Crítica | Pisque Duas Vezes reduz crítica social a entretenimento descompromissado

Crítica | Pisque Duas Vezes reduz crítica social a entretenimento descompromissado

Zoë Kravitz junta-se em 2024 ao seleto grupo de atrizes famosas que viraram diretoras nos últimos anos, como Olivia Wilde, Elizabeth Banks e Greta Gerwig. Seu novo filme, “Pisque Duas Vezes”, revisita alguns clássicos e outros sucessos recentes (veja no final do texto) para mexer com temas quentes do noticiário, paranoia e cinema de gênero, com um resultado provocativo, mas irregular.

Na trama, Frida (interpretada por uma Naomi Ackie muitos tons acima do necessário) é uma garçonete que cai nas graças do bilionário Slater (Channing Tatum, ator de uma fisionomia só) e é convidada para passar uma temporada em sua ilha particular. Frida viaja acompanhada pela amiga Jess (Alia Shawkat, que rivaliza com Naomi no histrionismo) e começa a conviver com um grupo de mulheres e outros desocupados privilegiados. Aos poucos, a garçonete passa a desconfiar que a rotina dos visitantes não é exatamente o que parece e briga com a própria memória para tentar entender o que está acontecendo.

Não demora muito para o espectador se dar conta de que os temores de Frida são fundados e algo de muito errado acontece naquela ilha. Kravitz tenta construir suspense, mas esbarra na própria abordagem maneirista das cenas (o excesso de planos fechados que resume a narração a uma sucessão de rostos, ombros e nucas, não aproveita o espaço nem permite que os atores “respirem” na tela, um cacoete da geração de cineastas formada assistindo a vídeos nas telas de celular), o que por sua vez obriga a edição a exagerar nos cortes e efeitos sonoros para construir “tensão”. Este é o ponto fraco do filme.

Kravitz: provocar sem aborrecer nem se aprofundar

Por outro lado, quando se assume como crônica social, o filme mostra ser provocativo ao limite, expondo uma realidade que hoje é conhecida do noticiário policial e que faz referência a uma famosa “ilha da fantasia” bizarra para onde celebridades e políticos costumavam se dirigir, em busca de diversão descompromissada (e muitas vezes, abusiva) com garotas de pouca idade.

Como sutileza não é o forte nem do roteiro (da própria Kravitz e de E.T. Feigenbaum, oriundo da TV), nem de Naomi Ackie, o filme irá transitar durante uma hora e meia entre a espera pela “revelação” do mistério e a atmosfera satírica do grupo de amigos, no qual os personagens masculinos reduzem-se aos estereótipos esperados (o bonitão lacônico, o tiozinho beberrão, o gordinho atrapalhado, o adolescente sem nada na cabeça, o ex-militar de cara fechada, etc.). Ao optar pela caricatura, o filme perde a oportunidade de realmente discutir a “questão social” sobre a qual quer se debruçar, e o que sobra é pouco mais que pantomima e correria. O destaque fica por conta de Adria Arjona, capaz de ser ambígua e divertida em cena sem parecer que vai começar a cantar a qualquer momento (como a dupla de protagonistas).

Por mais que se admire a recente onda de mulheres na direção, é sempre bom lembrar que a aventura feminina na realização não começou com a atual geração de cineastas-celebridades, constituindo uma longa e gloriosa jornada que remete não só a diretoras (como Ida Lupino, Agnès Varda, Chantal Akerman, Lina Wertmüller, Nora Ephron, Kathryn Bigelow, Liliana Cavani, Jane Campion, Barbra Streisand, Nadine Labaki, etc.) como a produtoras igualmente importantes (desde a pioneira Mary Pickford até Kathleen Kennedy, Debra Hill, Gale Anne Hurd e tantas outras). Isso sem contar uma infinidade de profissionais atuantes em outras funções, como roteiristas, figurinistas, montadoras e diretoras de arte. É impossível falar da história do cinema sem lembrar nomes como de Milena Canonero, Thelma Schoonmaker, Verna Fields, Polly Platt e por aí vai…

Como toda obra de arte “engajada”, “Pisque Duas Vezes” precisa se equilibrar entre os temas nos quais tem interesse (notadamente “esquecimento” e “perdão”, a relação entre homens e mulheres, mas também relações de poder econômico e luta de classes) e outros que seriam igualmente relevantes, mas que o filme precisa deixar de lado para não se perder no enredo (por exemplo, por que motivo os “nativos” da ilha comunicam-se apenas por balbucios ou expressões faciais, como se não dominassem idioma algum). “Engajamento” tem limite, né, Zoë?

No final das contas, a estreia da filha de Lenny Kravitz mostra-se um entretenimento descompromissado, que toca superficialmente temas delicados do convívio social sem se aprofundar. Não ofende nem aborrece, mas será facilmente esquecido. 

Referências a um clássico e outros filmes recentes

No parágrafo seguinte, não haverá nenhuma revelação a respeito da trama, mas sim referência a outros filmes que influenciaram “Pisque Duas Vezes” e que, por isso, poderão dar spoilers indiretos. Se você não quer saber absolutamente nada sobre o enredo, pare de ler agora.

Como praticamente todo novo filme desde os primórdios é um jogo de espelho com filmes anteriores, aqui não seria diferente. Kravitz divide com Olivia Wilde (em “Não Se Preocupe, Querida”) uma referência comum no clássico dos anos 1970 “As Esposas de Stepford”, misturando um pouco a misandria do best-seller de Ira Levin com o clima “Twilight Zone” de Jordan Peele no brilhante “Corra!”. Além dessas duas referências, “Pisque Duas Vezes” mistura elementos já vistos em filmes como “O Círculo” (2017) e “Piscina Infinita” (2023), sendo mais provocativo e original que o primeiro, mas menos apelativo que o segundo. Se você ainda não entendeu a qual “ilha real” a “ilha fictícia” remete, procure por “Jeffrey Epstein” no noticiário policial.

A ironia final fica por conta da trilha musical (excelente, por sinal), que inclui ao menos duas canções de James Brown, não conhecido exatamente por sua correção no trato com mulheres. Kravitz não sabia disso, não deu importância ou quis ser novamente provocativa?


As noticias do seu site não geram um previews quando vou postar elas no grupo '-'

Crítica | Longlegs: Vínculo Mortal tenta ser um clássico, mas só é bom

Há algumas maneiras de diferenciar "suspense", "mistério" e "horror" dentro do cinema e não há consenso quanto a elas. Hitchcock brincava que suspense é quando o espectador sabe mais que os personagens e mistério quando ele sabe menos. Podemos jogar com o mestre da Hollywood clássica e ampliar seu conceito: suspense é uma "bomba" debaixo da mesa, horror é uma bomba em cima da mesa e mistério é não saber se aquilo é realmente uma bomba, quem colocou a bomba ali, etc.

Osgood Perkins (filho do lendário ator Anthony Perkins, do "Psicose" de Hitchcock, por acaso), diretor e roteirista de "Longlegs: Vínculo Mortal", um dos títulos mais esperados do ano, conhece um pouco de cada conceito e parece acima de tudo um estudante aplicado. Em seu filme anterior, "Maria e João: O Conto das Bruxas" (2020), exercitou sobretudo suas proezas visuais (a ponto de servir de clara inspiração para Alex Garland em seu "Men: Faces do Medo" (2022), ambos contos de fadas perversos e que possibilitam leituras contemporâneas com o pano de fundo da "floresta encantada" das histórias infantis).

https://www.youtube.com/watch?v=OG7wOTE8NhE

Em "Vínculo Mortal', Perkins procura dar equilíbrio a um material que vai oscilar durante a metragem entre o suspense (que ele trabalha bem), o horror (que é sutil, presente sem apelar ao histrionismo que tanto contamina o gênero atualmente) e o mistério - e é aqui onde ele encontrar'as maiores dificuldades.

Na trama, a agente do FBI Lee Harker (interpretada por uma Maika Monroe que passa o filme inteiro atônita) é uma recruta com poderes aparentemente sensitivos designada para investigar um caso não resolvido de um serial killer que assina seus crimes como "Longlegs" - isso em algum lugar do noroeste dos Estados Unidos durante o governo de Bill Clinton. À medida que ela segue as pistas, descobre conexões com práticas ocultas e se vê pessoalmente envolvida na caçada ao assassino.

Perkins assina também o roteiro, o que lhe possibilita prestar verdadeiro tributo a ao menos três clássicos definitivos do subgênero de "serial killers": a referência mais evidente e que ele explorá à exaustão (na protagonista que tem traumas infantis, na sua relação com um mentor no FBI, em sua sexualidade amorfa, etc.) é a de "O Silêncio dos Inocentes" (1991). Mas estão ali também "Zodíaco" (2007), presente nas cartas codificadas pelo assassino e "Se7en - Os Sete Crimes Capitais" (1995), especialmente em um ponto específico e culminante do enredo que não se pode revelar aqui.

É certo que "fazer referências" tornou-se de 20 anos para cá um tiro meio certeiro que os cineastas podem disparar e também um mecanismo de proteção diante da cinefilia militante - como se a cada nova referência a um filme famoso do passado, o diretor do novo filme dissesse "Veja, eu também sou cinéfilo, eu também reverencio os mesmos filmes que você!".

Perkins, entretanto, filma com rara consistência e o tributo que presta é de um admirador estudioso e aplicado. Ao usar diversas vezes o recurso de centralizar a protagonista no quadro, por exemplo (uma característica que remete diretamente a Jodie Foster filmada por Jonathan Demme), ele demonstra compreender e dominar os recursos de narração que a linguagem cinematográfica possibilita, no jogo de olhares e ponto de vista, na imersão espacial do espectador nas cenas, nas rimas internas (que ele faz, por exemplo, ao repetir o padrão de quadro com alguns personagens e dispensar outros, e mais não se pode revelar porque se entregaria aqui informação da trama...). Há um cineasta de verdade por trás de "Vínculo Mortal", e não um cabotino implorando por atenção.

O esmero formal é certamente um dos maiores acertos aqui: o trabalho de câmera é excepcional, a iluminação é elaborada e extremamente sugestiva, a edição de som é um elemento vivo dentro do espetáculo, a música é perturbadora e ajuda a carregar as cores da jornada infernal de Lee Harker.

A partir de então, as qualidades do filme sofrem uma reviravolta e precisamos entender o que aconteceu para que o filme chegasse aonde chegou.

Longlegs quer ser um hit cult

É curioso notar como "Vínculo Mortal" tem pretensões de se equiparar ao nível dos melhores filmes de serial killer já feitos e o realizador não faz questão de esconder tal objetivo. A pretensão em si não é exatamente um problema, mas a dificuldade de entregar aquilo a que se propõe talvez seja. E uma das explicações para que este objetivo não seja atingido pode estar exatamente em suas fontes de referência.

Há uma diferença aparentemente banal, mas fundamental, entre o filme de Perkins e suas três maiores referências. "O Silêncio dos Inocentes" parte do best-seller de Thomas Harris na poderosa adaptação do roteirista Ted Tally e, embora Demme tenha feito cortes sutis na versão final, sua participação termina por aí. "Zodíaco" por sua vez é a versão cinematográfica de uma célebre história real, também parte de um best-seller de não-ficção (de Robert Graysmith) e foi roteirizado por James Vanderbilt. Finalmente, "Se7en" é um roteiro original de Andrew Kevin WAlker e até hoje de longe seu melhor trabalho.

Ou seja: o material dramático com que os três diretores trabalharam para criar suas obras-primas (e não é exagero usar tal expressão em nenhum dos três casos) tem de longe muito mais consistência que o roteiro próprio que o diretor filmou em "Vínculo Mortal". A história do cinema tem notáveis casos de gênios diretores que nunca foram exatamente roteiristas (pode-se citar Kubrick, Spielberg e Hitchcock para encurtar a conversa aqui). Há também brilhantes diretores-roteiristas (como Woody Allen, Tarantino, Fellini, Godard...), muito à vontade para levar às telas seu próprio texto. Mas não parece ser este último o caso de Osgood Perkins porque a grande fraqueza e a impossibilidade pela qual seu filme não atinge o mesmo nível das obras que o inspiraram é o roteiro, exatamente onde residem suas maiores fraquezas.

Não se pode aqui dar muitos detalhes a respeito da trama, uma vez que o "mistério" é parte importante de "Vínculo Mortal". Mas é sua parte mais fraca. A contrário do filme de Jonathan Demme, por exemplo, que quando observado em retrospectiva, tem uma trama muito simples, embora sofisticada na condução e nos temas, o roteiro de Perkins funciona como um quebra-cabeça complexo, excessivamente "enigmático", que quando completado revela uma imagem não exatamente "surpreendente", mas antes disso deslocada do conjunto.

O que se descobre finalmente - e tal descoberta envolve atabalhoadamente o "vilão ocultado", interpretado por um Nicolas Cage que parece o Bufallo Bill antagonista de Jodie Foster se este fosse interpretado por Mickey Rourke - de alguma maneira não encaixa com o que se assistiu antes com apreensão e curiosidade. No final, o espectador é conduzido por Perkins a um pesadelo que se inicia no grande cinema praticado nos anos 1990 (e está lá sua fonte de inspiração), mas despertado na banalidade solene, algo "litúrgica", dos mais repetitivos exemplares atuais do gênero.

Não é preciso muito esforço para se dar conta de que Perkins parece ser muito melhor diretor do que é roteirista (ou ao menos do roteirista que nos apresenta o decepcionante vilão Longlegs). Vamos esperar ansiosamente que seus próximos filmes encontrem um equilíbrio mais feliz entre drama e forma, sendo que esta última o cineasta já parece dominar como os mestres que admira e referencia.

Longlegs: Vínculo Mortal (Longlegs, EUA, 2024)

Direção: Osgood Perkins
Roteiro: Osgood Perkins
Elenco: Maika Monroe, Nicolas Cage, Blair Underwood
Gênero: Horror, Thriller, Crime, Mistério
Duração: 101 min


No aniversário de Alfred Hitchcock, reveja uma de suas cenas mais famosas

No aniversário de Alfred Hitchcock, reveja uma de suas cenas mais famosas

Nascido em Londres, Inglaterra, no dia 13 de agosto de 1899, Alfred Hitchcock é um dos mais celebrados diretores da história do cinema, responsável por clássicos que influenciam gerações de cineastas até hoje, tais como Janela Indiscreta, Psicose, Intriga Internacional, Os Pássaros, entre tantos outros.

Votado diversas vezes como o melhor filme já feito, Um Corpo Que cai resume o estilo de Hitchcock, que pode ser conferido na cena a seguir, onde estão presentes algumas de suas maiores qualidades: a precisão e economia dos quadros e dos movimentos de câmera, a encenação elegante, o uso das cores, a música de Bernard Hermann, a utilização dramática do cenário - enfim, o espetáculo cinematográfico completo e o tipo de conteúdo que fez do cinema a moderna "arte total".

https://youtu.be/tesqTwX7cpc?si=moHnwblvhCHkCTXH


7 melhores filmes de M. Night Shyamalan

7 melhores filmes de M. Night Shyamalan

M. Night Shyamalan é um diretor, roteirista e produtor norte-americano de origem indiana, conhecido por seu estilo único e narrativas envolventes. Ele começou sua carreira no final dos anos 1990 e rapidamente se destacou no cenário cinematográfico com seu talento para criar enredos de suspense e mistério.

Seu trabalho é frequentemente caracterizado por reviravoltas inesperadas e finais surpreendentes, o que se tornou uma marca registrada de seus filmes. Shyamalan tem uma habilidade notável para construir tensão e manter o público na ponta da cadeira, explorando temas como o sobrenatural, a fé e a fragilidade humana.

A evolução de um cineasta

Ao longo dos anos, Shyamalan enfrentou altos e baixos em sua carreira. Após um início promissor, ele experimentou uma série de projetos que não foram bem recebidos pela crítica, mas que ainda assim mantiveram um público fiel. Essa fase desafiadora não o impediu de continuar explorando novas ideias e abordagens em seus filmes.

Nos últimos anos, Shyamalan conseguiu recuperar parte do prestígio perdido, retornando às suas raízes de suspense e mistério. Ele também se aventurou na televisão, produzindo e dirigindo séries que receberam elogios por sua qualidade e inovação.

Além de seu trabalho como diretor e roteirista, Shyamalan é conhecido por sua dedicação ao cinema independente. Ele frequentemente financia seus próprios projetos, mantendo um controle criativo rigoroso sobre suas obras. Essa abordagem lhe permite experimentar e inovar, sem as restrições impostas pelos grandes estúdios de Hollywood.

Shyamalan também é um defensor da diversidade no cinema, frequentemente escalando atores de diferentes origens étnicas e culturais em seus filmes. Ele acredita que a representação é importante e que as histórias contadas no cinema devem refletir a diversidade do mundo real.

Ainda que seja mais lembrado pela originalidade como roteirista de suspense e mistério, Shyamalan é também um diretor de estilo elegante e olhar apurado, praticando um cinema que lembra o de alguns mestres de Hollywood como Woody Allen e Jonathan Demme pela precisão e economia de seu trabalho de câmera.

A seguir apresentamos uma lista com seus sete melhores filmes até 2024.

7 - Armadilha (2024): Aqui o Shyamalan roteirista dá all-in na inverossimilhança e na cooperação do público, enquanto o Shyamalan diretor usa (bem) todas as ferramentas do ofício para oferecer uma narrativa empolgante, absurda e que deixa a porta aberta para uma nova continuação.

6 - Vidro (2019): Os personagens de seus filmes anteriores encontram-se em um confronto final, explorando os limites entre realidade e fantasia. Para melhor compreensão da trama, é conveniente ver "Corpo Fechado" e "Fragmentado" antes.

5 - Fragmentado (2016): Um homem com múltiplas personalidades sequestra três adolescentes, enquanto uma de suas identidades mais perigosas começa a emergir. Está presente aqui a habitual destreza de Shyamalan em manipular os elementos do enredo de forma muito autoral.

4 - Corpo Fechado (2000): Um homem descobre que possui habilidades extraordinárias após sobreviver a um acidente de trem, explorando sua nova identidade. Esta é acima de tudo uma aula de direção de Shyamalan, repleta de cenas excepcionalmente conduzidas e dois ou três enquadramentos que deveriam estar presentes em qualquer bom curso de cinematografia.

3 - Sinais (2002): Típica família do interior norte-americano começa a encontrar misteriosos círculos nas plantações, levando-a a enfrentar uma ameaça extraterrestre. Sem precisar de muitos efeitos visuais e falsificações digitalizadas, o cineasta consegue provocar medo e manter a atmosfera de mistério até o final.

2 - O Sexto Sentido (1999): Um psicólogo infantil ajuda menino que afirma ver e falar com espíritos, levando a uma revelação surpreendente, no filme que tornou Shyamalan uma celebridade e que presta tributo a outro clássico do gênero ("O Parque Macabro", de 1962).

1 - A Vila (2004): Moradores de uma vila isolada vivem com medo de criaturas que supostamente habitam a floresta ao redor, até que segredos começam a ser revelados, naquele que é talvez o roteiro com o mais original plot twist da história do cinema.


Crítica | Armadilha mistura direção brilhante e roteiro inverossímil

Crítica | Armadilha mistura direção brilhante e roteiro inverossímil

A melhor palavra que caracteriza o cinema de M. Night Shyamalan é "invulgar": é fácil amar ou odiar seus filmes, mas dificilmente eles provocarão indiferença. E com "Armadilha", seu lançamento de 2024, não poderia ser diferente.

Na trama, Cooper (Josh Hartnett, brilhante) e sua filha adolescente (Ariel Donoghue) vão a um show de uma estrela da música pop (Saleka, filha do diretor) quando ele percebe uma presença excessiva de policiais ao redor. Rapidamente, Cooper se dá conta de que ambos estão no epicentro de uma armadilha montada para capturar um serial killer da Filadélfia apelidado de “The Butcher” (“O Açougueiro”).

Revelar mais do que isso traria spoilers inevitáveis, mas exporia também a grande deficiência do filme: para que a trama mova-se adiante como um relógio suíço, é preciso que a audiência aceite uma sucessão de eventos nem sempre críveis em conjunto. Tudo se encaixa perfeitamente para levar o filme aonde o diretor pretende. Vilões e mocinhos comportam-se de maneira irrealista, num balé de plots twists que tende à artificialidade.

Se o roteirista Shyamalan está disposto a comprometer totalmente a verossimilhança em nome do entretenimento, o diretor Shyamalan por outro lado exercita seu ofício de maneira singular. Poucos diretores na indústria ainda hoje se dispõem ao seu esforço formal e raríssimos usam o quadro tão bem. Acostumado à vulgarização contemporânea dos "planos fechados", o espectador atento irá perceber como, aqui, o close desempenha um papel dramático fundamental, servindo para intensificar os conflitos entre os personagens, por exemplo (e para que tal recurso funcione, o close não pode aparecer o tempo todo).

Mas nem só isso: Shyamalan sabe a importância de posicionar bem a câmera (outra raridade na indústria que acaba soando até como excentricidade) e é um dos poucos dispostos a filmar os atores olhando diretamente para a lente, num efeito arrebatador que é uma de suas marcas registradas. O resultado dessa decisão que, embora pareça banal, é bastante incomum, é permitir aos atores momentos de concentração e emoção crescente que normalmente perde-se em edições muitos entrecortadas (outro cacoete que Shyamalan sabiamente evita). Tal qual Jonathan Demme com o rosto de Jodie Foster em "O Silêncio dos Inocentes" e o próprio Shyamalan com o de Anya Taylor-Joy em "Fragmentado", os momentos em que a montagem se detém na expressividade comovente de Saleka Shyamalan correspondem a um ponto alto não só deste filme, mas como certamente de toda a safra de filmes de 2024. Filmar rostos é uma arte para poucos e Shyamalan é um deles.

Quem aprecia o trabalho do cineasta encontrará em "Armadilha" os elementos de sempre que parecem contribuir para  seu prestígio duradouro dentro da indústria: roteiro elaborado e original, vilões marcantes e mocinhos(as) que provocam identificação imediata, sua generosidade com o trabalhos dos atores, além da direção elegante e do excepcional trabalho de câmera. Quem, por outro lado, irrita-se com seu estilo, com a confiança demasiada nas tramas, as reviravoltas vertiginosas e o imaginário cartunesco, quase infantilizado, também encontrará motivos para reclamar. A impressão que fica é que seu talento é também uma armadilha da qual ele talvez sequer esteja interessado em escapar, mas se optasse por uma narrativa menos rocambolesca - quem sabe - seus filmes seriam ainda melhores. Ou ao menos mais verossímeis e - portanto - mais adultos.

Armadillha (EUA, 2024)

Direção: M. Night Shyamalan
Roteiro: M. Night Shyamalan
Elenco: Josh Hartnett, Ariel Donoghue, Saleka Shyamalan
Gênero:  Mistério, Crime, Suspense, Horror
Duração: 105 min


Os Melhores Filmes com Shelley Duvall

Os Melhores Filmes com Shelley Duvall

Atriz incomum, de uma beleza exótica, raro talento e brilho inconfundível na tela, Shelley Duvall nasceu no Texas em 7 de julho de 1949 e nos deixou hoje (11/07). Nos últimos anos, tinha estado um pouco afastada do cinema, mas seus principais filmes figuram em qualquer lista séria de produções de primeiro nível dentro da indústria.

Estes são seus cinco melhores filmes e que valem ser vistos e revistos:

Os Melhores Filmes com Shelley Duvall
Reprodução

5. Nashville (1975)

Considerado o filme definitivo de Robert Altman, é o típico caso de ame ou odeie: alegórico, frenético, entrecortado e vertiginoso, sobrevive até hoje como um retrato de uma época em que o cinema industrial era altamente experimental (para o bem e para o mal).

4. Retratos de uma Mulher (1996)

Antes de se consagrar com o Oscar de Ataque dos Cães, Jane Campion dirigiu Duvall e um elenco estelar nesta sensível adaptação da obra de Henry James. Excelente reconstituição de época e música do genial compositor polonês Wojciech Kilar (o mesmo de "Drácula de Bram Stoker").

Os Melhores Filmes com Shelley Duvall
Reprodução

3. Três Mulheres (1977)

A carreira de Duvall é fortemente determinada pelos papéis em filmes de Robert Altman. Se outros títulos do diretor hoje podem parecer levemente datados e maneiristas, este não é o caso do drama "Três Mulheres", um poderoso enredo com alta carga psicológica, clima etéreo e atuações femininas excepcionais. Indispensável.

2. Noivo Neurótico, Noiva Nervosa (1977)

Conhecido no Brasil durante muito tempo por seu estapafúrdio título em português, "Annie Hall" é possivelmente a mais influente comédia dramática de todos os tempos. Seu estilo foi e continua sendo imitado e homenageado por seriados e novos filmes desde seu lançamento e recursos que hoje parecem banalizados (como os atores falando para a câmera) surgiram na época repletos de frescor e invenção. Uma mistura de Godard e Howard Hawks, encantador, melancólico e brilhante, não sentiu um dia sequer a passagem do tempo. O personagem de Duvall é reduzido, mas suas cenas são hilárias.

Shelley Duvall, de O Iluminado, morre aos 75 anos
Warner

1. O Iluminado (1980)

Existem filmes de terror mais assustadores, mas poucos serão tão exuberantes, simbólicos e climáticos quanto esta obra-prima de Stanley Kubrick. Uma produção cercada de folclore e boatos (a maioria deles pode ser desvendada ao assistir aos bastidores do filme, em clima totalmente familiar, e que no máximo revelam um diretor minucioso no melhor exercício de seu ofício). Talvez apenas "Psicose" dentro do gênero seja ainda hoje tão influente e imitado quanto "O Iluminado" e o grito de Shelley Duvall figura entre os momentos mais marcantes do século do cinema.


Crítica | Um Lugar Silencioso: Dia Um - É melhor ficar em silêncio quando nada se tem a dizer

Crítica | Um Lugar Silencioso: Dia Um - É melhor ficar em silêncio quando nada se tem a dizer

"Um Lugar Silencioso: Dia Um" é um spin-off do original "Um Lugar Silencioso" de 2018, este dirigido pelo também ator John Krasinski. O prólogo dirigido por Michael Sarnoski (de Pig - A Vingança) mostra a chegada dos alienígenas à Terra e o caos social imediato resultante da invasão. A protagonista Samira (interpretada por uma esforçada Lupita Nyong'o) é uma paciente terminal vivendo em Nova York que testemunha a chegada das criaturas e o massacre que se segue. Ela é acompanhada pelo tímido Eric (Joseph Quinn) e um gato de estimação numa fuga em círculos pela cidade arruinada.

A pergunta que um amante de cinema pode se fazer é: a premissa iniciada no primeiro filme teria fôlego para dois mais (ou sabe-se lá quantos ainda virão)? A resposta parece evidente na metade deste enredo, quando os protagonistas vagam em cenas que forçam um lirismo entrecortado por sustos gratuitos que aparecem para nos lembrar de que, afinal, se trata apenas de mais um filme de terror, apocalipse ou algo parecido.

Além de esticar ao limite uma premissa que não parece ter material dramático para se sustentar por uma hora e meia (e você já assistiu à uma situação semelhante com melhor sorte em Cloverfield -  Monstro, por exemplo), o roteiro força a barra de maneira pueril, quando meia hora depois de a cidade ser atacada por um inimigo alienígena do qual rigorosamente nada se sabia até então, os habitantes já parecem plenamente convencidos (e mobilizados) de qual é a "regra do jogo" (ficar quietos para não atrair atenção das criaturas), o que é bastante inverossímil e só serve para conduzir a história aonde o roteirista quer.

Quando, evidentemente, seria muito mais razoável imaginar que a população levaria dias (ou ao menos umas boas horas) para entender o que estava acontecendo e aceitar a "regra de segurança" (que é a base de toda a franquia e, até por esse motivo, merecia ser mais bem trabalhada). Exigir realismo tampouco parece razoável, porque precisamos lembrar que este não é muito mais que outro filme de "monstro" e se comporta como tal.

O filme repete também o mesmo truque barato dos dois anteriores: nenhum deles é nada "silencioso", pois tanto aqui, como nos outros, a direção lança mão de todo tipo de intervenção sonora e música constante, de modo que os sussurros são compensados por uma barulheira bem exagerada. Seria surpreendente e realmente "inovador" conseguir provocar sustos sem efeitos sonoros, por exemplo. Mas esta é uma proeza que nem Krasinski, nem Sarnoski, sequer cogitariam.

No deserto de qualidades no qual se converteu a indústria de entretenimento nos últimos anos, a ideia do primeiro filme de Krasinski soou bastante original num primeiro momento (embora sorrateira fosse uma palavra melhor). Depois, entretanto, de mais de cinco horas de correria e monstrengos fazendo careta, a impressão que se sobressai é que se trata apenas de mais uma fórmula sendo reprisada. No fim do mundo, como Hollywood tem nos ensinado há décadas, não há muito que se dizer: o jeito é correr mesmo.

Um Lugar Silencioso: Dia Um (A Quiet Place: Day One – EUA, 2024)
Direção: Michael Sarnoski
Roteiro: Michael Sarnoski, John Krasinski, Bryan Woods
Elenco: Lupita Nyong’o, Joseph Quinn, Alex Wolff, Djimon Hounsou, Thara Schoon, Thea Butler
Duração: 100 min.


ET de Varginha: Após 28 anos, muitas dúvidas e nenhuma evidência concreta

ET de Varginha: Após 28 anos, muitas dúvidas e nenhuma evidência concreta

Há 28 anos, o Brasil foi palco de um dos episódios mais intrigantes da ufologia mundial: o suposto encontro com um ou mais seres extraterrestres na cidade de Varginha, Minas Gerais. Desde janeiro de 1996, o caso do "ET de Varginha" tem gerado debates, especulações e teorias, mas até hoje, nenhuma evidência concreta foi apresentada para confirmar a visita de vida extraterrestre ou esclarecer completamente os acontecimentos daquele dia.

Garotas veem algo inexplicável

O incidente começou na manhã de 20 de janeiro de 1996, quando três jovens - Liliane e Valquíria Fátima Silva e Kátia Andrade Xavier - alegaram ter visto uma criatura estranha em um terreno baldio. Descreveram-na como um ser de aproximadamente 1,60m de altura, com pele marrom, olhos vermelhos e três protuberâncias na cabeça. As meninas ficaram assustadas e relataram o avistamento para suas famílias e amigos, gerando rapidamente alarde na cidade.

Pouco depois, surgiram relatos de que o Corpo de Bombeiros e o Exército Brasileiro foram acionados para capturar uma ou mais criaturas. Testemunhas afirmaram ter visto veículos militares transportando uma carga incomum, levando a crer que ao menos um ser havia sido capturado e levado para uma base militar. À noite, um policial militar teria se envolvido num terceiro resgate, desta vez acompanhado apenas de seu parceiro, e sem testemunhas.

A partir desses relatos iniciais, a história como um todo abre uma infinidade de trilhas (muitas delas contraditórias) e não chega a lugar nenhum.

Investigações e Versões Oficiais

Desde o início, o caso atraiu a atenção da mídia e de ufólogos, tanto no Brasil quanto no exterior. Vários pesquisadores independentes e organizações de ufologia foram a Varginha para coletar depoimentos e tentar descobrir a verdade por trás do incidente. No entanto, as investigações logo se depararam com inúmeras contradições e falta de provas concretas.

Os militares negaram qualquer envolvimento com a captura de um ser extraterrestre. O Exército Brasileiro emitiu uma nota oficial afirmando que as operações conduzidas na região naquela época não tinham relação com seres de outro planeta. De acordo com os militares, os veículos vistos transportando uma carga eram parte de uma operação rotineira e a suposta criatura era, na verdade, um morador do bairro com necessidades especiais.

Além disso, a falta de fotografias, vídeos ou qualquer registro físico (incluindo documentos escritos) do suposto ET ou dos eventos relacionados levanta sérias dúvidas sobre a acuidade dos testemunhos. Em muitos casos, relatos dos envolvidos mudaram com o tempo, e algumas das pessoas que afirmaram ter visto o ser ou participado de sua captura admitiram posteriormente que poderiam ter sido influenciadas pela comoção e pelas histórias que circulavam na cidade.

Uma Abordagem Cautelosa dos Acontecimentos

É fundamental considerar a possibilidade de que o episódio do ET de Varginha possa ter sido um grande mal-entendido alimentado por coincidências, histeria coletiva e sensacionalismo midiático. Estudos de psicologia indicam que em situações de alta tensão e medo, é comum que as pessoas interpretem eventos ambíguos de maneira a se alinhar com suas crenças ou temores preexistentes.

A teoria de histeria coletiva é apoiada pelo contexto da época. Nos anos 1990, havia um grande interesse público em assuntos relacionados a OVNIs, impulsionado por programas de televisão, filmes e livros sobre o tema. Além disso, o impacto do caso Roswell, nos Estados Unidos, ocorrido décadas antes, ainda reverberava na cultura popular, predispondo o público a acreditar em contatos com extraterrestres.

Outra explicação plausível é a de que o suposto ET fosse, na verdade, um animal ou uma pessoa com alguma condição especial, que foi interpretada erroneamente pelas testemunhas devido às condições de luminosidade e ao estado de pânico em que se encontravam. Estudos sobre avistamentos de OVNIs e seres extraterrestres mostram que, frequentemente, fenômenos naturais ou humanos são confundidos com eventos extraterrestres por observadores não treinados.

Se observarmos os testemunhos originais, ou seja, aqueles colhidos nos dias seguintes ao desenrolar dos fatos, encontramos repetidas menções a elementos da religiosidade popular, como a citação de “demônios”, o que também reforça a tese de que parte da história (aquela que relaciona os episódios à cultura ufológica) foi sendo condicionada pela própria presença dos pesquisadores interessados no tema, que por sua vez descartaram imediatamente qualquer explicação que não fosse a de natureza “ufológica”.

A Falta de Evidências Concretas

Passados 28 anos, a principal crítica ao caso do ET de Varginha é a ausência de evidências concretas que comprovem qualquer das alegações feitas. Nenhum artefato, corpo ou material de origem extraterrestre foi apresentado. Isso é particularmente problemático em um campo de estudo onde a verificação empírica é essencial. Ademais, faltam documentos ou registros escritos dos órgãos envolvidos nos acontecimentos relatados. Nenhum material “vazou” de nenhuma fonte, o que seria esperado após tantos anos e pela quantidade de pessoas supostamente envolvidas nas “operações”. Caso a história contada pelos ufólogos fosse totalmente verdadeira, estaríamos diante da mais bem-sucedida operação de acobertamento empreendida por qualquer autoridade em qualquer época da História - o que, convenhamos, é também altamente improvável, até mesmo porque o relato dos próprios ufólogos envolve centenas de “testemunhas”, o que de forma alguma se encaixa numa operação secreta conduzida profissionalmente.

Os céticos insistem ainda que, sem provas físicas, é impossível diferenciar um evento genuíno de um mito ou engano. A ciência requer que afirmações extraordinárias sejam acompanhadas por evidências extraordinárias. No caso de Varginha, essas evidências simplesmente não existem.

Além disso, investigações posteriores feitas por órgãos independentes e por jornalistas não conseguiram substanciar as alegações iniciais. A falta de documentação oficial e a ausência de testemunhas credíveis que possam fornecer relatos consistentes e verificáveis reforçam a posição de que o incidente foi, na melhor das hipóteses, um engano e, na pior, uma fraude.

Ufólogos: “proteção às testemunhas” tenta justificar pobreza em evidências

O caso de Varginha é o mais célebre relato envolvendo discos voadores e criaturas alienígenas já registrado no Brasil e, por isso, atrai a atenção de centenas de ufólogos e pesquisadores do tema. Apesar dessa intensa atividade em torno do caso, a pobreza de evidências concretas e a dificuldade de encaixar os testemunhos existentes num relato coerente chama a atenção.

Confrontados com as lacunas do caso, os ufólogos brasileiros costumam atribuí-las à necessidade de manter suas principais testemunhas no anonimato, preservando seus nomes e papeis no desenrolar dos fatos. Entretanto, testemunhos anônimos não são um fim em si mesmos: eles precisam levar a algum lugar para serem reconhecidos. Do contrário, não passam de becos sem saída: uma testemunha anônima lista informações que não podem ser comprovadas ou negadas, não levando o caso a lugar nenhum. Ironicamente, quanto menos evidências verificáveis, mais os ufólogos alegam ter certeza de sua versão dos acontecimentos.

Muitos dos supostos envolvidos nos eventos negam repetidamente a versão sustentada pelos ufólogos. Neste caso, os pesquisadores não aceitam ou desqualificam tais testemunhos, alegando que aquilo que se afirma é falso ou parte de uma “operação de acobertamento”. Ou seja: descartam evidências contrárias ao que julgam ter acontecido e, ao mesmo tempo, tentam sustentar o caso com evidências inexistentes.

Uma das mais recorrentes alegações apresentadas pelos ufólogos é a de que a versão oficial das autoridades militares é bizarra - e, de fato, não é das melhores. Ocorre, no entanto, que ela é, na pior das hipóteses, tão improvável quanto aquela(s) defendida(s) pelos próprios ufólogos. A probabilidade de “ver um anão” (e esta é a base da explicação dos oficiais à época) não é menor do que a de “ver um disco voador” ou “ver um extraterrestre” com o agravante de que não há qualquer dúvida de que “anões existem”, enquanto por outro lado não há nenhuma certeza de que “discos voadores e extraterrestres existem”.

A abordagem ufológica para o caso parte de premissas enganosas. Por exemplo: “se a versão apresentada pelo Exército não é verdadeira, então só pode se tratar de um episódio de queda de nave espacial e a captura de criatura alienígena”. Tal premissa não tem lógica alguma: é perfeitamente possível que a versão apresentada pelo Exército não seja verdadeira e que não tenha havido qualquer disco voador ou criatura envolvida. De fato, é bem razoável pensar que o que realmente aconteceu está distante tanto da versão oficial quanto daquela defendida pelos ufólogos.

O suposto vídeo do ET de Varginha

Conscientes de que, após quase três décadas, o caso pouco saiu do lugar, em 2024 há um verdadeiro frenesi entre ufólogos em busca de sua “bala de prata”: um vídeo que mostraria uma das supostas criaturas capturadas em contato com médicos e militares brasileiros da época.

Até o momento, nenhum dos supostos vídeos que circulam na internet conseguiu provar minimamente qualquer relação com os eventos de 1996. Não obstante, qualquer vídeo que possa vir a surgir deverá superar a desconfiança da fraude digital e - não menos importante - demonstrar relação inequívoca com os fatos relatados. Qual seria a prova de que um “vídeo de criatura” refere-se especificamente à “criatura de Varginha”? Como saber que a criatura é a mesma dos relatos e que o local onde ela foi gravada é um dos locais citados nas pesquisas? São perguntas que os ufólogos envolvidos na busca ainda não conseguiram responder.

Mais dúvidas que certezas

O caso do ET de Varginha permanece um enigma na ufologia brasileira, alimentado por especulações e relatos não verificados. Embora tenha capturado a imaginação do público e se tornado um ícone cultural, a falta de evidências concretas e a presença de inúmeras contradições e inconsistências sugerem que o episódio é mais provavelmente um produto de histeria coletiva e interpretações errôneas do que um contato real com seres extraterrestres.

Para os investigadores céticos, o caso de Varginha serve como um lembrete da importância da análise crítica e da necessidade de provas empíricas para sustentar qualquer alegação extraordinária. Enquanto novas evidências não forem apresentadas, o incidente continuará a ser visto com ceticismo, como um mistério não resolvido, mas provavelmente explicável por fenômenos terrestres.