A consagrada atriz Kathy Bates abriu o jogo sobre as dificuldades e o preconceito que enfrentou em Hollywood devido à sua aparência, um tema que a acompanhou ao longo de décadas de uma carreira premiada. Em uma entrevista recente à revista Vanity Fair, Bates relembrou episódios dolorosos, incluindo a vez em que o falecido diretor Garry Marshall se recusou a escalá-la para o filme “Frankie e Johnny” (1991), mesmo ela tendo originado o papel no teatro, por não considerá-la convencionalmente atraente para um papel romântico.

O papel negado em ‘Frankie e Johnny’ e a visão de Garry Marshall

Um dos episódios mais marcantes compartilhados por Bates ocorreu após seu triunfo no Oscar de Melhor Atriz por “Louca Obsessão” (1990). Mesmo com o reconhecimento máximo da Academia, a atriz descreveu o período seguinte como “um deserto” na busca por grandes projetos, em parte por não se encaixar nos padrões estéticos hegemônicos de Hollywood. Foi nesse contexto que surgiu a oportunidade de adaptar para o cinema a peça off-Broadway “Frankie and Johnny in Clair de Lune”, de Terrence McNally, na qual Bates havia sido a protagonista no palco.

No entanto, Garry Marshall, diretor da adaptação cinematográfica e falecido em 2016, optou por não escalá-la. A justificativa, segundo Bates, foi cruelmente direta: “Ele não conseguia imaginar que as pessoas me veriam na tela beijando alguém”, afirmou a atriz.

“Eu realmente beijando um homem na tela — isso não seria romântico.” Os papéis acabaram com Michelle Pfeiffer como Frankie e Al Pacino como Johnny. O filme narra a história de Johnny, um ex-detento que consegue um emprego em um café e se apaixona pela garçonete Frankie.

Comentários cruéis e o impacto emocional duradouro

Infelizmente, a justificativa de Marshall não foi um caso isolado na trajetória de Bates. Ela recordou que, para ela, ouvir tais comentários não era surpreendente, pois “Bem, eu sempre tive isso”. Inclusive, lembrou-se de quando soube que seu próprio pai havia comentado com sua professora de atuação em sua cidade natal, no Tennessee: “Sabe, ela não é convencionalmente atraente”.

Outro momento de profundo constrangimento ocorreu durante a turnê de divulgação do filme “Brincando nos Campos do Senhor” (1991). Um jornalista britânico questionou seu colega de elenco, Aidan Quinn, que interpretava seu marido na trama: “Você é um protagonista. É crível que você e Kathy se casem?”. Bates relatou ter ficado arrasada com a pergunta. “Subi as escadas, tranquei a porta e chorei como uma criança do jardim de infância”, desabafou.

Uma trajetória de talento reconhecido, apesar dos obstáculos

Apesar desses comentários depreciativos e das barreiras impostas pela indústria, o talento de Kathy Bates se impôs de forma incontestável. Além do Oscar por “Louca Obsessão”, ela acumulou mais três indicações ao prêmio máximo do cinema. Recentemente, a atriz foi ovacionada de pé no Critics Choice Awards por seu trabalho na série “Matlock”, um reconhecimento que, segundo ela, às vezes ainda é difícil de processar plenamente, dados os anos de comentários rudes sobre sua aparência.

“É a afirmação de uma carreira que nem sempre foi aqui, com o time classe A indo para Ibiza ou algo assim, sabe?”, refletiu Bates sobre o reconhecimento. “Não foi uma trajetória linear.” Suas palavras ecoam a luta de muitos artistas que não se conformam com os moldes estéticos restritos, mas que, com persistência e talento inegável, conseguem deixar sua marca e provar seu valor, ainda que carregando as cicatrizes de um sistema muitas vezes excludente.

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