Devidos parabéns devem ser dados todos os envolvidos por isso aqui. O resultado frutífero de anos acumulados de críticas que mais pareciam esperneios hipócritas de “fãs” e um acúmulo de arrogância, ignorância, incompetência de produtores executivos; eis que finalmente conseguiram o que fãs e os assessores de estúdio queriam: a Marvelização definitiva da DC!
Podem deixar de lado a ideia de tentar lidar com maturidade ou fazer drama adulto genuíno para esses tipos de material personagens de maneiras que pareçam pessoais, envolventes, vindas de um lugar realmente desafiador de nuance dramática ou ideologia moral. Tentando iluminar e fundamentar isso em uma encenação do que poderia parecer filmes reais com peso real.
E muito menos querer ser ambicioso o suficiente para tentar ir aos detalhes intrínsecos, às possibilidades de explorar a repercussão das ações dessas entidades em uma escala micro e macro, que conseguia ressoar com a essência central do que esses personagens são de uma forma que parecesse, complexa, lidando super heróis como… ora, qual é aquela palavra perigosa? LEVADOS A SÉRIO? COM PESO? Tratados grandeza, seriedade e caráter distinto? Humanos? Sim, talvez algo assim… mas quem liga não é mesmo?! Porque aparentemente a ideia tentada aqui por James Gunn na sua missão de “consertar” o Superman que anos de Snyder o fizeram, de tentar o aparentemente proclamado impossível de humanizar, parece ser o mesmo que ridicularizar.”
Humanizar” porque Gunn concorda com esses bobocas do Twitter que por anos ficaram falando sem parar que o Superman é um herói ultra power sem graça, então o caminho para humanizá-lo é ter que ridicularizá-lo. Um Superman que apanha de todo mundo, que rala para vencer alguém, que só sabe gritar e reclamar das menções online sobre ele pois nem sequer é seguro de si mesmo ou de seus relacionamentos, porque tampouco a Lois tem firmeza no relacionamento de ambos, no qual somos simplesmente jogados num meio de desenvolvimento no que parece ser a segunda temporada de um seriado que você não teve a chance de uma retrospectiva e muito menos tem tempo de criar empatia com esses personagens.
Gunn considera a história de origem – pelo menos para o Super; desnecessária, talvez porque ele confie no conhecimento popular mitológico prévio desses personagens no imaginário popular, ou tal como fazer o personagem ter pesos realistas e repensar sua moralidade ao ponto de se formar esse medo abstrato rondando o futuro com sua imagem se tornar corrupta tal como o mundo o tornou – tal como Snyder o fez, seja algo dispensável. Ou talvez porque sua praia seja realmente incapaz de criar/contar uma história de origem com seu devido peso então buscar focar só no básico aprazível e facilmente digerível.
Falem o que quiser sobre os anos de artigos e textões raivosos repletos de imundície intelectual frágil e infantil, ou em sua maior parte conhecidos como “vozes da razão” tendenciosas que já permanentemente condenaram ora como pretensiosos, errôneos ou caricatos o fruto de diretores como Sam Raimi, Bryan Singer ou Zack Snyder e o que eles fizeram com esses personagens; eles realmente conseguiram fazer com que esses seres imaginários se destacassem mais do que apenas bonecões comercializados em forma humana, transformando-as de fato em figuras realmente introspectivas, multifacetadas, divertidoe e complexos.
Mas tudo isso é muito complexo e frágil de se fazer de maneira efetiva não é mesmo?! Requer muito esforço e pode incomodar as pessoas erradas, pois é deveras muito difícil de adaptar personagens de quadrinhos de uma forma que agrade a todos e não transforme seus fãs, seu público, em macacos raivosos digitando furiosamente em seus teclados com sangue nos olhos os piores insultos ofensivos e intolerantes possíveis. Então você tem que fazê-los entender o que você está querendo dizer, terá que fazer seus personagens explicarem linha por linha quais são suas motivações reais e mais profundas: o que torna Lex Luthor mal; o que faz Lois Lane amar Clark/Superman ou não; o que torna Superman humano ou não; as características íntimas e o peso macro-simbólico de seus personagens têm que ser tudo mastigadinho para que ninguém se perca e entenda claramente o que está em jogo, sem sutilezas, sem fazer você pensar muito, é o drama como um produto entregue da maneira mais enlatada possível. Escrita genial, hein?!
Muito foi elogiado sobre a leveza – e o quanto precisávamos disso; mas isso só soa como uma tremenda baboseira, porque, se você não suporta uma comparação com o Snyder sem usar o argumento de “viúva” então ok, vamos aos originais do Reeves, filmes que eram sim profundamente leves, excêntricos e campy, quase se passando por contos de fadas infantis, e ainda conseguiam ter uma encenação clássica, a gravidade dramática e a fantasia aventureira que esse Superman jamais teria em um milhão de anos. Além do mais, essa tentativa de leveza cômica soa como uma busca desesperada por validação, tendo que projetar esse Superman da Geração Z para a geração TikTok em seu ritmo hiper-rápido e crueza sarcástica para que ele possa ser colocado sob o disfarce da suposta linguagem/estética de história em quadrinhos.
Poderia ter sido uma escolha autoral válida, até mesmo corajosa… se não fosse talvez por esses mesmos talentos já outrora mencionados já terem feito tudo isso e encaixado essa linguagem em uma forma de gênero há anos, enquanto tudo o que Gunn fez foi apenas torná-lo mais esteticamente escrachado e óbvio. Mas não há nada de errado nisso, já que Gunn tem o entusiasmo e a ambição para tal, trazendo uma textura visual cálida e vívida inspirada em Alex Ross, e a ação tem essas formas físicas distorcidas para expressar o máximo possível a caricatura dos movimentos, o choque de velocidade e poderes na tela, enquanto o tom puxa esse universo da Era de Prata como pano de fundo de uma fantasia formalmente naturalizada, embora excessiva, e uma leveza ingênua e espirituosa.
Mas que por sua vez é constantemente massacrado e interrompido pelos ecos do humor cru do diretor, esmagando nessa inconsistência tonal que tenta unir o idealismo purista e ingênuo do Superman com a irreverência irônica de Gunn, que simplesmente não casam; além de todo o excesso de explicações e exposições baratas ou tentativas de fundamentar tudo em um campo político alegórico cuja seriedade nunca ecoa o peso que busca porque, na maioria das vezes, é tratado como uma subtrama de fundação temática.
Em teoria e conceito, me parece sim um caminho natural questionar o Superman como símbolo e conceito (soa familiar). É um filme que quer tomar esse exemplo mor de bondade e altruísmo que Gunn vê no Superman e pô-lo em cheque em uma atualidade que enxerga tais valores de forma antiquada, que os encara com um olhar questionador, subversiva e abrange o escopo geopolítico no qual Superman, o vermelho e azul americano alcança como influência. Válida ou não? A quais valores, propósitos e intenções ele serve? Uma bandeira ou o bem comum sem fronteiras?
Tudo muito bem, mas acaba parecendo mais um conglomerado de ideias que nunca são desenvolvidas de maneira dramaticamente coesa como sua primeira hora inicial promete com surpreendentes bons diálogos, mas que logo são tornados em discursos expositivos rotineiros, e ideais se transformam em bandeiras de sinalização de virtude. E aí quando tenta trazer à tona as ramificações geopolíticas da influência do Superman com paralelos reais em um conflito sub Israel v Palestina / Ucrânia e Rússia; e de quebra enfrentando a cobertura da mídia tendenciosa baseada na ampla disseminação de notícias falsas… aí você percebe então que Gunn está praticamente refazendo 70% da trama de Batman v Superman mas aí você ter lá o Superman tendo sua divindade questionada é deturpação das HQs e se levar excessivamente à sério?! Enquanto se é o Gunn fazendo é mais aceitável no olhar crítico pois meramente faz o tipo de alegoria política com paralelos reais, feita por cineastas liberais vestindo sua capa de ativismo legítimo para se sentirem bem consigo mesmos.
Enquanto isso, espalhando esse cinismo naturalizado que prega paz e amor enquanto despreza e lança tons de cinza contra tudo o que eles consideram doutrinador, problemático ou ignorante. É por isso que o que você tem aqui não é um Jor-El que envia seu filho para espalhar esperança, mas sim para dominar e usurpar a raça humana no qual ele considera uma raça inferior. Ousado? Audacioso? Ah, claro, mas Jor-El sendo um tirano meramente se traduz como os “daddy issues” de James Gunn que já vem desde o Ego em Guardiões da Galáxia 2 e o pai nazista do Peacemaker. Essa bizarra fixação do diretor infectando outro de seus filmes, e agora afeta um que não tem nada a ver com esse tipo de subversão, pois é basicamente o mesmo que jogar fora toda a aura mitológica e religiosa do Superman no lixo. O mesmo que dizer que a crença em um pai, em Deus, é uma mentira corrupta.
O Jor-El de Snyder queria que seu filho desse ao povo da Terra um símbolo e um ideal, e os ajudasse a se tornarem tão grandiosos quanto ele acreditava que seriam, mas isso foi chamado de sombrio e sério demais. O Jor-El de Gunn enviou seu filho para dominar o mundo e construir um harém de mulheres para procriar outros kryptonianos… e o filme foi chamado de inspirador. A hipocrisia que irradia daqui é ofuscante! Mas não se trata (apenas) de discordar da subversão que quebra o lore; em vez disso, é uma frustração que vem do resultado de uma hipocrisia clara. A mesma hipocrisia que fez Gunn atestar que este seria um filme completamente diferente dos anteriores, a primeira vez que ele não usaria músicas pop como needle-drops em elaboradas sequências de ação chamativas – uma tremenda mentira, como a bela cena do Sr. Incrível chutando traseiros comprova; enquanto que os elogios tão apaixonados vêm em parte de pessoas que carregam o argumento do “fiel aos quadrinhos” debaixo do braço como a bíblia, que por anos criticaram, não apenas Snyder, mas também Andy Muschietti, James Mangold, até mesmo Nolan; por muito menos, mas quando Gunn o faz, é aceitável porque É BOM O SUFICIENTE.
E é sobre isso, não é mesmo? Não importa se as cenas de ação aqui se tornam um caos sensorial megalomaníaco confuso, excessivamente bombástico e visualmente poluído; pois “ainda é divertido”; “é colorido”, “tem textura”; enquanto os defensores ferrenhos parecem estar firmemente se agarrando nessas comparações, convictas de que é uma história em quadrinhos ou de um desenho animado ganhando vida. Mas só estão se exaurindo da responsabilidade de analisar o filme como cinema. E mesmo se for encarar dessa forma, não há uma aptidão sólida e apaixonada que sustente essas escolhas em um contexto textual ou imaginativo, apenas uma aspiração lançada na tela, mas sem te permitir se emergir nela. É muito apressado para isso, ocupado demais em querer estabelecer muita coisa e querer dar destaque a todos os nomes de seu elenco, no que deveria ser um filme solo. É por si só um filme sim divertido e razoável, como todo mundo está dizendo, só que entulhado e superdimensionado. Em grande parte salvo pelo senso de diversão descontraída e por um elenco sólido. E é onde você consegue também ver onde os talentos do Gunn se refletem.
Enquanto que na Gangue da Justiça, se a Mulher Gavião da Isabela Merced deixa a desejar fazendo absolutamente nada no filme fora ser uma Gamorra durona de escanteio; o Sr Incrível de Edi Gathegi e o Guy Gardner de Nathan Fillion compensam demais com versões que parecem arrancadas direto das páginas dos quadrinhos e colocados na tela, te deixando faminto por muito mais deles no futuro da DC – e são claramente os personagens que o Gunn mais se diverte escrevendo.
Já o David Corenswet como o escoteiro de bom coração e de índole idealista é o Superman em sua juventude raiz, e certamente o que ansiávamos e precisávamos nessa nossa atualidade moderna cheia de cinismos, suspeitas e pessoas sempre esperando o pior do outro; enquanto que o Clark de Coren nos mostra que ser humano é ter orgulho do bem que podemos escolher fazer apesar do mundo querer te desesperançar contra.Mas enquanto gentileza e humanidade deveriam ser os temas aqui, mal conseguimos ver atos reais de tal vindos do Superman – que quando está superdeprimido fica sentado tomando chocolate quente enquanto uma lula alienígena gigante destrói a cidade – e chamaram o Cavill de imprudente, hein?! E que abraçar brevemente algumas crianças ou salvar um esquilo realmente não basta para transmitir essa humanidade e ternura inspiradoras e puras que o filme tenta convencer e seja capaz de inspirar mudanças cruciais nas pessoas em um efeito duradouro, resumindo tudo através de um discurso de última hora – que basicamente se resume a: “Eu sou humano porque sei o que é amor, #Paz”. Sentiu? Nope…
Acabando com um filme auto deslumbrado com sigo mesmo em um inócuo sentimental e divertimento passável que sim tem lá seu charme quadrinhesco só que tomado pelo sarcasmo e a tomada ideológica de valores de pureza manchados por uma irreverência cínica. Ou seja, um filme de James Gunn de cabo a rabo do começo ao fim, tanto para o bem quanto para o mal. Pregando sua ideia de bondade universal para algo mais próximo do hedonismo moderno, na forma de um desenho animado ostentoso, instável e moralmente inseguro sobre si mesmo. Que não foi feito para desafiar ninguém, não inspirou nada, apenas para tentar transformar os macacos raivosos em macacos felizes que que adoram cachorros e batem palmas! A DC finalmente deixou de ser um evento cinematográfico épico e finalmente se tornou um episódio da semana! Fique ligado para a segunda temporada de Peacemaker na próxima semana ou para a Supergil beberrona empoderada. Promissor…

Estudante de Jornalismo e amante de filmes desde o berço, que evoluiu ao longo dos anos para ser também um possível nerd amante de quadrinhos, games, livros, de todos os gêneros e tipos possíveis. E devido a isso, não tem um gosto particular, apenas busca apreciar todas as grandes qualidades que as obras que tanto admira.