Crítica | Seinfeld: 1ª Temporada - Um pequeno passo para a sitcom definitiva
Em 5 de julho de 1988, o piloto da então nomeada The Seinfeld Chronicles era exibido nos EUA pelo canal NBC. A série era uma comédia criada pelo comediante de stand up Jerry Seinfeld e seu amigo Larry David, e se concentrava em aspectos banais do cotidiano para elaborar seu humor cínico: a força de um cumprimento de mão, o complexo significado de buscar uma amiga no aeroporto e a posição dos botões de uma camisa são apenas alguns dos “temas” que o piloto aborda.
A gênese de Seinfeld parte de experiências autobiográficas de Jerry e David, que baseiam diversas conversas do programa com situações enfrentadas por eles, além do próprio Jerry interpretar uma versão dele mesmo e o George Costanza de Jason Alexander servir como a representação de David. O vizinho maluco Cosmo Kramer (Michael Richards) também foi inspirado numa excêntrica figura da vida da dupla, enquanto a personagem de Elaine Benes (Julia Louis-Dreyfus) surge como uma combinação de diversas pessoas, tal como amigas e ex-namoradas de Jerry.
Ao contrário das outras temporadas, a primeira de Seinfeld traz apenas cinco episódios: The Pilot, Male Unbonding, The Stakeout, The Robbery e The Stock Tip. São histórias que passam longe da genialidade que a série viria alcançar no futuro, mas já começava a flertar com o humor ácido que insiste em coisinhas do cotidiano como, por exemplo, comparar o término de uma amizade masculina com um relacionamento amoroso, piada que viria a ser copiada fervorosamente por praticamente todo tipo de sitcom por aí.
Um dos elementos fortes na primeira temporada é a apresentação em stand up de Jerry, que é totalmente conectada com as ações do respectivo episódio e vai se desenrolando em paralelo com a história, graças a uma montagem simples que sugere que o protagonista baseou toda sua performance nos eventos temáticos. Tal estética viria a ser abandonada futuramente, dando mais fluidez à trama de cada episódio, mas é um recurso divertido que, de certa forma, ajuda a mergulhar no processo de criação do comediante – e como suas piadas são frutos de seu próprio cotidiano.
E sobre essas piadas, muitas vezes elas servem como longos fillers das situações centrais, como quando, em The Robbery, George volta do banheiro e simplesmente comenta “Adoro o espelho deste lugar, sempre me sinto bem olhando pra ele. Me sinto um Robert Wagner toda vez que vou ao banheiro” ou aquela que foi minha primeira grande risada com a série – em The Stock Tip -, quando Jerry reclama com o dono de uma lavanderia sobre sua camisa encolhida: “Eu não quero meu dinheiro de volta, quero que pelo menos uma vez na vida, uma lavanderia assuma seu erro”.
Ainda que curta e simples, a primeira temporada de Seinfeld é uma amostra perfeita de todos os temas e piadas que viriam a ser desenvolvidas ao ápice no futuro.
Melhor episódio: The Stock Tip.
Piorzinho: The Stakeout.
Seinfeld – 1ª Temporada (EUA, 1989)
Criadores: Jerry Seinfeld e Larry David
Principais diretores: Tom Cherones, Andy Ackerman
Elenco Principal: Jerry Seinfeld, Jason Alexander, Michael Richards, Julia Louis-Dreyfus, Wayne Knight, Barney Martin, Liz Sheridan, Jerry Stiller, Estelle Harris, Len Lesser, John O’Hurley, Ruth Cohen
Duração: 22 min (cada episódio)
Crítica | Halloween (2018) - Jamie Lee Curtis rouba o holofote de Michael Myers
Ao longo de 40 anos de sua história, o assassino Michael Myers talvez seja o ícone de terror que teve a cronologia mais bizarra da história do gênero - a linha do tempo dos X-Men é fichinha perto de Halloween. Desde o clássico de 1978, o assassino criado por John Carpenter e Debra Hill rendeu mais 10 continuações, que envolveram explorações forçadas de sua mitologia, antologias, reboots, retcoms e remakes; praticamente todos os termos de produção de Hollywood podem se aplicar à franquia.
Já tendo apagado os filmes anteriores da franquia mais de uma vez, a Blumhouse aposta em mais uma versão inovadora para Halloween, agora contando com o apoio do mestre Carpenter, de Jamie Lee Curtis e dos entusiasmados David Gordon Green e Danny McBride, que mais uma vez oferecem uma sequência aos eventos do original com este novo Halloween, exatamente 40 anos depois.
Como explicado acima, o novo filme ignora todos os outros filmes e invenções da mitologia, apresentando-nos a uma Laurie Strode (Curtis) completamente traumatizada e paranoica após o ataque de Myers no Halloween de 78. Vivendo isolada de sua família, que a considera uma sociopata perigosa, a situação muda quando dois documentaristas chegam em Haddonfield para estudar os crimes de Myers, que encontra-se trancafiado em uma instalação psiquiátrica desde sua captura. Conseguindo fugir durante uma transferência, Myers segue para Haddonfield, onde Laurie planeja uma vingança.
Uma década da caça, outra do caçador
É difícil imaginar o que pode ser feito com a franquia Halloween, quando praticamente tudo já foi feito. Até mesmo a proposta de trazer Laurie se reencontrando com Michael durante o aniversário do massacre original já ganhou as telas, com Halloween H20 - Vinte Anos Depois partindo de uma ideia muito similar. Por incrível que pareça, o roteiro assinado por Jeff Fradley, McBride e Green consegue encontrar um ponto de abordagem verdadeiramente novo, que é um estudo bem maduro sobre os efeitos de Myers na vida de Laurie, que demonstra sinais claros de PTSD, algo que o texto explota bem no primeiro ato da narrativa e a relação defeituosa com a filha e a neta, vividas por Judy Greer e Andi Matichak, respectivamente.
Também não deixa de ser moderno e relevante ter figuras que tentem enxergar a humanidade em Michael, papel dos documentaristas (podcasters, na realidade, o que traz Serial à mente) de Jefferson Hall e Rhian Rees e encontrar uma justificativa para seu distúrbio, indo de encontro com a natureza mais simplista do Dr. Samuel Loomis no original, que se contentava em taxar o assassino de “mal encarnado”, assim como a própria Laurie.
A inversão dos papéis na narrativa, que consiste basicamente em ter uma vítima caçando seu perseguidor também é um fator raro dentro do slasher: nunca vemos os adolescentes tarados indo atrás de Jason Voorhees ou Freddy Krueger, mas sim os vemos constantemente fugindo, e o roteiro da dupla traz esse fator estimulante de se ter figuras pensantes - na maior parte do tempo - para protagonizar a ação.
Erros do Passado
O problema começa quando o novo Halloween resolve ser similar demais ao original. Não à sua estrutura que ainda permanece superior, mas sim no que julga ser os elementos básicos de seu filme de terror slasher. Entra a insuportável subtrama envolvendo Allyson, seu namorado e os amigos, que parece saído de uma versão piorada de Superbad (onde é possível identificar o dedo de McBride) e empalidece completamente do arco muitíssimo mais interessante envolvendo Laurie.
Da mesma forma, ainda que a proposta ainda esteja pautada na homenagem, é repetitivo demais apresentar ainda mais um psiquiatra para perseguir Michael ao lado de um policial, algo que só fica pior com a performance de Haluk Bilginer sendo uma clara imitação da de Donald Pleasence no original. Mesmo que seja uma decisão auto consciente do texto, com Laurie chamando-o de “novo Loomis”, é um artifício que soa preguiçoso, assim como a maioria das tentativas de humor do filme, quase anacrônicas com o tom mais sóbrio do primeiro ato.
A decisão do filme de quebrar a narrativa em diferentes pontos de vista também traz seus defeitos. Ainda que seja divertido acompanhar uma série de “vinhetas” com personagens aleatórios diversos que sempre ganham um tempo de cena considerável antes de tropeçarem em eventos relevantes da trama, mas acaba proporcionado uma narrativa sem foco. A impressão que fica é que tivemos pouco tempo com Laurie, enfraquecendo a catarse de sua relação familiar durante o clímax mais intenso, deixando o desejo de que o roteiro se concentrasse mais no núcleo da relação familiar do que nos típicos clichês adolescentes do slasher. Uma pena, pois Jamie Lee Curtis está simplesmente fantástica, e merecia mais espaço para demonstrar suas nuances.
Do Stoner ao Slasher
Na direção, David Gordon Green mostra-se eficiente no terror. Quando consideramos que o diretor já foi de dramas como Joe para comédias stoner como Segurando as Pontas e Sua Alteza, Green é bem capaz de conduzir sequências inteiramente dependentes de silêncio e atmosfera, e ironicamente tornam-se mais intensas quando temos Laurie na posição de predador, e acompanhamos o próprio Michael como vítima. Green é até mesmo inteligente em recriar alguns momentos icônicos do original com Laurie no papel de Michael, deixando bem claro sua bem sacada inversão de papéis, e oferece sua própria resposta ao plano sequência lendário de Carpenter em 1978 em uma cena ambiciosa onde Michael invade diferentes casas para fazer novas vítimas, em uma sucessão de elegantes planos longos.
É um bom trabalho, mas não sem excessos comuns do gênero. Por mais que o novo Halloween traga alguns momentos de atmosfera e progressão de suspense, há muita dependência em jump scares abruptos e intervenções da trilha sonora; mas este último não chega a ser realmente um problema, visto que a música eletrizante é composta por Carpenter, seu filho Cody e Daniel A. Davies.
Há algumas decisões estranhas de direção, como quando Allyson corre pela floresta e se assusta com os manequins destruídos por Laurie em um estande de tiro; é um caso de Green exagerar na obviedade de transformar Laurie em uma predadora, e que visualmente soa perdido em sua proposta graças aos cortes rápidos e zooms forçados.
Lá no fundo, há uma história poderosa para ser contada neste novo Halloween, que se beneficia de uma direção competente e uma ótima abordagem para as figuras de Michael Myers e Laurie Strode. Só faltou o foco narrativo e a coragem para ser algo realmente transgressor, e que de fato trouxesse a franquia pra uma nova era.
Mas definitivamente é o suficiente para nos manter felizes, pelo menos até Halloween H60 ser anunciado.
Halloween (EUA, 2018)
Direção: David Gordon Green
Roteiro: David Gordon Green, Danny McBride e Jeff Fradley, baseado nos personagens de John Carpenter e Debra Hill
Elenco: Jamie Lee Curtis, Nick Castle, James Jude Courtney, Judy Greer, Andi Matichak, Haluk Bilginer, Will Patton, Rhian Rees, Jefferson Hall, Toby Huss, Virginia Gardner, Dylan Arnold, Miles Robbins
Gênero: Terror
Duração: 106 min
https://www.youtube.com/watch?v=ek1ePFp-nBI&t
Crítica | Halloween 2 - Pouco além do cavalo branco
Após o remake de Rob Zombie para Halloween ser relativamente bem-sucedido, no que diz respeito à arrecadação de bilheteria e resposta dos fãs - que, em maioria, reagiram bem aos novos massacres de Michael Myers -, a Dimension se via em um cenário muito pouco comum para esse tipo de produção: a continuação de um remake. É um luxo que nem Jason Voorhees, Freddy Krueger ou o Norman Bates de Vince Vaughn foram capazes de garantir, e Zombie retorna à cadeira de diretor e roteirista novamente, agora trazendo uma visão mais "autoral" para este Halloween 2. O resultado é levemente superior ao anterior, mas ainda carece de um artista eficiente por trás das câmeras.
Seguindo um longo flashback que se passa diretamente após o final do anterior, com Michael Myers (Tyler Mane) sobrevivendo aos ferimentos e perseguindo Laurie Strode (Scout Taylor-Compton) enquanto a jovem se recupera em um hospital, a trama engata para começar 2 anos após o retorno do assassino à Haddonfield. Laurie e Annie (Danielle Harris) tentam superar o trauma dos ataques e se veem em uma situação muito diferente, ao passo em que o Dr. Samuel Loomis (Malcolm McDowell) faz sucesso com as vendas de seu novo livro baseado nos ataques de Myers. Porém, à distância, um obcecado Myers planeja seu retorno à Haddonfield para matar sua irmã, sendo guiado por visões angelicais de sua mãe (Sheri Moon Zombie) e um misterioso cavalo branco.
The Hateful Everyone
Da mesma forma como executara em 2007, Zombie divide-se entre literalmente refilmar uma porção do filme original (no caso, a continuação de 1981 dirigida por Rick Rosenthal) e introduzir uma porção completamente nova, mas aqui arrisca-se a ser "inventivo" durante a maior porção da arrastada narrativa de 2 horas. Há elementos interessantes, como toda a porção que envolve Michael e as visões do cavalo branco, que praticamente elevam a mãe Myers a níveis de Pamela Voorhees e Norma Bates, que guiam seu filho para concluir uma série de assassinatos, e Zombie é feliz em trazer os personagens discutindo o significado do cavalo branco e até trazer um texto acadêmico sobre o estudo dos sonhos para justificá-lo, e confesso que a decisão agrada; é algo diferente do que já tínhamos visto na franquia, e até serve para trazer alguma identificação com a máquina de matar - ainda que seja uma decisão questionável.
O grande erro fica no arco de Laurie Strode. Scout Taylor-Compton já não demonstrava o carisma ou leveza de Jamie Lee Curtis no anterior, o que justifica sua radical mudança para uma jovem rebelde e roqueira (típico Zombie), mas é uma personagem simplesmente insuportável. Graças à escrita debilitada de Zombie, o trauma de Laurie jamais é capaz de gerar alguma empatia, visto que a jovem está sempre zangada e largando palavrões como se estivesse em um filme de Martin Scorsese, e suas mudanças de humor são risíveis: em um momento está chorando e xingando o mundo por enfim descobrir sua origem como irmã de Myers, e na cena seguinte está inexplicavelmente implorando para suas amigas para ir à uma festa e "curtir". Desenvolvimento de personagem 101 com Rob Zombie, é assim que funciona. Não ajuda também que Compton seja forçada e abrace o over acting com os berros e choro o tempo todo, e dessa forma até "entendo" como é mais fácil se identificar com Myers, apenas seguindo o espírito de sua mãe, ao passo em que os policiais, amigas e até mesmo Samuel Loomis se revelam como figuras detestáveis e aborrecentes - ver Malcolm McDowell pistolando em uma coletiva de imprensa foi difícil de defender.
Cavalo do Apocalipse
Na direção, Zombie mantém sua câmera pseudo-documental e marcada por uma fotografia altamente contrastada de Brandon Trost, que também exagera no grão. Mas é um avanço em relação ao anterior, visto que aqui o diretor é capaz de criar tensão genuína em raros momentos, como a ótima cena em que Laurie se esconde no escritório de um segurança do hospital, em um cenário desolado castigado por uma chuva intensa e quase perigosa, sendo a melhor cena de todo o filme e também um dos melhores usos da figura de Michael em toda franquia, cuja máscara fica ainda mais amedrontadora nesse cenário de dilúvio. E por falar em máscara, o visual "mendigo" do assassino funciona surpreendentemente bem, com a máscara despedaçada do Capitão Kirk oferecendo detalhes bem nítidos do rosto barbudo de Tyler Dane, e por consequência, uma presença um pouco mais consciente do assassino, que ganha mais destaque em seu olhar.
Os exageros visuais de Zombie também contribuem para uma sequência ambientada em uma rave de Halloween, com as luzes piscando salientando as bizarras fantasias de monstros e criaturas ali. Por fim, todas as visões de Michael de sua mãe também rendem um cuidado visual mais aparente, com o uso do branco (tanto na fotografia quanto no design de produção e figurino) e raios de luz que evocam uma presença quase angelical. E não fossem as caretas de sua esposa Sheri Moon, Zombie até seria capaz de provocar um certo medo com tais sequências, que contam ainda com a aparição do jovem Michael, que aqui é vivido por Chase Vanek, substituindo o ótimo Daeg Faerch do anterior.
Halloween 2 tenta mergulhar na psique de Michael Myers e oferece algumas coisas interessantes, sendo uma notável evolução de Rob Zombie como cineasta, mas ainda sofre com suas escolhas infelizes e o retrato detestável de praticamente todos os personagens, promovendo um cenário onde o o espectador é simplesmente incapaz de torcer para alguém.
Halloween 2 (Halloween II, EUA - 2009)
Direção: Rob Zombie
Roteiro: Rob Zombie, baseado nos personagens de John Carpenter e Debra Hill
Elenco: Malcolm McDowell, Scout Taylor-Compton, Sheri Moon Zombie, Brad Dourif, Danielle Harris, Tyler Mane, Dayton Callie, Richard Brake, Margot Kidder, Octavia Spencer, Caroline Williams, Chase Vanek
Gênero: Terror
Duração: 105 min
https://www.youtube.com/watch?v=fSPqbbjc0BE
Crítica | Halloween: O Início - A pobre visão de Rob Zombie
Com o fracasso de sua última interação, o mediano Halloween: Ressurreição, a Dimension havia desistido da franquia, mas o Mal supremo jamais descansa... Quatro anos depois, Michael Myers enfrentaria o teste de fogo que todos os slashers dos anos 70 e 80 inevitavelmente têm que passar: um remake na era millennium. Após a boa resposta ao remake de Marcus Nispel de O Massacre da Serra Elétrica para a Platinum Dunes (que também traria novas versões de Sexta-Feira 13 e A Hora do Pesadelo), chegava a hora do roqueiro-tornado-cineasta Rob Zombie oferecer sua própria visão, trazendo ao mesmo tempo uma refilmagem e uma história de origem para o longa original de John Carpenter. Infelizmente, a abordagem de Zombie neste Halloween: O Início é completamente equivocada para esse tipo de história, e falha em todas as intenções.
A trama volta no início da saga Halloween para nos mostrar a infância de Michael Myers (vivido aos 10 anos por Daeg Faerch), incluindo sua criação abusiva e as sementes de seu comportamento psicopata, que o levam a assassinar friamente uma de suas irmãs, cunhado e o padrasto na noite de Halloween. Após ser acompanhado pelo psicólogo Dr. Samuel Loomis (Malcolm McDowell) por um período de 15 anos, Michael escapa do manicômio onde esteve encarcerado, rumando para Haddonfield à procura de sua irmã sobrevivente, Laurie Strode (Scout Taylor-Compton).
Remakes são sempre arriscados. É praticamente impossível não se comparar a nova versão com o original, mas Rob Zombie ao menos traz elementos capazes de distanciá-lo de Carpenter. A primeira metade inteira é dedicada à infância de Myers, e a tentativa de um estudo sobre a psicopatia emergindo em uma criança aparentemente normal. Aqui, Zombie demonstra vislumbres de algo interessante, especialmente nas cenas de Myers com Loomis (algo que todo fã da franquia já quis ver) e em seu olhar quase documental para as sequências mais violentas, como o plano onde esconde a câmera atrás de arbustos para registrar a brutal vingança de Michael contra um bully da escola. A habilidade do jovem Daeg Faerch também impressiona, e Zombie é sábio ao construir uma figura que levemente vai tornando-se ameaçadora graças ao longo cabelo loiro caindo sobre sua face.
O problema vem mesmo no roteiro, que também traz Zombie como responsável. O nível da escrita e dos diálogos é pedestre para dizer o mínimo, resumindo as fases do tratamento de Michael em meras frases de efeito marcantes, e uma dinâmica familiar que escancara os clichês e a obviedade, praticamente zerando a lista que inclui uma figura paterna odiosa, a mãe stripper de bom coração e a irmã mais velha promíscua e agressiva. Claro, tudo com uma escrita exagerada e que beira o ridículo em uma tentativa desesperada de ser "chocante", mas que no fundo só demonstra mesmo imaturidade.
A escrita ruim se estende às novas versões dos personagens consagrados do original, com Compton entregando uma versão completamente equivocada e estereotipada de Laurie Strode: logo em sua primeira cena, ela brinca de forma maliciosa com donuts enquanto descreve o comportamento sexual de um professor (algo que não combina em nada com sua postura mais "inocente") e solta frases do tipo "eu realmente preciso de um namorado", enquanto a atriz simplesmente entrega as falas em um tom de euforia forçado e que, novamente, fica próximo da paródia. De forma similar, mas bem melhor aproveitada, Malcolm McDowell mostra-se uma escolha inspirada para viver o Dr. Loomis, sendo um bom sucessor de Donald Pleasence, e realmente convencendo em suas intenções de tentar ajudar Michael durante seu tratamento; assim como uma amostra do ar psicótico do doutor ao persegui-lo na noite de Halloween. Também é divertido ver Danielle Harris interpretando uma das amigas de Laurie, já bem crescida após despontar como Jamie em Halloween 4 e 5.
E por falar na noite títular... Quando Zombie termina sua exploração sobre as origens do assassino, só lhe resta replicar todo o filme de Carpenter na longa segunda metade, e é aqui que temos a pior amostra que um remake pode ter. Zombie nem de longe tem a habilidade ou olhar de Carpenter, e confia que apenas um gore extremo e cortes excessivos para planos fechados e desfocados serão o bastante para causar medo ou desconforto no espectador, mas soa simplesmente como algo genérico; nem mesmo a ambientação e as fantasias de Halloween pela rua são aproveitadas, visto que Zombie parece apressado demais para chegar na matança, e nosso desdém com os personagens impede qualquer tipo de suspense ou torcida por suas vidas.
Parcialmente interessante pela proposta inédita, Halloween: O Início acaba fracassando pela imaturidade de Rob Zombie como diretor e roteirista, que não tem a habilidade de John Carpenter em criar um suspense escapista ou a visão apropriada para abordar uma história séria de psicopatia. Pode não ser a pior fase de Michael Myers, mas ele com certeza merecia uma revitalização mais digna.
Halloween: O Início (Halloween, EUA - 2007)
Direção: Rob Zombie
Roteiro: Rob Zombie, baseado no roteiro de John Carpenter e Debra Hill
Elenco: Malcolm McDowell, Brad Douriff, Tyler Mane, Daeg Faerch, Richard Lynch, William Forsythe, Danny Trejo, Scout Taylor-Compton, Danielle Harris, Skyler Gisondo, Bill Moseley, Leslie Easterbrook
Gênero: Terror
Duração: 107 min
https://www.youtube.com/watch?v=MhyZmUeq6do
Crítica | Halloween: Ressurreição - Entre boas ideias e uma execução competente
Certos ciclos são eternos na máquina de Hollywood. Um sucesso sempre garante uma continuação, e isso é praticamente uma máxima na estrada sinuosa e cheia de lombadas que é o gênero de terror. Por isso, não importa qual fora a intenção de Jamie Lee Curtis e de todos os envolvidos na "celebração" de Michael Myers com Halloween H20: Vinte Anos Depois; se o filme fosse um sucesso, todos estariam de volta para uma continuação. Visto que o longa de 1998 permanece como o mais bem sucedido da franquia até hoje, a Dimension aposta em Halloween: Ressurreição para manter o trem andando. No entanto, mesmo que traga boas ideias, não é o bastante para reviver Halloween.
A trama começa alguns anos após o final de H20, com Laurie Strode (Curtis) internada em uma clínica psiquiátrica após ter matado um homem inocente; quando decapitou Michael Myers, na verdade tratava-se de um paramédico que o assassino usou para forjar sua morte. Quando o Myers verdadeiro enfim retorna para matar Laurie, ele acaba seguindo de volta para Haddonfield, onde sua antiga casa está sendo usada para para transmitir um reality show temático de terror.
Ressurreição é uma besta estranha. Os primeiros 15 minutos surgem como - literalmente - uma mera obrigação contratual, com Curtis sendo rapidamente eliminada da trama em uma sequência abrupta e pouco inspirada, que tenta extrair o suco que ainda resta dessa interação - e que já não era exatamente fresco em H20. Uma despedida ingrata e tão qualquer coisa para a personagem mais querida da franquia, e fico feliz que a atriz esteja retornando no vindouro reboot deste ano, visto que Laurie Strode merece um destino mais digno - ou ao menos uma morte que fosse mais impactante do que este exemplar da novela das oito.
Quando o roteiro de Larry Brand e Sam Hood caminha para o arco principal, envolvendo o reality show batizado de Dangertainment, temos o primeiro sopro de ar fresco na franquia em décadas. Tudo bem que nenhum dos personagens é capaz de gerar qualquer tipo de envolvimento ou empatia, sendo dos mais genéricos e irritantes que o gênero poderia fornecer (nem a ambição de ser Pânico está aqui), mas toda a ideia do reality é muito interessante, e rende uma metalinguagem inesperada. Por exemplo, os espectadores assistem no conforto de suas casas os adolescentes sendo perseguidos por um Michael Myers sanguinário, sem ter ciência de que se trata do verdadeiro, e reagem como se estivessem diante do entretenimento mais sangrento e realista que já viram - o que não deixa de ser uma surpreendente sátira da sociedade de consumo escondida ali, mesmo que a dupla de roteiristas não seja capaz de explorá-la.
Do ponto de vista da direção, este talvez seja o Halloween mais único da franquia desde o original. Trazendo de volta Rick Rosenthal (de Halloween II), o veterano da franquia mostra que entende o novo milênio ao apostar em diversas câmeras dentro da história para construir sua narrativa. É uma mistura do estilo de A Bruxa de Blair com aquele que veríamos alguns anos depois no espanhol REC 2: Possuídos, e que em determinado momento até oferece uma bela rima visual com o primeiro filme ao nos mostrar Michael segurando uma arma com uma câmera, onde literalmente acompanhamos o POV do objeto brando que o assassino usa para fazer uma de suas vítimas; e a própria imagem da máscara de Myers torna-se mais assustadora quando a vemos através de uma resolução pixelada e não clara. São bons momentos que se sobressaem a uma narrativa povoada por personagens idiotas, mas vale o experimento.
Nem de longe tão ruim quanto a maioria de suas sequências, Halloween: Ressurreição permite-se brincar e experimentar traços diferentes com a figura de Michael Myers, rendendo momentos inspirados de direção e algumas ideias interessantes. Infelizmente não o bastante para realmente trazer algo novo à franquia, e a qualidade da escrita definitivamente não ajuda, mas é um Halloween melhor do que a lembrança agridoce possa sugerir.
Halloween: Ressurreição (Halloween: Resurrection, EUA - 2001)
Direção: Rick Rosenthal
Roteiro: Larry Brand e Sam Hood, baseado nos personagens de John Carpenter e Debra Hill
Elenco: Jamie Lee Curtis, Busta Rhymes, Bianca Kajich, Thomas Ian Nicholas, Ryan Merriman, Sean Patrick Thomas, Katee Sackhoff, Daisy McCrackin, Luke Kirby, Tyra Banks, Brad Loree
Gênero: Terror
Duração: 90 min
https://www.youtube.com/watch?v=UMV3pcxbcTA
Crítica | Halloween H20: Vinte Anos Depois - Michael Myers enfrenta a nova geração
Quando John Carpenter lançou Halloween: A Noite do Terror em 1978, o diretor e roteirista havia deixado um dos marcos mais significantes no gênero do horror. Michael Myers havia se tornado um ícone, mas passava por problemas com a qualidade cada vez mais debilitada de suas continuações, que também sofriam com o afastamento de Carpenter, e o fracasso de A Última Vingança havia colocado a franquia na geladeira mais umae vez. E mais: agora os tempos eram outros. Myers pode ter moldado o gênero slasher, mas Wes Craven e o badalado Pânico haviam virado-o de cabeça pra baixo na metade dos anos 90, e Halloween precisava se adaptar se ainda pretendia tirar algum suco desse fruto.
Eis que para o aniversário de 20 anos da franquia, Moustapha Akkad e a Dimension Films preparavam algo especial, com H20: Halloween: Vinte Anos Depois servindo para celebrar o nascimento de Michael Myers e também entregar algo sob medida para uma geração sedenta por filmes de terror mais sagazes e autoconscientes. O resultado? Muito aquém do que prometia, mas definitivamente uma das mais dignas continuações da saga - o que não é necessariamente o maior dos elogios.
Como o próprio título já escancara, a trama é ambientada duas décadas após a noite de Halloween em que Michael Myers (Chris Durand) tentou assassinar sua irmã Laurie Strode (Jamie Lee Curtis) enquanto trabalhava como babá e, consequentemente, se recuperava em um hospital. Laurie agora vive escondida com outra identidade, trabalhando como diretora de um colégio interno enquanto cuida de seu filho adolescente, John (Josh Hartnett). Assombrada pelos eventos de vinte anos atrás, ela precisará enfrentar Michael mais uma vez quando ele consegue encontrá-la.
H20 definitivamente trazia muita antecipação por parte dos fãs, mas convenhamos: apenas pelo retorno de Jamie Lee Curtis, já que a trama em si é a mesma de sempre. O grande atrativo do roteiro de Robert Zappia e Matt Greenberg (baseados em um argumento de Kevin Williamson, roteirista de Pânico) era ignorar as sequências anteriores, sendo uma continuação de Halloween II: O Pesadelo Continua e atuando como um retcom da franquia. O problema fica mesmo na falta de novidades, com os personagens de Josh Harnett, Michelle Williams, LL Cool J e companhia não trazendo nenhum tipo de empatia; a inspiração em Pânico está ali, em trazer os jovens mais irônicos, mas falta a metalinguagem satírica da cinessérie de Wes Craven. Isso sem falar que o então estreante Hartnett desperdiça todo o potencial dramático do jovem Strode em uma performance estranhamente preguiçosa e aérea, em um clássico exemplo de miscast.
O charme está mesmo com Curtis. Ver Laurie Strode tão transformada e lidando com o trauma daquela noite de vinte anos atrás rende alguns dos melhores momentos do longa, principalmente quando ela revela para seu namorado (vivido por um competente Adam Arkin) sobre sua real identidade, em uma cena que mistura o drama do trauma com uma estranha sensualidade, visto que Laurie faz a confissão durante preliminares de um encontro romântico. Além disso, o fato de vermos sua mãe Janet Leigh interagindo com ela é algo que provoca arrepios nos cinéfilos de longa data, sendo a ponte definitiva entre Halloween e Psicose ao trazer a veterana atriz da cena do chuveiro de Alfred Hitchcock.
Em termos de direção, é bom ver que Steve Miner almeja trazer o espírito Carpenter de volta, apostando em enquadramentos ricos e situações típicas do primeiro capítulo da série. O prólogo do filme (que traz participação de um jovem Joseph Gordon-Levitt) é um bom exemplo disso, com um clássico set up de casa invadida por um assassino que ainda não vemos por completo. As subsequentes sequências de terror acabam ganhando mais fôlego graças à inspiração em Pânico, tanto que o estúdio até mesmo usou faixas do trabalho de Marco Beltrami no filme de Craven como complemento ao sólido trabalho de John Ottman - algo que irritou profundamente o compositor original. O gore também surge mais forte aqui, algo que era de se esperar naquela época, e Miner o explora bem ao manter sempre o suspense, vide a cena em que Jodi Lyn O'Keefe tenta escapar de Myers através de um elevador de alimentos.
Halloween H20 com certeza ajuda a nos trazer um Michael Myers mais digno do que os pavoroso capítulos anteriores, ignorando as ressurreições e cultos satânicos a seu redor, e o retorno de Jamie Lee Curtis por si só é um fator que torna a visita agradável. Só faltava mesmo algo que justificasse a reunião, que trouxesse novidades e fosse além da proposta básica.
Halloween H20: Vinte Anos Depois (Halloween H20: Twenty Years Later, EUA - 1998)
Direção: Steve Miner
Roteiro: Robert Zappia e Matt Greenberg, baseado nos personagens de John Carpenter e Debra Hill
Elenco: Jamie Lee Curtis, Adam Arkin, Michelle Williams, Janet Leigh, Josh Harnett, Joseph Gordon-Levitt, LL Cool J, Jodi Lyn O'Keefe, Branden Williams, Nancy Stephens, Beau Billingslea, Matt Winston, Larisa Miller
Gênero: Terror
Duração: 86 min
https://www.youtube.com/watch?v=WEEZCo8WS4k
Crítica | Halloween 6: A Última Vingança - Michael Myers luta para fazer algum sentido
Michael Myers estava vivo, mas morto novamente. Mesmo que A Vingança de Michael Myers tivesse acabado com um ridículo cliffhanger que prometia a volta do assassino, a recepção do filme foi decepcionante, tanto em crítica quanto em bilheteria, o que levou o produtor Moustapha Akkad a levar um tempo para repensar a relevância e os rumos da franquia. Meia década depois, os direitos da franquia agora residiam com a Dimension, e Akkad enfim parecia satisfeito com uma nova abordagem ao misterioso vilão, agora para explorar sua mitologia com Halloween 6: A Última Vingança. Uma péssima ideia, é claro.
A trama... Uau, a trama. Os eventos começam em um confuso in media res, com Jamie Floyd agora mais velha, com as feições de Kim Darby, e prestes a entrar em trabalho de parto. Descobrimos que a moça foi capturada por um culto obscuro que traz laços com o assassino Michael Myers (George P. Wilbur), dado como morto pela mídia. Quando Jamie e seu bebê conseguem fugir dos captores, Myers novamente irá a seu encalço para eliminar os últimos remanescentes de sua família, enquanto o implacável Dr. Samuel Loomis (Donald Pleasence) deixará sua aposentadoria para tentar impedi-lo; agora com a ajuda de um traumatizado Tommy Doyle (Paul Rudd).
Por um lado, é preciso dar algum crédito ao roteirista Daniel Farrands. No turbilhão da pré-produção do sexto capítulo, Farrands esforçadamente esboçou uma linha do tempo da franquia, uma árvore genealógica dos principais personagens e até recorreu aos roteiristas dos capítulos anteriores, buscando explicações para o misterioso símbolo Thorn que aparecia no final do longa anterior. A resposta da pesquisa? Um classudo "se vire", o que resultou em Farrands tentar usar A Última Vingança para amarrar todos os filmes de forma lógica - excluindo A Noite das Bruxas, claro. E esse é justamente o problema em tentar extrair suco de um fruto tão simples quanto aquele criado por John Carpenter e Debra Hill em 1978, que era uma básica e direta história de assassino: Farrands não faz o menor sentido, e é risível de tão exagerado e forçado em suas explicações.
A introdução do bizarro culto de Myers não funciona sob prisma algum. De acordo com o texto de Farrands, Myers é um canalizador do mal supremo invocado para destruir toda a sua linhagem, um argumento que colapsa por si só quando imaginamos o motivo pelo qual ele seria libertado em primeira instância. Claro, Halloween 6 é notório por ter tido diferentes versões, e a considerada "oficial" contou com diversos cortes, inclusive um que explicitaria que o bebê de Jamie é do próprio Michael, que teria engravidado sua sobrinha após um estupro. O que diabos Farrands estava fumando? A única conexão minimamente curiosa vem com a presença de Tommy Doyle, personagem que fora a criança cuidada por Jamie Lee Curtis no filme original, mas não passa de um mero fun fact.
Aliás, a performance de um novato Paul Rudd aqui é algo de se tomar nota. Surgindo como um guilty pleasure acidental, Rudd tenta retratar Tommy como um sobrevivente traumatizado pelo encontro com Myers no original, mas suas expressões, o olhar fixado e a entrega das falas nos dão a impressão de estarmos lidando com um tarado sexual; e confesso que é difícil de segurar a risada em algumas cenas supostamente "sérias". Sobre o restante do elenco, Donald Pleasence oferece sua performance final, visto que o ator faleceria pouco tempo após as filmagens, e consegue entregar um Loomis mais sóbrio e racional. Já os coadjuvantes são completamente descartáveis, com uma menção desonrosa para o núcleo familiar de outros membros da família Strode, o que só torna a inserção de Laurie nesse universo ainda mais confusa.
Em sua segunda incursão no cinema, Joe Chapelle faz muito pouco para render algo memorável. Não chega a ser uma direção danosa, mas é sem imaginação e encontra a franquia em um ponto onde todo o charme e atmosfera de Carpenter parecem completamente esquecidos, visto que a produção é marcada por jump scares ininterruptos e da pior qualidade: aqueles onde o design sonoro oferece uma deselegante onomatopeia para nos assustar, sempre que um personagem qualquer entra em cena. O único momento em que Chappelle traz algo interessante é quando aposta em luzes de strobe para uma sequência de mortes, garantindo uma montagem dinâmica e um efeito visual realmente marcante, e que remete àquele usado por Ridley Scott em Alien, o Oitavo Passageiro. Felizmente, Chappelle recuperaria sua moral ao dirigir e produzir diversos episódios da badalada The Wire.
Naquele que é o pior capítulo da franquia até então, A Última Vingança tenta oferecer algum sentido e coerência aos diferentes eventos da vida de Michael Myers, mas falha ao descambar para o completo absurdo e ridículo.
Halloween 6: A Última Vingança (Halloween: The Curse of Michael Myers, EUA - 1995)
Direção: Joe Chappelle
Roteiro: Daniel Farrands, baseado nos personagens de John Carpenter e Debra Hill
Elenco: Donald Pleasence, Paul Rudd, Marianne Hagan, Mitchell Ryan, Kim Darby, Bradford English, Keith Bogart, Mariah O'Brien, Leo Geter, J.C. Brandy, Susan Swift, Devin Gardner, George P. Wilbur
Gênero: Terror
Duração: 87 min.
https://www.youtube.com/watch?v=rAaPBxBxaV8
Crítica | Halloween 5: A Vingança de Michael Myers - O perigo da redundância
Por mais improvável que parecesse, a sorte sorria para Michael Myers. Enquanto franquias de seus "sucessores" como A Hora do Pesadelo e Sexta-Feira 13 começavam a enfrentar a fadiga, Halloween 4: O Retorno de Michael Myers havia se consolidado como o mais lucrativo capítulo da saga até então, e o produtor Moustapha Akkad já planejava um quinto filme para o ano seguinte enquanto o quarto ainda estava em cartaz. Na pressa e no desejo de manter a roda girando, quando Halloween 5: A Vingança de Michael Myers encerra sua projeção, temos apenas uma repetição preguiçosa e irrelevante do anterior.
A trama começa um ano após os eventos do quarto filme, com Michael Myers (Don Shanks) desaparecido após cair em um poço, mas logo pronto para matar novamente após ser encontrado por um mendigo. O alvo do assassino permanece sendo sua sobrinha Jamie Lloyd (Danielle Harris), que segue internada em uma clínica psiquiátrica após ter assassinado sua madrasta.
Nesse ponto, Halloween começa a enfrentar a redundância. O roteiro assinado por Michael Jacobs, Shem Bitterman e a diretora Dominique Otherin-Girard carece de originalidade e simplesmente enfia novos personagens e situações goela abaixo, sem o qualquer senso de preocupação em torná-los interessantes ou cativantes. E pior: o final chocante do quarto filme oferecia um caminho ambicioso e sombrio para Jamie, que tinha tudo para ser a nova assassina da franquia; algo que de fato fora o pitch original, mas que infelizmente foi rejeitado. Assim, é como se o assassinato de sua madrasta fosse praticamente ignorado, já que nem mesmo as ramificações psicológicas de um ato tão violento são discutidas pelo texto. A única consequência é um gimmick ridículo onde a garotinha tem uma espécie de "conexão neural" com o assassino, sendo capaz de ter visões de suas matanças e sentir sua presença. Complicado...
Nenhum dos novos personagens introduzidos é capaz de prender nosso interesse, com Rachel (Ellie Cornell) sendo eliminada no primeiro ato e passando a tocha para Tina (Wendy Foxworth) uma nova amiga que é apresentada à força para que estabeleça um elo com Jamie. Mesmo que ambas sejam boas intérpretes (e novamente destaco o ótimo desempenho de Harris), não há nada ali capaz de provocar empatia. E se a presença do Dr. Samuel Loomis (Donald Pleasence, nunca cansado da franquia) já era exagerada no anterior, aqui o terapeuta simplesmente beira o ridículo em sua obsessão com Myers e as tentativas de matá-lo; rendendo uma hilária cena em que golpeia o vilão aos berros de "morra!".
Sendo a única mulher a assumir a direção de um capítulo da série, Dominique Othenin-Girard não traz nada de novo em termos estéticos. Aliás, a francesa mal consegue manter o padrão de Carpenter e os diretores anteriores, oferecendo cenas de suspense genéricas e sem um pingo de tensão. A sequência onde Jamie é perseguida por Michael no porão da clínica chega a ser desastrosa pela câmera incessante da diretora, que não nos permite enxergar absolutamente nada do que está acontecendo. E que diabos, produção... O que se passa com a máscara de Michael Myers?!
A Vingança de Michael Myers mostra-se como o capítulo mais fraco até então. Pode até não ser ridículo como A Noite das Bruxas, mas se contenta demais em seguir uma fórmula batida com uma execução genérica e sem charme.
Halloween 5: A Vingança de Michael Myers (Halloween 5: The Revenge of Michael Myers, EUA - 1989)
Direção: Dominique Otherin-Girard
Roteiro: Michael Jacobs, Dominique Otherin-Girard e Shem Bitterman, baseado nos personagens de John Carpenter e Debra Hill
Elenco: Donald Pleasence, Danielle Harris, Ellie Cornell, Beau Starr, Jeffrey Landman, Tamara Glynn, Jonathan Chapin, Matthew Walker, Wendy Foxworth, Troy Evans, Don Shanks
Gênero: Terror
Duração: 97 min
https://www.youtube.com/watch?v=gvTjz_LXvPo
Crítica | Halloween 4: O Retorno de Michael Myers - Casos de família
O fracasso de Halloween III: A Noite das Bruxas havia custado caro para a Universal Pictures. Desinteressada em produzir novos longas de terror na franquia Halloween - agora dormente por meia década-, o produtor Moustapha Akkad buscava uma nova casa para tocar o barco novamente, e com a clara intenção de trazer de volta o assassino Michael Myers; cuja ausência teria sido o principal motivo pela fraca resposta do público em relação ao terceiro filme - tirando o fato de ser um filme medíocre, claro. Akkad recorreu à Trancas International (e a distribuição ficou com a Fox) e também a John Carpenter e Debra Hill, mas as negociações acabaram indo por água abaixo quando o casal e Akkad entraram em desavenças criativas, e todos os direitos sobre a franquia acabaram ficando com Akkad.
Assim, rejeitando o pitch "cerebral demais" do roteirista Dennis Etchison e a sugestão de Carpenter de Joe Dante para dirigir, Halloween 4: O Retorno de Michael Myers é uma tentativa de voltar às raízes mais simples do original. E ainda que a ideia original de Etchison de fato fosse mais interessante, este quarto filme é a melhor continuação da franquia até então.
Assumindo os dez anos que passaram desde o primeiro filme, a trama começa quando o detento Michael Myers (George P. Willbur) novamente encontra uma maneira de fugir das autoridades; rapidamente despertando a atenção e paranoia de seu antigo terapeuta, o Dr. Samuel Loomis (Donald Pleasence). Com Laurie Strode (Jamie Lee Curtis) morta neste intervalo de tempo, descobrimos que ela deixou uma filha de 7 anos convenientemente chamada Jamie (Danielle Harris), que acaba tornando-se o alvo principal de Myers durante seu retorno à cidade de Haddonfield.
A premissa assume exatamente o que o público quer ver: Michael Myers em sua matança desenfreada. Da mesma forma como a franquia Sexta-Feira 13 errou em apostar em uma continuação sem Jason Voorhees em Um Novo Começo, Akkad faz um caminho similar ao do assassino de Crystal Lake e estabelece no título o retorno do assassino; em mais uma lição da franquia da Paramount, que batizara o capítulo seguinte de Jason Vive - e essa não seria a última lição tirada de Jason, mas chegaremos lá. Sem máscaras de Halloween macabras ou muitas invencionices, o roteiro de Alan B. McElroy surge quase como uma nostálgica viagem ao passado, novamente trazendo o clima da noite de Dia das Bruxas e os pequenos dramas adolescentes de novos personagens. Não é um trabalho brilhante, até mesmo por termos Loomis retornando vivo após ter sido explodido junto com Michael no final do segundo capítulo, e sua obsessão em torno de Myers novamente apelando para frases ridículas como "ele não é um homem, ele é o mal".
O diferencial, e aí venho novamente oferecer um eco com Sexta-Feira 13, é a introdução de uma criança no centro da história. Assim como Corey Feldman tornou O Capítulo Final uma experiência muito mais interessante, a pequena Danielle Harris é capaz de provocar empatia ao longo da narrativa, seja pelo fato de sofrer um pesado bullying por sua trágica condição (a de ser uma órfã), a saudade de sua mãe e a relação eficiente com sua irmã adotiva, Rachel (Ellie Cornell). A mera imagem de Harris correndo desajeitadamente por uma rua escura com uma fantasia de palhaço é um bom representante do tipo de terror do filme, que explora de forma competente - ainda que abruptamente - a perda da inocência.
Na direção, Dwight H. Little faz o seu melhor para emular o estilo de John Carpenter (chegando até mesmo a oferecer uma bela rima com o prólogo em POV do original), mas oferece uma abordagem diferente para Myers. Antes um assassino silencioso das sombras, sua figura agora é a de um ser praticamente invulnerável e bruto, do tipo que usa uma espingarda para empalar suas vítimas contra a parede. Os jump scares são mais presentes dessa forma, mas Little consegue captar o senso de perigo à solta quando a narrativa estabelece um apagão em Haddonfield, fazendo com que um grupo de policiais saia pelas ruas para caçar Michael. Com a fotografia azulada e marcada por névoas de Peter Lyons Collister e a eficiente trilha sonora de Alan Howarth (que é feliz sem os sintetizadores de Carpenter, ainda que seu tema esteja presente), é possível, sim, ter momentos de tensão.
Só há um gigantesco problema nessa questão: inexplicavelmente, a máscara de Michael Myers é ridícula. Parecendo uma imitação barata da original, é impossível não olhar para este Michael e esboçar uma risada involuntária, já que parecemos estar diante de uma boneca inflável gigante. O grande mérito é quando Myers não usa o icônico visual, aparecendo com o rosto enfaixado nas cenas iniciais; consequência de sua incineração no segundo filme.
Mesmo que seja uma reciclagem de outras ideias da concorrência - e nem de longe se equipare ao brilhantismo do original - O Retorno de Michael Myers é uma boa continuação. É eficiente em atualizar e trazer novas ideias para o mesmo conceito claustrofóbico e da noite de Halloween, ao mesmo tempo em que oferece rimas inteligentes com seu primogênito. A lição fora aprendida: não se mexa em time que está ganhando, muito menos quando seu capitão é Michael Myers.
Halloween 4: O Retorno de Michael Myers (Halloween 4: The Return of Michael Myers, EUA - 1988)
Direção: Dwight H. Little
Roteiro: Alan B. McElroy, baseado nos personagens de John Carpenter e Debra Hill
Elenco: Donald Pleasence, Ellie Cornell, Danielle Harris, George P. Willbur, Michael Pataki, Beau Starr, Kathleen Kinmont, Sasha Jenson
Gênero: Terror
Duração: 88 min
https://www.youtube.com/watch?v=izDsHmqAl8c
Crítica | Halloween III: A Noite das Bruxas - Antologia fracassada
Michael Myers estava morto. Mesmo que houvesse trazido um bom resultado nas bilheterias, Halloween II: O Pesadelo Continua nem de longe havia causado o mesmo impacto que o original, e nem mesmo John Carpenter e Debra Hill tinham interesse em revisitar o personagem quando a Universal inevitavelmente sugeriu um terceiro capítulo da série. A solução da dupla foi inspirada, e flertava com os interesses da recém-inaugurada franquia Sexta-Feira 13, que optou pela mesma saída antes de aprovar uma sucessão de filmes com Jason Voorhees: estabelecer uma antologia cinematográfica com a marca. Assim, Halloween III: A Noite das Bruxas nos traz uma história completamente original e desgarrada de Myers e dos eventos do anterior, mas
A trama começa a alguns dias da noite de Halloween, com todas as crianças no país sucumbindo à febre das máscaras de Halloween da empresa Silver Shamrock. Quando um homem é morto enquanto fugia com uma das máscaras, o médico Daniel Challis (Tom Atkins) precisa desvendar uma bizarra conspiração que envolve as máscaras, a empresa e um plano sinistro que culminará na noite de Halloween.
Rod Serling de segunda mão
É difícil imaginar os motivos pela recepção tão negativa de A Noite das Bruxas. O mero fato de não termos Michael Myers já é o bastante para enfurecer os fãs, mas o fato de que os fanáticos pelo terror entrarem no cinema esperando um slasher apavorante e terem recebido uma versão reciclada e trash de um episódio de Além da Imaginação certamente é o fator definitivo. Roteirizado pelo diretor Tommy Lee Wallace (em sua estreia na função após atuar como designer de produção nos dois filmes anteriores), a trama é muito mais próxima da ficção científica do que terror, e testa a paciência do espectador ao nos apresentar conceitos espalhafatosos, personagens risíveis e diálogos nada agradáveis - isso vindo de uma franquia com médicos safadinhos, veja bem. Wallace até traz uma sátira interessante ao consumismo e o uso da mídia para manipulação de crianças, mas é um argumento muito raso e que se perde em meio às cafonices.
Quero dizer, é no mínimo curioso que o médico vivido por Atkins simplesmente se envolva tão rápido nessa teia de mistérios, ainda que o fato de que inicia um caso amoroso com a filha do paciente fugitivo do começo do filme, na relação mais estranha e sem química que já vi no gênero em muito tempo. Não há ator bom que tire algo de uma premissa tão mal escrita, e Atkins e a bela Stacey Nelkin parecem não se esforçar tanto (ainda que a moça traga uma performance interessante durante o terceiro ato). Apenas o veterano Dan O'Herlihy parece tirar algum proveito da situação, na pele do inescrupuloso Conal Cochran, manifestação do corporativismo maléfico e realmente sinistro como o CEO da Shamrock - mas é um daqueles casos onde o ator oferece algo muito superior ao que estava no papel.
Suspensão de Descrença
Como diretor, Wallace não é particularmente inspirado. Ainda que tenha um bom olho para enquadramentos e composições (a maioria deles quando envolve alguma forma de arquitetura peculiar, vide sua profissão anterior), é incapaz de construir uma atmosfera palpável ou provocar tensão. A noção dos 10 dias que antecedem o Halloween mostra-se falha por uma série de elipses que nos dão a impressão de toda a trama se desenrolar em um final de semana, e em momento algum somos capazes de sentir medo ou desconforto, já que Wallace depende de planos longuíssimos pontuados por uma trilha sonora sintetizada preguiçosa (Carpenter, o que houve?).
Quando Wallace faz a melhor preparação de terreno, onde enfim veríamos o segredo por trás das máscaras de Halloween, a entrega é tão genérica e decepcionante do ponto de vista estético, que completamente invalida a força da revelação e os esforços da equipe em tentar oferecer algo realmente repugnante; em outras palavras, era só isso?
É realmente triste ver uma boa proposta falhando dessa maneira. Por melhor que tenham sido as intenções de Carpenter e Hill ao injetar vida nova nessa preciosa franquia, Halloween III: A Noite das Bruxas não tem um roteiro ou mitologia interessantes o suficiente para manter o interesse - ou o pavor - do espectador. Esquecível.
Halloween III: A Noite das Bruxas (Halloween III: Season of the Witch, EUA - 1982)
Direção: Tommy Lee Wallace
Roteiro: Tommy Lee Wallace
Elenco: Tom Atkins, Stacey Nelkin, Dan O'Herlihy, Michael Currie, Ralph Strait, Jadeen Barbor, Brad Schacter, Nancy Kyes, Jonathan Terry
Gênero: Terror
Duração: 98 min
https://www.youtube.com/watch?v=9MnaYzBhx0A