Decisão da Pixar de alterar personagem trans em Win or Lose gera críticas e debate sobre diversidade
Mudança na narrativa da série da Pixar reacende discussões sobre representatividade e diretrizes criativas na Disney.
A Pixar, tradicionalmente reconhecida por suas narrativas inovadoras e inclusivas, enfrenta críticas após a decisão de alterar o enredo de Win or Lose, sua próxima série animada. Inicialmente programado para incluir uma personagem central que expressava sua identidade trans, o projeto foi modificado para apresentar essa mesma personagem como cisgênero. A decisão, confirmada pelo The Hollywood Reporter (THR), gerou descontentamento entre antigos funcionários e consultores envolvidos no desenvolvimento do roteiro.
Sarah Ligatich, ex-editora assistente da Pixar, afirmou ao THR que a mudança não a surpreendeu, mas a devastou. Ela destacou que, durante seu período na empresa, discussões internas apontavam uma abordagem conservadora da Disney, controladora da Pixar desde 2006. “Eles veem a animação como um meio conservador”, comentou, referindo-se a declarações do ex-CEO Bob Chapek em reuniões passadas. “Por muito tempo, a Disney não estava no negócio de fazer ótimo conteúdo. Eles estavam no negócio de fazer grandes lucros. Mesmo há dois anos, quando eu estava na Pixar, tivemos uma reunião com [o então CEO] Bob Chapek, e eles foram claros conosco que veem a animação como uma mídia conservadora.”
O THR falou com vários ex-funcionários da Pixar que expressaram sua tristeza e consternação com a empresa ter eliminado essa história. Um deles também notou a aparente ironia da declaração da Disney, dado que os filmes de animação da empresa são conhecidos por incluir temas adultos como a morte de um dos pais (Bambi, O Rei Leão) ou uso de substâncias (Alice no País das Maravilhas, Pinóquio). O que foi particularmente frustrante foi o episódio já ter sido concluído, o que significa que ajustar elementos da história exige que a equipe se esforce para estar pronta para o lançamento em fevereiro, sem mencionar que isso traz despesas adicionais.
“O episódio em sua forma final foi tão bonito — e ilustrou lindamente algumas das experiências de ser trans — e literalmente salvaria vidas ao mostrar àqueles que se sentem sozinhos e não amados, que há pessoas por aí que entendem”, diz um ex-funcionário da Pixar que não trabalhou diretamente no programa, mas o viu e pediu para permanecer anônimo. Os insiders observam que o episódio mudou significativamente de filmagens mais antigas que circularam nas redes sociais na semana passada e mostraram o personagem deliberando sobre qual banheiro usar. “Então é muito frustrante que a Disney tenha decidido gastar dinheiro para não salvar vidas.”
Decisão editorial e impactos culturais
O enredo original de Win or Lose girava em torno de um time de softball do ensino fundamental, com foco em uma adolescente chamada Kai, que explorava sua identidade trans. Um porta-voz da Disney justificou a alteração, afirmando que “muitos pais preferem discutir certos assuntos com seus filhos em seus próprios termos e cronograma”. Contudo, críticos apontaram a aparente ironia, considerando que muitos filmes da Disney incluem temas adultos complexos, como luto e perda, amplamente abordados em títulos como O Rei Leão e Bambi.
A decisão foi particularmente frustrante para alguns envolvidos, dado que o episódio original já havia sido concluído. Reajustar a história trouxe despesas adicionais e colocou pressão sobre a equipe, que enfrenta o prazo para o lançamento da série, marcado para fevereiro. “O episódio em sua forma original era lindo e poderia literalmente salvar vidas ao representar experiências trans de forma autêntica”, disse um ex-funcionário anônimo da Pixar.
Contexto e perspectivas futuras
A mudança em Win or Lose ocorre em um contexto de crescente debate sobre diversidade na Disney. Em anos recentes, o estúdio enfrentou polêmicas, como a resposta morna ao projeto de lei “Don’t Say Gay” na Flórida e críticas conservadoras ao beijo do mesmo sexo em Lightyear (2022). Além disso, outros projetos animados, como Moon Girl and Devil Dinosaur do Disney Channel, também tiveram episódios centrados em personagens trans removidos.
Bob Iger, atual CEO da Disney, reforçou em abril que o objetivo principal da empresa é entreter, com mensagens sociais assumindo um papel secundário. Ainda assim, antigos e atuais funcionários da Pixar expressam preocupação de que decisões como essa possam limitar a abordagem de narrativas diversas e impactantes.
Enquanto isso, estúdios independentes e plataformas de streaming, como a Netflix, têm demonstrado abertura para conteúdos mais ousados e inclusivos. A aquisição e o sucesso de Nimona, indicada ao Oscar e amplamente elogiada como uma alegoria trans, ilustram a demanda por histórias autênticas e representativas no mercado de animação.