Tentando honrar a tradição e reapresentar alguns de seus monstros famosos a um público novo, a Universal oferece no início de 2025 este Lobisomem bastante tradicional, sem grandes invenções mas disposto a reviver uma fórmula simples com visível engenho.
A tarefa coube a Leigh Whannell, que já havia demonstrado qualidades em seus trabalhos anteriores, como o original Upgrade: Atualização e as produções maiores, como Sobrenatural: A Origem e a também refilmagem O Homem Invisível.
Tentando evitar a decepção por exemplo de A Múmia, de 2017, com Tom Cruise, a ideia aqui foi concentrar a atenção no conceito mais próximo possível da ideia original, e nisso a refilmagem se sai bastante bem.
Rever a tradição sem a obrigação de reinventar o tempo todo
Na trama, Blake (Christopher Abbott) leva uma vida comum na cidade grande com a esposa Charlotte (Julia Garner) e a filha pré-adolescente Ginger (Matilda Firth), até que ele é obrigado a voltar ao interior do estado norte-americano do Oregon para recolher os pertences de seu pai desaparecido e finalmente dado como morto pela justiça. Esse retorno liga Blake ao prólogo em que ele aparece como um menino e entendemos que seus traumas do presente estão relacionados ao passado com um parente autoritário e paranoico.
Assim que retorna ao Oregon, a família percebe que aquela região tem sua própria dinâmica e regras de sobrevivência. Mas o filme não parece disposto a muita preparação, e rapidamente enfia o espectador em uma caçada frenética onde a família precisa lidar com duas ameaças: uma que vem de fora, e outra que cresce internamente.
O maior mérito de Lobisomem está no fato de que a direção não perde tempo distraindo o espectador ou propondo muitos subtemas que possam tirar atenção daquele que é definitivamente o ponto de interesse da produção: a criatura no sentido mais tradicional possível e que remete não apenas ao clássico com Lon Chaney Jr., mas também ao sucesso dos anos 1980, Um Lobisomem Americano em Londres, de John Landis. Todo o processo de transformação do homem em lobo parece bastante orgânico, com uso moderado de efeitos digitais, de modo que o que se vê tem um impacto diferente de muitos filmes atuais. Este é um mérito difícil de ignorar, mas está longe de ser o único.
Desde o início, a direção trabalha com habilidade os espaços externos – no caso, a exuberante e assustadora paisagem do Oregon – e também a alternância inteligente entre ruído e silêncio, o que constroi suspense de qualidade desde a abertura. Não temos aqui um festival de efeitos sonoros que, na maior parte das vezes, tentam compensar a pobreza da encenação: há momentos de barulho e outros de tensão ocasionada pelo vazio. Um capricho que merece louvores.
O elenco traz a excelente Garner (de Ozark) num papel em que ela usa pouco sua habilidade em fazer diaĺogos renderem, mas mesmo assim segura bem as cenas. Talvez o ponto menos entusiasmante seja a atuação de Abbott, um ator que tem dificuldade em despertar simpatia mas que logo é salvo pela maquiagem.
Sem distrações: se você quer um filme de lobisomem, é isto que Lobisomem entrega
Um tema que o filme toca superficialmente e que tem estado presente em boa parte da produção de gênero em Hollywood é a contraposição entre uma América urbana, progressista e pacifista, e outra rural, tradicional e armamentista. Em geral, o que se vê é que o choque entre ambas produz horror e violência – e aqui não é diferente, mas o filme não tem muito tempo para gastar com grandes discussões, e imediatamente penetra no escuro da floresta e no drama avassalador de um pai dividido momentaneamente entre a lealdade à família e uma nova natureza animalesca que teima em surgir.
Lobisomem é curto, direto, fiel ao título e à tradição na qual pretende se inserir. Se você espera um filme de terror “desconstruído”, repleto de intermináveis referências e autoironia, este não é o programa para você. Se, por outro lado, você procura um terror mais “raiz” – e que neste sentido remete ao que o gênero produzia na virada dos anos 1980 para os 1990 – o filme novo da Universal é o programa ideal.
Cineasta, roteirista e colaborador esporádico de publicações na área, diretor do documentário “O Diário de Lidwina” (disponível no Amazon Prime e ClaroTV), entre outros.

