Quando o lendário acordo que resultou na compra da Fox pela Disney foi finalizado há alguns anos atrás, só uma coisa importava para os fãs de quadrinhos: e os X-Men? Por duas décadas compondo uma franquia de altos e baixo ao longo dos anos 2000, os personagens encontraram um novo boom em 2016 quando Ryan Reynolds encontrou raio engarrafado com seu cômico Deadpool, que revitalizou não apenas o tom da franquia, mas também de todo o subgênero de quadrinhos.
Quando a tinta do acordo Disney e Fox seca, a única certeza e garantia era a de que veríamos o Mercenário Falastrão novamente; e, dessa vez, interagindo com as valiosas propriedades do MCU de Kevin Feige, que oferece em Deadpool & Wolverine a primeira produção para maiores de 17 anos da franquia. E, de quebra, trazendo de volta da aposentadoria o grande rosto da saga X-Men, com Hugh Jackman apanhando as garras de adamantium mais uma vez – mesmo depois de ter literalmente estrelado um filme cujo grande intuito era matar o personagem, com o premiado Logan.
Com a Marvel Studios enfim batendo em uma parede criativa com sua infinitude de tramas, personagens e realidades, Deadpool & Wolverine surge como uma espécie de correção de curso. Através do próprio discurso ácido e metalinguístico do protagonista de Reynolds, a saga tenta voltar alguns passos e tentar se concentrar apenas em personagens; abertamente criticando as investidas em multiverses e realidades alternativas.
É tudo feito com muito bom humor e piadas sagazes, de praxe como Reynolds e seus roteiristas colegas, Rhett Reese e Paul Wernick, vêm entregando desde o filme original. Ironicamente, é justamente na crítica ao multiverse que Deadpool & Wolverine encontra sua maior limitação: o excesso de referências e dependência excessiva em piadas de nostalgia e legado. Em outros termos, Deadpool & Wolverine é um grande e saboroso fan service para o cinema de quadrinhos da Fox dos anos 2000 (e até além), que garante participações surpreendentes e divertidas – e que por si só, já garantem a curiosidade.
Porém, pouco sobra além disso. A dinâmica de Reynolds com o sempre excelente Hugh Jackman é divertida e derivativa de clássicos como 48 Horas e Fuga à Meia Noite (o buddy cop ácido feito de forma certa), mas fica a constante sensação de ser um filme perdido em suas intenções. Não parece haver uma história forte e que justifique trazer esses personagens mais uma vez (além do claro interesse mercadológico). A despedida de Jackman em Logan foi emocionante e digna, mas nada em Deadpool & Wolverine (nem o belo traje amarelo ou máscara embaraçosa) parece compensar esse pequeno delito cinematográfico.
Infelizmente, o vazio temático e emocional acaba refletindo na direção de Shawn Levy. Diretor muito competente de obras como Gigantes de Aço e a trilogia Uma Noite no Museu, Levy faz o básico em um trabalho que parece mais confortável em filmes originais do Disney+ do que épicos cinematográficos que a saga mutante já foi capaz de atingir no passado. Com exceção de uma ou outra cena de ação inspirada (apoiada por uma escolha musical certeira), não é um trabalho dos mais brilhantes – e que ainda peca pela fotografia bem apagada de George Richmond.
Mas no fim, parafraseando o próprio protagonista de Reynolds, Deadpool & Wolverine deve entregar exatamente o que os fãs querem. É um banquete de referências, participações e infinitas piadas internas com o estado atual do gênero e a decadência da finada Fox. Uma experiencia ocasionalmente divertida e que decola pelo carisma dos astros, mas que parece vazia e esquecível em todo o resto.
Deadpool & Wolverine (EUA, 2024)
Direção: Shawn Levy
Roteiro: Rhett Reese, Paul Wernick, Ryan Reynolds, Shawn Levy e Zeb Wells
Elenco: Ryan Reynolds, Hugh Jackman, Emma Corrin, Matthew McFayden, Morena Baccarin, Aaron Stanford, Leslie Uggams
Gênero: Aventura, Comédia
Duração: 127 min.