Decepção em sequência: o tropeço de Coringa: Delírio a Dois no mercado cinematográfico
Quando Michael De Luca e Pamela Abdy assumiram como codiretores do estúdio de cinema da Warner Bros. em junho de 2021, uma de suas primeiras decisões foi seguir adiante com uma sequência de Coringa. O filme original, que acumulou mais de US$ 1 bilhão e venceu o Oscar, redefiniu as expectativas para produções baseadas em histórias em quadrinhos. Com um orçamento de US$ 55 milhões, a obra superou as expectativas, tornando-se um fenômeno cultural e comercial.
Entretanto, a continuação, intitulada Coringa: Delírio a Dois, sofreu um revés inesperado. Dirigido novamente por Todd Phillips, com Joaquin Phoenix no papel principal e a inclusão de Lady Gaga no elenco, o filme estreou com um orçamento elevado de US$ 190 milhões. Phillips e Phoenix receberam US$ 20 milhões cada, enquanto Gaga obteve US$ 12 milhões por sua participação. Os contratos haviam sido fechados antes mesmo de De Luca e Abdy assumirem, firmados por seu antecessor, Toby Emmerich, garantindo a realização do projeto.
A decisão de seguir com a sequência foi estratégica, já que o sucesso anterior de Joker e a pressão por novos conteúdos pesavam na balança. No entanto, no fim de semana de estreia, entre os dias 4 e 6 de outubro, Coringa: Delírio a Dois arrecadou apenas US$ 37,8 milhões no mercado doméstico. Foi um desempenho surpreendentemente abaixo do esperado, marcando a primeira vez que um filme de quadrinhos recebeu um D no CinemaScore, um índice que mede a aceitação do público.
COMPARAÇÕES E O EFEITO DOMINÓ DE UM INÍCIO FRACO
No mercado doméstico, o filme ficou atrás de outros títulos considerados fracassos, como The Flash (US$ 55 milhões) e The Marvels (US$ 46,1 milhões), além de Morbius da Sony, que, apesar de um orçamento mais modesto, estreou com US$ 39 milhões. No mercado internacional, a produção arrecadou aproximadamente US$ 81 milhões, dentro das expectativas, mas ainda aquém do desempenho do primeiro longa.
Fontes ligadas ao filme consideram o resultado como um reflexo de uma rejeição do público. A Warner Bros., em uma postura atípica, não tentou justificar o fraco desempenho nem projetar uma possível recuperação. Isso levanta questionamentos internos sobre como De Luca e Abdy permitiram que o filme se desviasse tanto do que o público queria ou esperava. Uma das possíveis respostas é a autonomia completa que Todd Phillips recebeu para conduzir o projeto, sem interferência ou testes preliminares.
Phillips é um cineasta que construiu um histórico de sucessos com a Warner, incluindo a trilogia Se Beber, Não Case. No entanto, a falta de controle externo e a ausência de envolvimento direto dos novos chefes da DC Studios, James Gunn e Peter Safran, deixaram o filme isolado das novas diretrizes para o universo cinematográfico da DC. Os dois executivos já haviam sinalizado, durante uma apresentação em janeiro de 2023, que Coringa: Delírio a Dois seria um projeto de Elseworld, ou seja, fora do universo compartilhado que estão desenvolvendo.
O fracasso de Coringa: Delírio a Dois marca o quinto revés consecutivo para a DC nos cinemas, após os desempenhos insatisfatórios de Black Adam, Shazam! Fury of the Gods, The Flash e Aquaman and the Lost Kingdom. A única exceção foi o lançamento de The Batman em março de 2022, dirigido por Matt Reeves, que conseguiu boas críticas e resultados de bilheteria. Com esse histórico recente, a pressão agora recai sobre Superman: Legacy, o próximo grande lançamento da DC programado para julho de 2025, com direção de James Gunn.
CRÍTICAS E O FUTURO DA WARNER BROS.
A autonomia de Phillips foi uma faca de dois gumes para o projeto. Diferentemente de Vingadores: Endgame, que contou com exibições de teste para ajustar detalhes e maximizar o impacto, Coringa: Delírio a Dois seguiu um caminho isolado, tentando manter um nível de sigilo que, segundo críticos, era desnecessário. O enredo não apresentava grandes reviravoltas, e a ausência de testes fez com que a Warner perdesse a chance de ajustar o tom e a narrativa conforme o feedback dos espectadores.
Internamente, a decisão de dar luz verde ao projeto também foi influenciada por David Zaslav, chefe da Warner Bros. Discovery, que pressionou por novas produções de grande porte para recuperar a relevância do estúdio após o controverso Project Popcorn. Essa iniciativa havia gerado atrito com talentos e cineastas ao estrear toda a programação de 2021 simultaneamente no serviço de streaming Max. Zaslav, que busca explorar a propriedade intelectual da empresa de forma mais abrangente, incentivou a sequência de Joker na esperança de repetir o sucesso do original.
Ainda assim, a falta de envolvimento da DC nos estágios iniciais de desenvolvimento deixou Folie à Deux em um limbo criativo. Enquanto Joker original se destacava como um estudo de personagem sombrio e impactante, a continuação tentou expandir a história com elementos que, para muitos, soaram deslocados, como números musicais com Lady Gaga. Críticos e fãs questionaram para quem exatamente o filme foi feito, com uma fonte próxima ao projeto resumindo que o público-alvo era, em última análise, apenas Joaquin Phoenix.
Agora, o futuro de títulos mais arriscados baseados em personagens da DC parece incerto. A Warner terá que avaliar cuidadosamente como equilibrar o legado do estúdio com as expectativas do público, enquanto Gunn e Safran buscam estabelecer um novo rumo para o universo cinematográfico. Resta saber se a aposta de alto risco em Coringa: Delírio a Dois será um ponto de aprendizado ou um sinal de alerta para futuras produções.