Se o primeiro filme da franquia Maze Runner nos introduziu a um modo muito mais primitivo e visceral das inúmeras narrativas pós-apocalípticas que se tornaram marca registrada do século XXI, não posso dizer que sua continuação obteve o mesmo sucesso em manter o frenético ritmo dos corredores do labirinto. E é de forma triste que um longa com tamanho potencial tenha se rendido à mediocridade e abraçado todos os convencionalismos do gênero de ação, criando um espetáculo muito interessante de ser acompanhado – até a página dois.
A continuação da saga se inicia com um pequeno prólogo quase inteiramente pautado em câmera lenta e com algumas novas investidas que não foram exploradas no longa original – o que é bem interessante, considerando que essa nova estética mais simétrica representa um breve momento de amadurecimento para a direção de Wes Ball. Apesar da montagem bem fragmentada, optar por esse caminho ajuda a criar uma atmosfera tensa para o cosmos arquitetado por James Dashner, autor dos romances em questão; aqui, o cineasta usa de forma contida plongées absolutos e planos detalhe para mostrar o cenário caótico no qual os protagonistas estão inseridos, e até mesmo combina os enquadramentos com uma fotografia mais desbotada e que resgata outras produções do gênero. O uso da luz dura também contribui para a reafirmação da sociedade pós-apocalíptica que agora se mostra mais intensa em comparação com o “paradisíaco” labirinto no qual os protagonistas outrora moravam.
Diferentemente da ambiência tensa e sombria construída com grande esmero na iteração predecessora, aqui já vemos a influência inenarrável das distopias futuristas que, sem sombra de dúvida, começam a traçar mais paralelos com franquias audiovisuais e até mesmo literárias que se iniciaram no século passado e perduram de forma saturada até os dias de hoje. Se em 2014 Maze Runner ocupava um patamar equivalente a Jogos Vorazes, no ano seguinte ele começou a transmutar-se em uma reciclagem monótona e que não enxerga o próprio potencial, preferindo muito mais inclinar-se para obstáculos psicológicos a aceitar sua despretensão. Conforme passamos a saber tanto no final de Correr e Morrer quanto no primeiro ato de Prova de Fogo, o mundo mais uma vez sofreu com uma catástrofe natural – o superaquecimento do globo pelo Sol, o que varreu qualquer possibilidade de vida fora de instalações específicas e que deu margem para o surgimento de um terrível e irrefreável vírus.
Ao menos essa é a história contada pelos agentes da WCKD, uma organização que raptou diversos jovens e os colocou em mortais simuladores – os labirintos. Os sobreviventes a esse experimento foram resgatados por um grupo rebelde e levados para uma facilidade muito mais segura e cuja promessa de permitir-lhes retornar para a vida que conheciam foi feita e reafirmada pelo charmoso Janson (Aidan Gillen), uma figura tão misteriosa quanto seu próprio nome – ao menos em teoria. Entretanto, é óbvio que um de nossos protagonistas, Thomas (Dylan O’Brien), desconfiaria das intenções estranhamente benevolentes de um grupo do qual nunca ouviu falar – e essas suspeitas se agravam com o inexplicável afastamento da forasteira Theresa (Kaya Scodelario) de seu grupo.
Ao final do ato inicial, os personagens que já conhecemos, com a adição de rostos novos, já conseguiram escapar de forma quase inverossímil da facilidade, correndo para as paisagens desérticas do que uma vez já foi conhecida como a cidade de São Francisco, em uma roupagem em ruínas e amedrontadora. A ideia é chegar até as montanhas, onde um outro grupo de sobreviventes montou acampamento e deseja sobreviver por conta própria. Entretanto, como também já podemos imaginar, os nossos heróis irão passar por obstáculos complexos e até mesmo mais mortais que os enfrentados no labirinto: dessa vez, não há refúgio para escapar, visto que a construção apocalíptica exala perigo o tempo todo, principalmente pela presença dos Cranks – seres humanos infectados que se transformaram em criaturas horrendas, canibais e ferozes.
A ideia seria satisfatória o suficiente se tivesse ao menos alguma coisa original dentro de seu escopo; entretanto, toda a identidade imagética puxa elementos de outros longas-metragens, incluindo Resident Evil: Extinção e Battle Royale. Desde a escolha da paleta de cores, que restringe-se ao uso de tons mais quentes em uma saturação que não causa angústia, mas incomoda pelos motivos errados, até a composição dos planos, todas as escolhas estéticas não são originais, ainda que um enquadramento ou outro seja belíssimo e poético. Algumas sequências são bem emocionantes por privarem-se da exposição e prezarem pelo foreshadowing, mas esses momentos não seguem uma cronologia ou uma progressão compreensiva, funcionando como peças soltas.
Todo o filme é movido pelo excesso de planos abertos e pela presença interminável de cenas de ação – que são adornadas com a câmera na mão e pelos planos-sequência – em detrimento de um cuidado com diálogos que também envolvam o espectador ou que até mesmo permitam que nos emocionemos com os sacrifícios mais uma vez presentes dentro desse complicado escopo. A entrada de novos personagens, como Aris (Jacob Lofland) e Brenda (Rosa Salazar) é muito bem-vinda, mas de que realmente adianta a presença de personalidades tão distintas se essa exploração permanece na superficialidade? Ora, Aris talvez seja uma das figuras mais inteligentes e mais versáteis dentro do filme, e sua presença de cena é tão ínfima quanto a de personagens descartáveis.
Prova de Fogo é, eventualmente, uma aula de como não fazer uma sequência digna para uma franquia em potencial que tinha tudo para dar certo. Desde sua amálgama de distopias futuristas até o desperdício de um elenco de ponta – incluindo as presenças de Patricia Clarkson e Giancarlo Esposito -, a continuação de Maze Runner é sofrível, por falta de outra palavra que o descreva.
Maze Runner: Prova de Fogo (Maze Runner: The Scorch Trials – EUA, 2015)
Direção: Wes Ball
Roteiro: T.S. Nowlin, baseado na obra de James Dashner
Elenco: Dylan O’Brien, Thomas Brodie-Singer, Kaya Scodelario, Ki Hong Lee, Jacob Lofland, Alexander Flores, Rosa Salazar, Giancarlo Esposito, Patricia Clarkson, Aidan Gillen
Gênero: Ação, Ficção Científica
Duração: 131 min.