Crítica | A Taça Partida – O intimismo de Esteban Cabezas

Natural, mas pouco memorável.

Separação não é uma coisa fácil, principalmente sob o olhar de uma criança. E é aqui, em A Taça Partida (La Taza Rota, 2021), de Esteban Cabezas, presente na 45ª Mostra Internacional de São Paulo, que esse assunto é abordado de maneira leve e incisiva.

O filme acompanha Rodrigo, um jovem adulto que está separado da esposa, fora de casa e sem a guarda do filho. A trama se passa em um dia completo, onde Rodrigo decide, de uma maneira ou outra, aproveitar o máximo de tempo possível com o filho, fora dos dias em que pode vê-lo. É baseada em um relato de Joaquín Fernández, onde podemos perceber muitas das cenas e diálogos naturais, situações comuns, do ponto de vista de uma criança, de maneira caricata, e como isso pode reverberar para uma construção familiar a longo prazo. Querendo ou não, os próprios personagens, Clara e Rodrigo, também parecem de uma maneira serem afetados por essa questão afetuosa. Em momento algum citam seus pais, falando somente em si como primeiros de uma geração.

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Na direção,  Esteban faz um exercício de linguagem que começa desde o primeiro plano, quando Rubens sai de um táxi na madrugada e observa a rua deserta, à espera de começar a sua jornada em busca de um dia com seu filho. Ali podemos ver a presença da solidão, de um sujeito que se destaca dentro de um subúrbio, e, quando finalmente podemos entrar na casa, é de uma maneira voyeurística. A primeira coisa que vemos rachaduras, vidros trincados, e uma caneca quebrada. Quem sabe brigas passadas, discussões mal resolvidas, que representa, acima de tudo, o amadurecimento dos personagens. O como vão quebrando, trincando, esfarelando, e não deixam essas cicatrizes de lado. A personagem de Clara, a mãe interpretada por María Jesús González, diz na primeira cena, ao ser confrontada pelo namorado, que não jogaria a caneca fora, como símbolo de quem não quer deixar para trás um defeito.

Conforme a história progride, vemos que nenhum personagem é certo ou errado. Tanto a mãe quanto o pai estão batalhando por algo que o garoto não quer, ou não precisa querer. E fica aí a grande graça da interpretação de Juan Pablo Miranda: o ator consegue combinar muito bem o jeito canastrão de um pai ainda jovem, que tenta usar-se de exemplo para que o filho possa ter uma personalidade mais parecida com a sua, ao mesmo tempo que sequer tem uma formada. Há uma longa sequência em que Rodrigo fica na casa, aproveitando para bisbilhotar e se vingar da ex-mulher e seu novo namorado.

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São esses e outros pontos que nos levam a crer, no decorrer do filme, em que não sabemos quem de fato é a criança que precisa de tutela. Se é Rodrigo que precisa do filho ou o filho que precisa do pai.

Em uma produção mais intimista, feita durante a pandemia, Estaban consegue estruturar os quadros dentro de uma casa, utilizando planos longos e cheios de detalhes. Conseguimos ver as rachaduras em conjunto de diálogos posicionados em mesas, em quinas, no banheiro, e até mesmo um plano que emenda a cozinha com a escada, onde ocorrem dois diálogos fortíssimos.

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A beleza da fotografia assinada por Cristián Petit-Laurent está no artificio da mudança do dia ao decorrer do filme. Começamos com o dia nublado, que percorre para a luz dura do meio-dia, até as lâmpadas acessas no fim da tarde, dando um ar natural para a produção.

Por mais que o roteiro tente em alguns momentos, não me parece ter um ponto final ou queira concluir uma ideia. Há momentos naturais, mas pouco memoráveis. Não há todo o dramalhão conhecido em histórias de separação, e o que fica aqui são praticamente momento leves sobre amadurecimento. É um filme para aqueles que querem tirar um tempo para refletir sobre seus dias atuais, suas saudades e muitas vezes a suas próprias responsabilidades.

A Taça Partida (La Taza Rota, Chile – 2021)

Direção: Esteban Cabezas
Roteiro: Álvaro Ortega, Esteban Cabezas
Elenco: Juan Pablo Miranda, María Jesús González, Moisés Angulo, Román Cabezas, Rodrigo Soto, Daniel Antivilo
Gênero: Drama
Duração: 73 min

Acompanhe mais da nossa cobertura da 45ª Mostra Internacional de São Paulo

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