Crítica | Assassin's Creed: Renascença

A história da humanidade é um tanto quanto fascinante. Passando pela pré-história até aos dias de hoje, é um tanto curioso a evolução humana. Nesta linha do tempo aparentemente que se finda ao nosso presente, personalidades históricas carimbaram seus feitos, sangrentas batalhas épicas definiram o percurso de civilização, revoluções moldaram a política tal como conhecemos hoje. Nada disso é fruto da mente de um indivíduo, mas, sim, fatos que ocorreram neste pequeno planeta em que vivemos.

Neste sentido Assassin's Creed é uma franquia muito inteligente. Nos faz participar de importantes momentos, por vezes colocando o jogador como figura chave de algum acontecimento. Marcando os jogos eletrônicos, agora a franquia se expande para outras mídias, sendo uma delas a literatura. O resultado é formidável, mesmo com alguns "bugs" na narrativa.

Ezio Auditore é filho de um rico banqueiro em Florença, Itália. Jovem, se encontra em diversas aventuras com seu irmão, Mário. Correr sobre telhas, se envolver em brigas de rua com famílias rivais, etc. Seu pai, Giovanni Auditore, porém, não tinha uma situação muito adequada a vida dos filhos. Acusado de traição, é sentenciado à forca, dissolvendo toda a família. Nisso, Ezio vê-se pressionado ao amadurecimento, tornando-se, então, um Assassino.

A maior diferença com os games aqui e talvez o maior acerto, é justamente não termos nenhum deslumbre ou detalhe do presente. Os laboratórios e a máquina "Animus" são deixados de lado, dando lugar uma fantasia histórica épica, proporcionando um maior cuidado com personagens deste período.

Oliver Bowden, pseudônimo de Anton Gill, que é conhecido por ser um historiador, faz seu trabalho com eficácia ao retratar o Renascimento. As paisagens e o modo de vida do período são bem apresentados. A política da época torna-se clara, entendemos a economia do período e as ordens hierárquicas. Em figuras reais da época, como Leonardo da Vinci, o autor mantém sua síntese, mas utilizando de liberdade criativa, adéqua-os na trama imaginativa.

No entanto, se o cenário é eficaz, o autor erra no desenvolvimento da história e em seus personagens. As etapas da vida de Ezio são escritas de maneira apressada e preguiçosa, tornando o personagem por vezes artificial, prejudicando gravemente a experiência. O aprendizado de suas habilidades passam de forma quase batida. Porém, o autor consegue construir bem as camadas do personagem, tornando-o mais que um herói. Este ponto torna-se melhor desenvolvido no final. A princípio, sua narração se demonstra monótona, transparecendo a confusão do autor ao transferir-se de livros de não-ficção para ficção.

Mesmo que tenha esses defeitos, a leitura é por vezes empolgante, graças a riqueza da mitologia envolvendo a Ordem dos Assassinos. O modo "Stealth" aqui é bem usado, há uma sensação de perigo a todo instante e a imersão nas sombras é bem presente.  Vale lembrar que a história não é nem um pouco infantil, ou juvenil. As cenas de violência são bem detalhadas e fortes, causando impacto no leitor (o mesmo vale para as de "romance"). Infelizmente, porém, muitas vezes a aflição em momentos emergentes é quebrada, devido a eficiência dos personagens nestes acontecimentos.  Algumas subtramas também não são clichês, fugindo do famoso "final feliz". 

O antagonismo dos Templários não é muito fascinante, mas as diferenças entre ambas as Ordens é interessante. Talvez o maior problema neste núcleo seja em seu líder. As passagens de tempo as quais comentei também foi prejudicial aqui. Não há nenhum vínculo do leitor com o vilão principal.

Outro acerto que funciona de maneira bem orgânica, é o uso de palavras em italiano. Os personagens usam diversos adjetivos ao chamar outros, deixando claro a sua nacionalidade. Há também o uso de gírias e título de alguns eventos. Caso o leitor tenha dúvida sobre o significado de alguma palavra, há um glossário bem montado nas páginas finais do livro - junto com um guia de personagens e suas biografias. Neste ponto é válido dar certo mérito a tradução.

Renascença é um livro decente. Se comparado com boa parte de seus sucessores você sairá daqui bem satisfeito com o conjunto da obra (já adiantando aqui uma opinião sobre o futuro da série). O resultado pode agradar tantos os jogadores do game quanto aqueles, assim como eu, fã de uma boa aventura.

PS: Este foi meu primeiro livro o qual resolvi comprar em edição econômica. Já de início me arrependi em gastar alguns reais a menos, tendo em vista o péssimo acabamento. A capa se desgasta facilmente, criando orelhas em suas pontas, e a qualidade de impressão é extremamente ruim - algumas páginas estavam praticamente em branco, quase ilegível.

Escrito por Kevin Castro


Review | Assassin's Creed Rogue

Review | Assassin's Creed Rogue

O que dizer sobre Assassin's Creed Rogue? Não, sério, o que dizer sobre Rogue? É talvez o episódio da série que menos se destaca, trazendo muito pouco que seja novo. E as poucas mudanças que traz, mesmo que notáveis em potencial, são apenas detalhes superficiais. A principal mudança: jogar como um assassino que se torna templário. O que praticamente só importa na história. Que é corrida e mal desenvolvida. Fora isso, o jogo é Black Flag 1.5. Ou, na verdade, Black Flag 0.5, pois além de ser pior, tem muito menos a oferecer que seu predecessor. Dito isso, Rogue é um bom jogo. Lançado junto com Unity em novembro de 2014, o título agradou certos fãs por não ser o desastre de bugs que foi seu companheiro e por ser tão parecido com o que o sucesso AC 4: Black Flag tinha sido um ano antes. Não arrisca, mas petisca. Uma experiência competente, que não tem nem um décimo da ambição de Unity. Para não simplesmente repetir a explicação das mecânicas de Black Flag, foco então no "diferencial" de Rogue, sua trama.

Você é Shay Patrick Cormac, um irlandês de sotaque forte que...que...ele é irlandês. Também é membro da Irmandade dos Assassinos, junto com seus amigos Liam e O'Duggan. Juntos trabalham para a Ordem, fazendo coisas de assassinos como: assassinar, pular em fenos e folhas, parkour, manejar barcos, enxergar o mundo através da cor azul. Só pra esclarecer, eu inventei o nome O'Duggan, o personagem não existe. Só queria ver se os personagens realmente importam (spoiler: não).  Shay gosta de correr e...olha, vou simplesmente falar das etapas narrativas. Shay começa como assassino. Realiza algumas missões para a ordem. Após a busca irresponsável de um artefato em Lisboa resultar em uma catástrofe (o infame terremoto de Lisboa de 1755), Shay vê a Irmandade de maneira diferente, notando sua fome de poder e e violência desmedida.  Após um conflito com seu superior, Achilles (de Assassin's Creed 3), Shay se torna um alvo da Irmandade. Foge, se acidenta, e acaba acolhido por um casal idoso (eu já vi esse filme, se chama X-Men Origens:Wolverine).

Se recuperando, Shay é eventualmente abordado e recrutado por Haytham Kenway, um templário (importante em AC3). Pelo resto da trama, vemos Shay caçando seus antigos "amigos", tentando chegar até Achilles, para impedir que outra busca a um artefato resulte na mesma catástrofe de antes. A ideia é boa, mas a frieza com que a trama é entregue rivaliza com seu cenário gelado do Atlântico Norte. Os personagens não possuem algum carisma ou até mesmo detalhes de personalidade.  Não ajuda também a dublagem inglês extremamente sem força, onde o que mais marca é o sotaque monótono de Shay. Por outro lado, a dublagem em português brasileiro é ótima, mantendo o padrão de qualidade das localizações da Ubisoft. Alexandre Moreno, dublador de atores como Adam Sandler e personagens como o Gato de Botas de Shrek, traz muita expressão a Shay. O elenco coadjuvante é também muito bem trabalhado vocalmente. Nesse sentido, Rogue é como aquele filme meh que acaba ficando mais divertido dublado na sessão da tarde, como incontáveis filmes de Schwarzenegger e Stallone. A trilha sonora é competente, mas não possui o impacto da trilha de Unity ou qualquer outro da franquia. Disse ao início que o diferencial de Rogue é sua narrativa, mas seu destaque continua sendo sua jogabilidade.

Trazendo a mesma mescla de exploração a pé e naval de Black Flag, Rogue foca em agradar quem queria mais daquilo (honestamente, quase todo mundo). E nisso ele acerta. Black Flag realizou algo tão único e eficiente, que seria uma pena se a série nunca mais explorasse aquilo. Claro, Rogue não tem o mesmo nível de surpresa ou competência, mas seu saldo ainda é positivo. Não é a evolução ideal dessa fórmula naval apresentada por seu predecessor, também sendo limitado pelo fato de que foi lançado apenas nos consoles da geração passada, PS3 e 360 (PC também, mas posteriormente). Isso a franquia poderia resolver, se reconhecesse todo o grande espaço a ser explorado por essa jogabilidade naval. Imaginem um novo Assassin's Creed, para a geração atual de consoles, que se utilizasse de praticamente tudo de positivo que a série trouxe até agora. Não seria bacana? Um épico com carruagens, cavalos, navios, talvez a volta de uma das máquinas de Da Vinci. Essa variedade mecânica poderia ser melhor explorada pela franquia. O sucessor de Rogue e Unity, Syndicate, deu um passo nessa direção, mas disso falaremos depois.

Outro positivo de Rogue é a estrutura de sua história. Se por um lado apenas seis sequências principais tornam a duração da história mais curta (no máximo 7 horas de jogo), por outro lado temos um jogo mais focado, sem as terríveis missões de "eavesdropping"(onde você segue um alvo sorrateiramente e escuta suas conversas à certa distância) ou outras atividades banais e frustrantes. A jogabilidade "a pé" também tem certas mudanças, mesmo que poucas. Por ser um templário, por exemplo, certos assassinos inimigos podem estar esperando você na próxima esquina, monte de feno ou telhados, esperando para atacar com suas lâminas escondidas. E em certos momentos onde nos outros jogos você era o fugitivo, você aqui é o perseguidor. Fora isso, a jogabilidade é a mesma de Black Flag.

Concluindo, Rogue é mais do mesmo, de um divertido e inovador mesmo. Porém, suas promessas de mudanças na narrativa são apenas isso, promessas. Isso impede, então, que tenhamos um capítulo marcante. Se você queria mais Black Flag, o jogo certamente irá te agradar. E se você não jogou Black Flag, Rogue talvez te surpreenda com sua exploração de mundo diferenciada. Mesmo que sua história não seja marcante e suas side missions não tenham nada da personalidade das atividades de AC2 (as tumbas) ou AC3 (as missões Pegleg), Rogue possui conteúdo competente e diverte, sendo então mais um produto positivo da franquia da Ubisoft.

Texto escrito por Júlio Vechiato


Crítica | Desventuras em Série - 1ª Temporada

Em certos textos, caro leitor, é preciso começar pelo apego tão defenestrado e, talvez, pouco sadio daquela nostalgia que acalora nosso corpo, faz os olhos lacrimejarem enquanto nosso coração praticamente pula para fora do tórax. Uma imagem grotesca de se imaginar, mas sentir nostalgia é algo profundamente mágico. Algo que edifica o caráter de alguém.

O sentimento efêmero é valioso. Pelo menos, eu mesmo nutro tremenda paixão quando ele surge inesperadamente com uma lembrança surpresa ou através do relançamento de um produto que amávamos muito em outra época da vida. Um amor que molda a imaculada lembrança.

Desventuras em Série, a franquia de livros muitíssimo bem-sucedida de Lemony Snicket, é uma das que me causa tal sentimento de uma infância nem muito distante na cronologia, mas que provoca a mais digna das saudades. Não posso dizer por todos, mas pelo menos para mim, esse terrível conto tão deliciosamente escrito, despertou o verdadeiro prazer pela literatura.

Foi justamente através dos diálogos cínicos, irônicos e, muitas vezes, cruéis, que nomes de autores importantes ou de peças literárias tão marcantes em nossa História chegaram até mim. Desventuras em Série foi, é e sempre será um grande abre-alas para jovens mentes sedentas por histórias tão peculiares como a dos irmãos Baudelaire.

Com tanto zelo por esses livros dos quais tive meu primeiro contato aos meus já longevos sete anos de idade, no fatídico ano de 2001, imaginem meu cinismo já influenciado pela leitura quando fiquei sabendo que haveria uma adaptação cinematográfica da tragédia Baudelaire. Embora não fosse a adaptação perfeita que queria, hoje, nutro estima pelo longa que demonstrou soluções inteligentes, criativas e parece ter entendido muito mais a proposta dos livros.

Mal sabia eu que era aquela versão que mais teria meu respeito, enquanto no campo audiovisual, apesar de ter aguardado com boas expectativas para o seriado ordenado pela queridinha da América e da internet, Netflix.

Pois bem, se chegou até aqui após relatos nada pertinentes na expectativa de uma recomendação entusiasmada, uma crítica açucara ou uma daquelas resenhas que apenas oferecem aquela sinopse que todos já estamos cansados de saber, pare de ler agora. Isto está longe de acontecer na experiência que encontrará nessa longa dissertação.

Jogue seu celular no asfalto, dê um murro na tela de seu notebook ou lance seu tablet aos pombos. Esse texto certamente não lhe trará nada além de profunda decepção caso já tenha assistido a essa peça audiovisual e tenha achado a última bolacha do pacote. Infelizmente, lhes informo que o mundo é uma tragédia ou glória graças a esta pluralidade de opiniões – claro que muitas vezes infundadas.

A que você lê nesse exato instante abordará as mazelas, más escolhas, vista grossa, cópias infelizes, mentes anestesiadas, o declínio de um gênio, atuações tiradas diretamente de desenhos Hannah-Barbera e da bizarríssima trilha musical. Por isso, lhes aviso novamente: nesta página só há infortúnio e perturbação caso tenha amado a citada obra. Poupe sua mente e preserve sua alegria. O cotidiano já insiste em afundar nosso espírito a níveis abissais nos jogando no poço do elevador Ersatz.

Há diversos portais, sites ou blogs com opiniões muito mais saltitantes que a minha. Posso lhes recomendar os colegas do Cinematecando ou até mesmo do Plano Crítico, que já fora mais crítico, na minha modesta opinião. Para os que preferem os estrangeiros, torrentes de alegria encontrarão na análise do Entertainment Weekly. Aqui, no Bastidores, há somente esta opinião ranzinza que, embora seja escrita por mim, reflete o sentimento geral de nossa equipe.

Bom, certamente você é insistente. Já que não olhará para longe e se atentará a esse infeliz relato, sem meias palavras. O texto é obviamente longo, afinal há 360 minutos de material para analisarmos!

Portanto, preparem-se. Partiremos para a desventura em série mais ordinária de uma história que celebrava o talento da criatividade inventiva, do gosto pela boa literatura e de alguns dialetos de uma mordedora.

O trabalho dos figurinos é satisfatório, embora o estilo princesa deveras colorido para Violet fuja da proposta original.

Bom Começo

Ironicamente, minha jornada por Desventuras em Série foi deveras agradável. Mais engraçado ainda são as parábolas de Snicket – muito bem interpretado por Patrick Warburton, que muitas vezes parecem ter autoconsciência. Tomemos de exemplo a principal que marca a adaptação de Mau Começo – “melhor do que nada”.

Infelizmente para a criação do seriado desta obra e para a Netflix, os espectadores já possuem algo melhor e mais interessante surgido em 2004 no audiovisual. O que certamente é um caroço no sapato da produtora, pois, em todo momento, as comparações surgem. E, quase sempre, a Netflix perde. Por longa margem.

Algo que é interessante, de primeiro momento, é a boa escolha em adaptar cada livro em dois episódios rendendo obras com durações cinematográficas, apesar de ficarem bem distantes da qualidade de um filme de médio porte de Hollywood. O roteiro é adaptado diretamente por Daniel Handler. Sim, o autor original dos livros disfarçado sob o pseudônimo de Lamony Snicket. É curioso notar que, por vezes, Handler quase atenta contra sua obra ao apostar em certos exageros que tornam sua escrita repetitiva – importante lembrar que o material original não possuía tantas tentativas fracassadas de comédia.

Talvez, o maior equívoco de Handler fique justamente em não saber dosar bem a comédia com drama, afinal Desventuras em Série é uma tragédia de humor negro.

Os episódios de Mau Começo já delineiam muitas coisas que irão se repetir na série inteira, além de dar o primeiro vislumbre do como essa versão se portará na caricatura. Em vez de algo mais original, o diretor Sonnenfeld aposta mesmo em retratos toscos sendo que alguns funcionam como os da Sunny. Já outros, transformam todo o núcleo antagonista em vilões Hannah-Barbera seja de Corrida Maluca ou Scooby-Doo.

A maquiagem em Neil Patrick Harris é um dos pontos mais altos! Ótima caracterização!

Definir se essa tosquice é prejudicial à obra é algo completamente subjetivo. Como este é um artigo de opinião, eu vejo que, sim, é algo que foge bastante de atmosfera proporcionada pelos livros, tanto mais sóbrios e menos ridículos. Quem não consumiu as obras anteriores, é capaz que adore a atmosfera leve do seriado, já quem experimentou outros pontos de vista, possivelmente nem tanto.

Mau Começo são os episódios com o menor dos males, na verdade, pois a dosagem está próxima do correto, ainda que raramente haja quaisquer impactos da perda súbita dos pais dos irmãos Baudelaire. É bizarro apontar isso, mas, estranhamente, os irmãos mal conversam entre si, já que praticamente estão sempre interagindo com outros personagens estúpidos demais como o senhor Poe e tia Josephine ou elaborando planos para escapar das garras de Olaf. Nisso, o drama sai prejudicado no seriado como um todo.

Handler tenta contornar a situação com as inserções da narração de Lemony que ainda permanecem muito criativas e até mesmo com direito a histórias inéditas. Snicket pontua, frisa a tristeza dos Baudelaire e pronto. Não há esse momento de luto, pesando o drama um pouco mais com tantas tragédias que acontecem com os irmãos. Não há lágrimas ou pesar em Desventuras em Série da Netflix – o que é uma verdadeira pena. Uma regra do showbiz que nunca deve ser ignorada: show, don't tell. Handler, por ser do meio literário, talvez ainda precise se adequar ao novo meio.

Já que o drama é falho aqui e na série como um todo, como se sai a comédia? Apesar de medíocre em grande parte graças à caricatura e falta de um texto mais ácido para a televisão, é um elemento que se sobressai. Algumas vezes, boas ideias como a de Sunny jogar pôquer são revertidas em péssimas soluções graças ao uso nefasto de CGI porco – Sunny é quem mais sofre com os péssimos efeitos injustificáveis.

Em suma, Handler ainda consegue nos arrancar boas risadas. O problema é: a cada boa piada, ele ressuscita uma esgotada. Por sorte, ela não tem muita chance de aparecer nos episódios de Serraria Baixo-Astral. Trata-se da inaptidão completa de fornecer tiradas mais interessantes para Olaf. Seja como Olaf, Stephano e ou Sham, Handler escreve o mesmo conceito de humor: o personagem que se trai a todo instante pelas próprias palavras. Isso sempre acontece quando Olaf conversa sobre os órfãos e, acidentalmente, revela seu real interesse neles: a fortuna.

A Sala da Netflix

Enquanto Mau Começo consegue pintar uma boa impressão, os pequenos problemas de outrora tornam-se mais evidentes pela repetição. A Sala dos Répteis ainda mantém um bom padrão de qualidade perto da deplorável adaptação de O Lago das Sanguessugas.

Aasif Mandiv consegue criar um tio Monty interessante e fascinado pelos répteis que cuida. Fez o básico, assim como a dupla Malina Waissman e Louis Hynes como Violet e Klaus – em Serraria Baixo-Astral, há uma nítida melhora na performance de ambos.

A graça da adaptação é que consegue contar de modo competente a história do livro. Nisso, Handler não desaponta no seu teleplay. Para o seriado, ele sabiamente já insere um mistério maior que sonda os Baudelaire e o Conde Olaf envolvendo, obviamente, C.S.C. que ainda não fora mencionada nominalmente. Esse mistério pode ser considerado uma boa faca de dois gumes, pois enquanto lhe mantém interessado sobre do que se trata esse conflito que assombra as narrativas, te provoca decepção por não chegar perto de oferecer algo mais sólido.

É algo para ser trabalhado no decorrer das três temporadas, mas sua inserção já na primeira é de causar estranhamento por alguns motivos. Primeiro, a conspiração maior remove o aspecto intimista de drama familiar, perseguição e abusos que os órfãos sofrem, já que é um elemento distrativo. Ao colocar C.S.C. na 1ª temporada faz com que seu impacto real na narrativa se perca consideravelmente – a sigla só surge no livro quinto e então passa a ser desenvolvida até o final.

Já colocar tio Monty como um membro ativo da sociedade e da inserção da personagem Jacquelyn é algo totalmente subjetivo. A história de Desventuras é forte o suficiente sem a necessidade dessas passagens que se comportam como fillers. Os problemas mais presentes nesses episódios estão concentrados na segunda parte.

É aqui que começamos a ver como Neil Patrick Harris, mesmo se esforçando, parece não conseguir captar bem a essência de conde Olaf – algo que Jim Carrey conseguiu ao modo dele. Desde Mau Começo, Harris praticamente não se movimenta em cena, apostando apenas em alguma variedade de expressões faciais para cada novo personagem que Olaf se disfarça. Harris quase nunca usa seu corpo para favorecer o disfarce como Stephano ou Sham, ficando imóvel em cenas que ele deveria brilhar elevando sua atuação.

Ironicamente, Harris atua como uma estátua um personagem que é ator - mesmo que Olaf seja um péssimo ator. Ser um ator ruim não tem nada a ver com imobilidade ou vozes engraçadinhas. Harris não entendeu isso por boa parte do seriado.

Enquanto há uma boa autonomia de texto entre os Baudelaire e Monty, é vergonhoso ver um diálogo tão escrachado e infantil aparecer durante o jantar entre os quatro e Stephano acerca de entretenimento: cinema vs. televisão. Era para ser piada, mas certamente o recado da Netflix foi dado com bastante soberba.

Um mau momento de solução de roteiro já aparece neste aqui e se repetirá na próxima adaptação: as fugas de conde Olaf.

A Janela Discreta

Definitivamente o ponto mais baixo do seriado se encontra na adaptação de O Lago das Sanguessugas. Embora a história seja basicamente transcrita com alterações que a diminuem, os episódios 5 e 6 são quase insuportáveis pelo exagero do “hannah-barberismo” ou pastiche que absurdamente foge do que havíamos visto até agora.

De supetão, temos o exagero forçado da atuação de Alfre Woodard. A direção deve ter ficado tão apreensiva de repetir o fenomenal desempenho de Meryl Streep que, basicamente, não filtrou as ideias ruins. É difícil elogiar qualquer ponto da atuação de Woodard como Josephine já que basicamente não o há. Fora os bizarríssimos gritos inseridos em momentos inoportunos, a essência da covardia de Josephine praticamente se esvai ao ela se assustar até mesmo com o próprio reflexo. Woodard também não trabalha bem com expressões de medo reforçada por gestos de seu corpo. Aliás, já é redundante afirmar: o elenco inteiro basicamente não se dedica em nada em explorar um pouco mais da teatralidade trazida pelo visual do seriado.

É linguagem básica para os diálogos no pior modelo de esquema televisivo: o de novelão. Os únicos atores que tentam sair desse vício de se portarem como manequins são os integrantes da trupe de Olaf, Don Johson como Senhor e Joan Cusack entregando a melhor atuação como Juíza Strauss. Um belo desperdício de bons nomes. Somente K. Todd Freeman se aproxima de um desempenho tão decepcionante quanto o de Woodard.

Novamente, Harris apenas modifica a voz, apresenta umas caretas novas e não aproveita a oportunidade de brincar mais com as fantasias de Olaf. Os problemas de O Lago das Sanguessugas permeiam bastante coisa, principalmente seu desfecho. Enquanto a dinâmica dos irmãos parece melhorar – principalmente no uso de suas habilidades, algumas alterações de Snicket e diversas barbeiragens visuais do diretor Sonnenfeld conseguem sempre piorar a experiência geral desses episódios.

Apesar de os dois episódios contarem com momentos péssimos, me limitarei a apenas três para ilustrar meu ponto de vista. O primeiro é a representação visual da biblioteca de Josephine que basicamente rasga um conceito originalíssimo da sala oval suspensa com uma enorme janela. No seriado, a wide window fica devendo e muito – basta comparar com as ilustrações originais ou com a concepção visual impecável  proporcionada pelo filme de 2004.

A destruição da casa de Josephine é outro momento que eu gostaria de esquecer. No livro e no filme, o senso de urgência é implacável, além de fornecer outro trabalho em conjunto dos irmãos para se salvar do furacão e da queda da casa. Aqui, Klaus dá piruetas no mesmo lugar (?). É absolutamente brochante ver como o seriado não leva muito à sério as situações mais tensas da obra original. Até mesmo a péssima trilha musical de James Newton Howard atinge um patamar ridículo com melodias que acompanhariam os piores esquetes de galhofas clown - sim, estou falando de Lazytown.

(SPOILER)

O terceiro e o pior momento desse conjunto de episódios, infelizmente é o ataque das sanguessugas e do resgate de Olaf. A morte completamente patética de Josephine perde totalmente a penumbra de incertezas que configura a tragédia da mulher no livro. Handler, numa decisão ruim, também muda a essência da personagem ao fazê-la ter um desenvolvimento desnecessário ao confrontar Olaf. A potência dramática da “tia” dos Baudelaire implorar por sua vida e oferecendo as crianças ao vilão é aterradora. Mostra que os verdadeiros monstros estão por todos os lados.

(FIM DO SPOILER)

Aqui, novamente ocorre a suspensão de descrença enorme exigida pela fuga de Olaf, mais se assemelhando a Scooby-Doo em má fase do que com Desventuras em Série. Handler insiste em usar toda a trupe do Olaf desnecessariamente em A Sala dos Répteis e aqui também. Quando Poe finalmente é confrontado pela verdade de que Sham é Olaf, fica difícil crer que todos os vilões preferem dar no pé em vez de simplesmente matarem o banqueiro e sequestrarem as crianças.

A direção acerta em "pausar" as cenas para inserir os monólogos de Snicket. Ponto alto do seriado.

Seriado Alto-Astral

Após essa queda abissal de qualidade com O Lago das Sanguessugas, o seriado se fortalece com Serraria Baixo-Astral. Talvez justamente por se livrar das inevitáveis comparações com o filme que era infinitamente mais criativo que o seriado. Ou simplesmente porque seria difícil superar a "qualidade" dos anteriores.

Chegado este momento da crítica, é hora de analisar o trabalho geral dos diretores Barry Sonnenfeld, Bo Welch e Mark Palansky. Como Sonnenfeld e Welch são os mais presentes, a maioria das responsabilidades recaem em seus ombros.

Em termos de originalidade, o seriado é uma profunda decepção. Os diretores decidiram copiar o estilo cinematográfico de Wes Anderson a um nível absurdo. Enquanto na estética, há semelhança, Desventuras em Série não possui o menor brilho das obras de Anderson justamente por conta do diretor entender melhor de encenação e atuação que os do seriado.

Enquanto há essa linguagem cinematográfica, a teatralidade da série é morta graças as atuações pálidas e sem graça que não injetam vida ou dinamismo de cena. É subjetivo, mas o seriado tem um ritmo muito chato justamente por conta dessa completa inoperância da direção que parece ter medo de ousar um movimento de câmera mais interessante ou de quebrar um pouco a lógica dos enquadramentos centralizados.

Graças aos enquadramentos similares na obra inteira e na completa falta de contraste da cinematografia pálida de Bernard Couture, Desventuras em Série é uma mesmice visual que só quebrada pela riqueza de detalhes de alguns cenários interessantes como a casa de Olaf e tio Monty, do cinema, dos dormitórios da serraria e do restaurante Palhaço Ansioso. Lembrando que a falta de contraste é algo grave. Mesmo em filmes que se baseiam com esquemas de cores mais monocromáticos, há sim contraste. Basta ver o filme dessa mesma obra que foi tão bem fotografado por Emmanuel Lubezki.

Fora isso, dificilmente dá para comentar mais elementos da direção do trio. Quando tentam inventar algo na encenação, acabam errando e criando um efeito tosco vide os péssimos momentos de O Lago das Sanguessugas. O melhor do trabalho dos diretores está restrito justamente quando não inventam nada e seguem a receita do bolo pré-definida na decupagem. O esquema de cores também sai a la Tim Burton, com leve influência nos enquadramentos. Sonnenfeld também incorpora elementos de Pushing Daisies, uma das séries que dirigiu.

Mas como havia dito, Serraria Baixo-Astral apresenta melhoras significativas e ainda consegue resolver uma ideia que teria sido ruim caso se concretizasse – a boa reviravolta que marca o destino dos personagens de Cobbie Smulders e Wil Arnett. Neil Patrick Harris finalmente passa a utilizar melhor seu corpo ao se travestir de Shirley oferecendo outra gama inexplorada de humor até então. Os irmãos finalmente entram em conflitos que podem destruir o laço familiar entre eles através da hipnose de Georgina Orwell. Apenas um comparsa acompanha Olaf, conferindo o ar original dos livros, além de toda a resolução da relação vilão vs. herói ser mais crível ao conseguir injetar mais tensão no clímax.

Os novos personagens como Senhor, Charles e Georgina Orwell interpretada muito bem por Catherine O’Hara, passam a ser menos paródias dos originais da literatura se comportando de maneira mais realista com um quê de absurda – exatamente como deve ser. Há mais integridade narrativa nesses episódios como um todo os colocando diretamente no rol dos melhores do seriado, além do humor ser mais funcional e inteligente. Os únicos poréns continua mesmo com o uso péssimo de CGI em Sunny que te remove da imersão proposta e da trilha musical de James Newton Howard.

Desventuras em Série

Enfim, caro leitor, termina o relato de alguém que sempre acompanhou com fidelidade cada lançamento dos livros e, agora, das obras variadas deles. Pela minha introdução, realmente achei que ficariam horrorizados, mas creio que consegui desatar esse nó górdio apresentado pela Netflix de modo balanceado.

Apesar de eu não ter gostado de praticamente ¾ da experiência que a série me proporcionou, não afirmo de modo algum que é algo abismal, mas sim desperdiçado. A criatividade ficou restrita à muitas ideias ruins que tentaram fugir da comparação das boas ideias e soluções visuais que o filme empregou em 2004. Em seus pontos altos, estão as participações de Snicket, das diversas referências a elementos dos livros e também da adaptação mais pura da história que tivemos até agora, apesar das derrapadas que mais conferem ar de paródia do que de verdadeiras adaptações.

A jornada dos órfãos Baudelaire sempre fica cada vez mais trágica e injusta ao decorrer dos livros então torço muito para que a produção não tente limitar tanto o drama da tragédia do modo que aconteceu aqui.

É justamente pela tragédia que o autor demonstra o quão poderoso é o espírito de seus personagens diante da corrupção ética e moral, da negligência e da morte violenta de quem mais amam. Por isso que Snicket/Handler tinham conquistado tanto minha atenção na infância. A mensagem edificava e era valiosa cheia de nuances culturais inteligentes de ótimo vocabulário e tons acinzentados de seus personagens. Ver como os Baudelaire não resignavam diante de tanta injustiça e perversidade certamente influenciaram o caráter de quem leu essas desventuras.

Há essa esperança de que os produtores da Netflix pesem menos a mão no pastiche e não entreguem mais um produto tão efêmero, bobo e estéril de fortes mensagens. É de bom tom entender que é possível criar produtos infantis que tocam todas as idades como Handler criou em 1999. Aqui, a Netflix não entendeu isso. É sim um bom seriado para crianças bastante novas nascidas em uma era repleta de blindagens, onde até mesmo a tragédia da perda paterna não é minimamente mensurada apropriadamente em um produto cultural destinado a elas. Diversão, comédia, letargia.

Infelizes de nossos tempos.


Review | Toy Story 3

Review | Toy Story 3

Toy Story, com certeza um título que traz nostalgia e um certo feeling para crianças e adultos ao redor do mundo. Com sua fama nos cinemas, é totalmente normal chegar jogos baseados nas aventuras e histórias que o filme menciona. O jogo de Toy Story vem desde a época do Super Nintendo onde controlávamos o personagem Woody dentro de um típico jogo de plataforma com detalhes sempre bem coloridos e divertidos lançado nos anos 90. Dessa época em diante, foram feitos muitos jogos da franquia sempre com bons resultados e atraindo os jogadores a experimentarem a magia de Toy Story.

Finalmente chegamos em 2010 e, com o lançamento do filme, Toy Story 3 nasce para todas as plataformas daquela geração. Para quem jogou Toy Story 3 pode ter percebido uma coisa realmente interessante a respeito de sua história, diferente de muitos jogos que seguem o caminho e enredo perfeito do filme, Toy Story 3 mostra uma história após o filme ter ocorrido, podemos dizer que o jogo em si seria uma espécie mini extra para a trama original nos cinemas.

Existem dois modos de jogo em Toy Story 3, primeiro é sua campanha, onde o jogador passará por 8 tipos de fases diferentes sendo algumas focadas no filme e outras não. Cada uma dessas fases contém alguns coletáveis para serem adquiridos, logo é muito importante que o jogador vasculhe bem cada cenário para platinar o jogo. Mas o modo mais divertido e chamativo com certeza é o Toybox. Nele entramos em um mundo aberto aonde devemos fazer diversas e diversas side-quests e abrir novos locais para explorar, vale lembrar que ambos os dois modos contêm uma porcentagem de finalização dando um tempo a mais para platinar o jogo.

Dentro do modo ToyBox podemos fazer diversas coisas que acabam dando um toque muito bom no jogo, podemos customizar os habitantes e alienígenas da cidade com roupas carismáticas, trocar a cor das estruturas com temáticas de outros filmes da Disney, fazer corridas com o cavalo Bullseye e adquirir novos territórios para se explorar. Na ToyBox podemos jogar um modo Coop para fazer certas quests ou apenas se divertir na cidade. Vale ressaltar que o modo coop não é online e sim Split screen sendo obrigatório a presença de outros jogadores no mesmo console.

O trabalho em equipe é importante em Toy Story 3. No modo campanha podemos jogar com os 3 personagens principais do filme, cada um com uma habilidade especial para ajudar no progresso da fase. Buzz Lightyear é um personagem mais pesado e forte por conta disso consegue ajudar Woody a alcançar lugares mais altos e de difícil acesso, Jessie consegue se equilibrar em botões e objetos pendurados no cenário e Woody consegue se balançar em alguns objetos com sua corda atrás das costas. Cada personagem terá um momento de importância para ser usado seja para finalizar a fase ou para pegar os coletáveis.

Sua jogabilidade é bem correspondida porem bem limitada. Cada fase tenta ser diferente das outras não tentando ser repetitiva no clássico “andar e pular”. Algumas usam um sistema de voo e combate como as de Buzz Lightyear, outras mais focadas no stealth para não ser detectado. Um ponto positivo é o cenário bem modelado e diferenciado, detalhados com muitas cores chamativas e acompanhado com uma ótima trilha sonora digna de uma das diversas obras da Disney.

Toy Story 3 contém um gigantesco problema: os ports das diferentes versões. As mais completas e realmente bonitas são as versões de Playstation 3 e Xbox 360. Todos os outros ports são extremamente mal feitos e bugados. A versão de PC talvez seja a mais problemática e mal-acabada que existe, perdendo até mesmo para as versões do Nintendo Wii. Falta de conteúdo, falta de conquistas e extras, expressões ridículas e sem animações, problemas de áudio e muitos outros problemas destroem o jogo completamente, dando a experiência de um jogo incompleto e mal produzido.

A dificuldade de Toy Story 3 é totalmente nula, sem nenhuma penalidade ao morrer e com infinitas vidas, mesmo o jogo sendo focado em um público mais juvenil Toy Story 3 extrapola, se tornando um jogo bem monótono e rápido de se acabar. Podemos chutar umas 2 horas de campanha no máximo e mais umas 4 no modo ToyBox, e acreditem, o jogo se torna totalmente chato e monótono.

No final das contas Toy Story 3 acaba sendo um jogo bem fraquinho comparado com seus títulos anteriores, o seu problema de port é extremamente perturbador dando uma boa experiência apenas no Playstation 3 e Xbox360. Também não traz nenhum tipo de recompensa ao pegar os coletáveis o que traz uma desmotivação enorme por todo trabalho extra que o jogador tem.

Mesmo sendo um jogo divertido de se experimentar, seu progresso é mais rápido que o normal não dando para aproveitar o game direito. Toy Story 3 se torna um jogo aturável porem será um jogo que nunca mais colocaremos a mão novamente principalmente as versões de Nintendo WII e PC.