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Artigo | A Fábula de um imigrante chamado Paddington

Com certeza por agora vocês já devem ter ouvido falar sobre esses filmes altamente aclamados sobre um simpaticíssimo ursinho falante chamado Paddington. Se não, bem, é praticamente isso que os dois filmes do personagem até agora se tratam. O que fez alguns muitos questionarem: mas o que raios esses filmes como esses possuem para agradar tantos críticos e público? Bom, além de ambos serem fábulas modernas para toda a família surpreendentemente bem roteirizadas e dirigidas por Paul King, cheias de humor inteligente, personagens muito carismáticos, e uma aura de fantasia tão encantadora, etc.

Mas, há algo à mais que os filmes do personagem tão amado e icônico da literatura popular Inglesa possuí e que os fazem conquistar à tantos em volta do mundo. E é exatamente esse à mais do que essa simples história do peixe fora d’água encontrando seu lugar no mundo e aprendendo o valor da família, que está em discussão aqui. Talvez isso seja cutucar no óbvio, já que nem demora muito tempo para perceber enquanto assistimos ao primeiro filme que realizamos sobre como a história de Paddington muito sutilmente simboliza a jornada de um imigrante vindo para um novo país em busca de um novo lugar para se chamar de lar e iniciar uma nova vida.

Todas as claras evidências para isso estão lá: o motivo da sua saída do seu lar original, as selvas do Peru, são ocasionadas por um desastre natural (no caso um terremoto), que acaba destruindo a sua casa e termina na morte de um de seus tios; sua vinda para Londres é de forma explicitamente “ilegal”, vindo escondido dentro de um navio; ele sabe o inglês fluente mas falta-lhe algumas palavras como seu nome e certas maneiras “civilizadas”, onde ele até vem a ensinar “ursês” para a Judy, a menina da família Brown que o ajudam a se hospedar; lida com um óbvio preconceito enraizado, tanto inicialmente vindo do senhor Henry Brown (um excelente Hugh Bonneville) que o trata à primeira vista como um pedinte e mentiroso, e também do vizinho rabugento Curry (Peter Capaldi) em ambos os filmes.

No segundo filme isso é deixado um pouco de lado em prol de construir toda a trama de aventura e corrida contra o tempo completamente divertidíssima, mas ainda usam da situação de Paddington como sutis mensagens simbólicas dessa metáfora construída em volta do personagem. O fato dele começar a trabalhar honestamente para conseguir dinheiro para um presente para sua Tia Lucy (ajuda financeira à um parente não?!), onde mostra sua aceitação como um cidadão de bem em sua comunidade vizinha; ou sobre ele sendo preso injustamente baseado em uma simples ordem fria de sim ou não.

Embora isso tudo nem seja tanta novidade para todo o histórico do personagem ao longo de suas diversas adaptações. A própria coletânea original de livros do personagem de Michael Bond muito servia para ilustrar através de Paddington o destino de crianças refugiadas durante a segunda guerra, algo que é bem representado através do personagem do senhor Gruber (Jim Broadbent).

Mas por favor, não levem o fator simbólico e metafórico de interpretação da temática política de ambos filmes serem o fruto de todo o brilho que Paddington tem a oferecer, muito pelo contrário. Onde esses elementos, inegavelmente interessantes e sucintos em discussão, se passam quase como brilhantes bolas em uma grande e linda árvore de Natal por si só.

E essa é a beleza tão atrativa de Paddington, pois ao mesmo tempo em que lida sim de forma bem clara com essas temáticas, nunca tenta empurrar elas goela abaixo ao longo do filme de forma a levantar uma bandeira ou forçar representatividade cujo se tornou uma forma base que filmes financeiramente bem sucedidos e elogiados pela crítica precisam cumprir para garantir esse sucesso e reconhecimento, e Paddington nunca apela para nada disso ou muito menos deixa isso entrar no caminho de sua real mensagem sobre bondade e humanidade.

Paddington, tanto nos livros de Michael Bond quanto nos filmes de King, é representado como esse ser com uma pureza inabalável e confrontando um mundo onde pessoas parecem ter esquecido do que são bons valores ou boas maneiras. Sua chegada em Londres no início do primeiro filme, sendo recebido com empurrões e sendo ignorado friamente por todos denotam isso de forma rápida e brilhante, mas nunca o bastante para fazer o personagem perder um pingo de suas esperanças ou mudar aquilo que é.

Ele expõe essa deterioração do espírito humano, ao mesmo tempo em que inspira outros a serem melhores pessoas exatamente por ele sempre enxergar o melhor em cada um. Ao ponto dele literalmente reformular todo o sistema carcerário da prisão através do seu pão com marmelada no segundo filme, não só por conquistar o afeto dos prisioneiros mas revelar a bondade e talento de cada um, especialmente do valentão rouba cenas de coração de ouro Knuckles (um brilhante Brendan Gleeson).

O que ele já fizera antes com cada um dos membros da família Brown, especialmente por fazer tanto de Judy como o senhor Brown que inicialmente passam a impressão para o público de pessoas frias e insuportáveis, para ao longo do filme através das interações com Paddington começamos a adora-los. A personalidade tão doce, educado e carinhosa do personagem trazido a vida por Ben Whishaw e sua química com todo o elenco já beneficiam para tornar toda a experiência de assistir aos filmes não só deliciosos de se assistir mas também se tornar verdadeiramente inspiradores.

Onde se até o seu público alvo, as crianças, e também (e especialmente) os adultos que os acompanham perceberem a simples forma de como Paddington usa palavras como “por favor” e “obrigado”, respeitando os mais velhos e tratando o seu próximo como um igual já se torna uma conquista valorosa de ambos o personagem e os filmes em que ele habita.

Em uma história de lições puras e inocentes de vida que, como dito antes, fazem parte desses dois filmes que pertencem aquela espécie de filmes feitos para toda a família, que você já cansou de ver milhares de vezes e com certeza ao assistir vai prever tudo que vai acontecer e entre 80 e 90% vão acontecer, mas isso não diminui ou tira o mérito e fato de que são dois filmes perfeitamente executados para em sua proposta simples e clara.

Isso tanto se deve ao imaculado talento do elenco reunido em cada um dos filmes, com alguns dos melhores atores britânicos juntos em um filme só, desde a família Brown protagonista e os coadjuvantes de luxo, com destaque particular para Hugh Grant em discutivelmente sua melhor atuação como o fantástico vilão Phoenix Buchanan. Assim como o comando exímio de Paul King que não só adapta toda a essência dos livros como integra muito a ela, como também entrega uma direção invejável para um filme desse gênero em particular.

Possuindo um estilo diretorial que muito lembra alguns dos primeiros filmes de Chris Columbus como Uma Babá Quase Perfeita ou os Esqueceram de Mim, sendo esses filmes “simplistas” em trama mas muitíssimo bem executados no que diz respeito à construção de ritmo bem redondinho, puxar boas atuações de seu elenco e saber dosar muitíssimo bem o humor e drama de sua história, sem um atrapalhar ou infantilizar o outro como se fossem um filme da Pixar (um bom isto é).

Junte isso tudo a um lindo design técnico que parece ter sido tirado de um filme de Wes Anderson; a aura de realidade sendo vista de forma fantasiosa de filmes como Amélie Poulain de Jean-Pierre Jeunet; o humor pastelão extremamente cheio de gags físicos muito bem coreografado como se fosse um filme de Chaplin com o charme Britânico de Mr. Bean.

Tudo isso elementos que formam a perfeita mistura que mostram como os dois filmes de Paddington conseguem ser tantas coisas interessantes em uma só receita. Serem mais engraçados do que qualquer comédia feita hoje; mais dramaticamente ressonantes, complexos e envolventes do que qualquer drama meloso que o Oscar ainda gosta de indicar hoje em dia; e até mais cheios de ação e adrenalina que qualquer John Wick ou filme de super-heróis feito hoje em dia – onde no primeiro filme temos um heist ala Missão Impossível versão ursinho falante e no segundo temos a melhor perseguição de trem desde O Cavaleiro Solitário só que com uma direção ‘Spielbergiana’.

E ainda é tematicamente político e socialmente relevante, mas sem exibicionismo ou forçação de barra. Mas acima de tudo, filmes realizados com total carinho e esmero, o mesmo carinho e esmero que o seu doce protagonista procura ensinar para as pessoas à sua volta, tanto adultos quanto crianças, e que, assim como para com seu público, traz alegria por onde passa e é capaz de fazer se divertir, refletir e talvez inspirar em sermos pessoas melhores para com o nosso próximo.

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Publicado por Raphael Klopper

Estudante de Jornalismo e amante de filmes desde o berço, que evoluiu ao longo dos anos para ser também um possível nerd amante de quadrinhos, games, livros, de todos os gêneros e tipos possíveis. E devido a isso, não tem um gosto particular, apenas busca apreciar todas as grandes qualidades que as obras que tanto admira.

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