Marcela Soares: da desvalorização no futsal à autonomia com conteúdo adulto, atleta expõe preconceito Marcela Soares: da desvalorização no futsal à autonomia com conteúdo adulto, atleta expõe preconceito
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Marcela Soares: da desvalorização no futsal à autonomia com conteúdo adulto, atleta expõe preconceito

Marcela Soares, ex-atleta de futsal, expõe preconceito após demissão por ter perfil adulto e discute autonomia financeira e machismo no esporte.

O desligamento da atleta de futsal Marcela Soares, de apenas 21 anos, de seu clube após a descoberta de um perfil pessoal em uma plataforma de conteúdo adulto não foi apenas um ponto final em um contrato, mas o estopim para um debate urgente e necessário sobre machismo, liberdade individual e a gritante hipocrisia que ainda permeia o esporte brasileiro. Em uma entrevista reveladora concedida ao portal LeoDias, Marcela rompeu o silêncio, detalhando os bastidores de sua demissão e a onda de julgamentos que enfrentou, especialmente por parte de outras mulheres, ao buscar caminhos alternativos para sua independência financeira e realização pessoal longe das quadras.

A profissionalismo em xeque e a acusação de hipocrisia

Marcela faz questão de frisar a separação entre sua vida profissional como atleta e suas escolhas pessoais. “Nunca misturei as coisas. Sempre fui focada, treinava sério, respeitava todo mundo e nunca levei nada disso para dentro de quadra”, assegura a jovem. Mesmo com uma conduta profissional ilibada dentro do time e mantendo sua vida particular reservada, a descoberta de seu perfil na plataforma de conteúdo adulto culminou em seu desligamento. Para ela, a decisão do clube não reflete uma preocupação genuína com a imagem da equipe, mas sim uma “punição motivada por preconceito e hipocrisia”.

A atleta argumenta que sua atividade online não interferia em seu desempenho esportivo e que a reação do clube evidencia um moralismo seletivo, frequentemente mais rigoroso com as mulheres. A situação levanta questionamentos sobre até que ponto as instituições esportivas podem ou devem controlar a vida privada de seus atletas, especialmente quando tais escolhas não impactam suas responsabilidades profissionais.

A busca por valorização financeira e pessoal fora das quatro linhas

A trajetória de Marcela no futsal feminino, modalidade que ainda luta por reconhecimento e investimento adequado no Brasil, é marcada por uma realidade financeira desafiadora. Ela relata ter recebido salários irrisórios, chegando a apenas R$ 500 por mês em determinados momentos de sua carreira, apesar de sua dedicação e atuação em nível profissional. Essa desvalorização crônica foi um dos fatores que a impulsionaram a buscar novas fontes de renda.

A transição para a criação de conteúdo adulto representou uma virada financeira significativa. Atualmente, Marcela declara alcançar rendimentos mensais de até R$ 55 mil, um valor que pode ser mais de cem vezes superior ao que recebia nas quadras. “Foi um pouco de tudo. O lado financeiro pesou sim — o futsal feminino ainda é muito desvalorizado”, admite. Contudo, ela ressalta que a decisão também foi motivada por um anseio por liberdade e pela falta de reconhecimento no esporte. “Hoje eu ganho muito mais do que ganhava jogando. Me trouxe independência, segurança e uma autoestima que o esporte, infelizmente, não me dava mais”, confessa.

O peso do julgamento feminino e o machismo estrutural

Um dos aspectos mais dolorosos para Marcela foi o julgamento vindo de outras mulheres, incluindo colegas atletas. “O que mais me doeu foi o julgamento de outras mulheres, inclusive atletas. Parece que mulher tem que seguir uma cartilha de comportamento para ser respeitada”, desabafa. Sua experiência evidencia como o machismo internalizado pode levar mulheres a reproduzir discursos e atitudes opressoras contra suas pares, cobrando um padrão de conduta que raramente é exigido dos homens no mesmo meio. “Fiz o que muitos homens fazem e fui muito mais cobrada”, pontua a atleta, destacando o duplo padrão existente.

Essa dinâmica revela a complexidade do machismo no esporte, que não se manifesta apenas em atitudes masculinas, mas também na forma como as próprias mulheres são condicionadas a policiar e julgar umas às outras com base em expectativas sociais restritivas.

Um futuro de liberdade e a possibilidade de retorno ao esporte

Apesar da experiência negativa com seu último clube, Marcela Soares, que já defendeu equipes como Marechal Copagril, Leoas da Serra, Pato Branco, Celemaster e Female, não fecha completamente as portas para um retorno ao futsal. No entanto, estabelece condições claras: “Não fecho as portas para o esporte, mas só volto se for em um ambiente que respeite minhas escolhas”.

Hoje, ela se sente fortalecida por sua nova trajetória. “Tenho muito orgulho da minha história como atleta. Ao mesmo tempo, quero continuar com meu conteúdo. Me encontrei ali. Me sinto livre, dona de mim e do meu tempo. Me sinto valorizada, respeitada e posso ser quem eu quero”, declara. A experiência, embora controversa para alguns, permitiu que Marcela encontrasse um novo sentido de valorização pessoal. “Hoje vejo que sou mais que uma jogadora ou criadora — sou uma mulher que aprendeu a se valorizar e a viver do jeito que acredita”, conclui, deixando uma mensagem poderosa sobre autonomia e autoaceitação.

Sobre o autor

Matheus Fragata

Editor-geral do Bastidores, formado em Cinema. Jornalista, assessor de imprensa. Apaixonado por histórias que transformam. Todo mundo tem a sua própria história e acredito que todas valem a pena conhecer. Contato: matheus@nosbastidores.com.br

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