Crítica | Corrente do Mal - Um dos Melhores Filmes de Terror dos Últimos Anos
Os últimos anos têm sido generosos quando se trata de filmes de terror - com obras como Invocação do Mal, O Babadook, It: A Coisa sendo alguns dos exemplares que marcaram a revitalização de um gênero que não andava bem das pernas. Apesar de algumas pontuais preciosidades, no entanto, ainda nos deparamos com dezenas de tragédias antes de sermos surpreendidos - positivamente - por um filme de horror. Mas, para sermos justos, o mesmo vale para qualquer outro gênero cinematográfico. Dito isso, é com grata surpresa que Corrente do Mal aparece como um dos melhores títulos do gênero nos últimos anos e, mesmo quatro anos após, ele não deixa de surpreender com seus pequenos, mas relevantes, detalhes.
Inspirado em um pesadelo recorrente de David Robert Mitchell, diretor e roteirista do longa, temos aqui uma fita que não faz questão de dar a mão ao seu espectador. A premissa, teoricamente, é simples e é apresentada logo no terço inicial do filme, mas é repleta de pequenas nuances que fazem nos perguntar, durante toda a projeção, coisas como “será que isso funcionaria?” ou “e depois, o que acontece?”. Perguntas essas que nos tornam espectadores ativos, não simplesmente vendo imagens expostas diante de nossos olhos, mas, sim, pensando em como fugir dessa situação, aparentemente, inescapável.
É nesse estado, de constante tensão e indagação que permanecemos ao longo de toda a trama, que acompanha a adolescente Jay Height (Maika Monroe), que passa a ser seguida por uma entidade, capaz de assumir a aparência de qualquer pessoa, após seu último caso amoroso passar isso para ela através do sexo. Tal ser segue a vítima a passos lentos, mas não para e, eventualmente, ela irá alcançar quem é que esteja perseguindo e não há como saber em que forma ela irá aparecer a seguir.
Mitchell é certeiro na forma como dirige esse seu segundo longa, aproveitando sempre da profundidade de campo, acompanhada frequentemente de planos mais abertos, para nos fazer procurar a criatura se aproximando lentamente e o mais assustadoramente divertido disso é que, na maior parte dos casos, realmente há alguém caminhando na direção da protagonista. Naturalmente que outros recursos já conhecidos do gênero também se fazem presentes como o aparente ponto de vista do assassino/ ser/ criatura e lentos travellings e panorâmicas que não apenas aumentam nossa expectativa para ver tudo o que está presente em determinado local, como passam a impressão de algo estar perseguindo a personagem, ou a observando.
Tudo isso passa a impressão de que Jay realmente nunca está a salvo e pode se deparar com a entidade a qualquer momento. O roteiro, claro, amplifica essa sensação ao oferecer certos detalhes de forma esporádica e nunca explicitamente. Por exemplo, de início não sabemos se a criatura é capaz de atravessar paredes, ou se simplesmente “teletransporta” e aparece em qualquer lugar. Além disso, quando os personagens estão prestes a passar adiante a maldição, na maior parte das vezes, não sabemos se eles chegaram a passar de fato ou se a entidade continua com sua atenção fixada neles. Trata-se de uma miríade de fatores que pouco a pouco intensificam nosso desconforto, jamais permitindo que relaxemos durante a projeção.
Tirando uma página do livro de Stanley Kubrick, em O Iluminado, Mitchel ainda preenche suas imagens com pequenas estranhezas, que não necessariamente requerem que prestemos atenção nelas, já que passivamente nossa mente absorve tais informações criando estranhamento. O mais claro desses elementos, que soam fora do lugar, é a presença de tecnologias de diferentes coexistindo como se o mundo, de fato, fosse assim. Vemos fotografias em preto e branco, carros dos anos 1970/80 perfeitamente conservados ao lado de veículos mais modernos, roupas íntimas que parecem ter pertencido à avó da protagonista, decorações com ar mais antigo e, ao mesmo tempo, uma espécie de celular, não muito diferente de um Apple Watch, com lanterna e e-reader que mais parece ter vindo do futuro próximo.
Fora essa questão tecnológica, ainda temos a questão das estações do ano, outro ponto que o diretor utiliza para gerar uma profunda estranheza no espectador, por mais que ele não saiba exatamente de onde ela vem. Para deixar claro irei utilizar uma cena específica de Corrente do Mal: em determinado momento vemos Jay relaxando em sua piscina (que claramente não é aquecida). Pouco após, vemos todos os personagens, inclusive ela própria, encasacados e não estamos falando de uma sutil elipse, que nos levou alguns meses para frente - trata-se, de fato, de um elemento para nos tirar da zona de conforto, uma espécie de erro de continuidade proposital, que se repete diversas vezes ao longo da trama, apenas contribuindo para que não relaxemos em momento algum.
David Robert Mitchell ainda faz uso de elementos clássicos de filmes slasher para compor essa sua peça única, primeiro e mais óbvio fazendo uso do sexo como sinônimo de perigo, apenas para subverter a ideia e tornar o ato sexual como única possibilidade de salvação. Naturalmente que há o subtexto das DSTs, mas isso é tão óbvio que não requer uma análise aprofundada. Ademais, a entidade funciona exatamente como um Jason, Freddy ou Michael Myers, sendo implacável, jamais desistindo de perseguir a vítima - a subversão está na troca constante da aparência do ser, ao contrário dos clássicos de terror que mantiveram, em geral, o mesmo visual do assassino por anos e anos. Além disso, a própria estrutura de “corrente” (que justifica o título nacional) remete imediatamente a O Chamado.
Fazendo uso desses elementos, Mitchell é capaz de criar algo próprio e inédito e que, felizmente, dispensa o uso constante de jump scares (ainda que alguns ainda estejam presentes no filme), priorizando a atmosfera de tensão aos sustos. Essa atmosfera, infelizmente, acaba cambaleando já na segunda metade do filme, que se beneficiaria sem algumas sequências que acabam trazendo um ar de repetitividade, mas nada que, de fato, estrague nossa imersão por completo.
No fim, Corrente do Mal é uma experiência extremamente positiva, um terror de respeito que certamente merece estar na lista de melhores exemplares do gênero dos últimos anos. Demonstrando uma gigantesca atenção aos detalhes, que apenas contribui para uma denso clima de tensão, além de uma proposta que sabe abraçar outros filmes que o precederam, mas sem perder a originalidade, esse filme de David Robert Mitchell prova que o terror sempre pode nos surpreender, tenha sido lançado em uma boa época para o gênero ou não.
Corrente do Mal (It Follows - EUA, 2014)
Direção: David Robert Mitchell
Roteiro: David Robert Mitchell
Elenco: Maika Monroe, Keir Gilchrist, Olivia Luccardi, Lili Sepe, Jake Weary, Daniel Zovatto, Leisa Pulido
Gênero: Terror
Duração: 100 min.
https://www.youtube.com/watch?v=9A3yMne0hwk
Review | Fallout 4: Game of the Year Edition - O ácido e divertido apocalipse
Meados de 2010, pela primeira vez montei um computador que suportasse, de fato, games da geração atual à época – sempre fui mais ligado aos consoles e aqui estava eu diante de uma nova experiência. Já conhecia Fallout de nome, mas nunca havia sequer encostado no jogo, eis que decido experimentá-lo, mais especificamente, Fallout 3, já lançado há dois anos. A paixão foi imediata, “viver” em um mundo pós-apocalíptico, destruído pelas explosões nucleares, repleto de sarcasmo e humor negro rapidamente transformou esse game em um dos meus preferidos de todos os tempos.
New Vegas veio pouco depois, expandiu o conceito, introduzindo novas mecânicas e um roleplaying que somente a Obsidian consegue proporcionar – jogos similares, mas que se distanciam da mesma forma que Knights of the Old Republic destoa de sua continuação pelo mesmo desenvolvedor. Não é preciso dizer que horas e mais horas – eu chutaria duzentas em cada um – foram gastas e a ansiedade por uma nova entrada, naturalmente, surgiu, algo que fora discretamente disfarçado por Skyrim, também da Bethesda.
Chegamos, portanto, a Fallout 4, que abriu a nova geração para a franquia em um ano marcado por games de mundo aberto, como o fantástico The Witcher 3 e o bom The Phantom Pain.
I don't want to set the world on fire
Com um prólogo em live-action, que nos situa no universo em questão, o jogo apresenta o mundo em 2077, um Estados Unidos que seria utópico não fosse o medo do fogo nuclear iminente, possível consequência da sangrenta guerra com a China. Uma sociedade quase perfeita, sustentada pela energia nuclear, que movimenta desde os carros até robôs pessoais. Tudo isso é devastado quando inúmeras ogivas atingem as cidades americanas, dizimando toda a grande potência.
Seu personagem – seja ele homem ou mulher, depende de você – sobrevive ao escapar para uma Vault, um dos muitos abrigos antibombas construído pela Vault-Tec a fim de assegurar o futuro da humanidade. Pouco sabe sua personagem, contudo que ali você seria congelado e acordaria apenas duzentos anos depois em um local conhecido apenas como Wasteland, no qual seu filho ainda bebê seria raptado e você precisaria entrar em uma odisseia para o reencontrar.
Essa é a premissa inicial do game, uma simples busca pelo filho perdido, dialogando imediatamente com a procura realizada pelo protagonista de Fallout 3. O que inicia simples, porém, a Bethesda sabe tornar complexo e inúmeros outros jogadores entram no cenário. A exemplo do que veio antes, o principal não é o desfecho e sim como chegar até ele, transformando cada decisão em verdadeiros dilemas morais, que fazem o jogador, de fato, viver uma experiência de RPG. Antes de entrarmos nos detalhes do jogo em si, contudo, é importante ressaltar a importância de sua breve introdução para a franquia. Mesmo que por um curto período, vivemos na sociedade pré-guerra e controlamos uma personagem que conheceu os dois mundos, o que gera, imediatamente, interessante desdobramentos para a trama, que definitivamente são explorados nas milhares linhas de diálogos nela presentes.
E já que estamos falando do sistema de conversa de Fallout 4, pela primeira vez controlamos alguém que efetivamente emite som quando fala, o que aumenta nossa empatia pela personagem – não é apenas um boneco que controlamos, passa a ser um ser humano que vivencia todo aquele horror distópico. A mecânica adota um modelo similar àquele de Mass Effect, no qual não temos certeza absoluta do que será dito, apenas breves resumos que encaminham o objetivo de cada fala escolhida. Em alguns pontos isso pode gerar o clássico “mas eu não queria dizer isso!”, forçando até mesmo um load por parte do jogador, o que motivou, inclusive, um mod, na versão para PC, que altera tal sistema. O importante dessa escolha, ainda que dúbia, porém, é a forma como as conversas são dinamizadas, forçando uma leitura menor por parte do jogador e, assim, contribuindo em momentos de maior tensão. Não é um “emburrecimento” e sim um fator necessário para uma fluidez narrativa. Só faltou um pouco de detalhes maior no que cada opção quer dizer, um meio termo entre a mecânica antiga e a nova.
A simplificação não para por aí, e atinge as mecânicas de level-up e de criação de personagem. Os pontos de habilidade foram embora e agora o foco nos perks, já clássicos da franquia, é maior. Começo aqui dizendo para aqueles que defendem as skills de Fallout 3 e New Vegas – era um sistema quebrado, um simples investimento em inteligência permitia maximizar quase todas as habilidades, o novo sistema, portanto, é mais que bem vindo. Uma maior variedade de perks, ou até a volta dos traits - presentes tanto nos dois primeiros Fallout da Interplay, quanto em New Vegas cairia bem, no entanto. Um balanceamento maior, do que cada perk necessita também ajudaria para diminuir a sensação de que o jogo é muito fácil. Felizmente, existem níveis de dificuldade para resolver essa questão, mas um game precisa ser minimamente desafiador já no “médio” e Fallout 4, infelizmente, não é.
Entramos, pois no que constitui a essência de Fallout: a liberdade. O jogador pode fazer simplesmente tudo o que quiser – seguir a história, criar um maluco psicótico que mata todos a seu redor, um paladino da justiça ou alguém que simplesmente sai andando por aí a fim de descobrir coisas novas. E para esse último não há um limite para o que podemos encontrar no game. De eventos randômicos como a mutação de qualquer inimigo em um lendário que oferece um loot melhor, até sidequests das mais criativas, podemos ocupar horas e mais horas e ainda termos a sensação de que nem arranhamos a superfície. Essa experiência ainda consegue se provar extremamente recompensadora pelo simples fato de que a progressão em níveis ocorre de forma surpreendentemente fluida – jamais passamos horas e horas sem conseguir um novo perk e isso nos motiva a continuar por horas a fio, ansiando pela melhoria de nosso personagem.
Criando para sobreviver
Expandindo esse conceito, o game introduz um novo, simples, mas rico sistema de crafting, no qual podemos modificar nossas armas e armaduras, alterando não só seu dano como seu próprio funcionamento – uma pistola pode ser transformada em um rifle de precisão e para isso tudo o que precisamos são itens como ferro, madeira, alumínio que são adquiridas através do desmantelamento de coisas consideradas como lixo – latinhas, relógios, aspiradores de pó. Essa é a forma do desenvolvedor nos dizer que: nada está em determinado lugar por acaso, tudo, absolutamente tudo tem uma função específica. Se esse sistema não bastasse, agora podemos montar diversos novos assentamentos que podem ser defendidos e providos de água, comida e, é claro, habitantes – enxerguemos isso como uma versão similar ao Fallout Shelter, só que acima da terra.
O grande problema nessa criação de assentamentos é que, além de coletar os recursos necessários para expandi-los, não há qualquer outro desafio. Sim, raiders ocasionalmente aparecem para tentar atacar os locais, mas basta uma viagem até lá para resolver isso. No fim, sentimos como se não houvesse uma recompensa maior ao jogador, a não ser no modo survival, que, pela necessidade de dormir para salvar, faz cada assentamento parecer um save point - mas não é necessário construir muito para tal, basta colocar uma cama no lugar e pronto. Assim sendo, faltou mais empenho da Bethesda em gerar algo mais dinâmico, por mais que as possibilidades de customização sejam inúmeras - especialmente com os patches e DLCs.
Por outro lado, não há necessidade alguma de dedicar sequer um minuto à criação dessas pequenas cidades. Trata-se de uma função opcional, que, como muitas outras, em geral, são ligadas a uma das facções as quais podemos nos aliar durante a trama.
Ad Victoriam
Cada uma dessas apresenta um novo ideal sobre a humanidade pós-guerra e suas visões se encaixam com estilos específicos de jogabilidade, o que torna a customização de personagem ainda mais dinâmica, aumentando exponencialmente a taxa de replay, ao passo que diferentes finais estão presentes no game. Aqui abro um pequeno adendo para dizer que esses finais poderiam ser ainda mais diversos, mas, infelizmente, se resumem a dois, com missões diferentes para chegar lá e com diálogos levemente diferentes no desfecho em si.
As facções, como muitos outros npcs ainda trazem uma série de referências aos jogos anteriores criando no jogador não só a percepção de que vivemos no mesmo universo, como se trata de uma continuação, ainda que a história seja fechada em si própria. O próprio Instituto, organização dentro do game, já deu as caras inúmeras vezes na franquia, isso sem falar, é claro, na icônica Brotherhood of Steel, que traz como líder, nesse game, um personagem introduzido em Fallout 3.
E por falar nos coletores de tecnologia pré-guerra, as famosas power-armors retornam de forma verdadeiramente memorável aqui. Ao invés de serem apenas mais uma armadura, elas agora funcionam como um exoesqueleto que trazem inúmeros benefícios além de uma proteção completa. A melhoria, porém, não vem sem alguns sacrifícios e agora elas requisitam de uma fonte de energia, as fusion cores, que são mais dificilmente encontrados no game, por mais que não tão escassas quanto imaginamos nos primeiros minutos e, sim, por questões de balanceamento (lembra quando disse que o jogo é fácil demais?) esses itens deveriam ser bem mais raros.
O importante dessa escolha da Bethesda, que certamente não agradou a todos, é como essas armaduras imediatamente adquirem uma maior importância, não são apenas mais uma forma de equipamento e sim algo verdadeiramente especial e, é claro, poderoso. Com isso as valorizamos mais ao passo que se tornam praticamente essenciais em lutas contra Deathclaws, por exemplo, no início do jogo. Somado a isso, o sistema de crafting se demonstra indispensável para aqueles que desejam passar suas experiências nessas carcaças de metal, visto que podemos adicionar algumas modificações, como propulsores ou conduítes de eletricidade.
Mais uma vez retomamos o tema da liberdade que Fallout nos proporciona e ao invés de nos deprivar dela com essa nova mecânica, somente temos uma inteira nova possibilidade de gameplay.
Entramos, portanto, em um aspecto muito criticado: os gráficos do jogo. É mais que evidente que Fallout 4 não faz uso total das capacidades da atual geração. Ao menos é o que parece na superfície. Estamos falando de um game em um gigantesco mundo aberto, com random encounters e dezenas de milhares de itens a serem coletados. Cada um desses possui um modelo em 3D que deve ser completamente renderizado e pode ser simplesmente jogado de um lado para o outro pelas explosões provocadas pelo jogador. Uma melhoria brutal nos gráficos significaria aquilo que todos odeiam: mais telas de load, muitas delas. The Witcher 3 é um jogo mais bonito? Sim! Mas a grande maioria do que vemos na tela são detalhes fixos que não podem ser interagidos.
Somado a isso, a Bethesda é famosa por permitir a modificação de seus jogos, liberando, inclusive, as ferramentas utilizadas na criação da obra. Basta ver o sistema de criação de assentamentos, que foi tirada de um mod de Fallout 3 (que, à título de curiosidade, eu cheguei a experimentar). Portanto, se víssemos uma qualidade muito absurda de imagem, perderíamos esses fatores, assim como a clássica brincadeira com os console commands, dois aspectos que garantem uma extensa vida útil aos games da desenvolvedora. Isso sem falar que muitos computadores não rodariam o game.
Os DLCs de Fallout 4
Como grande parte dos maiores lançamentos de games hoje em dia, Fallout 4 já estreou com um season pass disponível para a compra. Agora vamos mergulhar em cada uma dessas expansões, que muito acrescentam ao game, mas que, não necessariamente valem o preço cobrado (mesmo hoje em dia).
Automatron
A primeira expansão do game é, também, uma das mais interessantes. Ao recebermos um sinal de emergência, transmitido pela rádio, ganhamos uma nova missão para investigar o local de onde o pedido de socorro veio. Ao chegarmos lá nos deparamos com inúmeros robôs atacando o restante de uma caravana, no caso, uma robô denominada EVA. Através dela descobrimos que essa ameaça mecânica está sendo causada por alguém chamado The Mechanist e cabe a nós descobrirmos onde sua base se encontra e colocar um fim a seus planos maquiavélicos.
A maior adição do DLC é o Robot Workbench, que nos permite criar e modificar robôs, inserindo novas partes e fazendo uma mistura entre assaultron, robobrains, protectrons e sentries. A mecânica é interessante, prática como as outras workbenches do jogo e possibilita que customizemos companheiros como Codsworth, que a cada dia que passa ganha mais nomes que pode falar (o meu é Bruce Wayne e ele me chama de Mr. Wayne).
Além disso, podemos fazer com que nossas criações preencham os buracos de nossas habilidades, como dar a elas a possibilidade de destrancar uma porta., o que, por si só, já nos faz querer ter uma dessas máquinas ao nosso lado o tempo todo.
A quest principal em si é bastante curta, especialmente se estivermos em um level mais avançado, mas o último estágio é simplesmente maravilhoso, fazendo uma evidente alusão a filmes de ficção científica dos anos 1950/60. O Mechanist é um personagem extremamente dramático e cada fala sua nos traz boas risadas e ainda há um interessante, ainda que previsível, plot-twist no final. O DLC ainda traz dois novos conjuntos de armaduras e armas de energia, o que sempre é bem-vindo.
Wasteland Workshop
Essa daqui é um grande desapontamento. A promessa é inserir novas mecânicas aos assentamentos, que nos permitem criar arenas para realizar combates entre deathclaws, raiders, gunners, etc. Na teoria a ideia é boa, mas na prática não funciona tão bem assim, requerendo alguns perks específicos para seu funcionamento pleno, além de sua mecânica não ser nada explicada dentro do jogo em si.
Além disso, para o jogador do PC já podemos fazer isso sem requisitar o conteúdo extra, através de console commands e o conteúdo não inclui nenhuma quest. Em resumo: vale o investimento? Certamente não, é provável que, ao adquirir o season pass o jogador ignore esse add-on completamente, como fiz na maior parte dos meus novos personagens.
Far Harbor
Essa daqui é, disparada, a melhor expansão de Fallout 4, nos trazendo um mapa completamente novo, com novos inimigos, personagens, facções e uma questline bastante extensa, que chega a ser melhor que a história principal do game.
Aqui, ao sermos contratados como detetives para investigar o desaparecimento da filha de um casal, viajamos para Far Harbor, uma ilha ao norte da Commonwealth. Lá nos deparamos com uma densa névoa radioativa e um assentamento sob constante ataque de criaturas estranhas. Aos poucos descobrimos que, na ilha, existem três facções distintas: os habitantes de Far Harbor, as Crianças do Átomo (Children of the Atom), cuja primeira aparição se deu em Fallout 3 e uma comunidade de synths que fugiram do Instituto.
O DLC, além de nos oferecer novas armas e equipamentos (uma armadura, inclusive, muito similar à do ranger de Fallout: New Vegas), nos traz uma história muito interessante, que nos oferece uma gama de escolhas, cada uma com um alto grau de moralidade, o que inclui a possibilidade de detonar uma bomba atômica, substituir um humano por uma cópia sintética e mais. Os personagens são muito bem escritos e entendemos as motivações e temores de cada um deles, além disso, o mapa da ilha é enorme, sendo praticamente da mesma extensão do norte da Commonwealth. Novas funcionalidades para construção de assentamentos também são acrescentadas, ainda que sejam praticamente um extra dentro do restante do conteúdo aqui apresentado.
Não menos importante é o mais alto grau de dificuldade, que entrega verdadeiros desafios ao jogador, como enfrentar uma rainha Mirelurk em campo aberto, além das criaturas extremamente resilientes da ilha.
O interessante de Far Harbor é sua atmosfera de filme de terror em virtude da constante névoa que precisamos atravessar. Jamais sabemos se há uma criatura à espreita, o que nos deixa permanentemente tensos ao explorar o local. O ponto negativo é ter de utilizar o fast travel todas as vezes que vamos para a ilha, o que tira um pouco da fluidez do game. Além disso, poderiam ter sido acrescentadas mais criaturas únicas, para fugir um pouco mais do jogo base.
Ainda assim, Far Harbor é praticamente obrigatório para qualquer um que vá jogar Fallout 4.
Contraptions Workshop
Mais um add-on aos moldes de Wasteland Workshop. Dessa vez ganhamos a possibilidade de construir linhas de produção, elevadores e outras máquinas em nossos assentamentos. Infelizmente, as mecânicas também não são apresentadas para nós e funcionam de forma confusa – alguns pontos como portas mecanizadas são interessantes, mas nada que efetivamente valha o preço que pagamos pelo conteúdo.
Recomendo somente se você passar a maior parte de sua experiência em Fallout 4 construindo moradias e bases, caso contrário, pode pular esse daqui sem pestanejar, como fiz em diversos gameplays.
Vault-Tec Workshop
Esse daqui foge dos moldes das outras workshops e nos traz um conteúdo que realmente merece nossa atenção. Através de Vault-Tec Workshop podemos construir uma das famosas vaults ao descobrirmos, a Vault 88, que ainda estava sendo construída quando as bombas caíram. Lá encontramos a Overseer encarregada do local e, através de quests oferecidas por ela, construímos um novo abrigo e realizamos experimentos nos moradores desavisados.
A questline em si é bastante curta, mas nos oferece interessantes escolhas: vamos experimentar em cima dos moradores ou vamos fazer suas vidas melhores? Além disso, o conteúdo novo para construirmos a vault, por si só, já vale o investimento e podemos criar novos locais, reconstruir a 111, de Fallout 3, por exemplo, dentre outras possibilidades. O melhor é que tudo isso se torna disponível para a utilização em outros pontos do mapa após terminarmos a quest principal, trazendo horas e horas de jogo para quem, assim como eu, gosta de se afiliar aos Minutemen.
Nuka-World
O último dos conteúdos adicionais a serem acrescentados a Fallout 4, Nuka-World abraça por completo a acidez da franquia ao nos levar para um parque de diversões aos moldes da Disney World, com direito a mini parques temáticos, um castelo, montanhas russas, zoológicos e mais.
A questline é bastante simples e basicamente nos transforma no líder de raiders, devendo conter a sede por sangue (ou dinheiro) de três facções, cada uma com suas particularidades. Ao fim, a expansão acaba dialogando diretamente com os Minutemen, ao passo que temos a opção de criar assentamentos de raiders na própria Commonwealth, o que não passa despercebido por Preston Harvey, que se torna hostil caso optemos por essa saída. O interessante é a possibilidade de tomar assentamos à força de outros npcs, o que sempre cai bem no universo de Fallout.
Infelizmente, ainda que o DLC acrescente um novo mapa, não há tanto o que ser feito nele, como foi o caso de Far Harbor. Muitos detalhes podem ser observados em termos de world design, mas não muito além disso, fazendo soar como se a expansão estivesse incompleta. Ao menos, a tarefa de reativar cada um dos parques dentro de Nuka-World traz algumas boas risadas e interessantes quests, mas nada que faça valer o preço individual da expansão.
O veredito
Fallout 4 certamente não é o jogo perfeito, e pode não estar no mesmo grau de qualidade de seus dois antecessores. Ainda assim, ele nos traz uma experiência única em um mundo pós-apocalíptico, com uma história que se prova surpreendentemente intimista conforme progredimos nela. Mais uma vez a Bethesda consegue acertar, mantendo a base de sua fórmula e investindo em inúmeros detalhes que acrescentam horas, horas e mais horas ao jogo.
Com conteúdos adicionais que variam entre o descartável e o indispensável, a edição Game of the Year certamente é aquela que traz a experiência completa de Fallout 4, garantindo, a cada novo jogo, pelo menos cem horas de missões e exploração.
Com novas mecânicas e uma quantidade praticamente infinita de coisas a serem realizadas, temos aqui uma obra verdadeiramente obrigatória para qualquer um, seja um iniciante na franquia, seja um fã de longa data, que se apaixonou por Fallout 3 e não abandonou o Wasteland desde então.
Fallout 4 - Game of the Year Edition
Desenvolvedor: Bethesda Game Studios
Lançamento: 10 de Novembro de 2015
Gênero: RPG
Disponível para: PC, PS4, Xbox One
Lista | Os 5 melhores diálogos de Quentin Tarantino
Ao longo de sua curta, porém expressiva, filmografia, Quentin Tarantino nos presenteou com alguns diálogos verdadeiramente lendários, que para sempre ficariam marcados em nossas memórias - certamente o suficiente para tornar a tarefa de escolher apenas cinco dos melhores algo praticamente impossível. Mas é claro que fizemos mesmo assim. Eu e Lucas Nascimento selecionamos aqueles diálogos inesquecíveis do diretor, aqueles que definiram seus filmes e sua própria carreira.
Dito isso, confira abaixo os cinco melhores diálogos de Quentin Tarantino e nos deixe saber quais são os preferidos nos comentários abaixo!
https://www.youtube.com/watch?v=SwE19SjXZ2w
5. O Filho do General | Os Oito Odiados
Em um dos momentos mais inspirados de Os Oito Odiados, o personagem de Samuel L. Jackson profere a grande pérola do teatro filmado de Tarantino. Ao reencontrar um velho inimigo da Guerra Civil, o confederado Sandy Smithers, Marquis Warren tenta fazer o velho perder sua paciência e tentar atacá-lo. Para isso, Warren inventa uma história maluca onde afirma ter sido o responsável por encontrar e assassinar seu filho, mas sem antes deixá-lo caminhando nu pela neve e forçá-lo a lhe pagar um boquete. A escolha de palavras do texto e a suspeita sobre a história ser ou não real é o que torna este diálogo um dos melhores e mais engraçados da carreira do cineasta.
https://www.youtube.com/watch?v=hglyRJXCNCM
4. A ciência da frenologia | Django Livre
Tarantino é especialista em criar tensão a partir dos diálogos. Quando os caçadores de recompensa Django e King Schultz são desmascarados pelo maléfico Calvin Candie, o fazendeiro sulista oferece uma ameaça arrepiante, e que envolve o uso de uma caveira humana para comprovar uma tese racista em relação à frenologia. O grande atrativo fica, como sempre, na escolha de palavras e no jogo inteligente de combinação de frases, com Candie repetindo o material e o modelo da mesa de jantar enquanto grita, e também pela ironia ácida do vilão.
https://www.youtube.com/watch?v=J782jBp_pW0
3. Like a Virgin | Cães de Aluguel
Cães de Aluguel é um filme que praticamente não para. Mesmo nos momentos de aparente calmaria no armazém, a tensão é constante: não sabemos quem irá chegar ali, o que cada um irá fazer, se irão começar a atirar uns nos outros, ou simplesmente fugir - e no topo de tudo, ainda há a grande dúvida sobre o que aconteceu durante o roubo. O único ponto verdadeiramente "tranquilo" do filme é a sua abertura, com todos os personagens sentados em uma lanchonete jogando conversa fora. De fato, não importa que estejam falando sobre Like a Virgin, da Madonna, o fato desse ser o tópico da conversa apenas garante a acidez do roteiro de Tarantino, que em um curto prólogo, com o movimento de câmera que para sempre seria lembrado, apresenta um a um os personagens.
https://www.youtube.com/watch?v=Mnb_3ibUp38
2. Café da Manhã | Pulp Fiction: Tempo de Violência
"Does he look like a bitch?" Não é preciso ter assistido Pulp Fiction para reconhecer essa simples pergunta. A cena do Café da Manhã é um amontoado de deliciosas falas, muitas das quais poderiam ser inclusas em melhores citações do Cinema. Partindo de uma conversa simples sobre um delicioso hambúrguer, o pilar de todo café da manhã nutritivo, mas cheia de tensão, até trocas de tiro e de "apostas duplas", temos aqui uma das sequências mais memoráveis da filmografia do diretor, que para sempre marcaria a carreira de Samuel L. Jackson.
https://www.youtube.com/watch?v=QfSjs_6MZOQ
1. Era Uma Vez na França Ocupada pelos Nazistas | Bastardos Inglórios
Quentin Tarantino dificilmente escreverá algo melhor em sua vida. A promessa de um épico de Segunda Guerra Mundial por suas mãos já era empolgante, e os cinéfilos puderam se deliciar com a apresentação de um dos grandes vilões do cinema recente - e que, coincidentemente, - também é o melhor personagem que Tarantino já escreveu: o nazista Hans Landa. Intercalando o idioma entre francês e inglês, a sequência mostra o educado coronel investigando a presença de judeus escondidos em uma fazenda leiteira. A postura galante e delicada do coronel logo evoluem para uma presença ameaçadora e que faz jus ao apelido de Caçador de Judeus, tornando esta uma perfeita abertura para Bastardos Inglórios. Essa cena sozinha deveria ter garantido um Oscar a Tarantino naquele ano.
Crítica | Extinção - Boas ideias desperdiçadas
Vez ou outra nos deparamos com um filme que poderia ser excelente, capaz de não só cumprir sua proposta, como de realmente entregar uma experiência memorável ao espectador, mas que acaba falhando em atingir tal patamar em razão de pequenos ou grandes detalhes que tiram toda ou parte da força de sua narrativa. Triste testemunhar uma obra que detém a receita para o sucesso, mas que não sabe segui-la como deveria, ou até sabe, mas com ingredientes de qualidade inferior, gerando um produto muito aquém do que ele poderia ter sido. Extinção, infelizmente, é um desses exemplos.
A proposta do longa-metragem original da Netflix teoricamente não foge do comum. Uma família deve lutar, correr e se esconder para sobreviver de um ataque alienígena que está destruindo toda a cidade onde os personagens centrais vivem. Essa premissa, no entanto, é transformada sucessivas vezes ao longo da narrativa, permitindo que doses esporádicas de surpresas sejam entregues aos espectadores, tudo sem desvirtuar o cerne da obra. A ideia criada por Spenser Cohen é simples, porém funcional e remete a grandes clássicos da ficção científica, tirando evidente inspiração de Isaac Asimov para tal. O problema, no entanto, como já deixado claro antes, está na execução.
De início já somos incomodados pelas atuações da dupla principal - Michael Peña e Lizzy Caplan vivem Peter e Alice, marido e mulher, mas não poderiam parecer mais distantes disso. Não existe a menor química entre os dois, o que, desde cedo, nos deixa incertos se estamos diante de um relacionamento frágil, prestes a acabar, ou apenas abalado - mas sem risco de ruptura - pelos constantes pesadelos do marido. Não conseguimos sentir o amor ali e para um filme que gira em torno da sobrevivência dessa família, isso é grave.
Para piorar, a ausência de sentimento entre os dois se estende para a relação de ambos com seus filhos. Cenas com intuito de trazer um ‘calor’ maior para essa casa estão presentes, mas nada que consiga quebrar nossa percepção dessa artificialidade. No fim, a sensação é de estarmos diante de um grupo de estranhos que acabou de se conhecer. Mesmo levando em conta um dos twists do roteiro, isso não pode ser justificado, aliás, ele enfraquece essa revelação, visto que ela também tem como aspecto central a emoção, que também é essencial para a mensagem final que o filme tenta nos passar.
Ainda nas atuações, Michael Peña claramente mostra que não está pronto para levar o filme por conta própria. O ator funciona perfeitamente como coadjuvante, como deixou bem claro em Homem-Formiga, mas aqui acaba não trazendo peso o suficiente para sua atuação. A única coisa que somos capazes de extrair de suas feições é a confusão - medo, raiva, amor, qualquer outro semblante de emoção está ausente de seu trabalho. O mesmo vale para Caplan, que funciona em modo automático, sem se destacar sequer um momento, gerando um longa com uma boa história, mas que acaba parecendo vazio, incapaz de transmitir sua mensagem da maneira adequada.
Não ajuda o fato do roteiro de Spenser Cohen e Brad Kane (que pelo jeito perdeu o brilho mostrado em Black Sails) ser preenchido de velhos clichês, já vistos em dezenas de outros filmes sobre invasão ou de famílias em perigo, como a típica cena da garotinha parada gritando alto enquanto o perigo se aproxima. O agravante é que alguns desses clichês se repetem mais de uma vez ao longo da trama, chegando a gerar risadas espontâneas no espectador - Extinção sabota sua credibilidade e, muitas vezes, acaba não fugindo do ‘mais do mesmo’, ainda que sua linha narrativa central seja instigante.
Mesmo a maioria das revelações apresentadas ao longo da narrativa - que não deixam ser boas surpresas, indícios de uma boa ideia original - são acompanhadas de um didatismo exacerbado, com diálogos e cenas expositivas demais, quando facilmente poderiam ter sido entregues com maior sutileza. Em determinado ponto do filme, o diretor praticamente pega em nossas mãos e nos leva por um passo a passo do que já estava óbvio, não só inchando a narrativa, como gerando incômodo em nós, espectadores, que gostaríamos muito de pensarmos por conta própria.
Por falar na direção, Ben Young, nesse seu segundo longa, mostra que não sabe muito bem como dirigir sequências de ação, sendo tudo confuso demais - fruto de planos mais curtos do que deveriam ser. Não ajuda, claro, que algumas dessas sequências sejam escuras demais, uma ou outra há justificativa para tal, mas em outras não custava inventarem uma fonte de luz em cena para que, de fato, pudéssemos enxergar algo. No fim, torcemos para que a ação seja logo substituída por diálogos ou por trechos que coloquem os personagens centrais se escondendo do perigo.
Ao menos, enquanto nossa imersão é quebrada por esses elementos, somos, em parte, resgatados pelo trabalho em cima do som da obra, entregando uma sonoplastia envolvente, ainda que não fuja do comum em certos aspectos. Os próprios visuais mostrados muito bem se encaixam com tais sons, sabendo abraçar um lado da ficção científica que perfeitamente se encaixa com a proposta do filme, por mais que alguns efeitos especiais em CGI deixem a desejar.Isso, porém, não salva Extinção, que poderia ter sido uma ótima ficção científica, mas que se limita a ser um filme que, ocasionalmente, nos diverte. Com muitas falhas em sua execução, indo desde as atuações, passando pelo roteiro, até a direção, esse longa da Netflix não surpreende, mesmo com alguns bons twists no meio do caminho. O potencial claramente estava lá, mas não souberam utilizá-lo como deveriam.
Extinção (Extinction - EUA, 2018)
Direção: Ben Young
Roteiro: Spenser Cohen, Brad Kane
Elenco: Michael Peña, Lizzy Caplan, Amelia Crouch, Erica Tremblay, Lex Shrapnel, Emma Booth, Mike Colter
Gênero: Ficção científica
Duração: 95 min.
https://www.youtube.com/watch?v=-ePDPGXkvlw
Crítica | O Diabo e o Padre Amorth - O Exorcismo da Credibilidade
Ao pensarmos em exorcismo, se é que qualquer um pensa nisso quando não está diante de um filme do subgênero, é inevitável criarmos a imediata conexão com O Exorcista, de William Friedkin. É praticamente impensável não vir à mente a imagem de uma garota vomitando, se contorcendo e virando a cabeça quando nos pegamos no meio dessa temática, tamanho o impacto do longa-metragem de 1973, que basicamente definiu o caminho a ser seguido pelos outros filmes e séries que viriam a partir daí.
Naturalmente que o anúncio de O Diabo e o Padre Amorth, um documentário que tem como premissa mostrar um exorcismo na vida real, dirigido pelo próprio Friedkin, geraria, no mínimo, curiosidade em qualquer um que tenha apreciado seu clássico do terror.
O documentário, recentemente disponibilizado pela Netflix, no entanto, não poderia ser um melhor testamento de que alguns assuntos devem ser deixados de lado. Em sua aparente tentativa de mostrar o exorcismo de fato, tudo o que Friedkin gera é uma sucessão de risadas e incredulidade, com imagens e narrativa que ora são suspeitas, ora ingênuas demais.
De início, Friedkin que dirige e assina o roteiro, junto de Mark Kermode, já tira do caminho o seu passado envolvendo O Exorcista, mostrando o quanto essa sua obra-prima abriu caminho para o que veríamos nesse documentário. O estranhamento é imediato: o diretor é extremamente presente em praticamente todas as imagens, além da narração, é claro, tanto em off, quanto com ele aparecendo diante dos locais filmados, não muito diferente de Carl Sagan em Cosmos. O problema é que Sagan não parece querer nos convencer de algo que claramente foi forjado, como é deixado claro pela edição de som feita no documentário - mas chegaremos nisso em breve.
Depois de uma breve introdução, com um curto trecho de um dos entrevistados alertando Friedkin de não mergulhar nesse assunto, em uma clara tentativa de esboçar algum tipo de atmosfera de terror, pulamos para o que interessa: o exorcismo em si. Ao menos é o que achamos, primeiro somos apresentados ao padre, evidentemente como forma de atestar sua competência, em planos que percorrem certos locais de Roma, de tal forma que somos mais atraídos pela cidade como local turístico do que, de fato, palco de um ritual que está prestes a acontecer. Não ajuda, claro, no já mencionado estabelecimento de uma atmosfera, que praticamente todas as tomadas sejam diurnas, sem filtros, quebrando qualquer esperança de mergulharmos novamente naquele clássico visual de O Exorcista.
A tal ponto da narrativa, praticamente em sua metade, já deveríamos esperar o que veríamos no exorcismo em si - mas a esperança é a última que morre, claro. No fim, ganhamos dezessete minutos, filmados em uma câmera na mão, de uma mulher “possuída” se debatendo esporadicamente na cadeira (enquanto é segurada), com ocasionais ameaças verbais saindo dela em uma voz gutural muito claramente editada, do tipo que é simplesmente igual a qualquer outro filme de exorcismo já visto. Se ao menos tivessem ensinado à atriz amadora algumas palavras de outro idioma, um mínimo de veracidade poderia ter sido construído, mas nem isso. Como já dito antes, o resultado são risadas e puro tédio, visto que são 17 minutos ininterruptos, com direito à sabotagens do foco automático da câmera. Não ajuda, claro, que o dito exorcismo acaba da maneira mais anticlimática possível, em mais uma tentativa falha de fazer isso tudo soar como algo verdadeiro.
Não contente em ter falhado em entregar de maneira convincente o cerne de sua obra documental, Friedkin segue o ritual com entrevistas a médicos de diversas áreas e universidades, além de padres, a fim de corroborar a veracidade do que foi visto. O diretor teria apresentado a filmagem a esses profissionais que, a partir daí, oferecem cada um de seus pareceres. Acompanhada pela constante verborragia do apresentador/ diretor/ roteirista tudo acaba soando como um espetáculo de picaretagem, com Friedkin praticamente colocando as palavras nas bocas de cada um dos entrevistados. Naturalmente que toda obra, seja ficção ou não, invariavelmente apresenta o ponto de vista de seu realizador, mas, nesse caso, faltou um mínimo de discrição, para que tudo soasse um pouco menos forjado. O resultado não foge muito daqueles falsos documentários do Discovery Channel sobre dragões, fantasmas, OVNIs e afins.
O auge do inacreditável vem na forma do clímax do filme, que traz uma sequência claramente inventada e convenientemente não filmada, apenas narrada, que o diretor, embora carismático, não é capaz de nos vender, deixando-nos com um gosto não amargo, mas de algo completamente sem sal, que soa extremamente amador, o que não deveria estar atrelado à figura do homem que já nos trouxe Operação França e O Exorcista. Vem, portanto, a triste constatação, de que estamos diante de uma obra de alguém que apenas está tentando recapturar as glórias do passado, que tenta, mas não consegue criar qualquer tipo de aceitação por parte do espectador ou o mínimo de tensão. Ele tenta desesperadamente, como podemos ouvir através da dramática trilha, que ocasionalmente irrompe o silêncio do plano de fundo, mas não consegue sequer nos envolver com sua narrativa.
A percepção final que temos é de que testemunhamos uma experiência falha, uma tese incapaz de oferecer argumentos convincentes, que, no fim, falha até mesmo como fugaz entretenimento, já que o tédio toma conta de nós já na primeira metade da projeção.
O Diabo e o Padre Amorth não faz jus à sua premissa e começa a fugir de nossa memória assim que chegamos aos créditos finais. Seja recebido com risadas ou pura decepção, o filme é totalmente eclipsado pelo passado, outrora brilhante, de William Friedkin, que, ao menos, ainda tem O Exorcista como exemplar de filme sobre possessão demoníaca.
O Diabo e o Padre Amorth (The Devil and Father Amorth - EUA, 2017)
Direção: William Friedkin
Roteiro: William Friedkin, Mark Kermode
Elenco: Gabriele Amorth, Robert Barron, William Friedkin
Gênero: Documentário
Duração: 68 min.
https://www.youtube.com/watch?v=jpjRQokeQNo
Crítica | Missão: Impossível 3 - O toque de J.J. Abrams
Com a fraca continuação que fora Missão: Impossível 2, J.J. Abrams, Alex Kurtzman e Roberto Orci, mesma equipe que, posteriormente, nos traria o reboot de Star Trek, contava com a difícil missão (não impossível) de dar um novo sopro de vida à franquia, retomando o tom do primeiro filme ao mesmo tempo que sugasse alguns dos elementos do segundo filme a fim de apelar para as audiências que apenas querem ver mais um filme de ação. Missão: Impossível 3 certamente está longe do thriller de espionagem mais “calmo”, na falta de uma melhor palavra, que o original – sua estrutura é aquela de uma bomba prestes a explodir, como bem deixa claro os créditos de abertura, trata-se de um longa que nos leva de um frenesi para o outro e sob a batuta de Abrams não conseguimos tirar nossos olhos da tela.
Ethan Hunt (Tom Cruise) não mais atua no campo, é um homem que treina os novos agentes da IMF (Impossible Missions Force) ao mesmo tempo que busca constituir uma família com sua noiva Julia (Michelle Monaghan) – algo que apenas reitera a péssima construção do romance exibido na obra antecessora. Sua vida foge totalmente dos trilhos, contudo, quando o agente acaba incitando a ira de Owen Davian (Philip Seymour Hoffman), um comerciante do mercado negro que rapta a mulher de Hunt e que promete devolvê-la se, em quarenta e oito horas, o espião conseguir adquirir algo apenas conhecido como o Pé de Coelho. Ethan, portanto, deve partir nessa pessoal corrida contra o tempo a fim de resgatar sua amada.
Algo muito interessante da estrutura desenvolvida na obra é a forma como seu roteiro é fragmentado em atos bastante claros, muito nos lembrando a narrativa de uma série de TV. Vale lembrar que esse se trata do primeiro longa-metragem de J.J. Abrams e seria apenas natural que sua experiência em séries como Lost e Alias acabasse influenciando sua empreitada. O que efetivamente nos surpreende, porém, é a forma como não há constantes quebras de ritmo ou imersão dentro desse texto dividido, de forma que um ponto, invariavelmente, acaba puxando o outro e criando uma linha narrativa que oscila constantemente entre a calma e a agitação, criando uma ação de, literalmente, tirar o fôlego do espectador.
Para essa construção, o diretor/ roteirista bebe diretamente do material que veio antes – tanto filme quanto série – e escolhe a dedo o melhor para compor sua produção. Enquanto temos a presença de intrincadas operações, sendo o ápice a infiltração no Vaticano – uma sequência magistralmente conduzida, que certamente colocará sorrisos no rosto de qualquer um -, também temos o teor explosivo visto em Missão: Impossível 2, felizmente sem a irritante presença do slow motion que tanto atormentou Ethan Hunt no anterior. Abrams sabe conduzir a tensão em seu longa em todas essas diferentes frontes, utilizando clássico macguffin, o Pé de Coelho, para costurar os diferentes capítulos dessa história.
A eficiência dessa fórmula, naturalmente, deve muito a Philip Seymour Hoffman, que rivaliza Jon Voight como vilão mais memorável da franquia. Hoffman, que recentemente ganhara seu Oscar de melhor ator principal por Capote traz toda sua experiência dramática para o papel de Owen Davian, um personagem que é cuidadosamente construído pelo roteiro e que, no fim, consegue gerar uma evidente tensão no espectador. Ele exala poder, algo perfeitamente exemplificado pelo diálogo no avião: mesmo em uma posição de completa impotência, Davian consegue provocar medo em nós e sabemos que, de alguma forma, ele conseguirá escapar. Aqui, portanto, entramos no único aspecto que considero um grande deslize do filme, seu fim. Enquanto todas as sequências são bem resolvidas e amarradas o fim do personagem de Hoffman é simplório demais, quase um recurso colocado às pressas no roteiro, que fora tão bem desenvolvido até então.
Antes de terminar, gostaria de trazer um ponto para o palco. Estamos falando de um filme lançado no mesmo ano (poucos meses antes) de Cassino Royale, que redefiniria a franquia 007 para um tom mais sério e até mesmo mais realista por assim dizer. Comparar ambas as séries, contudo, certamente foge do ideal e o mesmo vale para Bourne. Temos diferentes objetivos em cada uma delas e isso garante identidade a cada uma. Missão: Impossível procura nos oferecer criativas operações com situações, digamos, impossíveis.
Missão Impossível 3 pode não trazer um momento em específico tão icônico quanto a do suor no primeiro filme, mas conta com uma estrutura narrativa de tirar o fôlego que o torna simplesmente memorável. Uma mistura quase perfeita dos antigos filmes de ação com os novos, trata-se de uma obra que nos faz enxergar o por que adoramos Missão: Impossível e onde reside a originalidade que o diferencia das outras franquias de filmes de espião. Ethan Hunt não é apenas mais um James Bond.
Missão: Impossível 3 (Mission: Impossible III, EUA - 2006)
Direção: J.J. Abrams
Roteiro: Alex Kurtzman, Roberto Orci e J.J. Abrams, baseado na série de TV de Bruce Geller
Elenco: Tom Cruise, Philip Seymour Hoffman, Ving Rhames, Billy Crudup, Michelle Monaghan, Jonathan Rhys Meyers, Keri Russell, Maggie Q, Simon Pegg, Eddie Marsan, Laurence Fishburne
Duração: 126 min
https://www.youtube.com/watch?v=rl2bysiyltg
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Crítica | Missão: Impossível 2 - Os exageros de John Woo
Quatro anos após a estreia de Missão: Impossível, sua sequência atinge os cinemas e já logo nos pôsteres conseguimos enxergar o caráter que a obra assumiria: explosivo. Não se trata de um total abandono das raízes do primeiro filme, que, por sua vez, herdou diretamente da série sessentista, mas sim uma mescla dos elementos que fizeram do antecessor um clássico moderno com as típicas características que observamos na grande maioria dos filmes de ação modernos. Um olhar externo facilmente poderia confundir Missão: Impossível 2 com um dos filmes de 007 da era Pierce Brosnan, felizmente com um grau de qualidade levemente superior.
A sequência inicial já introduz a problemática central da trama: Quimera, um terrível vírus criado em laboratório é roubado das mãos de seu criador, junto da cura, Belerofonte. Dito isso, Ethan Hunt (Tom Cruise) é tirado de suas férias pela MIF e colocado em um busca de Ambrose (Dougray Scott), principal suspeito do roubo em questão – ainda que tenhamos certeza disso desde os primeiros minutos do longa. Para completar seu objetivo, Hunt deve contar com a ajuda de dois membros da equipe escolhidos por ele e de Nyah (Thandie Newton), antiga namorada de Ambrose e por quem começa a ter sentimentos amorosos.
Já que falamos do romance presente na obra, irei utilizá-lo para exemplificar todos os nítidos problemas no roteiro que permeiam todo o longa. Simplesmente jogado na tela, a relação entre Nyah e Ethan não passa por qualquer evolução, sendo estabelecida no roteiro em dois diferentes estágios: primeiro encontro e paixão adolescente. De uma hora para a outra Hunt se vê perdidamente apaixonado pela ladra e tal característica perpetua pelo restante da projeção. Em ponto algum a personagem feminina é construída e somente existe em função de suas contrapartes masculinas. A influência de James Bond aqui é óbvia, ao passo que a garota funciona como uma equivalente de Bond Girl, noção apenas que se expande em virtude da ausência de sequer uma menção a ela no terceiro filme.
Os problemas na construção desse relacionamento, como dito anteriormente, podem também ser observados no desenvolvimento do restante da trama, que pede muito do espectador um olhar menos aprofundado. Prova disso é a maneira completamente “brega” como os diálogos são construídos – ora super dramáticos (especialmente no romance), ora composto unicamente de one-liners. Um evidente exemplo da falta de cuidado dos roteiristas é a forma como Ambrose parece atuar sem qualquer represália. Sim, temos Hunt em seu encalço, mas não há motivo algum pelo qual o antagonista não poderia ser apreendido mais facilmente, por um número maior de agentes ou até mesmo pelas autoridades locais, visto que já adquiriram provas contundentes de seus crimes. O ápice desse descuido do roteiro se apresenta já na segunda metade do longa, quando, em um tiroteio dentro de um laboratório, nenhum segurança parece ter sido ativado, algo que só ocorre quando uma bomba estoura lá dentro.
Observa-se, portanto, que a inteligência do primeiro filme foi abandonada, dando seu lugar a uma ação genérica. Felizmente a alma de Missão: Impossível se mantém através das decepções que vemos ao longo da projeção, as clássicas máscaras estão mais presentes que nunca e jamais deixam de trazer uma bem-vinda dose do inesperado para o texto. Lembro-me claramente de, quando ainda criança, ficar grandemente confundido por tais reviravoltas e o efeito, se desatentos, pode permanecer ainda, mas trata-se de um fator que apenas eleva o longa.
Esse aspecto, porém, não consegue tirar nosso pesado olhar da montagem de Steven Kemper e Christian Wagner, claramente comandados pelo diretor John Woo, que já é conhecido por utilizar uma quantidade desconfortável de vezes o slow motion a fim de criar uma ação dramática mais efetiva, mas que consegue apenas irritar o espectador. Estamos falando, é claro, de uma obra que foi lançada apenas um ano após Matrix (que faz um uso preciso do recurso em questão) e é apenas natural que o sucesso da obra-prima das irmãs Wachowski tenha influenciado os filmes de ação subsequentes. Curiosamente tal escolha apenas prejudica nossa percepção da fotografia de Jeffrey L. Kimball – responsável pelo clássico Top Gun – que, naturalmente está longe de ser uma obra de arte, mas que sabe ampliar a ação dentro de cada sequência moldando a tensão no espectador com movimentos constantes que, em ponto algum, nos deixam confusos.
O que a montagem falha, contudo, a trilha de Hans Zimmer não deixa a desejar. Da fantástica variação mais rock da música tema – criada por Lalo Schifrin para a série original – até o tema de Ambrose, Zimmer consegue perfeitamente ampliar o que está na tela, criando um nítido diálogo entre imagem e som. Mesmo a primeira aparição de Hunt na obra é acompanhada por uma escolha musical mais descontraída, como se o músico dissesse que não devemos levar o filme assim tão a sério, criando uma suspensão de descrença necessária na audiência.
No fim, Missão: Impossível 2 se trata de um simples divertimento, um típico “sessão da tarde” que pede um olhar menos aprofundado do espectador, ao passo que, claramente, não conta com o grau de qualidade de seu anterior. Por mais que mantenha aspectos-chave da série original, é um iflme genérico de ação, constituindo facilmente a entrada mais fraca da franquia.
Missão: Impossível 2 (Mission: Impossible II – EUA, 2000)
Direção: John Woo
Roteiro: Robert Towne, baseado na série de TV de Bruce Geller
Elenco: Tom Cruise, Dougray Scott, Thandie Newton, Ving Rhames, Richard Roxburgh, John Polson, Brendan Gleeson, Anthony Hopkins
Gênero: Ação, Aventura
Duração: 123 min
https://www.youtube.com/watch?v=vIpqpRuGrq4
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Review | Metroid: Zero Mission - Uma Aula de como se fazer um remake
A partir de meados da geração passada de videogames (PS3, Xbox 360 e Wii/ Wii U) a indústria passou a ser assolada por versões HD de clássicos dos consoles anteriores. A cada novo título, inúmeras outras remasterizações são lançadas, síndrome essa que, também, afeta Hollywood. O problema dessa manobra não está em tornar acessível determinados títulos para aqueles que se livraram dos antigos videogames e sim na falta de inovação dessas obras, que não passam de velhos jogos com leves melhorias nos seus filtros – os gráficos ou até a jogabilidade não é alterada de maneira alguma, chegando ao absurdo de jogos já disponíveis digitalmente ganharem versões “HD” com pouquíssimas diferenças, revelando, pois, a estratégia de marketing das desenvolvedoras em meramente relançar seu produto.
Voltemos um pouco no tempo, para 2004, e contemplemos um remake de verdade, que deveria servir como base para todas as remasterizações (sim, são coisas diferentes, mas ambas deveriam seguir a mesma “receita”). Refiro-me a Metroid: Zero Mission, uma obra que não apenas recria, em gráficos atualizados, todo o Metroid original, como introduz novos elementos, áreas a serem exploradas e história, surpreendentemente superando o primeiro da franquia em todos os sentidos possíveis, não desconsiderando sua importância histórica, claro.
Em essência, o jogo, lançado originalmente para Gameboy Advance, atualmente disponível no Virtual Console do Wii U, traz a mesma trama do primeiríssimo da série, com adições de cutscenes e narração em texto a fim de melhor encaixar tal obra com suas muitas sequências. A caçadora de recompensas, Samus Aran, é enviada para o planeta Zebes para destruir Mother Brain, líder dos Piratas Espaciais e acabar com todos os metroids do local. Após uma breve sequência da aterrissagem da nave, começamos o jogo exatamente da mesma forma que o original, conseguindo, inclusive, a primeira melhoria, a morph ball, logo nessa sala inicial.
Em termos de gameplay, Zero Mission funciona da mesma maneira que o primeiro Metroid: devemos percorrer o extenso mapa de Zebes, dividido em diversas áreas específicas, em crescente grau de dificuldade, adquirindo melhorias da armadura que garantem novas habilidades e permitem acesso a novos lugares. O game, porém, não se mantém no óbvio, apenas atualizando os gráficos, ele utiliza diversos dos elementos icônicos introduzidos ao longo da história da franquia, além de possibilitar movimentos antes inexistentes no jogo original. Em razão disso, mesmo que essa seja a primeira aventura de Samus, sentimos como se estivéssemos jogando a fórmula de Metroid no seu auge, com direito a toda a evolução pela qual a franquia passou desde 1986.
É importante notar, porém, como essas mudanças são feitas de tal forma a não comprometer a atmosfera do jogo base. A sensação de solidão, tão presente naquele, retorna em Zero Mission, mesclado com uma certa empolgação por estarmos vendo o mesmo game, apenas melhorado. Aliás, não podemos deixar de falar sobre a trilha sonora, toda composta pelas músicas originais (com algumas adições para os trechos inéditos) – essas icônicas e inesquecíveis melodias certamente afetam a experiência de maneira significativa, de tal maneira que nos sentimos compelidos a jogar com fones de ouvido para melhor escutar tais faixas, as quais perfeitamente se encaixam com a narrativa do jogo.
Em termos gráficos, a obra não deixa nem um pouco a desejar, fazendo bom uso de desenhos em 2D, mesclados com os sprites do jogo, garantindo, assim, chefes perfeitamente detalhados, inimigos com características próprias facilmente identificáveis e, é claro, uma protagonista cujos movimentos dialogam diretamente com a fluidez da jogabilidade, essa que, jamais, nos deixa na mão, funcionando de maneira intuitiva, simples e funcional. Vale lembrar que as mecânicas demonstradas aqui são fruto de avanços das prévias entradas da série, desde Metroid II: Return of Samus, passando por Super Metroid, até o excelente Fusion.
O único verdadeiro “porém” dessa obra é a sua duração. O Metroid original se tornou um favorito dentre os speedrunners, com jogadores chegando a zerar o jogo em aproximados quinze minutos – fator que é incentivado pela presença de diferentes finais, determinados pelo tempo gasto para chegar até o final da história. A intenção da Nintendo nesse remake é claramente a de manter esse espírito vivo, fazendo de Zero Mission um game consideravelmente curto para os padrões atuais (eu, por exemplo, terminei o jogo com 57% em mais ou menos três horas). Isso pode desmotivar alguns jogadores e, sim, mais conteúdo poderia ter sido adicionado, mas a essência da franquia está tanto no seu valor de replay quanto na exploração – garantir os 100% certamente irá custar algumas horas, contrabalanceando a curta duração da história, que, aliás, chega a ser expandida com um ato adicional após a derrota de Mother Brain.
Mesmo com essa característica em mente, fica difícil não enxergar Metroid: Zero Mission como uma obra que beira a perfeição, uma verdadeira aula de como se fazer um remake, dando um verdadeiro “tapa na cara” das desenvolvedoras que apenas pegam o mesmo jogo, colocam um filtro e vendem como versão HD. Capturando toda a essência da primeira entrada da franquia, adicionando elementos de destaque, frutos da evolução dessa série, o game não apenas supera o original, como demonstra ser a versão definitiva da primeira missão de Samus Aran.
Metroid: Zero Mission
Desenvolvedora: Nintendo
Lançamento: 9 de fevereiro de 2004
Gênero: Ação, aventura, plataforma
Disponível para: Gameboy Advance, Virtual Console
Crítica | Liga da Justiça: Guerra - Entretenimento barato e sem profundidade
Os longas-metragens animados da DC Comics podem ser divididos em antes e depois de Liga da Justiça: Guerra. Tal obra redefiniu o foco da editora quando se trata de suas animações lançadas direto para vídeo, funcionando como marco inicial de um novo universo compartilhado, com uma série de filmes baseados em histórias dos Novos 52. Esse primeiro adapta, portanto, o primeiro arco da Liga dessa fase dos quadrinhos, Origem, mantendo-se, em geral, bastante fiel, com algumas notáveis e pontuais alterações, que, de fato, não mudam o rumo da história em nada – como a troca do Aquaman por Shazam.
O problema de adaptar justamente essa história de surgimento da Liga é que ela não fora feita pensando especialmente em novos leitores, já mostrando os heróis mais ou menos estabelecidos, não oferecendo qualquer olhar sobre seu passado – ironicamente, o único que menciona sua motivação é Batman, cuja história todos que não vivam em uma caverna já conhecem. Para o leigo, portanto, iniciar a jornada pelo universo dos super-heróis através desse longa, será uma tarefa complicada, visto que se faz necessário conhecimento prévio sobre a origem de todos os super-heróis dali, além, é claro, dos poderes de cada um – no caso do Batman, Flash, Mulher-Maravilha e Superman, a maioria já saberá mais ou menos, mas quando se trata dos outros três integrantes mostrados nesse filme, o cenário pode ser diferente.
Outro aspecto que não faz essa história ser a ideal para um recomeço de universo, é que basicamente não há sequer um pingo de profundidade no enredo, que basicamente se resume a uma invasão alienígena genérica, com direito a vilão super-poderoso. A ameaça de Darkseid, ao menos, é bem estabelecida, já que, desde cedo, testemunhamos a extensão de suas habilidades. Por outro lado, ironicamente, enquanto peca pela exagerada simplicidade, o roteiro de Heath Corson insere as caixas maternas em sua trama, sem sequer explicar exatamente o que elas fazem, ou como funcionam, deixando qualquer um sem o conhecimento prévio sobre tais elementos completamente perdido.
Nenhuma surpresa, pois, constatar que Guerra pode ser resumido como uma sucessão de batalhas, muitas sem qualquer peso dramático, visto que as legiões de Darkseid continuam aparecendo, independente de quantos inimigos os membros da Liga derrubem. Felizmente, a animação funciona de maneira bastante fluida nas sequências de ação e Jay Oliva, na direção, em geral, permite que acompanhemos tais lutas sem nos perder, salvo em uma ocasião ou outra, que peca por enquadramentos muito fechados. Dito isso, se tudo o que você espera é uma boa dose de pancadaria por parte dos heróis, então esse será um prato cheio.
Mesmo assim, fica difícil, até para o espectador menos exigente, deixar de lado o traço assombroso desse desenho. Claramente digital tudo parece poligonal nesse desenho, como se as linhas efetivamente tivessem sido encaixadas umas nas outras, quebrando qualquer organicidade do traço. Chega ao ponto que, em determinados momentos, percebemos os personagens como um amontoado de camadas digitais, dando certo ar de ridículo para a animação. Não ajuda, também, o fato da movimentação desses indivíduos parecer extremamente travada nas sequências sem ação, evidenciando a animação parcial empregada, de maneira desconfortável ao olhar.
Dessa forma, Liga da Justiça: Guerra configura-se como entretenimento barato. Sem qualquer profundidade com traço genérico, pouco inspirado, esse desenho exige muito conhecimento prévio do espectador sem, de fato, acrescentar em nada. Trata-se da básica luta do bem contra o mal, representada através de uma invasão alienígena para lá de genérica, que proporciona algumas boas sequências de ação, mas, como um todo, acaba sendo completamente esquecível. Um primeiro passo na direção errada para esse novo universo das animações da DC Comics.
Liga da Justiça: Guerra (Justice League: War, EUA - 2014)
Direção: Jay Oliva
Roteiro: Heath Corson, baseado nos personagens da DC Comics
Elenco: Sean Astin, Zach Callison, Christopher Gorham, Justin Kirk, Michelle Monaghan, Shemar Moore, Jason O’Mara, Alan Tudyk, Steve Blum, Dee Bradley Baker
Gênero: Aventura, Ação
Duração: 79 min.
https://www.youtube.com/watch?v=q3F9ASSsHUk
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Crítica | A Liga da Justiça e os Jovens Titãs - Uma das Melhores animações da DC
Os Jovens Titãs esbanjaram um surto de popularidade quando, no início dos anos 2000, a série animada com os personagens estreou. No entanto, desde o término do seriado em 2007, o grupo ficou ausente das animações da DC, até 2013, quando uma versão mais cartunesca, Os Jovens Titãs em Ação! (Teen Titans Go!), chegou às telinhas – no DC Animated Universe nem sinal deles, porém. Isso mudou em 2016, com o lançamento de A Liga da Justiça e os Jovens Titãs, cujo título deveria ser ao contrário, visto que a Liga permanece em segundo plano, sendo essa uma aventura protagonizada pelos Titãs.
Como de costume, a história tem início com um embate genérico entre a Liga e a Legião do Mal, prólogo que, de fato, poderia ser cortado sem cerimônia, o que não impactaria a trama geral em absolutamente nada. A problemática central inicia quando Superman é dominado por um estranho espectro, que, posteriormente, descobrimos ser da dimensão do pai de Ravena, Trigon. A intenção desse ser é justamente trazer à Terra Trigon, que visa conquistar o planeta. Enquanto isso, Damian Wayne, o novo Robin, é enviado para QG dos Jovens Titãs a fim de aprender a trabalhar em equipe. Depois de alguns conflitos iniciais, eles se juntam para derrotar a ameaça, tudo enquanto Ravena precisa lidar com seu passado.
Embora A Liga da Justiça e os Jovens Titãs conte com sua boa dose de ação – com muitas sequências longas demais e outras inteiramente dispensáveis – o roteiro claramente se preocupa em construir alguns de seus personagens. Damian e Ravena claramente ocupam o palco central, tendo não só suas personalidades desenvolvidas, como sua própria relação – em relação um ao outro e ao restante dos Titãs. Estelar, Mutano e o Besouro assim permanecem no raso, mas, ao menos, existe química entre eles, algo que vai crescendo quando se trata do jovem Wayne, enquanto a narrativa progride.
Dessa forma, passamos a nos importar com esses personagens, por mais que sejam inéditos no DC Animated Universe – mesmo aqueles que não assistiram o ótimo desenho dos Jovens Titãs certamente aprenderão a gostar desse pequeno grupo de heróis mirins (à exceção de Estelar, que já é mais crescida aqui, atuando como líder e instrutora da equipe). Já os que acompanharam a animação dos anos 2000 notarão a similaridade no tom e sentirão familiaridade com a interação entre tais heróis, por mais que a atmosfera estabelecida aqui seja um pouco mais madura que a vista na série animada.
O traço, naturalmente, segue o mesmo estilo das animações passadas do DCAU desde Liga da Justiça: Guerra, com um visual bem pasteurizado. Esse ponto tira muito da alma da animação, fazendo-a parecer como fruto de uma grande linha de produção homogênea, mas, ao menos, houve uma nítida melhoria desde a citada animação da Liga. Problemas como a movimentação travada dos personagens continuam, mas as sequências de ação são bem conduzidas, com lutas realmente engajantes, que permitem que acompanhemos os personagens sem tudo soar extremamente confuso, fruto, claro, da direção de Sam Liu, que já trabalhara em inúmeros outros projetos da DC, como Crise em Duas Terras, The Batman e Liga da Justiça: Deuses e Monstros.
Os problemas do traço genérico utilizado nessas animações, portanto, não são capazes de esconder as muitas qualidades de A Liga da Justiça e os Jovens Titãs, que, apesar das inúmeras sequências longas ou desnecessárias de ação, consegue desenvolver apropriadamente seus personagens, fazendo com que nos importemos com cada um deles. Felizmente, pouco depois, ganhamos outra animação do grupo em forma de longa-metragem, Jovens Titãs: O Contrato de Judas.
A Liga da Justiça e os Jovens Titãs (Justice League vs. Teen Titans, EUA - 2016)
Direção: Sam Liu
Roteiro: Bryan Q. Miller e Alan Burnett, baseado nos personagens da DC Comics
Elenco: Rosario Dawson, Christopher Gorham, Shemar Moore, Jerry O’Connell, Jason O’Mara, Stuart Allan, Jake T. Austin, Taissa Farmiga, Sean Maher, Brandon Soo Hoo, Kari Wahlgren, Jon Bernthal, Laura Bailey
Gênero: Aventura, Ação
Duração: 78 min
https://www.youtube.com/watch?v=dFjg3oNxaJ4
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