O que Andrei Tarkovsky, Sergio Leone e Stanley Kubrick têm em comum? Claro, estamos falando de três dos maiores diretores que já existiram, mas entre eles há também uma curiosa e reveladora particularidade: todos filmaram relativamente pouco, ou muito menos que diversos contemporâneos e outros cineastas célebres.
O que isso exatamente quer dizer? Cada um a seu modo, mas talvez os três tenham percebido que mesmo gênios do cinema têm um “teto máximo” de bons filmes que podem realizar e, muitas vezes, quando não há certeza do rumo que cada projeto poderá tomar, é melhor simplesmente deixar passar. Kubrick era um mestre em escolher exatamente onde amarrava seu burro, mas os outros dois também não entravam em qualquer canoa furada – de fato, é interessante notar que nenhum deles jamais dirigiu um filme que fosse menos do que “muito bom”.
Bem, este não parece ser o caso de Ethan Coen. Embora ainda não esteja no mesmo patamar dos três, é sem dúvida um cineasta extremamente bem-sucedido, envolvido seja como diretor, produtor ou roteirista em projetos excepcionais, tais como Onde os Fracos Não Têm Vez, O Grande Lebowski, Arizona Nunca Mais, Fargo e outros.
Por tudo isso, Coen não precisava passar a vergonha monumental de dirigir (e co-roteirizar…) este Garotas em Fuga. Reunindo um elenco talentoso e participações especiais de astros como Matt Damon, contudo, o filme peca em tudo (exceto, talvez, na metragem, que sabiamente é reduzida): a caricatura não funciona, a crônica social é barata, a sexualidade entendida como motivo para piada permanente, a trama policial ultrajante, etc. Um espetáculo infantilizado dentro de uma embalagem luxuosa que, porém, só acentua ainda mais a fraqueza do material.
Na trama, duas amigas lésbicas (vividas pelas talentosas e esforçadas Margareth Qualley e Geraldine Viswanathan) são duas desajustadas que têm de entregar uma “encomenda” na Flórida. Mas o referido pacote é do interesse de um grupo de supostos criminosos que acabarão por precipitar a ambas numa fuga desastrada e, na maior parte do tempo, sem sentido e sem graciosidade.
O filme oscila entre ser uma comédia adolescente – onde o sexo é visto ora como banalidade, ora como ultraje – e o pastiche policial ao estilo Fargo que já funcionou muito bem mas que, de tanto ser “relido” e imitado, dá sinais evidentes de desgaste.
Quem já dirigiu ou produziu alguns dos melhores filmes norte-americanos deste século poderia ter mais cuidado com o material de seus novos projetos, pois Garotas em Fuga evidentemente ocupará um dos últimos lugares em sua filmografia. Alguém pode dizer que, bem, “show business” também é “business” (do contrário, chamaria apenas “show”), mas um cineasta tão bem-sucedido certamente encontraria projetos melhores para se envolver do que este lamentável road movie que passaria vergonha até mesmo numa sessão da tarde de TV aberta.