Crítica | O Reformatório Nickel ousa no formato, mas derrapa no roteiro

A violência da segregação racial já foi tema de diversas produções de Hollywood, mas, embora muitas histórias já tenham sido contadas, o racismo continua a ser um tema atual e relevante, que segue recebendo novos pontos de vista.

Nickel Boys é um desses filmes que conta a história de Elwood (Ethan Herisse), um garoto com um futuro promissor, que é preso de forma injusta ao pegar carona com um desconhecido. Ele é levado para um reformatório, onde os brancos eram melhor tratados, enquanto os negros sofriam todo tipo de violência. Muitos eram mortos e enterrados no quintal da instituição.

Lá, Elwood faz amizade com Turner (Brandon Wilson), que é apresentado na história como alguém que nutre uma simpatia por Martin Luther King, sendo um idealista da causa, enquanto Turner é mais realista com a situação.

Ao acompanharmos de perto a rotina cruel que os amigos vivem no reformatório e temos a oportunidade de ver como a amizade deles cresce ao longo da trama, e devido aos vários acontecimentos que ocorrem em suas rotinas, acabamos por nos sensibilizar com toda a situação.

Roteiro Deixa a Desejar

O filme é uma adaptação do livro escrito por Colson Whitehead e dirigido por RaMell Ross, que também assina o roteiro em colaboração com Joslyn Barnes. Entretanto, a narrativa apresenta alguns problemas que, se fossem melhor ajustados, certamente resultariam em uma obra muito mais interessante.

RaMell até tenta dar maior profundidade à trama, inserindo imagens de arquivo da década de 60 e nos colocando no cenário da luta pelos direitos civis, para que sejamos ambientados no período em que a história se passa.

Apesar de o filme abordar a rotina de Elwood e Turner no reformatório, não há um aprofundamento na vida dos personagens nem nas situações que ocorriam ali.

O reformatório, um local repleto de abusos, é retratado de forma superficial, com esses abusos sendo mostrados apenas em uma cena ou outra. O que se percebe é que o cineasta queria evidenciar a barbárie da época, mas sem exibir cenas violentas.

O mesmo acontece com a admiração que Elwood tem por Martin Luther King, mas é algo tão raso e mostrado tão rapidamente que não nos dá certeza de o quanto esses ideais de King são importantes em sua vida.

Filmado em primeira pessoa

O que é de se elogiar no longa é a forma como RaMell Ross conta a história. Ele escolheu filmar em primeira pessoa, de modo que, sempre que Elwood interage com algo ou conversa com alguém, só é possível ouvir sua voz e enxergar o que está à sua frente. Vemos o rosto de Elwood apenas quando estamos vendo o ponto de vista de Turner.

A decisão de filmar em primeira pessoa é boa, pois insere o espectador na visão dos personagens e permite que se vivencie a rotina deles no reformatório. Porém, não há uma sensação de profundidade ao olhar por essa perspectiva.

Além disso, há um problema de ritmo que se mantem ao longo de toda a narrativa, o que torna a jornada dos personagens em uma trajetória maçante.

Não digo que Nickel Boys seja um filme ruim; ele é regular e sua história aborda um tema que continua atual: o racismo. Porém, os problemas de roteiro e o fato de ser uma obra que não nos oferece muitas respostas tiram um pouco do brilho de um filme que tinha tudo para ser muito melhor.

Nickel Boys (Nickel Boys, EUA – 2024)
Direção: RaMell Ross
Roteiro: RaMell Ross e Joslyn Barnes, adaptado da obra de Colson Whitehead
Elenco: Ethan Herisse, Brandon Wilson, Luke Tennie, Aunjanue Ellis, Fred Hechinger
Gênero: Drama
Duração: 140 min.

https://www.youtube.com/watch?v=3Jrc6KaH36E&ab_channel=PrimeVideoBrasil

Crítica | Setembro 5 - O atentado terrorista em Munique visto por outra perspectiva

Em 5 de setembro de 1972, durante os Jogos Olímpicos de Munique, o grupo palestino conhecido como Setembro Negro realizou um atentado terrorista na Vila Olímpica, na área onde os atletas israelenses estavam alojados.

Em Setembro 5, filme dirigido e roteirizado por Tim Fehlbaum em colaboração com Moritz Binder, são retratados os acontecimentos desse fatídico dia, mostrando os bastidores da TV, especificamente do canal ABC, e como foi a rotina para realizar a transmissão ao vivo para o mundo.

É, sem dúvida, um grande filme sobre jornalismo, com o primeiro ato mostrando a calmaria da redação, com o canal se preparando para transmitir modalidades como boxe e vôlei, até o início dos atos terroristas, quando tiros foram ouvidos vindos da Vila Olímpica durante a madrugada.

Ao vivo e à cores

Roone Arledge (Peter Sarsgaard), o executivo da ABC responsável pela transmissão dos jogos, Geoffrey Mason (John Magaro), o produtor em ascensão que acaba ficando responsável pela
transmissão ao vivo, e Marianne (Leonie Benesch), a tradutora que se torna repórter de campo, são alguns dos personagens que foram responsáveis por mostrar ao mundo o que estava acontecendo em Munique.

Um longa como esse dificilmente se aprofunda na vida de cada nome que tenha importância no elenco, já que o foco está no atentado terrorista e na transmissão.

Porém, a falta de informações sobre a vida pessoal de cada um dos profissionais acaba deixando a desejar, até porque isso ajudaria a criar uma conexão do público com cada um dos personagens que estava ali.

Além disso, a escolha de transmitir tudo a partir da tela da redação é uma decisão que poderia ser revista, já que uma abordagem que mostrasse a reportagem em primeira pessoa poderia tornar a narrativa mais interessante.

As dificuldades da época pré-digital, em que era necessário levar um rolo de 16mm até o local onde estava a câmera, são um desafio mostrado no filme.

Toda a forma de fazer jornalismo é uma consagração de uma trama que tem nos vídeos reais daquele dia um dos seus grandes trunfos, até porque pouco se fala ou se mostra sobre os acontecimentos daquela data.

Setembro 5 acerta justamente ao retratar a tensão crescente do grupo Setembro Negro, fazendo os reféns e gerando a dúvida sobre se seriam libertados ou não, além de contar uma história pouco retratada no cinema.

Setembro 5 (September 5, EUA – 2024)
Direção: Tim Fehlbaum
Roteiro: Moritz Binder, Tim Fehlbaum
Elenco: Peter Sarsgaard, John Magaro, Ben Chaplin, Leonie Benesch, Zinedine Soualem, Georgina Rich
Gênero: Drama, Thriller
Duração: 95 min.

https://www.youtube.com/watch?v=O144SeE5Sh0&ab_channel=ParamountBrasil

Crítica | Conclave - Um jogo de intrigas e poder

Dizer que Conclave é um filme religioso não é um erro, mas ele não trata exclusivamente da Igreja Católica. O foco está no processo de votação para a escolha de um novo Papa e nas maquinações construídas nos bastidores para que um candidato seja escolhido.

Ou seja, Conclave aborda em sua trama mais a questão política do que propriamente a religiosa, e percebe-se isso quando o Cardeal Lawrence (interpretado de forma magistral por Ralph Fiennes) começa a conversar sobre a sucessão com o Cardeal Bellini (Stanley Tucci), que é o favorito para ser o próximo pontífice.

Alguns irão chamar o longa de progressista por apresentar personagens que buscam transformar a Igreja por meio de questões sociais e econômicas que vão além das práticas atuais. Essas questões estão, de fato, inseridas no roteiro adaptado de forma inteligente por Peter Straughan, a partir do livro homônimo de Robert Harris.

Para filmar esta história de ambição e poder, nada melhor do que um diretor que goste de tramas desse gênero. Desta forma, Edward Berger, vencedor do Oscar de Melhor Diretor em 2023 por Nada de Novo no Front, é uma escolha acertada.

Jogos de Intrigas

O roteiro apresenta diversas críticas à Igreja, retratando um ambiente onde os cardeais reunidos para a votação estão carregados de pecados e parecem ter esquecido seu verdadeiro papel na sociedade.

Os religiosos são mostrados fumando, preocupando-se mais em sentar à mesa para comer do que em rezar, entre outras "fraquezas" que reforçam ainda mais o tom crítico do filme.

Uma trama obscura sobre os bastidores da Igreja não poderia deixar de ter antagonistas — neste caso, figuras que parecem querer levar a instituição de volta ao passado, como o preconceituoso Tedesco.

As intrigas que surgem durante o período em que os cardeais estão confinados, bem como o próprio processo de votação, retratam uma Igreja composta por indivíduos movidos por ambições. O cardeal Lawrence, por exemplo, nunca declara explicitamente seu desejo de se tornar o próximo Papa, mas suas ações para desmascarar concorrentes deixam claro seu interesse pelo cargo.

Conclave não é apenas um filme sobre a sucessão papal. Ele possui múltiplas camadas, e a direção de Berger, em contraste com as imagens da Capela Sistina e o vermelho intenso das túnicas dos cardeais, cria grandes momentos. São esses pequenos detalhes que tornam essa história repleta de reviravoltas em um dos grandes filmes do ano.

Conclave (idem, EUA – 2024)
Direção: Edward Berger
Roteiro: Peter Straughan, adaptado do livro de Robert Harris
Elenco: Ralph Fiennes, Jacek Koman, Lucian Msamati, Stanley Tucci, John Lithgow, Isabella Rossellini, Sergio Castellitto, Carlos Diehz
Gênero: Drama, Thriller
Duração: 120 min.

https://www.youtube.com/watch?v=_V_bX7Gs7v8&ab_channel=DiamondFilmsBrasil

Crítica | Sing Sing tem em Colman Domingo seu principal trunfo

Não se espera nada de Sing Sing quando começamos a assisti-lo, mas, após a apresentação dos personagens e o conhecimento da rotina dos homens presos que fazem parte de um grupo de teatro, acabamos mudando de ideia e mergulhamos de vez na trama.

A história do grupo de prisioneiros da penitenciária conhecida pelo nome de Sing Sing narra o desenvolvimento de um programa com o objetivo de reduzir a reincidência criminal, utilizando o poder transformador da arte na vida dos detentos.

Não é à toa que o longa, dirigido por Greg Kwedar e coescrito por ele em conjunto com Clint Bentley, foi indicado na categoria de Melhor Roteiro Adaptado no Oscar 2025.

O roteiro é baseado no artigo da Esquire escrito por John H. Richardson, que abordava o programa conhecido como Rehabilitation Through the Arts (RTA), que leva arte e cultura até as prisões.

Baseado em fatos reais

No filme, não há menção a esse programa, que comprovadamente tem gerado resultados nos EUA, nem é mencionado que tudo começou na penitenciária de Sing Sing, em 1996 — e isso não é necessário para que a trama seja compreendida.

A obra, por si só, é autoexplicativa. Mesmo sem essas informações, conseguimos compreender perfeitamente as motivações e os objetivos que levam aqueles homens a participarem do grupo de teatro.

Algo inteligente que o roteiro faz e que, possivelmente, passa despercebido durante a trama, mas é bastante elogiável, é o fato de a produção não apenas ser baseada em fatos reais, como também trazer essa realidade para dentro do elenco.

Um exemplo disso pode ser visto em John Divine G. Whitfield (Colman Domingo) e "Divine Eye", sendo este último, por sinal, interpretando a si mesmo — Clarence Maclin, ainda jovem, na época em que atuou em Hamlet. Domingo também interpreta uma versão complexa de seu companheiro, que surge para participar do grupo de teatro como um homem cheio de traumas.

O mesmo acontece com parte do elenco, composto por ex-membros do programa da RTA, que, agora atores no longa, trazem consigo suas próprias experiências e dramas pessoais, o que ajuda a aprofundar a trama e criar um laço emocional com o público.

A mensagem da produção não poderia ser mais óbvia e clara: a de levar redenção por meio da arte, no caso, através do teatro. A ideia de resignificar um indivíduo utilizando métodos como a arte já foi explorada em Um Sonho de Liberdade (1994), e, que aparece com menos força em Sing Sing.

Seu roteiro tem algumas irregularidades, como o fato de ter diálogos longos e excessivos e, por se passar inteiramente em um presídio, a atmosfera acaba cansando por não trazer algo novo, além da aparição de novos personagens.

Seu ritmo também é um problema: é lento, e o primeiro ato é tão monótono que praticamente perde a conexão com o espectador, sendo restabelecida apenas no último ato, quando o fator emocional surge.

O fato de Sing Sing contar com destaques individuais, como o de Colman Domingo – que está vivendo um ótimo momento na carreira – contribui para que a obra conquiste o merecido destaque.

Sing Sing (idem, EUA – 2024)
Direção: Greg Kwedar
Roteiro: Greg Kwedar e Clint Bentley. Adaptado do artigo de John H. Richardson
Elenco: Colman Domingo, Clarence Maclin, Sean San Jose, Paul Raci
Gênero: Drama
Duração: 107 min.

https://www.youtube.com/watch?v=qWmBPLv9yCE&ab_channel=DiamondFilmsBrasil

Crítica | Acompanhante Perfeita tem boa premissa, mas se perde no caminho

O espectador que for assistir Acompanhante Perfeita e já tiver visto seu trailer provavelmente se decepcionará com o conteúdo do filme, que tinha tudo para ser um grande sci-fi, mas, devido às escolhas narrativas do diretor e roteirista Drew Hancock, acaba se perdendo pelo caminho.

A trama tem uma premissa interessante e causa algumas surpresas, principalmente com a primeira reviravolta que ocorre na transição do primeiro para o segundo ato. Porém, depois disso, nada de mais interessante surge.

No longa, acompanhamos um jovem casal: Iris (Sophie Thatcher) e Josh (Jack Quaid), que são convidados a ir a uma luxuosa casa no campo do milionário Sergey (Rupert Friend). Lá estão também os amigos de Patrick (Lukas Gage), Eli (Harvey Guillén) e Kat (Megan Suri).

Iris sente que os amigos de Josh não gostam dela, mas o que ela não espera é o acontecimento próximo ao lago que muda tudo na trama. Não demora muito para entendermos por que Iris fez o que fez, e logo descobrimos que a jovem garota é na verdade um robô.

Eu. Robô

O fato de Iris descobrir que é uma androide é um dos pontos mais importantes do filme. Há uma cena em que ela está amarrada e é obrigada a ouvir a verdade da boca de Josh, enquanto ele revela a realidade e explica seu objetivo ao tê-la usado na tarefa perto do lago.

A partir do momento em que descobrimos que Iris é um robô, novas reviravoltas começam a surgir. Entretanto, elas são poucas e não são suficientemente relevantes para nos manter interessados na mensagem que o diretor nos quer transmitir.

Assim como em Blade Runner (1982) e em muitas outras ficções científicas sobre androides, Hancock nos apresenta uma robô que adquire consciência a partir do momento em que descobre ser uma androide.

Há uma cena no último ato em que ela diz querer controlar suas ações, o que está muito de encontro com as ideias sobre as IAs nos filmes de ficção-científica — que provavelmente compõem a memória dessa robô — de buscar uma consciência própria.

Falta profundidade

Todo esse questionamento sobre consciência se mostra bastante superficial, não havendo um aprofundamento nem discussões éticas sobre o assunto. Iris só tenta sobreviver após descobrir que é uma robô, e a produção, que tinha uma boa premissa, acaba se perdendo e se transformando em um thriller genérico.

Muito longe de ser uma distopia, está mais para um filme sobre o tempo em que vivemos e os perigos da tecnologia. Não há menção alguma a IAs; portanto, esse debate sobre os avanços da tecnologia e seus perigos não existe, e perde-se aí uma outra oportunidade de ouro de questionar o poder das corporações e das IAs superinteligentes.

Se em Ex-Machina (2014) tínhamos uma androide com perversão, em Companion (título original) presenciamos uma jovem robô experimentando sentimentos diversos, como medo, raiva e sede de vingança. Isso nos leva a questionar se esses seres podem ter essa capacidade e se podem facilmente se passar por humanos no futuro — algo surreal para os dias atuais, mas que pode acontecer em breve.

O que é elogiável em Acompanhante Perfeita é o seu lado cômico e as atuações de Sophie Thatcher e Jack Quaid nos papéis de Iris e Josh. Fora isso, é um thriller bastante comum, que lembra outras produções do gênero, como M3gan (2022) e Submissão (2024), mas que se mostra vazio ao tratar de temas importantes e relevantes.

Acompanhante Perfeita (Companion, EUA – 2025)
Direção: Drew Hancock
Roteiro: Drew Hancock
Elenco: Sophie Thatcher, Jack Quaid, Lukas Gage, Megan Suri, Harvey Guillén, Rupert Friend, Marc Menchaca
Gênero: Sci-fi, Thriller
Duração: 97 min.

https://www.youtube.com/watch?v=vlYE15g_ZjQ&ab_channel=WarnerBros.PicturesBrasil

Crítica | De Volta à Ação - Cameron Diaz merecia um filme melhor

Foi um grande alvoroço quando Cameron Diaz quando decidiu se aposentar das telonas para construir uma família. Em 2015, ano em que tomou a decisão, a atriz vinha de trabalhos em produções questionáveis, como os fracos Sex Tape: Perdido na Nuvem (2014) e Annie (2014).

Com o sugestivo nome de De Volta à Ação, Cameron Diaz encontrou no filme dirigido por Seth Gordon (Cidade Perdida) o momento perfeito para retornar ao batente.

Além de o título fazer alusão a essa situação, o próprio roteiro brinca com o fato de a estrela retornar ao batente. Na trama, Emily (Diaz) e Matt (Jamie Foxx) abandonam a vida de espiões da CIA após Emily ficar grávida e contar para seu marido, aos prantos, durante uma cena inicial de ação de tirar o fôlego.

A decisão de começar uma família por parte dos espiões é semelhante à da atriz na vida real, e o retorno de Emily ocorre porque ela está cansada de ter que cuidar dos filhos e deseja retornar à ação de alguma forma.

Um filme de ação comum

Na verdade, De Volta à Ação não tem nada de novo nem de extraordinário. Sua ação é genérica e repetitiva, lembrando muitas produções recentes da própria Netflix, como Operação Fronteira (2019) e Alerta Vermelho (2021).

A Netflix precisa entender que não adianta investir milhões de dólares para ter artistas de renome no elenco se o roteiro for fraco e previsível. Assistindo a Back in Action (título original), fica a sensação de que o longa, sobre dois espiões que precisam encontrar uma chave mestra com poder de mudar o mundo, é algo batido e nada inovador.

E vamos concordar que são poucas as cenas de ação realmente boas. Há sequências de perseguição, tiroteio e pancadaria que funcionam por breves momentos, mas que não ajudam a trazer nada que já não tenhamos visto em outras produções do gênero.

Ponto fraco é o roteiro

O filme se concentra nos personagens de Diaz e Foxx, e, por isso, muitas questões que poderiam ter sido melhor desenvolvidas acabam ficando de lado. Um exemplo disso é a relação do casal com os filhos, que, no primeiro ato, é apresentada como problemática, com a filha mais velha desrespeitando os pais em várias oportunidades.

Esse é um dos muitos problemas estruturais do roteiro escrito por Seth Gordon e Brendan O'Brien. Primeiro, os filhos praticamente perdem a relevância que pareciam ter no início e acabam aparecendo apenas para cumprir uma função secundária na história.

Isso também acontece com outros personagens interessantes que surgem, como a mãe de Emily, a ex-agente Ginny (Glenn Close), que é mostrado como um conflito frio e vazio. O mesmo pode ser dito sobre o romance entre os ex-espiões, que no primeiro ato era mais intenso, mas depois fica morno.

A única coisa realmente boa em De Volta à Ação é o retorno de Cameron Diaz, mas poderia ter sido em um filme de melhor qualidade, que fizesse jus ao seu talento e não se limitasse a uma trama nada original.

De Volta à Ação (Back in Action, EUA – 2025)
Direção: Seth Gordon
Roteiro: Seth Gordon e Brendan O'Brien
Elenco: Jamie Foxx, Cameron Diaz, McKenna Roberts, Rylan Jackson, Kyle Chandler, Glenn Close, Jamie Demetriou
Gênero: Ação, Comédia
Duração: 114 min.

https://www.youtube.com/watch?v=3davFh1eoVs&ab_channel=NetflixBrasil

Crítica | Anora é um retrato de um mundo superficial

A princípio, Anora pode parecer apenas mais um filme que segue a fórmula de uma mulher que se envolve com um homem rico. Porém, à medida que a trama se desenrola, ela vai nos envolvendo e nos dando respostas, revelando mais sobre a complexidade dos personagens e suas ambições pessoais.

Dirigido e roteirizado por Sean Baker, o longa apresenta uma história de forte carga dramática, desenvolvida com profundidade e transmite de forma clara a mensagem que o cineasta deseja passar ao público. Nos dois projetos anteriores de Baker, Projeto Flórida (2017) e Red Rocket (2021), o foco estava em personagens à margem da sociedade, vivendo situações intensas.

Temas como desigualdade e pobreza são recorrentes na filmografia de Sean Baker, e em Anora não é diferente. A trama segue Ani, uma mulher que trabalha em uma luxuosa casa de striptease em Nova York.

Cinderela às Avessas

Por saber algumas palavras em russo, aprendidas com sua avó, a vida de Ani muda ao atender um grupo de russos liderado por Ivan Zakharov (Mark Eydelshteyn), um garoto rico e mimado que passa os dias passeando com seus amigos por diversos locais, muitas vezes consumindo bebidas alcoólicas e abusando de drogas.

Ivan é filho de um famoso e rico empresário russo, enquanto Ani tem 23 anos e Ivan, 21. Após se tornar sua acompanhante exclusiva, por um alto valor, Ani e Ivan decidem se casar em Las Vegas para que Ivan possa se tornar cidadão americano e assim evitar retornar à Rússia, onde teria que trabalhar com seu pai.

Quando o pai de Ivan descobre sobre o casamento, ele viaja aos EUA com a intenção de levar seu filho de volta à Rússia. A partir daí, toda a confusão se inicia, com os capangas do pai de Ivan, acompanhados de Ani, procurando por ele em diversos locais de Nova York.

Sexo e Melancolia

O roteiro inteligente de Baker é um retrato do sonho americano, como Ivan diz em uma das cenas: "Deus abençoe a América!". Para Ivan, viver nos EUA representa mais do que liberdade; simboliza também a oportunidade de um estilo de vida independente dos pais e, de certa forma, superficial, já que ele usa o dinheiro do pai para gastar de maneira fútil.

O sexo e a nudez são usados de maneira proposital no longa, não apenas para ilustrar o universo superficial em que os personagens estão imersos, mas também para destacar como o dinheiro nos transforma, levando-nos a adquirir coisas supérfluas que proporcionam prazer momentâneo. Ani trabalha com o sexo, uma realidade que ela conhece bem. Logo, ela se encanta com o estilo de vida de riqueza, sem refletir sobre o futuro nem a origem daquela fortuna.

A cena final, em que Ani faz sexo com Igor (em grande momento de Yura Borisov) no carro, simboliza toda a vulnerabilidade da protagonista. Ela está imersa em um mundo que conhece bem: o do prazer, e esse é o único meio que acredita ter para alcançar seus objetivos. É uma cena tocante, que revela e reflete a solidão da personagem.

Surge uma Estrela

Mikey Madison é, sem dúvida, um dos grandes nomes da temporada, consolidando-se como uma estrela em ascensão. Após sua participação em Pânico (2022), ela retorna para interpretar uma protagonista carismática e sensual. O papel não é fácil, mas Mikey se sai bem, entregando uma atuação de impacto que eleva a qualidade da produção.

Embora o propósito principal do filme não seja o humor, ele oferece boas risadas, especialmente em situações desastrosas e caóticas. Um exemplo disso é a cena em que os capangas aparecem na casa de Ivan, gerando um dramalhão inesperado com Ani e seu marido. O humor é espontâneo, com um toque irreverente, voltado para o público adulto, já que o filme também é repleto de cenas eróticas.

Anora se destaca não só pela qualidade de sua trama, mas também pela força de sua protagonista e pela atmosfera melancólica que permeia a narrativa. O filme certamente será lembrado no futuro pelo seu roteiro inteligente e pela direção de Sean Baker. Sem dúvida, é uma das grandes produções do ano.

Anora (idem, EUA – 2024)
Direção: Sean Baker
Roteiro: Sean Baker
Elenco: Mikey Madison, Yura Borisov, Mark Eydelshteyn, Lindsey Normington, Vache Tovmasyan
Gênero: Comédia, Drama
Duração: 139 min.

https://www.youtube.com/watch?v=K3f7jj8yJTo&ab_channel=UniversalPicturesBrasil