilão malvado e seus bobinhos, porém divertidos, Minions, que rapidamente se tornaram a marca registrada da produção.
É óbvio que tamanho sucesso faria com que o filme recebesse continuações, dois derivados e curtas-metragens, além de transcender as telas e vender produtos, como mochilas, camisas e brinquedos. É nesse cenário que surge Meu Malvado Favorito 4, uma sequência natural, mas não tão encantador quanto às versões anteriores.
Isso não quer dizer que a animação seja ruim; pelo contrário, sua qualidade continua sendo de primeira linha, graças à produtora Illumination Entertainment, responsável pela criação e animação da produção. O grande problema do quarto filme da franquia, e nisso há uma parcela de culpa dos diretores (Chris Renaud, Patrick Delage) e roteiristas (Ken Daurio, Patrick Delage), é que a história não se renova com o passar do tempo, apenas inserindo um ou outro elemento novo à narrativa.
Desta vez, o elemento novo é Gru Jr., o bebê recém-nascido da relação do ex-supervilão com Lucy, que ele conheceu e por quem se apaixonou em Meu Malvado Favorito 3. Esse fato já demonstra que a obra está se transformando em uma produção voltada para a família, não apenas pela história centrada nesse novo componente, mas também pelas mudanças na vida dos personagens.
Gru abandonou sua vida de supervilão há algum tempo e agora busca transmitir uma imagem de pessoa gentil e amável. Enquanto isso, Lucy e sua filha mais velha, Margo, enfrentam desafios ao se adaptarem a uma nova vida na cidade. É nesse contexto que surgem diversas situações engraçadas que devem divertir o público.
Nos outros longas da franquia, o principal era o vínculo entre Gru e suas três filhas adotivas, além do processo de humanização do vilão através desse vínculo. Neste novo capítulo, porém, são poucas as oportunidades para as três crianças se destacarem, sendo praticamente deixadas de lado. A falta de coragem da dupla de diretores, Chris Renaud e Patrick Delage, em dar um passo além e amadurecer os personagens representa uma grande oportunidade perdida.
São várias as subtramas criadas pelo roteiro e a história não consegue suportar tantas variações. Um exemplo são os Minions que se tornam espécie de super-heróis e que são pessimamente apresentados pelo roteiro. A partir do momento que mais e mais personagens vão surgindo na narrativa, mais difícil fica desenvolver suas histórias e deixando a trama cada vez mais vazia e artificial.
Meu Malvado Favorito 4 é praticamente uma cópia dos filmes anteriores, reproduzindo a fórmula que deu certo, incluindo o surgimento de um vilão com um plano maquiavélico para criar o caos no mundo. De todos os longas da franquia, este é o mais fraco, dando a impressão de que, com o tempo, a criatividade se esgotou e não há mais nada para inovar. Certamente agradará ao público infantil, mas para os outros espectadores, pode se tornar cansativo e previsível.
Meu Malvado Favorito 4 (Despicable Me 4, EUA – 2024)
Direção: Chris Renaud, Patrick Delage
Roteiro: Ken Daurio, Mike White
Elenco: Vozes - Steve Carell, Kristen Wiig, Joey King, Will Ferrell, Sofía Vergara, Miranda Cosgrove
Gênero: Animação, Aventura, Comédia
Duração: 95 min.
https://www.youtube.com/watch?v=-9QBR0BwK3E&ab_channel=UniversalPicturesBrasil
Crítica | Um Lugar Silencioso: Dia Um - É melhor ficar em silêncio quando nada se tem a dizer
"Um Lugar Silencioso: Dia Um" é um spin-off do original "Um Lugar Silencioso" de 2018, este dirigido pelo também ator John Krasinski. O prólogo dirigido por Michael Sarnoski (de Pig - A Vingança) mostra a chegada dos alienígenas à Terra e o caos social imediato resultante da invasão. A protagonista Samira (interpretada por uma esforçada Lupita Nyong'o) é uma paciente terminal vivendo em Nova York que testemunha a chegada das criaturas e o massacre que se segue. Ela é acompanhada pelo tímido Eric (Joseph Quinn) e um gato de estimação numa fuga em círculos pela cidade arruinada.
A pergunta que um amante de cinema pode se fazer é: a premissa iniciada no primeiro filme teria fôlego para dois mais (ou sabe-se lá quantos ainda virão)? A resposta parece evidente na metade deste enredo, quando os protagonistas vagam em cenas que forçam um lirismo entrecortado por sustos gratuitos que aparecem para nos lembrar de que, afinal, se trata apenas de mais um filme de terror, apocalipse ou algo parecido.
Além de esticar ao limite uma premissa que não parece ter material dramático para se sustentar por uma hora e meia (e você já assistiu à uma situação semelhante com melhor sorte em Cloverfield - Monstro, por exemplo), o roteiro força a barra de maneira pueril, quando meia hora depois de a cidade ser atacada por um inimigo alienígena do qual rigorosamente nada se sabia até então, os habitantes já parecem plenamente convencidos (e mobilizados) de qual é a "regra do jogo" (ficar quietos para não atrair atenção das criaturas), o que é bastante inverossímil e só serve para conduzir a história aonde o roteirista quer.
Quando, evidentemente, seria muito mais razoável imaginar que a população levaria dias (ou ao menos umas boas horas) para entender o que estava acontecendo e aceitar a "regra de segurança" (que é a base de toda a franquia e, até por esse motivo, merecia ser mais bem trabalhada). Exigir realismo tampouco parece razoável, porque precisamos lembrar que este não é muito mais que outro filme de "monstro" e se comporta como tal.
O filme repete também o mesmo truque barato dos dois anteriores: nenhum deles é nada "silencioso", pois tanto aqui, como nos outros, a direção lança mão de todo tipo de intervenção sonora e música constante, de modo que os sussurros são compensados por uma barulheira bem exagerada. Seria surpreendente e realmente "inovador" conseguir provocar sustos sem efeitos sonoros, por exemplo. Mas esta é uma proeza que nem Krasinski, nem Sarnoski, sequer cogitariam.
No deserto de qualidades no qual se converteu a indústria de entretenimento nos últimos anos, a ideia do primeiro filme de Krasinski soou bastante original num primeiro momento (embora sorrateira fosse uma palavra melhor). Depois, entretanto, de mais de cinco horas de correria e monstrengos fazendo careta, a impressão que se sobressai é que se trata apenas de mais uma fórmula sendo reprisada. No fim do mundo, como Hollywood tem nos ensinado há décadas, não há muito que se dizer: o jeito é correr mesmo.
Um Lugar Silencioso: Dia Um (A Quiet Place: Day One – EUA, 2024)
Direção: Michael Sarnoski
Roteiro: Michael Sarnoski, John Krasinski, Bryan Woods
Elenco: Lupita Nyong’o, Joseph Quinn, Alex Wolff, Djimon Hounsou, Thara Schoon, Thea Butler
Duração: 100 min.
Momento do Contato: filme sobre caso famoso falha como documentário, mas reforça lenda urbana
Momento do Contato: filme sobre caso famoso falha como documentário mas reforça lenda urbana
Com o passar do tempo, o episódio do “ET de Varginha” vai deixando de lado sua dimensão histórica e adquirindo típicas características de uma lenda urbana
Fora das principais plataformas de streaming no Brasil, o documentário “Momento do Contato - O Caso Varginha” (2022), dirigido por James Fox, encontrou grande divulgação no meio ufológico nacional desde que foi divulgado pela primeira vez, e hoje pode ser assistido gratuitamente no Youtube e em outras fontes alternativas.
O filme explora um subgênero em crescimento há anos (o da especulação conspiratória que mistura eventos históricos com o imaginário da literatura fantástica e ficção científica), o qual parece ter se convertido em fonte de renda relativamente garantida para os produtores por causa da ativa e fiel comunidade ávida por tal tipo de conteúdo (percorrendo temas como “formato da terra”, “governo mundial”, “sociedades secretas”, “chegada do homem à Lua”, entre outros).
Conforme tipicamente ocorre com o formato, o filme lança mão de informações amparadas ou não por fontes verificáveis para construir sua própria “tese” a respeito do que poderia ter acontecido a partir de janeiro de 1996, quando o episódio em Varginha adquiriu repercussão nacional e internacional. O próximo parágrafo resume tais supostos acontecimentos, então ele poderá ser ignorado por todos que estão familiarizados com o caso.
Em 1996, a cidade de Varginha, em Minas Gerais, foi palco de um dos casos ufológicos mais famosos do Brasil, conhecido como o "ET de Varginha". Três jovens irmãs, Liliane, Valquíria e Kátia, relataram ter visto uma criatura estranha em um terreno baldio, descrita como baixa, marrom, com grandes olhos vermelhos e protuberâncias na cabeça. O avistamento ocorreu no dia 20 de janeiro, gerando uma onda de relatos de outros moradores que afirmaram ter visto fenômenos semelhantes. Alegações de movimentação militar e a captura da criatura pela Escola de Sargentos das Armas (ESA) em Três Corações aumentaram o mistério.
Testemunhas afirmaram que a criatura foi levada a um hospital local e depois transferida para a UNICAMP, em São Paulo. As autoridades brasileiras, incluindo militares e funcionários do hospital, negaram qualquer envolvimento com seres extraterrestres e apresentaram explicações alternativas, como operações militares rotineiras e a possível confusão com um cidadão portador de deficiência.
O caso atraiu a atenção da mídia e de ufólogos internacionais, mas a ausência de evidências físicas concretas, como fotos ou vídeos da criatura ou de algum OVNI, deixou muitas dúvidas. As testemunhas originais, no entanto, mantêm suas histórias, e o "ET de Varginha" permanece um dos maiores mistérios ufológicos do país.
Até hoje, o episódio como um todo (bem como seus quase infindáveis “desdobramentos”, que atravessam meses a partir da data inicial) apoia-se unicamente em testemunhos, sendo que a maioria deles é anônima (e muita vezes, sequer transcrita, sobrevivendo somente de forma oral no relato dos ufólogos, ou seja, “testemunhos de testemunhos”) ou notadamente indireta (alguém repete algo que, na data do testemunho, já era conhecido de forma pública ou por uma “fonte” anterior, de modo que ele pode ser simplesmente uma repetição de algo já divulgado), tornando a verificação de sua veracidade quase impraticável e fazendo com que a maior parte das “pistas” que poderia levar à elucidação do caso desemboque eventualmente num beco sem saída (uma suposta “testemunha” que jamais poderá ser identificada em nome de sua “segurança”, por exemplo, e cujo testemunho por sua vez não encontra respaldo em nenhum outro lugar - seja ele foto, filme, documento, carta, etc.).
Conforme qualquer distraído fã de tramas de investigação sabe, uma “testemunha anônima” (ao melhor estilo “Garganta Profunda”) só tem valor se o que ela alega ou informa leva a alguma informação que possa ser de alguma maneira confirmada - do contrário, tudo que ela diz permanecerá num moto-perpétuo de pura especulação. Mas o que esse “detalhe” poderia atrapalhar a cruzada quase religiosa dos fanáticos pelo caso?
“Momento do Contato - O Caso Varginha”, por sua vez, mirando esse público sedento de confirmação de crenças nas quais ele já acredita de antemão (pouco importando as evidências que se confirmam ou não), não questiona nem leva em conta nada disso, usando o habitual viés de confirmação que predomina na área, de modo que, inadvertidamente, reforça as características de lenda urbana que o caso apresenta desde que se transformou num autêntico fenômeno cultural dentro daquela ativa comunidade ufológica.
Quase 30 anos após os ocorridos, o caso do ET de Varginha revela essa natureza lendária, se observarmos que uma lenda urbana conforme é normalmente entendida apresenta origem incerta (uma boa parte dos testemunhos sobre Varginha é de natureza apócrifa ou vagamente determinada), alguma verossimilhança (muitos de seus relatos são críveis e, de fato, guardam relação com elementos da realidade), capacidade de disseminação (as histórias relacionadas espalham-se muito facilmente dentro da comunidade), temática universal (os relatos suscitam ansiedade, pavor e curiosidade) e uma moralidade presumida (no caso, a necessária desconfiança generalizada em autoridades e versões oficiais apresentadas à opinião pública).
Lamentavelmente, por optar pelo caminho da “lenda”, James Fox perde a oportunidade de confrontar as versões correntes do que, de fato, poderia ter acontecido em Varginha em janeiro de 1996 a partir do relato das três testemunhas iniciais (estas, bem identificadas e que mantêm o mesmo relato desde então), não analisa as inúmeras contradições e lacunas encontradas na sucessão de eventos até hoje e ignora informações cruciais para a compreensão de alguns dos eventos “misteriosos” descritos no documentários (como a provável e bastante realista causa da morte do policial envolvido na “captura” de uma criatura, facilmente encontrada na internet).
Não obstante, Fox incorre em erros de raciocínio também típicos do meio no qual o documentário está inserido: por exemplo, expandindo indefinidamente o horizonte objeto de sua reflexão (listando casos que não guardam qualquer relação com Varginha, por exemplo), confundindo a audiência e fazendo dela cúmplice involuntária da versão relatada (como se questionar objetivamente elementos relacionados ao caso do filme em si invalidasse ao mesmo tempo qualquer outro caso ou acontecimento similar: “Você duvida de Varginha, então acredita que todos que disseram ter visto OVNIs ao longo da história estavam mentindo?”, ou algo do gênero).
Quando o filme abre portas na narrativa, ele rapidamente desiste delas. Um exemplo (e que se refere especificamente a um dos maiores questionamentos que pode ser feito ainda hoje à versão “ufológica” sobre o caso) é a suposta queda de uma nave alienígena antes da primeira aparição das “criaturas”, que teria sido testemunhada por apenas uma pessoa (numa região com movimento e nada inacessível) e que não teria deixado qualquer vestígio material na área (exceto a lembrança do “papel de embrulhar frango” descrito numa passagem do documentário…).
Um outro problema que o filme herda da abordagem “ufológica” diante do caso é utilizar livremente suposições para preencher lacunas na própria pesquisa: quando uma testemunha recusa-se a falar, por exemplo, o realizador logo induz o espectador a tirar daquilo a “inevitável” conclusão de que ela “esconde algo”, eliminando a hipótese (no pior dos casos, igualmente razoável) de que o entrevistado não suporta mais responder as mesmas perguntas ou ser perseguido por desconhecidos por 25 anos, o que não é preciso ser nenhum investigador muito minucioso para imaginar o quão seria inconveniente e prejudicial, especialmente numa comunidade do interior do país e num estrato social visivelmente vulnerável.
Nenhum desses problemas do filme, entretanto, parece se comparar ao ridículo de levar a sério a lenda sobre os “homens de preto”, supostos agentes trabalhando para algum núcleo de poder misterioso e que eventualmente aparecem para testemunhas com o objetivo de intimidá-las (e que, no caso Varginha, teriam dado as caras para quatro testemunhas). No momento em que se afunda na fantasia típica da mitologia Sci-Fi, o documentário coloca em xeque a própria natureza do gênero que se dispõe a praticar e perde prestígio, descendo à especulação infantilizada predominante em “grupos de discussão” que ganham adeptos misturando irresponsavelmente dados da realidade, imaginário criado pela indústria do entretenimento e neuroses arraigadas - e, ato contínuo, contaminando qualquer questionamento dotado de razoabilidade que possa ser feito ao “sistema”, jogando tudo num mesmo saco de paranoia, delírio e mistificação.
Se de fato Fox quisesse cumprir seu papel de “documentarista”, ele poderia questionar, por exemplo: por que diabos “agentes secretos” em “missões ultrassecretas” agiriam como personagens de franquias de Hollywood, vestindo fantasias de Halloween e chamando o máximo possível de atenção para seu trabalho? Embora esta seja uma pergunta aparentemente óbvia, ignorá-la não é privilégio deste filme, sendo um padrão de comportamento observado em toda a comunidade ufológica estabelecida. Fox apenas replica uma “cultura de pensamento” predominante no meio para o qual ele pretende vender seu peixe.
Os questionamentos que “Momento do Contato - O Caso Varginha” demonstra desinteresse em fazer não são evitados por outros pesquisadores e interessados no tema. Um dos principais ufólogos da época dos acontecimentos e morador da própria cidade, Ubirajara Rodrigues escreveu dois livros sobre o assunto e, de 1996 até hoje, reviu boa parte de sua interpretação a respeito do que poderia ter acontecido, reconhecendo até mesmo que sua abordagem à época (tipicamente “ufológica”) não teria sido a mais precisa para muitos dos fatos observados (https://www.youtube.com/live/5jsDXic4DO8?si=Kskrl9Z8wrXbQsnf).
Em 2024, por ter retrocedido em alguns conceitos e feito comentários bastante pertinentes, em retrospectiva, a tudo que foi afirmado anteriormente, Ubirajara já é incluído na paranoia generalizada que cerca o caso, sendo eventualmente acusado de participação em operações de “acobertamento” - palavra esta repetida mecanicamente entre ufólogos sempre que as respostas obtidas não correspondem às expectativas alimentadas.
Embora recorrente no meio, tal paranoia não elimina contradições lógicas nem preenche lacunas essenciais para que a narrativa ufológica a respeito do caso faça sentido. O canal Fábrica de Noobs, por sua vez, apresenta uma bem fundamentada lista de questionamentos e contradições em tal narrativa (https://youtu.be/JHPc9vzE_CI?si=6-PdgNzkIOfiox7u), levantando pontos que seriam imprescindíveis para que a história como é contada hoje (e da qual o documentário acaba sendo mais um dos replicadores) faça sentido.
Um dos elementos que se observa e que James Fox confortavelmente deixa de lado é que, conforme os anos passam, ao mesmo tempo em que um maior número de “testemunhas” se apresenta para supostamente corroborar a versão aceita dentro do meio ufológico, mais testemunhos contradizem-se entre si (em termos de datas, horários, localidades ou cronologia dos eventos de forma geral), de modo que pouco interessa ter “500 testemunhos” para o mesmo caso se uns anulam ou colocam em dúvida os outros - e apontar tal falha de raciocínio é talvez o maior mérito da pesquisa desenvolvida pelo canal Fábrica de Noobs a respeito do caso.
O diretor do documentário prefere, por outro lado, gastar seu tempo e o do espectador com passagens que nada contribuem para uma melhor compreensão dos fatos que ele pretende descortinar, por exemplo na dispensável entrevista com um político ou na passagem do “povo-fala”, na rua, que por si só tem baixa importância, bastando se questionar: ao ser indagadas por um estrangeiro com uma câmera sobre um assunto que tornou a cidade onde moram conhecida internacionalmente, quantas pessoas responderiam que “nada sabem” sobre o ocorrido, ou mesmo que acham ser aquilo uma bobagem inqualificável?
O documentarista honesto sabe que é muito mais fácil arrancar de um entrevistado desatento algo como um “Sim”, “Concordo”, “Foi isso mesmo”, do que um “Não”, “Discordo” ou “Não foi nada disso que aconteceu”, e essa percepção é crucial na condução de depoimentos.
As entrevistas definitivamente não são o ponto alto do filme, mas ao mesmo tempo expressam uma abordagem que também é tipicamente “ufológica”. Quando se encontra com um ex-controlador de voo que teria presenciado alguns dos eventos incluídos na narrativa do documentário (e que afortunadamente está disposto a mostrar o rosto), Fox não esmiúça qualquer das alegações do entrevistado, que por sua vez dá um depoimento totalmente vago:
O que foi dito pra nós é…silence…total silence - afirma o entrevistado.
Quem disse isso a vocês? - poderia ser a réplica de Fox, mas ele convenientemente não “complica” a entrevista.
Na sequência, o mesmo entrevistado completa:
Eles (os americanos) pousaram sem autorização do governo brasileiro. Era uma missão secreta.
Fox poderia explorar tal alegação, perguntando por exemplo:
Como vocês sabiam que a missão era “secreta” (sendo ela secreta, como sabiam ser aquilo uma “missão”)?
Se não havia autorização do governo para o pouso, como o avião não foi abatido no ar?
Qual foi o procedimento dos controladores de voo durante a aproximação?
Em solo, quem deu autorização para que o avião (que supostamente teria pousado sem autorização) reabastecesse?
Mais uma vez, como não está concentrado em chegar a alguma verdade objetiva sobre o que realmente se passou, mas apenas em fazer crescer o bolo da mistificação em torno da lenda, Fox deixa tudo em suspenso, limitando-se a encenar uma repetitiva fisionomia de espanto.
Se para um espectador experimentado de documentários, tais lacunas enfraquecem o todo, para um aficionado do tema servem como elemento de “mistério” que “corrobora” a trama. No documentário ufológico, ironicamente, quanto menos se revela, mais se tem certeza.
Ao optar por sustentar ou fortalecer pontos já conhecidos, sem trazer informações novas ou investigar mais profundamente as lacunas e contradições, “Momento do Contato - O Caso Varginha” reforça a natureza do evento como uma lenda urbana, onde cada novo “causo” contado fortalece (sem, contudo, esclarecer coisa alguma) algo no qual vagamente já se acredita por “ouvir dizer”, ou simplesmente pela desconfiança (a qual, convenhamos, é muitas vezes justificada) diante de “autoridades”, “militares” ou “cientistas”.
Na verdade, o papel que James Fox desempenha aqui está longe de ser o do documentarista em sentido estrito, ou seja, do realizador que usa o cinema para criar um recorte onde o que importa é a apreensão da realidade objetiva ou sua impressão pessoal, “autoral”, a respeito dela. Fox assume outra função, hoje muito disseminada em diferentes modalidades ideológicas: a do cineasta de “agenda”, o “animador de torcida”, cujos filmes nada mais são que divulgação quase institucionalizada de universos de interesse e pensamentos, com a finalidade de manter determinada comunidade ativa ou angariar novos adeptos para ela.
Naquele sentido, Fox pode ser eventualmente encontrado na internet oferecendo “um milhão” por um vídeo do suposto “ET de Varginha” (https://youtu.be/r25kd8mdm5c?si=nJeAF1Juq9hBTaKS), vídeo este convertido em autêntico Santo Graal da comunidade ufológica (especialmente brasileira). Assim como as alegações envolvidas no caso como um todo carecem de esclarecimentos, tanto busca quanto proposta pelo “vídeo” deixam dúvidas bastante sensíveis: se tal vídeo aparecesse, como seria possível determinar que ele se referisse ao caso específico de Varginha e à época em ocasião dos fatos?
A criatura provavelmente não usaria um crachá identificando-se como “ET de Varginha”... Como seria possível afirmar com algum grau de confiança que o local de gravação do vídeo corresponderia aos locais constantemente citados pelas testemunhas? Exceto evidentemente se houvesse como identificar as instalações mostradas, comparando imagens reconhecidamente da época com as do vídeo…
Haveria “rostos humanos” visíveis num vídeo dessa natureza, de modo que as identidades ora reveladas pudessem ser checadas com civis ou militares em atividade na época? Tudo isso, evidentemente, sem deixar de lado as quase infinitas possibilidades de manipulação e falseamento que cada vez mais são difundidas e popularizadas no suporte audiovisual, nos fazendo crer que a obtenção desse “tesouro” teria menor relevância do que se imagina.
Apesar de suas falhas de princípio e execução, “Momento do Contato - O Caso Varginha” estimula a inquietude a respeito do que poderia, de fato, não só ter acontecido em Varginha, mas ainda (e aqui, o cinema desempenha papel crucial), o que poderia ser apreendido objetivamente, contado ou mostrado, e que fizesse sentido além da mera crença especulativa e paranoica que predomina na comunidade ufológica.
O que as três garotas realmente viram, por não mais de 10 segundos (pois teria sido este o tempo durante o qual elas avistaram a suposta criatura e tiraram todas as suas conclusões que sustentariam por décadas desde então), naquele dia em seu bairro?
Qual o real motivo para a movimentação de militares na região nos dias que se sucederam a este fato?
Qual a motivação de testemunhas para expor relatos que muitas vezes anulam uns aos outros?
E, finalmente, por que após quase três décadas não existe nenhuma imagem ou documento vazado, seja ele de que natureza for, para simplesmente nenhum dos supostos fatos entendidos como verdadeiros dentro da narrativa ufológica para o caso (convenhamos, a História mostra inúmeros “vazamentos” em episódios de importância igual ou maior que o de Varginha)?
São perguntas que permanecem e que ficarão penduradas até que, eventualmente, outro documentarista faça o trabalho que preguiçosamente James Fox deixou para trás.
Momento do Contato - O Caso Varginha (Moment of Contact, EUA/Brasil - 2022)
Direção: James Fox
Gênero: Documentário, Histórico
Duração: 100 min
Crítica | Kill Boksoon é um filme coreano abaixo da média
No meio de tantos K-Dramas e filmes sul-coreanos originais que a Netflix disponibiliza em seu catálogo anualmente, é bem comum que algum conteúdo passe despercebido pelo público. Kill Boksoon é uma dessas produções, que, quando estreou em 2023, não recebeu a atenção merecida.
A primeira coisa que chama a atenção, e que é algo comum em longas sul-americanos, é o seu tempo de duração de 137 minutos, que não faz o menor sentido, pelo menos não para esse filme especificamente, já que muitas das cenas poderiam ter sido retiradas sem causar maiores danos à narrativa.
Kill Boksoon apresenta a velha história da mulher que é dona de casa, mas que não é bem aquela pessoa que diz ser. Ao estilo do que foi visto em Sr. e Sra. Smith (2005), Gil Bok-soon (Jeon Do-yeon) é uma mulher do lar, mas seu verdadeiro trabalho é praticar assassinatos por aluguel a mando de Cha Min Kyu (Sol Kyung-gu).
Esse é o principal atrativo do longa dirigido e roteirizado por Byun Sung-hyun. Ao mostrar Bok-soon vivendo sua rotina de mãe solteira com sua filha adolescente Jae-Yeong (Kim Si-a), a história tenta se distanciar do estilo apresentado em Atômica e John Wick, que apenas mostram a violência acontecendo e desenvolvem a trama a partir da pancadaria.
Em Kill Boksoon, há uma tentativa de humanizar a protagonista com base em sua história de vida, trazendo uma espécie de redenção para Bok-soon, que é conhecida em seu meio por ser uma assassina cruel e de primeiro nível, mas que pensa em se aposentar em breve. Isso faz com que um conluio seja criado pela empresa a qual serve, e eles passem a querer matá-la de todas as formas.
Seu longo tempo de duração é justificado pela intenção de abordar a vida particular de Gil Bok-soon em profundidade, mostrando a relação dela com a filha, com o trabalho e com os colegas. Isso gera cenas divertidas e um drama que tem a cara das produções sul-coreanas.
Sim, o longa tem uma pegada de John Wick. Na realidade, a maioria das produções do gênero está seguindo o estilo da franquia com Keanu Reeves, com muita ação e intensidade. Por ser uma assassina de aluguel, é natural que ela tenha que enfrentar seus inimigos, que são muitos, o que faz com que a trama traga várias sequências violentas e com bastante sangue espirrando na tela.
Kill Boksoon não está entre os melhores filmes coreanos; não possui grandes reviravoltas e traz poucas cenas marcantes, destacando-se apenas a luta em um bar em um plano sequência. Apresenta uma trama atrativa que tenta ser diferente ao mostrar uma assassina de aluguel das antigas atuando nos dias atuais. É uma obra que serve para passar o tempo, mas não alcança o status das melhores produções do país.
Kill Boksoon (Gil Bok-soon, Coreia do Sul – 2023)
Direção: Byun Sung-hyun
Roteiro: Byun Sung-hyun
Elenco: Lee Jae-wook, Jeon Do-yeon, Hwang Jung-min, Koo Kyo-hwan, Esom, Fahim Fazli
Gênero: Ação, Suspense
Duração: 137 min.
https://www.youtube.com/watch?v=Qa0yAWGOOXQ&ab_channel=NetflixBrasil
Review | Beyond Good & Evil: 20th Anniversary Edition é a edição definitiva de um clássico
A carreira de Beyond Good & Evil já é longa, afinal o jogo faz 21 anos agora em 2024. Apesar de ter sido considerado um fracasso comercial na época de seu lançamento, a obra conseguiu se tornar um cult mantendo uma fiel base de fãs que se empenhou em popularizar o game ao longo dos anos.
Tanto que atualmente, a franquia de apenas um jogo já se tornou uma lenda no cenário graças a produção da sequência produzida há mais de quatorze anos e que segue sem previsão de lançamento. A esse ponto, o jogo original conseguiu ser lançado duas vezes, o que é bastante irônico.
A Ubisoft já tinha feito um primeiro remaster em 2011 trazendo o game para a era HD. E agora, de surpresa com o segundo remaster que traz mais novidades do que apenas uma repaginada visual.
https://www.youtube.com/watch?v=CaU4tMuvvdc
O carisma de uma era
A história de Beyond Good & Evil sempre foi um dos pontos mais elogiados, principalmente por ter sido bastante vanguardista em uma época que as narrativas em jogos estavam começando a amadurecer após alguns anos do lançamento de GTA III.
Acompanhamos Jade, uma fotojornalista independente que vive em um farol de refugiados no planeta aquático de Hillys em 2435. Há anos que o planeta é atacado por uma raça de alienígenas chamados DomZ e a instituição de governo ditatorial Setor Alpha também não é muito eficaz em proteger a população.
Após repelir um último ataque e se conectar brevemente com os DomZ, Jade e seu melhor amigo, tio Pey’j são recrutados para um trabalho misterioso envolvendo uma invasão de DomZ. Esse trabalho acaba virando a porta de entrada para a ordem secreta rebelde IRIS que busca expor uma aliança bizarra entre os DomZ e o Setor Alpha.
Nota-se em questão de poucos minutos de gameplay que Beyond Good & Evil era mesmo um projeto bastante ambicioso, até mesmo tecendo críticas sociais audazes bem além da compreensão simples da faixa etária indicada do jogo (o público infanto juvenil).
Dirigido pelo veterano Michel Ansel, criador da saga Rayman, o título busca trazer elementos de mundo aberto para uma aventura expansiva, explorando diversos cenários com personagens interativos com diversas linhas de diálogo.
Logo, o diretor mistura diversos gêneros aqui, trazendo elementos de aventura, tiro, arcade, corrida e até sobrevivência. Sendo um jogo curto, é impressionante a quantidade de atividades necessárias que delineiam o jogo.
É óbvio que se trata de uma obra já datada em termos de jogabilidade, mas é inegável que envelheceu bem, principalmente pelo estilo visual único dos traços de Ansel para os personagens, inimigos e cenários. Aliás, é justamente o carisma dos personagens que seguram a narrativa até o fim, já que ela é simples e previsível para uma audiência mais adulta.
Dito isso, com um sistema de progressão baseado em duas moedas: uma de créditos para a compra de itens normais e outra baseada em pérolas para adquirir upgrades para o barco voador que a dupla protagonista usa, o jogo te incentiva a realizar atividades secundárias e explorar o singelo mundo aberto.
Enquanto para ganhar pérolas é preciso realizar algumas missões extras, os créditos são obtidos ao tirar fotos da fauna de Hillys, com diversas criaturas alienígenas interessantes para descobrir e catalogar. A mecânica é divertida e claramente inspirada em Pokémon Snap, de 1999.

Atravessando gerações
Infelizmente, por ser já datado em diversos termos, existem algumas rusgas que mostram tanto a idade quanto algumas fraquezas do original. Essas se concentram principalmente na mobilidade truncada de Jade e no combate enjoativo.
Nunca havia sido a intenção de Ansel em introduzir mecânicas de combate no jogo e isso se vê claramente pelo único combo de três golpes que Jade domina para lutar contra alienígenas. São raras as chances que ele mistura o combate com quebras-cabeças e menos ainda em sessões de parceria com o NPC parceiro de Pey’j que nos acompanha na saga.
Neste novo remaster, aliás, a Ubisott caprichou em aprimoramentos necessários que funcionam corretamente. A IA dos parceiros está menos errática, atendendo a comandos mais rapidamente para solucionar puzzles. A edição de 20 anos, na verdade, funciona mesmo como uma versão definitiva do jogo.
Os controles foram remapeados para aprimorar a qualidade de vida do jogador, se tornando um pouco mais adequados ao consenso moderno de jogabilidade. As texturas também ganharam melhorias ante a versão HD, conseguindo manter o design artístico de Ansel sem causar estranheza como já vimos em remasterizações anteriores - como no caso da infame edição definitiva de GTA: The Trilogy.
Agora o jogo pode ser executado a 4K em 60fps - constantes e em bom estado no PC, inclusive. As melhorias também incluem a habilidade de pular cinemáticas, salvamentos automáticos e salvamentos cruzados em todas as plataformas. Outro ponto de destaque notório é a regravação de algumas faixas musicais clássicas da excelente trilha original de Christophe Héral que facilmente é um dos pontos mais altos do jogo.
A edição também inclui uma missão secundária inédita de caça ao tesouro que traz maior contexto histórico para a protagonista Jade. Além disso, a problemática câmera do clássico foi retrabalhada, mais afastada da personagem, embora ainda seja meio complicada em passagens em primeira pessoa. Por fim, há um novo modo de speedrun, conquistas inéditas e também diversos conteúdos bônus trazendo mais detalhes das fases de produção do jogo.

Uma chance imperdível
Dado o baixo preço sugerido para o lançamento de Beyond Good & Evil: 20th Anniversary Edition e a antecipação gigantesca para a prometida sequência, se trata da oportunidade perfeita de conhecer esse excelente clássico do catálogo da Ubisoft. Melhor ainda se tratando da atenção e carinho que a empresa dedicou ao remaster que está bastante estável e polido, trazendo mudanças notórias e conteúdos adicionais muito bem-vindos.
Agora é torcer para que Beyond Good & Evil 2 não demore mais dez anos para finalmente chegar ao mercado dando tempo para uma cômica e desnecessária edição de 30 anos do jogo original.
Agradecemos a Ubisoft pela cópia gentilmente cedida para a realização da análise
Crítica | As Cores do Mal: Vermelho - Um eficiente thriller policial
Se há algo a se elogiar na Netflix, é o fato de trazer para a sua audiência produções originais de diversos países, como é o caso de As Cores do Mal: Vermelho, um filme polonês que foi adaptado do primeiro livro de uma trilogia escrita pela autora Małgorzata Oliwia Sobczak.
A história se passa na cidade de Gdynia, na Polônia, onde Monika (Zofia Jastrzębska) convence o gerente de uma boate de que ela é a pessoa certa para trabalhar no local e vender, além de bebidas, drogas. Surge um romance entre Monika e o gerente, mas ela não espera que o pior possa acontecer com ela. Monika é brutalmente assassinada, e seu corpo é encontrado na beira da praia, dando início a toda uma investigação policial.
Essa cena inicial, com Monika encontrada de bruços na praia e seu corpo marcado por sinais de violência, já mostra ao público a linha que o longa seguirá: uma história de assassinatos. O roteiro não revela de imediato o motivo nem o autor. Esse mistério gerado já no primeiro ato prende o espectador, despertando o desejo de solucionar o crime e em cada reviravolta só deixa com mais vontade de seguir acompanhando a narrativa.
A trama é apresentada em dois tempos distintos: um no presente, em que a investigação policial acontece, e outro no passado, mostrando Monika se envolvendo cada vez mais no mundo das drogas e como sua morte ocorreu.
Há vários personagens que podem ser considerados vilões, sendo o principal o chefe do tráfico na região. Ele é retratado como um homem cruel e sádico, que pratica atos violentos com uma naturalidade que lembra Frank Costello, de Os Infiltrados, devido à sua brutalidade.
O thriller de suspense traz todos os ingredientes que são vistos com frequência em obras do gênero, como assassinatos bárbaros, investigação e inúmeras reviravoltas, esse último elemento, por sinal, é o grande trunfo do longa, que traz uma reviravolta atrás da outra e nunca dando margem para que o público descubra quem é o verdadeiro vilão da história.
As Cores do Mal: Vermelho tem uma atmosfera fria e sombria, e tal ambiente se reflete na narrativa, trazendo muito mistério. Enquanto a trama se desenrola, é possível acompanhar a investigação se desenvolvendo em meio a momentos de tensão. Não é uma obra-prima, mas é uma produção eficiente e que desempenha bem o seu papel de entreter.
As Cores do Mal: Vermelho (Kolory zla. Czerwien, Polônia – 2024)
Direção: Adrian Panek
Roteiro: Lukasz M. Maciejewski, Adrian Panek, baseado na obra de Malgorzata Oliwia Sobczak
Elenco: Jakub Gierszal, Maja Ostaszewska, Zofia Jastrzebska, Andrzej Konopka
Gênero: Policial, Drama, Mistério
Duração: 111 min.
https://www.youtube.com/watch?v=ZDrN-w8yFps&ab_channel=NetflixPolska