Crítica | A Guerra dos Sexos - Uma conquista do feminismo sem a força que merecia
Os tempos estão mudando. Questões sociais que há alguns anos seriam consideradas tabus, agora são temas de discussões e também de entretenimento, e é importante que o cinema acompanhe essas mudanças a fim de jogar luz em acontecimentos pouco lembrados ou simplesmente oferecer uma reflexão. Com a força de movimentos feministas e a cada vez mais presente luta do gênero na contemporaneidade, A Guerra dos Sexos parecia a oportunidade perfeita para explorar ainda mais do assunto com uma história surpreendentemente atemporal, mas que tristemente acaba recebendo um tratamento confuso em suas próprias intenções.
O título faz referência a uma modalidade no tênis onde um homem e uma mulher se enfrentam em um jogo, e o roteiro de Simon Beaufoy concentra-se em uma das manifestações mais famosas: a partida de Billie Jean King (Emma Stone) contra Bobby Riggs (Steve Carell). Mais do que uma mera partida, o jogo foi uma chance de King mostrar o valor e a força das mulheres - subvalorizadas e com salários inferiores ao dos jogadores homens -, ao passo em que Riggs tentava recuperar seu prestígio após ficar afastado das quadras.
Premissa básica do gênero esportivo, com a bela oportunidade de trazer um paralelo bem atual com os tempos atuais. Pois, de fato: o retrato que Beaufoy faz aqui só causa a realização sobre como a posição da mulher em relação ao homem não melhorou; com a diferença de que, nos anos 70, jornalistas e comentaristas não tinham o "charme" de esconder o machismo, falando abertamente como o lugar das mulheres é na cama e no quarto; vide a coletiva de imprensa onde Riggs assume uma postura - adotada por ele mesmo - de chauvinista. Por ainda mostrar o trabalho de ativismo de Billie Jean, esta definitivamente é uma história que merecia ser contada.
Dupla Falta
Infelizmente, A Guerra dos Sexos acaba sofrendo de um problema cada vez mais constante em longas dessa linha de produção, de histórias movidas por bem intencionados retratos de uma luta por direitos e conquistas de minorias. Tal como Histórias Cruzadas e Estrelas Além do Tempo, o filme de Jonathan Dayton e Valerie Faris é extremamente apelativo e cartunesco em seu retrato, que traz uma balança irregular entre o drama sério e uma abordagem humorística desconfortavelmente cartunesca. Os antagonistas são todos malvados demais, enquanto as protagonistas ganham um tratamento multifacetado, o que garante um resultado incongruente, quase como se não pertencessem no mesmo filme. Fico surpreso que um roteirista competente como Simon Beaufoy (parceiro habitual de Danny Boyle, que é creditado como produtor), apesar de realizar um trabalho louvável de pesquisa e manter-se verdadeiro aos fatos, tenha se limitado a tantos diálogos bobos e que parecem motivados apenas a criar frases de efeito.
Diversos pontos interessantes e que renderiam uma profundidade considerável acabam sendo abordados superficialmente. O triângulo amoros entre Billie, seu marido Larry (Austin Stowell) e a cabeleireira Marilyn (Andrea Riseborough), por exemplo, acaba resolvido da maneira mais abrupta e anticlimática possível; com a presença de uma relação homossexual sendo considerada um perigo para a vida pública de Billie, mas que acaba soando como um mero acessório. Claro, temos um belo diálogo entre Billie e o personagem de Alan Cumming, sobre como um dia seriam livres para amar quem bem desejarem, e a cena realmente é admirável, mas sem efeito algum por dar luz a um personagem que mal recebeu qualquer tipo de desenvolvimento anteriormente - uma pena, visto que Cumming faz um bom trabalho mesmo em seus microscópicos minutos de participação. Outro ponto decepcionante também é quando Larry aborda Marilyn e fala, bem superficialmente, sobre o caso que a cabeleireira tem com sua mulher, enfatizando que tanto ela quanto ele são "meras distrações", e que o amor maior de Billie é o tênis. Bem, pessoalmente não encontrei nada no filme que ilustre tão bem essa paixão da tenista pelo esporte (com exceção de Bille constantemente falar que "precisa se concentrar no jogo"), e parece mais motivada pelo que sua participação no esporte representa.
O mesmo se aplica ao núcleo de Bobby Riggs, com mais uma cansada trama de casamento em crise, apelando até mesmo para o clichê da esposa (vivida por uma sumida Elisabeth Shue) jogando as roupas do marido para fora da casa. E é curioso como Beaufoy se dá ao trabalho de trazer frases expositivas como "quem te sustenta sou eu, uma mulher!" mas não explora a relação de Riggs com seu filho ou a súbita transformação para um canalha machista. Tudo nos leva a entender que todas as provocações e comentários misóginos feitos por Riggs nas coletivas de imprensa não passavam de uma forma do tenista em promover o evento e lucrar em cima dessa atenção, que chegou a níveis exagerados de fantasias, líderes de torcida e muito mais holofotes do que eu já vi na vida para uma partida de tênis. Porém, o filme nunca nos mostra essa transição. Nunca nos esclarece que Riggs não é um sujeito mau, e nada do que vimos no primeiro ato nos pinta esse retrato, e o próprio até parece admirar Billie Jean, já que em sua primeiríssima cena ele assiste a um jogo da tenista pela televisão com muito afinco; chegando até mesmo a pegar sua velha raquete da gaveta e praticar alguns movimentos.
Grand Set técnico
Sem um projeto de cinema desde 2012, com Ruby Sparks: A Namorada Perfeita (e antes disso, o badalado Pequena Miss Sunshine), o casal Jonathan Dayton e Valerie Faris entrega aqui sua obra mais requintada em quesitos técnicos. Poucas vezes nos últimos anos vi os anos 70 parecerem tão críveis e bem retratados, com um trabalho excepcional no design de produção e figurino, mas principalmente à fotografia de Linus Sandgren (La La Land), que mescla com habilidade uma paleta de tons de vermelho e azul mais intensos, com uma iluminação fria. A captação em película também garante um leve granulado que ajuda a replicar o estilo da época, e toda a equipe merece aplausos nesse quesito, inclusive pelo uso nostálgico do antigo logo da Fox na vinheta de abertura.
Porém, Dayton e Faris não demonstram muito além do básico na condução da história. As cenas que envolvem os jogos de tênis acabam sendo enfadonhas pela falta de variedade de planos, limitados a um visão geral da quadra (da mesma forma que vemos em transmissões televisivas) e alguns planos médios dos jogadores em momentos específicos; em sua maioria, de reação após alguma jogada. Tênis já não é o tipo de esporte mais empolgante de se assistir, mas basta observar como Alfred Hitchcock consegue tornar uma partida dessas como algo angustiante e empolgante com Pacto Sinistro, pela variação de planos, o jogo de fazer nosso olhar acompanhar a bolinha sendo rebatida de um lado para o outro e a montagem mais elaborada. Claro, nem todos conseguem ser Hitchcock, mas o casal ao menos traz uma ótima sacada de direção, quando Bobby conversa com seu filho em uma escada rolante que está descendo, mas ele teimosamente tenta subir. Uma perfeita simbologia de todo o arco do personagem, que insiste em voltar ao topo de sua carreira, mesmo com a vida inevitavelmente levando-o para baixo.
Por último, mas não menos importante, o elenco no geral faz um bom trabalho. Em sua primeira performance pós-vitória no Oscar, Emma Stone mostra que pode muito bem retornar ao prêmio da Academia, já que seu retrato de Billie Jean é um trabalho carismático e de muitas nuances sutis, especialmente nas cenas com Andrea Riseborough, onde toda a postura determinada e quase matemática e amolecida pelo olhar penetrante de sua amante. Cada vez mais interessado em papéis fora de seu perfil, Steve Carell entrega uma ótima performance como Riggs, e o departamento de maquiagem merece aplausos pela dentadura usada pelo ator, que jamais soa artificial e "pertencem" ao tipo de performance mais barulhenta e eufórica do ator. De restante, o elenco coadjuvante traz boas performances de nomes como Elisabeth Shue, Austin Stowell, Bill Pullman e Jessica McNamee, mas enfraquece a cada segundo em que a cartunesca Sarah Silverman aparece, dando vida a uma personagem deslocada e que serve como péssimo alívio cômico.
É triste ver uma história tão fascinante e relevante ganhando um tratamente tão mediano. A Guerra dos Sexos é cheio de boas intenções e valores deprodução sofisticados, mas não encontra o ponto certo entre a seriedade da história que quer contar, e os toques cômicos que o levam para um estranho lado cartunesco.
A Guerra dos Sexos (Battle of the Sexes, EUA - 2017)
Direção: Valerie Faris, Jonathan Dayton
Roteiro: Simon Beaufoy
Elenco: Emma Stone, Steve Carell, Andrea Riseborough, Sarah Silverman, Natalie Moraes, Elisabeth Shue, Bill Pullman, Alan Cumming, Jessica McNamee, Austin Stowell
Gênero: Drama, Comédia
Duração: 121 min
https://www.youtube.com/watch?v=H5mP6Xp5fYs
Crítica sem Spoilers | Blade Runner 2049 - Uma improvável sequência digna de um clássico
O mero pensamento de se fazer uma continuação para o clássico Blade Runner: O Caçador de Andróides deveria ser digna de diagnóstico de loucura. Eu mesmo quando ouvi e li diversas vezes sobre o desejo de Ridley Scott em revisitar o mundo distópico inspirado na obra de Philip K. Dick, torcia para que a ideia acabasse esquecida, mas quando o diretor praticamente reviveu sua franquia Alien com Prometheus (e Alien: Covenant), a realização de uma nova história com Rick Deckard ficava mais próxima de se tornar realidade.
Para bem ou para mal, Scott acabou limitando-se à função de produtor, entregando as chaves de seu reino chuvoso e banhado a neon para o franco-canadense Denis Villeneuve, que é facilmente um dos grandes nomes - e um dos mais talentosos - do mercado americano em atividade. Mas mesmo assim, é preciso mais do que um gigante para aceitar o desafio de continuar Blade Runner, filme que traz um dos mistérios mais enigmáticos da História do Cinema e que a mera sugestão de uma continuação é o suficiente para estragar sua ambiguidade. Felizmente, Villeneuve entrega o melhor que poderíamos esperar de uma tarefa destas, tornando este Blade Runner 2049 uma experiência formidável.
A trama é complicada. Antes de caminhar sobre esses ovos, é preciso elogiar a inteligência do departamento de marketing da Warner Bros/Sony em esconder diversos elementos básicos da história, e fazer o produto final parecer muito diferente do que realmente é; nada próximo de um filme de ação, como muitos trailers e TV spots pareciam sugerir. Dito isso, basta saber que a história começa 30 anos depois do original, onde uma nova linha de Replicantes, mais obedientes e domesticados, vivem abertamente na sociedade como prestadores de serviço. Nesse cenário, acompanhamos o blade runner conhecido como K (Ryan Gosling), que embarca em uma investigação nebulosa quando um misterioso objeto é encontrado, e a busca o fará reencontrar o aposentado detetive Deckard (Harrison Ford).
Sonhos elétricos
É alentador olhar para os créditos e encontrar o nome de Hampton Fancher, roteirista do primeiro filme, entre os envolvidos. Junto com Michael Green (de Alien: Covenant), Fancher elabora uma trama complexa e bem segmentada, que consegue muito bem equilibrar o que se faz uma boa continuação, mas também criar uma história que se sustente sozinha. A conhecida estrutura do film noir do primeiro é bem presente aqui, mas com os esperados toques mais modernos; por exemplo, se o filme de Scott tinha um ritmo bem próximo de O Falcão Maltês, Villeneuve segue mais a escola de David Fincher e Seven: Os Sete Crimes Capitais - seja no ritmo, seja na natureza mais gráfica da violência e da ação.
Impressiona também ver a imaginação da dupla ao expandir o universo do original, antes concentrado apenas na futurista metrópole de Los Angeles. Ainda que a sequência permaneça nela durante boa parte, vemos novos cantos e outros estabelecimentos que surgem como novidade, e que garantem um visual incrível graças ao trabalho do design de produção, mas chegaremos a ele em instantes. San Diego e Las Vegas também ganham uma participação interessante e que seguem o fantástico world building da dupla. Isso também se estende à mitologia dos Replicantes, que ganham uma roupagem muito mais profunda e sentimental, e é inventiva a ideia de mostrá-los sofrendo preconceito e xingamentos com uma palavra pejorativa a eles (chamados de Skinjobs).
Nosso guia durante praticamente toda a projeção, o policial K é desde já um dos personagens mais interessantes e bem construídos deste universo. Com uma performance apropriadamente fria e apática de Ryan Gosling, praticamente um forasteiro em sua própria cidade, temos a criação de um protagonista misterioso e que constantemente coloca nossa percepção em xeque - e não, não é o tipo de dúvida que você está imaginando. Essa postura ganha um balanço muito original com Joi (Ana de Armas), um holograma com inteligência artificial que serve como sua namorada, e rende algumas das melhores ideias de produção - que remetem bastante à Ela, de Spike Jonze, mas com um pé muito mais centrado no sci-fi do que no romance, e o roteiro de Fancher e Green estabelece um bom núcleo amoroso entre o casal, oferecendo diversas questões sobre a natureza artificial da relação dos dois.
Mas o que muitos aguardam de uma continuação de Blade Runner é mesmo Deckard. Seria o caçador de andróides um replicante? O que acontece após sua fuga com Rachael (Sean Young) no final do anterior? Basta dizer aqui, sem grandes revelações, que Fancher e Green não têm medo de apostar em decisões ousadas e que fazem da ficção científica o gênero mais experimental e libertador para ideias. Ford surge extremamente melancólico e traumatizado, mas com alguns raros momentos de humor que nos lembram do carisma incrível do ator, ainda em ótima forma para um sujeito na casa dos 70. São novas revelações e desenvolvimentos que elevam o personagem, mas que também gritavam por um pouco mais de tempo para atingir todo o potencial, especialmente no que diz respeito à entrada do Niander Wallace de Jared Leto, que assume a postura do antagonista principal, ao lado da ótima Sylvia Hoeks, que interpreta seu braço direito, Luv.
Responsável por desenvolver os novos replicantes, Wallace ganha um retrato típico das bizarrices de Leto, com uma voz grossa e eloquente, e é bem capaz de criar uma presença notável em cena. Porém, suas motivações acabam soando genéricas graças ao texto da dupla (mas tendo em vista o resultado de Covenant, vou deduzir que venha de Green), que resumem suas ideias e intenções a longos monólogos com analogias bíblicas e a relação entre Criador e Criatura, tal como vimos entre os andróides de Michael Fassbender no segundo prequel de Alien. Temos apenas duas cenas com o personagem, e não são o bastante para que o personagem ganhe um aprofundamento necessário, ainda mais porque o longa termina sem lhe dar um desfecho apropriado.
É um verdadeiro desafio seguir a análise do roteiro da dupla sem aprofundar em spoilers, mas tentarei ser breve e manter os segredos. Ainda que todos os elementos que convergem no terceiro ato tenham sido trabalhados anteriormente de forma concisa, foi inevitável sentir um certo inchaço durante sua conclusão. Não só saímos com diversas pontas soltas e arcos inconclusivos, mas pontos de história relevantes acabam mostrando-se como meras muletas narrativas, especialmente com um grupo de Replicantes que conhecemos no terço final do longa. Fica clara a ideia de continuar a história e fazer sequências, mas isso acaba prejudicando a estrutura deste filme como um todo.
Milagre visual
Existem deficiências na história e na forma como as amarras se fecham em sua conclusão, mas em termos técnicos e visuais, é praticamente um milagre. A começar pela direção de fotografia do mestre Roger Deakins, que transporta o estilo dos filmes de Villeneuve (cores dessaturadas, baixo contraste) para o mundo deslumbrante que Jordan Cronenweth criou com Scott em 1982, trazendo aquele que indubitavelmente é o mais belo filme do cineasta. Há diferentes tons de azul para ilustrar a presença de uma neve tóxica na cidade, assim como a luz de neon dos diversos billboards e propagandas holográficas (claro que teríamos um logo gigante da Sony em Blade Runner, claro...), com destaque para a maravilhosa imagem onde K encara um holograma gigante de Joi, sendo banhado pelos tons de rosa e roxo da projeção - um efeito atingido de forma prática, vale apontar.
O visual ainda se reinventa quando apresenta um laranja fortíssimo para o esperado retorno de Deckard - e as condições atmosféricas do local onde o aposentado policial se encontra, afetado pela radiação, justificam essa mudança na paleta; e também na campanha publicitária do longa, que baseou seus cartazes na mistura belíssima de azul e laranja. Eu poderia falar horas e horas sobre a fotografia de Deakins para o filme, mas basta dizer que ser ele não ganhar o tão esnobado Oscar por esse trabalho, a Academia simplesmente deveria cancelar a categoria de Melhor Fotografia. Não vai ter filme mais bonito e deslumbrante do que este no ano. Em muitos anos, talvez.
Igualmente poderoso é o trabalho do designer de produção Denis Gassner, que sabiamente expande o conceito do longa anterior e não perde muito tempo mostrando aquilo que já conhecemos. Temos novos billboards (seguimos no universo paralelo onde Atari e PanAm ainda existem) e uma forte influência árabe nas propagandas e elementos (tal como a japonesa era no original) do centro da metrópole, mas conhecemos bem as áreas mais isoladas e distintas da cidade, que continuam seguindo a estética cyberpunk. O ferro-velho que compõem o distrito de San Diego é fascinante pela quantiade de entulho e os vestígios de uma sociedade enterrados no meio da sucata, passando um extremo desconforto só de se olhar. Gassner também merece aplausos pela forma como a tecnologia evolui no cotidiano, vide os toca-discos com hologramas de cantores ou toda a concepção holográfica de Joi, que é uma das melhores ideias da produção. Mas talvez a jóia na coroa seja a personagem de Carla Juri, responsável por desenvolver e criar as memórias implantadas nos replicantes, e a forma como essa função é representada visualmente, assemelhando sua profissão com a de uma fotógrafa, talvez seja a coisa mais bela e original que vi no cinema em 2017.
Com todas essas ferramentas em mão, o talentoso Villeneuve entrega mais um ótimo trabalho. Seu uso de silêncio e planos de reação ligeiramente mais longos marcam presença aqui, começando já na enquietante e sombria primeira cena, onde K conhece o replicante vivido pelo cada vez melhor Dave Bautista, onde a câmera estática e a variação de planos abertos para fechados (com uma ênfase divertida em uma panela borbulhando no fogão) capta a tensão crescente naquele ambiente. De forma similar, a jornada de K para encontrar Deckard nas ruínas de um cassino é outro momento onde vemos a habilidade do diretor em pegar o espectador pela garganta e prender nossa atenção, dispensando a trilha sonora sintetizada de Hans Zimmer e Benjamin Wallfisch para um silêncio intenso e planos gerais que exploram a profundidade de campo, exacerbando o quão pequeno o protagonista é diante de todas as estruturas; que incluem voluptuosas estátuas de mulheres.
Temos também algumas cenas de ação, e surpreendentemente, essa mesma abordagem silenciosa e intensa se mantém à elas. O primeiro encontro entre K e Deckard é movido por antagonismo, e acaba com um caçando o outro dentro de um salão de festas abandonado, cuja escuridão vai sendo afetada por um sistema holográfico defeituoso, que descontroladamente vai exibindo imagens de Elvis Presley, Marylin Monroe e outros músicos de forma abrupta, em uma conquista visual e sonora impressionante: que é como se o trabalho de Roger Deakins com a silhueta da água viva em 007 - Operação Skyfall levasse uma pancada na cabeça enquanto sob o efeito de LCD, garantindo também um design de som inspirado para distorcer as gravações musicais do holograma. Há uma outra cena mais agitada durante o terceiro ato, mas que infelizmente acaba sofrendo com sua longa duração e a insistência em planos fechados para garantir claustrofobia, mas é o único demérito grave da condução do diretor.
Claro, Blade Runner 2049 nem tinha chance de superar o clássico original, mas diante da tremenda responsabilidade e coragem de ousar continuar uma história tão perfeita, Denis Villeneuve não poderia ter feito melhor. Mesmo com alguns solavancos e decisões atropelhadas no último ato, este novo filme é uma viagem imersiva, cheia de reviravoltas e que nos coloca em um universo de ficção científica que há tempos não presenciávamos, contando também com o auxílio de um elenco fantástico e o melhor dos brinquedos que Hollywood pode oferecer.
É um admirável novo mundo.
Blade Runner 2049 (EUA - 2017)
Direção: Denis Villeneuve
Roteiro: Hampton Fancher e Michael Green, baseado nos personagens de Philip K. Dick
Elenco: Ryan Gosling, Harrison Ford, Jared Leto, Ana de Armas, Robin Wright, Dave Bautista, Mark Arnold, Mackenzie Davis, Barkhad Abdi, Sylvia Hoeks
Gênero: Ficção Científica
Duração: 163 min
https://www.youtube.com/watch?v=86XtZMgFziI
Crítica | A Hora Mais Escura
Quando Osama bin Laden foi declarado morto pelo governo dos EUA em 1 de Maio de 2011, eu estava na escola. Envolto em programas de informática e embebido pelo sono provocado pela aula das 7, foi um dos poucos momentos em minha vida que senti estar presenciando a História sendo feita – para bem, ou para mal. E mesmo condenando diversas práticas adotadas pelos EUA nessa questão, o ataque da Al-Qaeda em 11 de Setembro é um dos mais abomináveis e cruéis dos últimos tempos.
Mas deixando de lado minha visão política, A Hora Mais Escura faz um ótimo trabalho ao abordar esse tema tão controverso de forma corajosa e que não surja como uma propaganda pró EUA. Isso porque a diretora Kathryn Bigelow não é Michael Bay. A única mulher oscarizada no cargo (vitória adquirida com Guerra ao Terror, em 2010) oferece um tratamento quase documental, certamente fruto da experiência do roteirista Mark Boal como jornalista, e traz uma narrativa repleta de eventos e nomes; tendo início em 2003 e culminando na operação de 2011. E Bigelow felizmente não cai na alternativa de glorificar os soldados americanos e colocá-los caminhando em câmera lenta ao som de uma melodia patriota.
A primeira metade do filme é centrada na tortura. Práticas hediondas que a diretora retrata na mera função de comprovar sua existência na busca pelo terrorista – ao contrário das críticas que o filme sofreu, que o acusaram de glamourizá-la inapropriadamente – a diretora claramente as taxa como um “mal necessário” (ainda mais se levarmos em conta os minutos iniciais que trazem gravações do 11 de Setembro, em uma forma de aplicar o pensamento de que “os fins justificam os meios”) e de forma alguma as julga como positivas. Sua câmera é sempre inquieta e constante, causando um senso de tensão ao longo da projeção – mesmo que tenha escritórios da CIA e salas de reuniões como ambientes principais. E ainda que a montagem de William Goldenberg e Dylan Tichenor seja eficiente ao organizar todas as informações que levarão ao terrorista, é Jessica Chastain que carrega nas costas esse bloco inicial.
Interpretando a versão fictícia de uma agente real (mas cuja identidade é mantida em sigilo, já que esta ainda encontra-se em atividade), Chastain impressiona e provoca grande admiração por sua indestrutível persistência. Durona e não deixando sua beleza ficar à frente de sua integridade (“Eu sou a ‘motherfucker’ que achou a casa”, diz ela a seus superiores), a atriz demonstra bem o cansaço através dos olhos pesados e os cabelos bagunçados de Maya; mas que também jamais perde seu foco em completar sua tarefa (e sua insistência ao marcar um certo número de dias diariamente na janela de seu chefe é uma bela evidência de sua insatisfação).
E quando chega a “hora mais escura” que todos estavam esperando para ver, o filme se transforma. Tendo o roteiro modificado durante as filmagens (já que a produção começara em um período anterior à morte de bin Laden), a mudança de ritmo é notável e gera uma melhora significativa ao filme. Mesmo que já saibamos o desfecho, a cena da invasão é de um nível cinematográfico excepcional graças à forte condução de Bigelow (que aposta na ausência de música e em momentos de violência gráfica e duvidosa) e a fotografia de Greig Fraser; cujo uso da escuridão e de visões noturnas chega a causar arrepios.
Não tenho dúvidas de que há muita ficção em A Hora Mais Escura. Mas mesmo que alguns fatos apresentados tragam uma veracidade questionável, funcionam eficientemente bem como peça de entretenimento e não do tipo que vangloria uma nação. Ao invés de comemorar euforicamente a morte de Osama bin Laden, o filme traz de volta a questão maquiavélica e ainda deixa no ar uma ainda mais complexa: ” e agora?” A reação ambígua de Maya, que com olhos lacrimejados e a noção de que havia concluído uma tarefa que lhe custara 12 anos de sua vida, é a prova de que o filme vai além de sua proposta.
A Hora Mais Escura (Zero Dark Thirty, 2012 – EUA)
Direção: Kathryn Bigelow
Roteiro: Mark Boal
Elenco: Jessica Chastain, Jason Clarke, Joel Edgerton, Chris Pratt, Kyle Chandler, James Gandolfini.
Duração: 157 min
Especial | Darren Aronofsky
Um dos nomes mais controversos e autorais do cinema contemporâneo, Darren Aronofsky tem uma filmografia curta, mas expressiva. A cada projeto, o cineasta americano foi capaz de causar alguma impressão e deixar sua marca, e reunimos neste especial toda nossa cobertura de sua carreira até então.
Confira:
Crítica | Pi
Publicado originalmente em 17 de setembro de 2017
Crítica | Réquiem para um Sonho
Publicado originalmente em 18 de setembro de 2017
Crítica | Fonte da Vida
Publicado originalmente em 19 de setembro de 2017
Crítica | O Lutador
Publicado originalmente em 21 de setembro de 2017
Crítica | Cisne Negro
Publicado originalmente em 8 de julho de 2016
Crítica | Noé
Publicado originalmente em 24 de julho de 2017
Crítica | Mãe!
Publicado originalmente em 15 de setembro de 2017
LISTAS
Ranking dos filmes de Darren Aronofsky
Publicado originalmente em 20 de setembro de 2017
ARTIGOS
Uma Estrada para a Plenitude - O Final de Fonte da Vida Explicado
Publicado originalmente em 21 de setembro de 2017
Alegoria Apocalíptica - O Final de mãe! Explicado
Publicado originalmente em 21 de setembro de 2017
Crítica | Noé
Ao passear pela carreira do cineasta americano Darren Aronofsky, nem poderíamos imaginar que futuramente encontraríamos Noé entre as produções, geralmente centradas em personagens problemáticos que enfrentam grandes dilemas morais e surtos psicológicos. Mas terminada a sessão, é bem claro que o personagem-título deste novo filme é uma figura que se encaixa perfeitamente na carreira do diretor e que, fiel ou não ao material bíblico, oferece um estudo complexo e fascinante.
A trama adapta o icônico conto bíblico da Arca de Noé, quando Deus (ou o Criador, a como é se referido aqui) estava insatisfeito com a maldade do Homem e resolveu enviar um dilúvio para extinguir a humanidade e recomeçar do zero. A fim de garantir a sobrevivência dos animais, o Criador recorre ao ser humano que este julga como mais puro e digno da tarefa: Noé (vivido por Russell Crowe).
Eu realmente temia pelo futuro de Aronofsky quando este anunciou Noé como seu próximo projeto. Não só os grandes épicos bíblicos parecem esquecidos por Hollywood (curiosamente, agora mais produções do gênero estão para chegar nos próximos anos), mas também pelo inevitável embate cineasta autoral vs. grande estúdio americano. Felizmente, o diretor – que assina o roteiro ao lado de Ari Handel – faz uso de todas as ferramentas megalomaníacas de uma produção blockbuster para compor uma história esperta e permeada por discussões filosóficas mais complexas do que o esperado. A fotografia de Matthew Libatique é eficaz ao capturar lindíssimas imagens de ambientes primordiais (a razão de aspecto expandida da tela ajuda), o design de produção de Mark Friedberg impressiona pelo escopo e realismo da robusta arca e o figurinista Michael Wilkinson merece aplausos pela releitura radical no visual de seus personagens: desde um Noé barbudo e careca até o antagonista Tubal Cain (Ray Winstone), cujas vestes de couro se sobressaem diante de seus colegas de cena.
Tecnicamente impecável (com exceção daquelas horrorosas pombas digitais, que garantem uma premonição do que um remake de Os Pássaros nos aguardaria), Noé realmente chama a atenção por seus significados. Classificá-lo como uma produção apelativa à religião seria um equívoco, até porque o filme traz diversos elementos da teoria evolucionista (que inclui uma das montagens aceleradas mais lindas já feitas, e que certamente deu dor de cabeça ao talentoso montador Andrew Weisblum). Nas mãos de Aronofsky (que, mera curiosidade, é ateu), Noé é um sujeito complexo e cuja devoção cega ao Criador o testa a refletir e contrariar sobre as mais delicadas questões: seriam todos os humanos mortos pelo dilúvio dignos de tal aniquilação? Definitivamente não. O momento em que Noé e sua família tentam se confortar no interior da arca, com os desesperados gritos abafados ecoando pelas paredes é um dos pontos altos da produção, já que quebra qualquer maniqueísmo em relação às motivações de seus personagens – incluindo as do próprio Criador.
O jogo fica ainda mais intrigante quando o roteiro nos revela até onde a devoção do protagonista a seu superior pode levá-lo, revelando facetas assustadoras – que Russell Crowe é excepcional ao exibí-las e contrastá-las com o retrato bondoso e amigável de Noé que vira traçando na primeira metade do longa. Sem entrar muito em detalhes, mas as decisões tomadas pelo protagonista no desfecho de tal evento são sutilmente refletidas nas figuras dos Guardiões – gigantes de pedra que parecem ter saído de uma escultura rupestre – que representam os anjos caídos; expulsos do Paraíso pelo Criador por sua compaixão à Adão. Quando se analisa a decisão final de Noé no longa, é um paralelo muito viável.
Embalado também pela belíssima trilha sonora do mestre Clint Mansell, Noé é um épico cuja preocupação com os dilemas de seus personagens impressiona tanto quanto o espetáculo visual. Nas mãos de um cineasta do calibre de Darren Aronofksy, é uma obra rica e capaz de iniciar as mais diferentes discussões. Não importando qual religião ou crença.
Noé (Noah, EUA - 2014)
Direção: Darren Aronofsky
Roteiro: Darren Aronofsky e Ari Handel
Elenco: Russell Crowe, Jennifer Connelly, Emma Watson, Logan Lerman, Douglas Booth, Anthony Hopkins
Gênero: Aventura, Drama
Duração: 138 min
https://www.youtube.com/watch?v=jLeE9OmyBg4
Crítica | Kingsman: O Círculo Dourado - Tudo o que uma continuação não deve ser
Matthew Vaughn sabe das coisas.
Desde que começou a dirigir seus próprios filmes, saindo da sombra de seu "mentor" britânico Guy Ritchie, o diretor foi se mostrando como uma das vozes mais originais e dinâmicas do cinema de gênero. Um pequeno indie de crime que brincava com seu estilo em Nem Tudo é o que Parece, um conto de fadas irreverente e inventivo com Stardust - O Mistério da Estrela e duas incursões primorosas no estudo do super-herói com Kick-Ass: Quebrando Tudo e X-Men: Primeira Classe. Esses últimos foram tão adorados que imediatamente geraram continuações, mas que dispensaram a presença do diretor; inseguro em trabalhar novamente com o mesmo material e se repetir, o que levou-o à adaptação da graphic novel Kingsman: O Serviço Secreto, obra de Mark Millar e Dave Gibbons.
Pessoalmente, acho o filme de 2015 seu melhor trabalho. Perfeito como sátira e homenagem, era uma exemplar história de espião que trazia fortes ecos da era dos James Bonds de Sean Connery e Roger Moore, abraçando o cartunesco e camp na medida certa e com a elegância inglesa que tornou o agente secreto de Sua Majestade tão popular, além de evocar todas as características que tornaram a carreira de Vaughn tão única; desde seu talento com cenas de ação até o humor negro impagável. Com um resultado tão excepcional, foi uma felicidade geral que Vaughn faria a primeira continuação de sua carreira com Kingsman: O Círculo Dourado. Porém, para um cineasta tão inteligente e entendido dos gêneros que explora, é uma gigantesca decepção que este seja seu pior e mais problemático filme.
A trama começa algum tempo depois do original, com Eggsy (Taron Egerton) atuando na agência Kingsman como o novo Galahad, enquanto mantém um namoro firme com a princesa sueca Tilde (Hanna Almström). Tudo vai bem até o momento em que o espião é atacado por Charlie (Edward Holcroft), antigo recruta que aliou-se a um misterioso cartel de drogas chefiado pela megalomaníaca Poppy (Julianne Moore), que facilmente destrói o QG dos Kingsman e elimina praticamente todos os agentes. Batendo em retirada, Eggsy e Merlin (Mark Strong) pedem auxílio aos Statesman, a versão americana da agência de espionagem.
Continuação de Meia medida
Assinando o roteiro ao lado de sua parceira habitual, Jane Goldman, Vaughn segue uma máxima importante na realização de toda boa continuação: começa a história com nosso protagonista se acostumando a uma nova realidade e então, literalmente, lhe tira tudo e joga-o em uma situação extrema. Isso é bem situado com a destruição da Kingsman e sua relação com Tilde, mas esta última infelizmente é incapaz de gerar o mínimo afeto ou desenvolvimento; convenhamos, o envolvimento de Eggsy com a princesa sueca não precisava ter ido além daquela piadinha escatológica no final do primeiro filme, e o relacionamento sério entre os dois é algo que fica forçado - especialmente pela falta de química entre seus intérpretes. Mas essa ideia de Eggsy jogado à realeza ao menos rende alguns momentos divertidos, como o jantar onde o jovem usa seus gadgets para surpreender seu sogro acerca de conhecimentos políticos e culturais.
Muito em O Círculo Dourado funciona assim: uma premissa interessante que acaba rendendo um ou outro conceito ou momento, mas que acaba tristemente subaproveitada. Desde o retorno de Charlie, um personagem bem coadjuvante do primeiro filme que ganha um destaque importante (e o roteiro da dupla agrada por usar uma minúscula ação do anterior para justificar a condição física de seu retorno), até a expansão do universo da história para nos apresentar aos Statesman. Se os Kingsman usam uma alfaiataria em Londres como disfarce, os primos americanos atuam como uma destilaria de uísque no Kentucky, o que por si só já oferece uma porta para inúmeras piadas e comparações entre os estilos distintos dos dois. Inexplicavelmente, o único humor fica nesse setting, visto que o roteiro não explora nada além do estereótipo do cowboy ou do caipira (não seria mais interessante explorar o estereótipo do espião americano remodelado com a franquia Bourne?), algo refletidos no sotaque dos personagens de Channing Tatum e Jeff Bridges ou no laço característico do agente vivido por Pedro Pascal, assim como os figurinos marcados por jeans e chapéus de praticamente todos os da agência - a trilha musical de Henry Jackman e Matthew Margeson também acerta ao trazer uma influência "caipira" e próxima do western - com as guitarras e banjos - para as cenas de ação desses personagens.
Toda a caracterização é perfeita, mas não temos nada além disso. Os personagens de Tatum e Bridges, por exemplo, aparecem pouquíssimos e são tristemente desperdiçados pelo roteiro, que mantém o chefe sênior de Bridges nas sombras e inventa um obstáculo fraco para tirar o ótimo Tatum da narrativa, literalmente colocando-o em uma geladeira. Halle Berry é outro tiro desperdiçado, atuando como a versão feminina de Merlin (o Q da operação), mas sem qualquer desenvolvimento ou alguma característica marcante, além do velho clichê da "analista que quer atuar no campo" sendo usado para garantir algum tipo de conflito. Pascal é o que acaba melhor aproveitado aqui, e felizmente o ator é carismático o bastante para tornar seu agente Uísque (sim, todos na Statesman têm codinomes de bebidas) uma figura interessante, ainda que sua motivação seja patética e apressada - algo que o filme faz muito: nos apresentar elementos e conceitos com os quais somos obrigados a nos importar imediatamente.
Um exemplo gritante disso, além de todas as viradas sem graça da relação entre Eggsy e Tilde, é a inserção abrupta de um núcleo presidencial em pleno segundo ato, envolvendo os personagens recém-apresentados de Bruce Springwood e Emily Watson. Diretamente ligados às ameaças da vilã Poppy, o drama criado pelos roteiristas é tão capenga e artificial, e também problemático na forma como lida com o problema do uso de drogas. Interpretada por uma inspirada Julianne Moore, Poppy é uma vilã cuja motivação nunca fica muito clara e nem parece forte o suficiente, em uma versão mais elaborada de "quero ser notada", algo muito mais fraco se comparado com o Valentine de Samuel L. Jackson, que era sim um psicopata, mas com um propósito específico e que até conseguia ser coerente em suas metáforas. Em termos de diálogos, todas as interações da personagem servem para vomitar exposição e oferecer detalhes de forma pouco sutil, além do velho clichê do "vilão que usa de alegorias para parecer inteligente", no caso, uma observação sobre como o açúcar é mais viciante do que suas drogas e, ainda assim, legalizado.
Poppy só ganha pontos pelo carisma de Moore e a "meiguice" que a atriz confere a uma completa lunática, vide a bizarra cena onde a vilã prepara um hamburguer com a carne de um funcionário recém-assassinado, e faz seu sucessor comê-lo. Outro ponto válido é a concepção da personagem, que vive isolada em uma floresta asiática, mas toda decorada com elementos, cenários e objetos que recriam os anos 50 - em um acerto louvável do designer de produção Darren Gilford, que utiliza bem os elementos vermelhos em objetos, balcões e paredes, e os doces artificiais como decoração nas externas; praticamente uma Disneyland açucarada e cinquentista. Já todos aqueles cachorros e operários robôs? Incogruentes com a proposta retrô de Poppy, e sinceramente, são ridículos demais; o primeiro sabia bem como dosar esse exagero, mais ligado ao Bond clássico. Aqui, o nível é mais pra Austin Powers. E já que falei em ridículo, prefiro nem comentar a pavorosa participação do músico Elton John, desde já um candidato fortíssimo para o Framboesa de Ouro.
No primeiro filme, o roteiro de Vaughn e Goldman era cuidadoso ao estabelecer todas as peças no primeiro ato do longa, que é invejável em sua estrutura cuidadosa e certeira, mas aqui todas as coisas são jogadas e tiradas da cartola, e esse é um problema grave que também se aplica aos gadgets. Claro, não cobro realismo ou lógica de uma aventura que se propõe a abraçar o cartunesco, mas quando todas as artimanhas e instrumentos surgem apenas no Deus Ex Machina (como o para-quedas de Uísque ou o clarão do relógio de Eggsy), fica difícil se envolver emocionalmente, já que os personagens parecem capazes de solucionar toda e qualquer situação - problema que também vem afetando muito o Homem de Ferro de Robert Downey Jr, mas isso é assunto para outro dia. Novamente, no primeiro filme todos os gadgets nos eram apresentados em um momento anterior (é uma lei sagrada dos filmes de 007), e seu uso posterior nas cenas de ação fazia mais sentido e até causava um senso de satisfação maior, por ser a recompensa ao espectador após uma promessa. Aqui, não há promessa alguma, apenas uma entrega excessiva que é empurrada goela abaixo, como uma criança histérica querendo brincar com todos os brinquedos ao mesmo tempo.
Mas talvez a grande suspensão de descrença que O Círculo Dourado proporcione é o retorno do Harry Hart de Colin Firth. Sua morte no filme anterior era uma das grandes surpresas da história, e também uma de suas grandes virtudes na forma em que afetava o personagem de Taron Egerton e o forçava a amadurecer, então Vaughn e Goldman deviam ter um ótimo motivo para trazê-lo de volta dos mortos, certo? Infelizmente, devia ser apenas saudades do ótimo superespião, já que a desculpa inventada para trazê-lo é tão absurda e circunstancial que não justifica qualquer ação do personagem; sem falar que elimina qualquer senso de risco aos personagens, já que somos introduzidos a um novo elemento que praticamente pode eliminar a mortalidade, em um problema similar àquele oferecido pelo sangue milagroso de Benedict Cumberbatch em Além da Escuridão: Star Trek.
Em mais uma máxima de sequências, temos Harry sem memória, o que nos leva para mais uma fórmula consagrada em que o jovem aprendiz do anterior precisa treinar seu mestre (vide Homens de Preto 2), mas nem isso é realizado já que a amnésia temporária logo é curada e Harry retorna o mesmo... mas imperfeito em suas habilidades. É estranhíssimo e revela como os roteiristas não têm ideia do que fazer com Harry, já que nem mesmo a relação com Eggsy evoluí ou traz algo de novo - o arco do jovem já estava completo no anterior, com a morte de seu mestre. Trazê-lo de volta é pura nostalgia.
O Trauma de Free Bird
Com uma história problemática e desencontrada, ao menos teríamos o talento de Matthew Vaughn para elaborar setpieces e cenas de ação marcantes? Por incrível que pareça, o Vaughn diretor surge tão deficiente quanto seu lado roteirista. Obviamente, o primeiro Kingsman acabou marcado pela espetacular cena do massacre na igreja, onde o agente de Colin Firth participava de uma verdadeira carnificina em plano sequência ao som de "Free Bird" do Lynyrd Skynyrd, então uma continuação de certa forma "clama" por uma sequência que a superasse. Felizmente, Vaughn em pessoa afirmou em entrevistas que essa não era sua intenção, e que todas as cenas de ação precisariam funcionar em serviço da história, não tendo a intenção de "superar a cena da igreja" como motivação para cada set piece. Curioso que o diretor tenha dito isso, visto que ele faz exatamente o contrário desta afirmação na maioria das cenas de pancadaria.
A fórmula de "música pop + pancadaria + plano sequência falseado" norteia praticamente todas as cenas de ação do filme, mas tudo parece mais exagerado aqui, além de sofrer de uma artificialidade gritante. A primeira grande cena, que já surge nos primeiros minutos de projeção de forma abrupta, traz uma luta dentro de um taxi que sofre para lidar com o espaço comprimido e a coreografia confusa, além das técnicas para esconder os cortes seja muito evidente e distraia; sem falar no slow motion excessivo e nas intrusivas mudanças no aspect ratio graças à tecnologia IMAX, que é absolutamente dispensável aqui. Esse tipo de crítica cairia bem em praticamente todas as outras cenas, mas o uso do espaço mais aberto garante uma coreografia interessante e divertida, especialmente quando temos o laço de Uísque envolvido.
Mas nada parece realmente novo, e a todo momento Vaughn acaba trazendo alguma música pop para servir de fundo, além de repetir diversas situações do anterior de forma preguiçosa; como mais uma briga de bar ou Eggsy lutando com algum oponente de prótese. Entretém, sim, mas nada realmente fica na memória ou causa uma grande impressão como no anterior, e o filme sofre também com um exagero nos efeitos visuais; que não chegam a ser exatamente ruins, mas o espectador percebe sua presença na hora de travellings digitais que nunca acabam, membros robóticos e uma cena envolvendo um teleférico que em momento algum surge convincente. O mesmo precisa ser dito dos cachorros robôs que acabam sendo uma enorme distração no clímax, e surgem como capangas muito mais genéricos e menos interessantes do que a Gazelle de Sofia Boutella.
O jogo de câmera de Vaughn nos momentos mais simples também surge mais pobre. Se no primeiro tínhamos movimentos de câmera elegantes e transições inteligentes, aqui a grande maioria é rendida aos já mencionados travellings digitais. Até mesmo a encenação básica do diretor parece comprometida, como na escatológica cena em que Poppy prepara o hamburguer canibal: vemos o corpo do pobre coitado sendo triturado pelo moedor, Poppy apanhando um bolo de carne e modelando a forma de um hamburguer e depois jogando-o na chapa. Quando o consumidor retorna, Vaughn e a vilã o oferece o sanduíche pronto, a câmera vira-se para o moedor onde o corpo da vítima ainda está ali, como se Vaughn quisesse "lembrar" o espectador sobre a natureza do alimento. Oras, nós acabamos de ver a cena do trituramento, qual a necessidade de precisar ficar - com perdão pelo trocadilho - mastigando para o espectador?
Como amante incondicional do primeiro filme, é triste ver como Kingsman: O Círculo Dourado faz todas as decisões erradas que uma continuação poderia fazer. Traz ótimas ideias e uma premissa saborosa, mas falha ao desenvolvê-las e trazer inovações pertinentes, que diversas vezes fazem este filme parecer como uma versão inchada e genérica do primeiro filme. Matthew Vaughn evitou fazer continuações por muito tempo, e a experiência aqui certamente indica que havia motivo para não fazê-las.
Vaughn sabe das coisas, mas não como continuá-las.
Kingsman: O Círculo Dourado (Kingsman: The Golden Circle, EUA/Reino Unido - 2017)
Direção: Matthew Vaughn
Roteiro: Matthew Vaughn e Jane Goldman, baseado na obra de Mark Millar e Dave Gibbons
Elenco: Taron Egerton, Colin Firth, Channing Tatum, Mark Strong, Pedro Pascal, Halle Berry, Julianne Moore, Jeff Bridges, Edward Holcroft, Hanna Alström, Sophie Cookson, Michael Gambon, Bruce Greenwood, Emily Watson, Elton John, Poppy Delevingne
Gênero: Ação, Aventura
Duração: 140 min
https://www.youtube.com/watch?v=8IkjDXqpxc0
Estúdio | Netflix
Um dos gigantes do audiovisual moderno, a Netflix evoluiu de um mero serviço de streaming para uma produtora de conteúdo respeitável e que está constantemente desafiando as convenções do mercado. Aqui, reunimos todo o nosso conteúdo original da Netflix.
Confira:
FILMES
2017
Crítica | Castelo de Areia
Publicado originalmente em 25 de junho de 2017
Crítica | War Machine
Publicado originalmente em 8 de junho de 2017
Crítica | Okja
Publicado originalmente em 30 de junho de 2017
Crítica | Death Note
Publicado originalmente em 26 de agosto de 2017
Crítica | Jogo Perigoso
Publicado originalmente em 30 de setembro de 2017
Crítica | A Babá
Publicado originalmente em 17 de outubro de 2017
Crítica | 1922
Publicado originalmente em 25 de outubro de 2017
SÉRIES
2015
Crítica | Demolidor - 1ª Temporada
Publicado originalmente em 22 de julho de 2016
Crítica | Narcos - 1ª Temporada
Publicado originalmente em 24 de setembro de 2017
Crítica | Jessica Jones - 1ª Temporada
Publicado originalmente em 25 de julho de 2016
2016
Crítica | Demolidor - 2ª Temporada
Publicado originalmente em 27 de julho de 2016
Crítica | Narcos - 2ª Temporada
Publicado originalmente em 30 de setembro de 2017
Crítica | Stranger Things - 1ª Temporada
Publicado originalmente em 21 de julho de 2016
Crítica | Luke Cage - 1ª Temporada
Publicado originalmente em 3 de outubro de 2016
Crítica | Easy - 1ª Temporada
Publicado originalmente em 16 de outubro de 2016
Crítica | Black Mirror - 3ª Temporada
Publicado originalmente em 28 de outubro de 2016
Crítica | The Crown - 1ª Temporada
Publicado originalmente em 6 de novembro de 2016
Crítica | 3%
Publicado originalmente em 26 de novembro de 2016
2017
Crítica | Caçadores de Trolls - 1ª Temporada
Publicado originalmente em 10 de julho de 2017
Crítica | Desventuras em Série - 1ª Temporada
Publicado originalmente em 17 de janeiro de 2017
Crítica | Santa Clarita Diet - 1ª Temporada
Publicado originalmente em 14 de fevereiro de 2017
Crítica | Punho de Ferro - 1ª Temporada
Publicado originalmente em 18 de março de 2017
Crítica | 13 Reasons Why - 1ª Temporada
Publicado originalmente em 13 de abril de 2017
Crítica | Girlboss - 1ª Temporada
Publicado originalmente em 28 de abril de 2017
Crítica | Master of None - 2ª Temporada
Publicado originalmente em 13 de maio de 2017
Crítica | Unbreakable Kimmy Schmidt - 3ª Temporada
Publicado originalmente em 26 de maio de 2017
Crítica | House of Cards - 5ª Temporada
Publicado originalmente em 15 de junho de 2017
Crítica | Castlevania - 1ª Temporada
Publicado originalmente em 10 de julho de 2017
Crítica | Orange is the New Black - 5ª Temporada
Publicado originalmente em 20 de julho de 2017
Crítica | Ozark - 1ª Temporada
Publicado originalmente em 29 de julho de 2017
Crítica | Os Defensores - 1ª Temporada
Publicado originalmente em 19 de agosto de 2017
Crítica | Narcos - 3ª Temporada
Publicado originalmente em 1º de outubro de 2017
Crítica | Big Mouth - 1ª Temporada
Publicado originalmente em 4 de outubro de 2017
Crítica | Mindhunter - 1ª Temporada
Publicado originalmente em 14 de outubro de 2017
Crítica | Stranger Things - 2ª Temporada
Publicado originalmente em 27 de outubro de 2017
Crítica | Alias Grace - 1ª Temporada
Publicado originalmente em 4 de novembro de 2017
Crítica | O Justiceiro - 1ª Temporada
Publicado originalmente em 18 de novembro de 2017
Crítica | Louca Obsessão
É uma relação curiosa, aquela entre um artista e seus admiradores. Há uma polêmica muito grande quando, por exemplo, George Lucas anunciava algum tipo de alteração digital em suas versões de Star Wars, com os críticos apontando que, agora, a os filmes não pertenciam mais à Lucas, mas sim aos fãs. É um raciocínio interessante, e que o autor Stephen King levou a um outro nível de insanidade com seu livro Misery, logo adaptado para os cinemas na forma de Louca Obsessão, um primoroso suspense de Rob Reiner.
A trama nos apresenta ao escritor Paul Sheldon (James Caan), que ganhou fama pela franquia bem-sucedida de uma personagem chamada Misery. Após terminar o primeiro rascunho do último livro da série, ele sofre um acidente de carro durante uma nevasca, sendo resgatado pela enfermeira Annie Wilkes (Kathy Bates). Com as pernas quebradas e ombro deslocado, Sheldon é acolhido na casa dessa aparente boa samaritana, que logo revela-se uma fã devota do autor e da série da Misery. Ah, claro, ela também é uma psicopata obcecada por Sheldon, e o mantém em cativeiro.
Uma premissa riquíssima e que o próprio King deve ter elaborado a partir de um fantasioso “e se”, e que o roteirista William Goldman transporta com muito cuidado e eficiência. É uma história simples e direta, que se desenrola de forma intensa e surpreendente, à medida em que vamos aprendendo mais sobre a natureza de Annie e seu passado, e o espectador acaba comendo as unhas de pavor ao entender o tipo de situação onde Sheldon está metido. A obsessão de Annie acaba chegando a níveis pavorosos quando ela começa a agredir e drogar o autor, para mantê-lo ainda de cama por meses e meses, além de queimar seu manuscrito do livro final de Misery e obriga-lo a escrever uma nova versão que a agrade – Sheldon havia matado a protagonista da série na versão original, o que enfurece Annie. Isso me faz pensar na quantidade de cartas furiosas que George R.R. Martin já deve ter recebido pela saga Crônicas de Gelo e Fogo... Bem, espero que tenham sido apenas cartas.
Inteligentemente, a trama divide a narrativa ao nos fazer acompanhar o núcleo do policial vivido pelo excelente Richard Farnsworth, que vai coletando pistas plausíveis sobre o desaparecimento do autor e cria uma conexão com Annie e as obras de Sheldon. Claro, sendo esta uma narrativa imprevisível, o desfecho desse núcleo infelizmente não é o dos mais agradáveis.
A direção de Rob Reiner é outro grande ponto alto aqui. Desde os segundos iniciais, quando temos closes da máquino tipográfica de Sheldon, a taça de champanhe vazia e o cigarro com um fósforo aguardando, somos bombardeados com informações relevantes sobre o protagonista, e também importantes pistas para a resolução da história - e Reiner apresenta tudo isso de forma misteriosa e instigante. Quando temos a interação entre Annie e Sheldon, o diretor aposta em diferentes planos que variam de acordo com a intensidade do diálogo, como ao trazer um plongée absoluto para mostrar a enfermeira colocando-o na cama. Vale mencionar também o fascínio de Reiner com planos-detalhe, como quando Sheldon usa um grampo para destrancar uma porta, ou quando esconde uma cartela de remédios dentro da calça - este último, responsável por um dos momentos mais intensos do filme. E, claro, a cena da marreta, que choca justamente pela falta de floreios ou exageros, revelando a tábua de madeira entre os pés de Sheldon em um desses planos-detalhe, e o golpe frio em um plano médio.
Então, temos o elenco, praticamente movido inteiramente por seus dois protagonistas. James Caan acerta ao trazer uma performance física e desesperada, onde o espectador entende seu esforço e dor, e torce por ele quando Sheldon começa a embarcar em um jogo mais complexo com sua captora, fingindo elogiá-la ou admirá-la. Mas é mesmo Kathy Bates quem rouba todos os holofotes, em uma performance vencedora do Oscar de Melhor Atriz (único prêmio da Academia para uma obra inspirada nos romances de King). Annie transita abruptamente de uma moça inocente e simpática para um verdadeiro monstro, elevando o tom de voz e até esbugalhando levemente seu olhar – na medida exata para não tornar-se caricata -, e que ganham mais força com os zooms sutis da câmera de Reiner quando enquadra a personagem gritando. Uma das grandes vilãs da História do Cinema.
Sem dúvida alguma, uma das melhores adaptações de Stephen King para os cinemas. Movido pelas excepcionais performances de sua dupla principal e a direção envolvente, Louca Obsessão é um suspense intenso e imprevisível, e que também nos faz pensar sobre a cultura da fanbase. Nunca esteve tão atual.
Louca Obsessão (Misery, EUA – 1990)
Direção: Rob Reiner
Roteiro: William Goldman, baseado na obra de Stephen King
Elenco: James Caan, Kathy Bates, Richard Farnsworth, Frances Sternhagen, Lauren Bacall
Gênero: Suspense
Duração: 107 min
https://www.youtube.com/watch?v=VESCIlSfsVM
Cine Vinil #08 | Lado A: Por que Amei Death Note
Dia vs Noite, TWD vs GOT, DC vs Marvel, BvS vs Guerra Civil, Xbox vs Playstation, Flamengo vs Fluminense, Android vs iOS, McDonalds vs Burger King, Nerd vs Nerd, Fanboy vs Fanboy.
O multiverso nerd é pautado por discussões intermináveis e, geralmente, extremamente redundantes. Mas com toda a certeza a gente adora aquela treta cósmica para provar que um lado é melhor que o outro – mesmo que o único convencido na discussão seja você mesmo. Analisando essa treta tão peculiar, decidimos trazer um pouco desse espírito “saudável” de discussão para o nosso site.
Sejam bem-vindos ao Cine Vinil! Calma, antes de soltar os cães nos comentários, entenda nossa proposta. Os discos de vinil foram um dos itens mais amados para reprodução de arquivos sonoros. Sua grande peculiaridade eram os lados A e B. O lado A era utilizado para gravar os hits comerciais das bandas, músicas mais populares. Enquanto o Lado B era mais voltado para canções experimentais ou mais autorais.
No caso, nos inspiramos pelos lados opostos do mesmo “disco” – de uma mesma obra. Serão dois artigos: o Lado A, que contém a opinião positiva, e o Lado B, com a versão negativa. Os autores, obviamente, serão distintos, e escolherão 5 pontos específicos da obra para justificar seus argumentos.
Explicado o conceito, nós lhes desejamos aquela ótima discussão para defender o seu lado favorito! Quem ganhou? Lado A ou Lado B? Que a treta perfeita comece!
Atenção aos spoilers.
LADO A
por Lucas Nascimento
Transposição cultural
Certo, todos os fãs do anime reclamaram muito das mudanças que a versão do Netflix realizou na mitologia e personagens do original. Só deixando claro que, como não conheço o material original, todas essas mudanças são absolutamente irrelevantes se analisarmos a obra por si só; se é diferente do original, é um fator externo que não deveria ser levado em conta na análise deste novo filme. Dito isso, é louvável que as personas e ambientações da história foram adaptadas para os EUA, ganhando arquétipos e um ritmo essencialmente americano; digo isso em comparação com o Ghost in the Shell lançado esse ano, que preservou o setting japonês... apenas para preenchê-lo com atores caucasianos, o que provoca um certo anacronismo. Aqui, a Netflix ao menos teve o bom senso de situar tudo no país de seus intérpretes, e essa transposição funciona.
Direção apurada
Adam Wingard é um nome que lentamente vai ganhando mais reconhecimento em Hollywood, após o elogiado Você é o Próximo e a divisiva continuação de A Bruxa de Blair. Com este Death Note, o diretor mostra que definitivamente sabe elaborar bons visuais e trabalhar um jogo de câmera inteligente, vise o uso estilístico de planos holandeses, um slow mo que contribui para algumas sequências climáticas e toda a atmosfera que é capaz de criar; isso sem falar no gore horrendo com todas as mortes. Ainda que imperfeito, vemos que Wingard é um cara de talento.
Visual Emblemático
Em complemento à condução de Wingard, temos aqui um dos filmes mais ricos em termos de visual que a Netflix já ofereceu até então - com exceção de Beasts of No Nation, esse é sem sombra de dúvida o filme mais estilizado e bem feito nos quesitos visuais. A fotografia de David Tattersall é esperta ao brincar com equilíbrio de cores (vide o lindíssimo primeiro encontro entre Light e L, banhados por uma luz azulada) e também no contraste forte e dinâmico, o que garante um eye candy inegável. Além disso, Tattersall também traz uma bela influência do horror durante as cenas com Ryuk, inteligentemente banhando o demônio pelas sombras a fim de torná-lo mais ameaçador; e também baratear o custo da produção, a-há.
Lakeith Stanfield
Eu não conheço muito do anime e mangá que originaram a obra, mas preciso confessar que fiquei impressionado com L. Um personagem dinâmico, bem escrito e que ganha uma performance femomenal de Lakeith Stanfield, que roubou a cena na série Atlanta e nos filmes Temporário 12 e Corra!, e ganha aqui seu melhor papel até então. O mais impressionante também é ver como o arco do personagem é completamente transformado, com toda a segurança e planejamento dando espaço a um desespero muito humano e sincero após a morte de determinado personagem, o que só torna este L muito mais complexo e interessante.
Trilha Sonora
Uma música pode mudar toda a intenção de uma cena, e as escolhas de Wingard em sua playlist incidental são muito curiosas, e justamente por isso acabam por sair do lugar comum: por exemplo, o clímax trágico e desesperador ganha um caráter completamente bizarro e cômico pelo uso inesperado de "I Dont Wanna Live Without Your Love", do Chicago. O diretor faz diversas outras escolhas inspiradas ao longo do filme, mas também é preciso destacar a excepcional trilha sonora original de Atticus e Leopold Ross, que trazem acordes eletrônicos e sintetizados que ajudam a manter o ritmo da história sempre agitado - especialmente durante a caçada policial.
Clique AQUI para ler o LADO B
Crítica sem Spoilers | It: A Coisa
Os anos 80 eram tempos mais simples para o cinema. Não só falando num sentido geral, mas especialmente no que diz respeito ao gênero do terror: o medo era provocado por ideias inventivas e criaturas que até hoje permanecem fincadas na cultura pop, vide as duradouras franquias de Jason Voorhees e Freddy Krueger, os dois maiores representantes da variante slasher movie. Faz falta ao cinema de terror atual algo do tipo, já que, mesmo que tenhamos tidos exemplares primorosos de mentes como James Wan, a geração atual carece de um monstro tão icônico e carismático. Afinal, é um fato que os adolescentes de hoje são mais difíceis de serem assustados, algo que ocorre mais com experimentos de linguagem e torture porn do que criatividade propriamente dita.
Por isso, não é de se espantar que Hollywood esteja constantemente voltando seu olhar para o passado, nestes tempos mais simples. Basta observar o sucesso estrondoso da série Stranger Things, um mero apanhado de referências e inspirações do cinema oitentista de Steven Spielberg e John Carpenter. Aproveitando a deixa, eis que a New Line e a Warner Bros olham para outra forte influência do seriado da Netflix: Stephen King, acelerando a nova adaptação do épico romance de terror It: A Coisa, em uma nova versão que contará com dois filmes; e que supostamemte passou por diversas mudanças em seu tom, que teriam sido o motivo da saída de Cary Fukunaga (diretor da primeira temporada de True Detective) originalmente contratado pelo estúdio, da direção.
Seja lá qual tenha sido o motivo dessa mudança no comando, que trouxe o cineasta em ascensão Andrés Muschietti para tocar o projeto, não importa. O que importa, é que este It: A Coisa é um trabalho magistral, e não imagino como poderia ter sido melhor.
A trama começa em 1988, na cidade de Derry, em Maine. Quando o jovem Georgie (Jackson Robert Scott) desaparece misteriosamente e inicia uma onda de outros casos similares, todos envolvendo crianças. No ano seguinte, seu irmão Bill (Jaeden Lieberher) e um grupo de amigos conhecido como Clube dos Otários começa uma busca por Georgie, com todos eles enfrentando acontecimentos estranhos e assustadores, e com uma ligação em cada uma das aparições: a presença de uma entidade misteriosa que assume a forma do sinistro palhaço Pennywise (Bill Skarsgård).
Goonies 2.0
Composto por mais de mil páginas, It é um dos mais cultuados e célebres romances de King, e o extenso volume da obra certamente não cabe em apenas uma adaptação. O terror já havia sido adaptado pela televisão em 1990", na forma de um telefilme/minissérie dirigido por XX e que iconizou Tim Curry como o palhaço Pennywise. Olhando para os dias de hoje, a televisão certamente é a mídia mais apropriada, mas a New Line merece créditos por aprovar a realização de dois filmes, comportando o núcleo dos personagens crianças na primeira parte, e um vindouro filme com a fase adulta; tal como acontece no livro de King, já que o maligno It assola a cidade de Derry num intervalo de 27 anos. Por isso, talvez seja o livro "pop" que mais merece uma divisão em duas, passando longe de ser um caça-níqueis como as divisões de O Hobbit, Jogos Vorazes e a Saga Crepúsculo.
E o filme ainda vangloria-se da duração estendida de 135 minutos, onde vemos um trabalho de síntese e construção de universo primoroso das mãos de Gary Dauberman, Chase Palmer e Cary Fukunaga (cujos créditos foram mantidos após sua saída), que aproveitam muito bem o tempo para desenvolver seus personagens e nos levar para acompanhar suas vidas bem de perto. A amizade sempre foi um tema forte nos trabalhos de King, e aqui o roteiro explora muito bem cada aspecto e identidade das crianças, explorando seus problemas e dilemas ao mesmo tempo em que trabalha a união e relação entre elas - tudo isso através de diálogos que soam como um ar fresco de tão naturais e chulos, com diversos comentários inapropriados na hora errada ou xingamentos verdadeiramente hilariantes.
Mesmo com um grupo de personagens tão grandes, é de uma extrema felicidade ver como o texto do trio encontra espaço para todos eles. Já estamos investidos no arco de Bill em decorrência de sua dedicação para encontrar seu irmão - além do fato de ser gago, o que já lhe apresenta certa vulnerabilidade, e é sensacional ver o novato Jaeden Lieberher abraçando todas essas características e encontrando a força do personagem de acordo com seus desafios enfrentados. De forma oposta, o Ben Hanscom de Jeremy Ray Taylor assume, fisicamente, o estereótipo do garoto gordinho solitário, mas seu desenvolvimento - e o trabalho do jovem ator - são bem mais sutis e baseados em sua reação aos eventos, e através dessa linda jornada vemos o personagem crescer; além de estrategicamente usar sua solidão como desculpa para que Ben investigue todos o passado de Derry e as conexões com a Coisa.
Os outros meninos são os que acabam tendo "menos" destaque, mas ainda garantem uma presença significativa. Eddie Kaspbrak (Jack Dylan Grazer) é a variação do "certinho" do grupo, algo exacerbado por sua germofobia e a proteção exagerada de sua mãe, o que acaba criando ali o grande arco do personagem: a libertação e saída do "ninho" familiar. Personagem que menos interage com o grupo (e é um dos deméritos do roteiro nesse quesito), o Mike Hanlon de Chason Jacobs garante bons momentos graças à seu excelente peso dramático - como quando conta a história trágica da morte de seus pais, em um plano sem cortes - e a seu arco simples, mas bem resolvido, que envolve o jovem trabalhando em abatedouro. Seguindo a lógica, Wyatt Oleff tem ainda menos tempo como o judeu Stanley Uris, porém temos uma subtrama eficiente com sua dedicação para o bar mitzvah. Por fim, o Richie Tozier de Finn Wolfhard (de Stranger Things) é o único personagem que não tem um núcleo familiar revelado ou algum arco muito forte, mas tem sorte de ser o piadista do grupo e o foco absoluto dos diálogos conjuntos; se Wolfhard era o nerd introspectivo na série da Netflix, ele simplesmente arrebenta como o sabichão boca suja e que se acha muito mais descolado do que realmente é.
A grande revelação do elenco, porém, acaba por ser Sophia Lillis como Beverly Marsh, a única menina do Clube dos Otários. Mais velha e com uma personalidade bem diferente do restante do grupo, ela acaba por ser justamente um dos elementos que os une - e não só pelo fato de todos estarem caídos por ela. Lillis traz carisma e um aspecto cool, mas ao mesmo tempo vulnerável para Beverly, principalmente quando acompanhamos seu perturbador arco pessoal e descobrimos que seu pai é abusivo, e a atriz faz o balanço perfeito entre essas emoções complexas. Vale mencionar também como Lillis parece saída diretamente dos anos 80, com o mesmo perfil e até semelhanças com Molly Ringwald e Heather Langenkamp.
A Soma de todos os medos
Com um grupo tão bem desenvolvido e perfeitamente entrosado em cena, It consegue facilmente criar apego emocional entre os personagens e o espectador, que compra a ideia de amizade e companheirismo que sustenta toda a história. Dito isso, é importante reforçar que este filme está um pouco longe do terror sobrenatural e angustiante que vemos na linha de produção de Invocação do Mal, por exemplo, e sim mais próxima do estilo de aventura sombria dos filmes de Spielberg; o mesmo que Stranger Things tenta replicar, e há uma quantidade gigantesca de alívio cômico e piadas aqui, o que ajuda a tornar a atmosfera menos densa e até mais divertida, mantendo um ótimo ritmo durante sua longa duração.
Não só na diversão, mas também o imenso peso emocional. Todos os núcleos de personagens discutidos nos parágrafos anteriores têm consequências e reviravoltas fortes, sendo curioso como a história praticamente coloca os adultos como vilões em sua grande maioria: o pai abusivo, a mãe que deliberadamente faz o filho pensar que é doente para mantê-lo dentro de casa ou o velho clichê dos pais que não acreditam nas teorias de seu filho inteligente. Mal vemos os pais da maioria das crianças durante todo o filme, o que só contribui para uni-las e fortalecer os laços entre eles, e a beleza do design de produção de Claude Paré altamente imersivo ajuda a criar uma cidade grande e quase deserta, onde as crianças estão por conta própria - mais um dos motivos que fazem esta uma das mais perfeitas "simulações" dos anos 80 até o momento.
Finalmente, chegamos a Pennywise. É uma performance desafiadora e que não depende apenas de uma boa caracterização, mas também do talento de seu intérprete; afinal, é difícil ter a sombra de Tim Curry sobre os ombros. Dito isso, Bill Skarsgård garante um espetáculo para seu Pennywise, mesmo que não seja uma participação exatamente massiva. Como toda nova releitura de um terror oitentista, seu palhaço é menos fanfarrão e mais sombrio do que o de Curry, com uma fala que surpreende pelo equilíbrio entre grossa e suave, servindo bem à proposta de uma criatura que "encanta" suas vítimas com seu discurso. Na primeira cena em que o encontramos (e também a mais longa), Skarsgård assusta pela forma com que transita entre esses diferentes tons no encontro com Georgie, vide sua falácia maliciosa ao falar sobre algodões doce, pipocas e fazer barulhos com a boca para arrancar risadas do garoto - e imediatamente transformando sua cara boba em uma expressão séria e ameaçadora. Um tremendo trabalho que, tanto pela maquiagem quanto pela performance, diversas vezes me lembraram do Coringa. Se Curry era um Cesar Romero mais sarcástico, Skarsgard é nada menos do que Heath Ledger em O Cavaleiro das Trevas.
O ator garante todo o mérito, mas é preciso elogiar o fantástico trabalho dos departamentos de maquiagem e figurino na concepção deste novo Pennywise. Menos um palhaço tradicional e mais próximo de uma vertente teatral arcaica (o nariz redondo de palhaço dá espaço a uma pintura), a roupa toda engomada dispensa todas as cores vibrantes e fortes da versão anterior, adotando uma paleta toda cinza. Já o rosto assusta pela camada de maquiagem aplicada na testa do ator, tornando sua cabeça maior e até ligeiramente desproporcional, algo contrastado pela pintura delicada das linhas finas que sobem da boca para os olhos do palhaço - algo que Skarsgård explora bem em suas múltiplas expressões, fazendo com que o desenho acompanhe os músculos de seu rosto para formar algo especialmente sinistro. Por falar nisso, é ainda mais grotesco o visual mais animalesco da criatura, que expande sua mandíbula de maneira similar aos vampiros de A Hora do Espanto (mais sobre essas referências nos próximos parágrafos) e desenvolve assustadores dentes pontiagudos.
O Legado de Elm Street
Então chegamos ao diretor Andrés Muschietti, assinando aqui como Andy. Mais um dos casos de diretores encontrados no YouTube, o argentino chamou a atenção de Guillermo Del Toro (que divide com James Wan o posto de "padrinhos do terror") após o sucesso de seu apavorante curta Mama, que acabou sendo transformado em seu primeiro longa-metragem. Mas se o filme com Jessica Chastain era uma obra muito irregular e infeliz em suas escolhas de tom, Muschietti acerta a mão consideravelmente aqui; amadurecendo o domínio da linguagem e preservando as marcas estilísticas que funcionaram em Mama - ainda que o diretor tenha um certo vício em jump scares previsíveis.
Logo na primeira cena já percebemos a segurança e habilidade de Muschietti para construir atmosfera, com a chuva torrencial ecoando pelas janelas da casa da família de Bill e Georgie, com um belo exemplar do clássico medo do escuro em um porão. Quando o irmão mais jovem corre pelas ruas encharcadas com o barquinho de papel, a câmera é ágil e elegante, logo transformando-se em algo claustrofóbico e perturbador quando temos o encontro de Georgie com Pennywise - com a cabeça para fora de um esgoto. É uma cena inquietante, e a forma como Muschietti enquadra os dois contribui muito para isso, assim como a iluminação excepcional do diretor de fotografia sul-coreano Chung-hoon Chung (colaborador preferido de Chan-wook Park), que mantém apenas a parte de baixo do rosto do palhaço com luz, formando um belo desenho de sua pintura facial com as sombras que preenchem sua testa.
Tal construção acaba tendo um payoff inacreditável. Graças à mise en scène capciosa de Muschietti, somos levados a acreditar que esse encontro entre Georgie e Pennywise acabará de um jeito - especialmente pelo plano aberto que reforça o isolamento do menino enquanto tenta apanhar seu barquinho do estranho -, e subverte nossas expectativas ao deixar algo bem claro: este é um filme violento, com um tipo de gore que nunca apela para o exploitation, mas que choca pela crueza. Não só em relação aos ataques assombrosos do palhaço do título, mas também no retrato do bullying que os protagonistas sofrem, com uma cena em especial onde Ben é atacado pelo repulsivo Henry Bowers (Nicholas Hamilton), sendo espancado e até esfaqueado. De maneira similar, outra das sequências mais intensas do filme é quando Beverly é atacada por seu pai em casa, gerando uma tensão apavorante pelo mero contexto da situação - assim como a decisão de Muschietti de cortar a música e adotar uma câmera mais intensa.
Falei acima sobre o vício do diretor em jump scares, e isso é realmente um demérito que acaba causando uma má primeira impressão. Porém, passado o susto e a revelação da ameaça que Muschietti prepara, ele continua investindo na imagem; não é um susto e acabou, temos uma exploração de imagens grotescas e assustadoras por muito tempo, saindo da técnica Tubarão de esconder as cartas para um jogo mais aberto a lá O Exorcista; de forma como William Friedkin nos mantinha olhando para o rosto deformado de Linda Blair por muito tempo. Um exemplo crucial disso é quando Pennywise aparece todo contorcido dentro de um cofre, e a câmera mantém o foco ali enquanto o palhaço vai desconfortavelmente saindo e voltando à sua forma natural; em uma cena sinestésica graças ao marcante tema musical de Benjamin Wallfisch para o personagem, que consiste em um sinistro coral infantil.
Mas talvez a grande surpresa que tive com este filme foi a realização de outra de suas grandes influências. Como a criatura titular alimenta-se e ganha força através dos medos das crianças, tal como um grande bicho papão, temos diversas sequências onde a Coisa acaba assumindo diferentes formas e monstros para provocar um efeito maior em suas vítimas. Isso rende sequências inspiradas onde temos uma criatura que é basicamente uma colônia de doenças ambulante, na forma de um leproso interpretado por Javier Botet, uma mulher de um quadro surrealista que representa tudo o que Muschietti experimentou em Mama (especialmente o uso de stop motion nos movimentos de uma figura alta e magricela) e até uma sala repleta de palhaços de madeira e porcelana. Mas foi quando Beverly sofreu um ataque de fios grossos e compridos de cabelos saindo de sua pia que eu senti uma alegria perturbada: em sua estética que mistura perfeitamente efeitos práticos com CGI, estava diante de uma cena digna da franquia A Hora do Pesadelo, com as maravilhosas e inventivas mortes que Freddy Krueger bolava em seus pesadelos - não por acaso, um dos pôsteres exibidos em um cinema de Derry é justamente o de A Hora do Pesadelo 5 - O Maior Horror de Freddy.
É maravilhosa a sensação de se assistir a um filme de gênero tão eficiente. Esta nova versão de It: A Coisa não só é infinitamente superior à adaptação de 1990, como também merece destaque como um dos melhores longas de terror dos últimos tempos, capturando os elementos mais tradicionais de uma escola oitentista com elementos modernos e eficientes. Uma aventura sombria que emociona e envolve, resultando em um dos melhores filmes de 2017.
Que a Parte 2 não demore 27 anos.
It: A Coisa (It, EUA - 2017)
Direção: Andy Muschietti
Roteiro: Cary Fukunaga, Chase Palmer e Gary Dauberman, baseado na obra de Stephen King
Elenco: Bill Skarsgård, Jaeden Lieberher, Finn Wolfhard, Sophia Lilis, Wyatt Oleff, Chosen Jacobs, Jack Dylan Grazer, Nicholas Hamilton, Owen Teague, Jackson Robert Scott
Gênero: Terror
Duração: 135 min
https://www.youtube.com/watch?v=dD264ZjfKlk