Filme de Andres Veiel apresenta novo olhar sobre a diretora ligada ao nazismo 

Leni Riefenstahl, falecida em 2003 aos 101 anos, continua sendo uma figura polarizadora na história do cinema. Conhecida como “a diretora favorita de Hitler“, seus documentários inovadores como The Triumph of the Will (1935) e Olympia (1938) são ao mesmo tempo aclamados por suas qualidades técnicas e infames por sua associação com a propaganda nazista. A questão de se o talento de Riefenstahl pode ou deve ser separado de suas visões políticas é um debate que persiste, alimentado por sua complexa biografia e o contexto histórico em que suas obras foram criadas.

A Profundidade da Ideologia Nazista

No novo documentário Riefenstahl, exibido fora da competição no Festival de Cinema de Veneza, o cineasta alemão Andres Veiel busca fornecer uma perspectiva mais profunda sobre a diretora, indo além das abordagens anteriores que muitas vezes focaram em sua estética e legado cinematográfico. Veiel teve acesso aos arquivos pessoais de Riefenstahl, que incluíam diários, correspondências, fotos privadas e gravações telefônicas. Através desse material, o diretor explora o envolvimento de Riefenstahl com a ideologia nazista, apresentando evidências de que ela não era apenas uma oportunista, mas sim uma defensora ativa das ideias nazistas.

Um dos aspectos mais reveladores do documentário é a descoberta de uma entrevista de 1934, na qual Riefenstahl afirmou ter lido Mein Kampf em 1931 e se tornado uma “nacional-socialista entusiasmada” após apenas uma página. Este detalhe contradiz suas declarações ao longo da vida de que nunca teve conhecimento real do nazismo ou do Holocausto.

O Legado Ambíguo e o Fascínio Duradouro

Grande parte de Riefenstahl foca na vida da diretora após a Segunda Guerra Mundial, quando ela foi rotulada como simpatizante nazista pelos Aliados e enfrentou dificuldades para continuar sua carreira cinematográfica. Riefenstahl manteve, até o fim de sua vida, a narrativa de que era uma vítima, alegando ignorância sobre os crimes do regime nazista. Veiel, no entanto, demonstra que essa alegação era, na melhor das hipóteses, uma mistura de repressão e mentira deliberada.

O documentário também examina o impacto de Riefenstahl nas décadas seguintes, especialmente em como ela conseguiu reabilitar sua imagem pública na Alemanha pós-guerra. Uma das cenas mais marcantes é a exibição de uma entrevista da década de 1970, onde Riefenstahl, com lágrimas nos olhos, convenceu muitos espectadores alemães de sua suposta inocência, gerando um renascimento em sua popularidade.

Reflexões sobre o Fascismo Moderno

Veiel não apenas traça o retrato psicológico de Riefenstahl, mas também usa sua história para lançar luz sobre o fascínio contínuo pelo fascismo. Ele sugere que o “sonho” de Riefenstahl — ter recursos ilimitados para criar arte — é uma metáfora poderosa para as armadilhas sedutoras do poder totalitário. Este paralelo é particularmente relevante no contexto atual, com o ressurgimento de movimentos de extrema-direita na Europa e nos Estados Unidos.

Riefenstahl oferece uma reflexão crítica sobre a figura da diretora, questionando não apenas sua moralidade, mas também a nossa capacidade de discernir e resistir às seduções do poder e da ideologia extremista. Ao revisitar a vida e obra de uma das cineastas mais controversas da história, o documentário convida o público a considerar as implicações mais amplas de sua história — não apenas para entender o passado, mas também para evitar os erros do futuro.

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