Crítica | Assassinos da Lua das Flores - É mais um filmaço da carreira de Scorsese

Crítica | Assassinos da Lua das Flores - É mais um filmaço da carreira de Scorsese

Martin Scorsese é um dos grandes diretores da história do cinema. Não é exagero afirmar isso, uma vez que suas obras notáveis são sempre lembradas pelo público como produções de qualidade ou servem de referência para novos diretores construírem suas narrativas.

Clássicos atemporais como Touro Indomável (1980) e Os Bons Companheiros (1990) são alguns dos longas fantásticos concebidos por Scorsese, que recebeu seu primeiro Oscar com o ótimo Os Infiltrados (2006). Ainda há espaço e tempo para que o cineasta filme novas e belas obras cinematográficas, como é o caso de Assassinos da Lua das Flores

A trama trata de uma conspiração realizada em 1920 para assassinar membros da tribo Osage, que haviam se tornado ricos da noite para o dia ao encontrar petróleo em suas vastas terras. Também conta como o FBI utilizou o caso para dar mais força para J. Edgar Hoover e para o órgão americano recém-formado.

Scorsese acerta novamente em Assassinos da Lua das Flores

A adaptação do livro de David Grann (no Brasil lançado com o título de Assassinos da Lua das Flores: Petróleo, morte e a origem do FBI)traz à tona um tema amplamente conhecido, o genocídio indígena que ocorreu nos EUA. No entanto, a obra aborda essa questão de forma intrigante, evidenciando mortes suspeitas de membros da tribo Osage, em um conluio arquitetado por William Hale "King" (Robert De Niro) e Ernest Burkhart (Leonardo DiCaprio).

O roteiro escrito por Martin Scorsese e co-escrito por Eric Roth e se sobressai, apresentando a história do ponto de vista dos criminosos, algo não muito usual nas produções do gênero, mas que Scorsese já havia feito em Os Bons Companheiros e volta a trabalhar em Killers of the Flower Moon.

O cineasta já explorou temas urbanos e criminais em diversas ocasiões de sua carreira, e a violência é uma linguagem que ele domina na arte de contar suas tramas. Em Killers of the Flower Moon, essa habilidade é novamente destacada, uma vez que a violência se mostra rotineira na vida diária dessas pessoas. O plano arquitetado por William Hale e Ernest Burkhart para eliminar os indígenas também funciona como uma crítica contundente ao tratamento dado aos nativos americanos ao longo da história.

Os personagens de De Niro e de DiCaprio são equilibrados. O de De Niro se destaca por ser o verdadeiro vilão da história, enquanto o de DiCaprio desempenha o papel um homem que serve aos interesses de seu tio King e tem uma afeição especial por Mollie Burkhart - interpretada pela ótima Lily Gladstone.  

Não é a primeira vez que Scorsese dirige um filme com Leonardo DiCaprio no elenco - e ao que parece não será o último -, tendo a parceria surtindo efeito com o já clássico Os Infiltrados e o ótimo O Lobo de Wall Street (2013), além de outras obras consagradas pela crítica. Possivelmente seu personagem em Assassinos da Lua das Flores é o mais sombrio de sua carreira, vivendo um homem sem escrúpulos e que comete crimes com frieza.

Scorsese foi questionado sobre o fato de fazer um filme lento, e houve muitas críticas devido à duração de 3 horas e 30 minutos da obra. Embora seja verdade que o longa tem uma trama que se desenrola de forma mais pausada, com muitos diálogos e pouca ação, não se torna em nenhum momento entediante. Surpreendentemente, as horas passam rapidamente, e o filme não parece tão longo quanto sua duração sugere. Scorsese continua a criar excelentes obras cinematográficas à sua maneira, sem se submeter a interferências de produtores, como ocorreu em Gangues de Nova York (2002).

Assassinos da Lua das Flores pode não ser a melhor obra da carreira de Scorsese, mas mantém o alto padrão estabelecido por outros filmes do cineasta, como O Aviador (2004) e O Irlandês (2019). Se há um diretor que não tem em sua carreira nenhuma produção ruim esse diretor é Scorsese, embora haja equívocos ao longo de sua trajetória, algo que certamente não ocorre neste belíssimo filme, que pode em breve se tornar um clássico cinematográfico.

https://www.youtube.com/watch?v=T22WRjooZn4


Crítica | Dezesseis Facadas – É outro acerto da Blumhouse

Crítica | Dezesseis Facadas – É outro acerto da Blumhouse

O subgênero do terror slasher é algo que nunca sai de moda. Embora possa ter tido um período de baixa entre meados dos anos 2000, recentemente está experimentando um novo boom. Isso se deve ao ressurgimento de franquias populares que voltaram aos cinemas e se tornaram sucessos, como Halloween (2018) e Pânico (2022), Isso sem mencionar as produções que tentam reinventar o modelo, como A Morte Te Dá Parabéns (2017), que é uma das referências de Dezesseis Luas, dirigido por Nahnatchka Khan.

A obra do Prime Video é um deleite para os fãs de filmes de terror. É uma divertida e aterrorizante viagem no tempo, na qual a jovem de 17 anos, Jamie Hughes, interpretada por Kiernan Shipka (Riverdale), precisa escapar do assassino Sweet Sixteen Killer, que retorna após um longo hiato de 35 anos. Jamie Hughes, ao tentar  fugir do assassino, entra em uma cabine fotográfica em um parque de diversões e é levada para os anos 80, onde fará de tudo para tentar mudar o passado e assim alterar o futuro.

O público em si não procura apenas qualidade narrativa ou mortes bem elaboradas nesse tipo de produção, procura também por doses de tensão e sustos, algo que alguns longas de terror recentes não proporcionam. O roteiro de Dezesseis Facadas tenta algo novo, que é fazer a protagonista ser levada para outra época e assim viver uma realidade diferente da sua. Isso causa até um humor espontâneo em certos momentos devido à estranheza que Jamie vivencia, como o fato de ser politicamente correta e ter que presenciar falas que não estão de acordo com a sua moralidade.

Essa ideia de explorar o choque cultural é bastante interessante, já que os anos 80 eram praticamente outro mundo. Imaginar como uma pessoa dos tempos atuais se comportaria em uma época tão diferente da atualidade adiciona profundidade à história e a torna menos convencional no gênero de terror. O roteiro pode criar um espaço para o desenvolvimento da personagem e reflexões sobre questões éticas.

A Blumhouse conquistou uma reputação sólida entre os entusiastas de filmes de terror, destacando-se como uma produtora que entrega produções de qualidade com roteiros inteligentes. Em Totally Killer (nome original), o terror em si pode não ser aterrorizante, mas desempenha com eficácia a função de gerar uma tensão constante no público. O assassino Sweet Sixteen Killer segue a estrutura clássica de construção de vilões dos slashers, não indo muito além de matar suas vítimas de forma sanguinolenta.

A cineasta Nahnatchka Khan ficou conhecida por seu trabalho no ótimo Meu Eterno Talvez, da Netflix. Desta vez, Khan demonstra sua destreza ao explorar de maneira inteligente o conceito de viagem no tempo, buscando inspiração no clássico De Volta para o Futuro (1985) e, ao fazê-lo, acrescenta profundidade à narrativa à medida que a história se desenrola.

Dezesseis Facadas segue a fórmula clássica dos filmes de slasher, incorporando elementos como a figura da Final Girl e a estética típica do gênero de terror. Mesmo com sua trama não evitando os clichês comuns a obras desse tipo, ainda assim é divertido acompanhar as situações nas quais a protagonista se envolve, gerando o sentimento de agrado no público. 

Dezesseis Facadas (Totally Killer, EUA – 2023)

Direção: Nahnatchka Khan
Roteiro: David Matalon, Sasha Perl-Raver, Jen D'Angelo
Elenco: Kiernan Shipka, Olivia Holt, Charlie Gillespie, Lochlyn Munro, Troy Leigh-Anne Johnson, Liana Liberato, Nathaniel Appiah, Randall Park
Gênero: Comédia, Terror
Duração: 106 min


Crítica | O Protetor: Capítulo Final - Um desfecho monótono

Com a variedade de filmes de ação que são lançados todos os anos pela indústria cinematográfica, é necessário selecionar quais são bons e quais são ruins. E olha que não é uma tarefa das mais fáceis, já que há uma grande quantidade de baixa qualidade estreando. É seguro afirmar que O Protetor: Capítulo Final (Antoine Fuqua) é um oásis em meio a tanto conteúdo irrelevante.

A adaptação da série de TV homônima (1985) retoma, em seu terceiro capítulo, a história de Robert McCall, um agente secreto com profundos conhecimentos em técnicas de batalha, que age como um vingador, trabalhando para proteger os indefesos e oprimidos.

Denzel Washington se transforma em Michael Myers

Em 2014, ano do lançamento de O Protetor, a produção rapidamente se tornou um sucesso entre público e a crítica por ser um filme de ação à moda antiga. Assim, se desenhou a trajetória da franquia, que logo se transformou em uma trilogia de ação liderada por Denzel Washington no papel de um bom samaritano que faz justiça com as próprias mãos. Neste terceiro longa, Robert McCall aparece na Europa, onde encontra conforto em uma cidadezinha na Itália após ser baleado e receber ajuda de um médico que reside ali. Ele se vê obrigado a ajudar os habitantes locais contra traficantes internacionais que atuam na região.

Esta é a quinta vez que o cineasta Antoine Fuqua trabalha com Washington, em uma parceria que tem rendido frutos desde o ótimo Dia de Treinamento (2001). O resultado, em comparação as duas versões anteriores, fica distante daquele que o público esperava. Não é uma obra feita para atrair novos fãs à franquia, mas sim para aqueles que já a conhecem e a acompanham desde o primeiro filme.

Não é errado dizer que Fuqua exagerou neste novo capítulo, transformando o personagem de Denzel Washington em um matador a sangue frio, lembrando em muitas cenas, Michael Myers, o clássico vilão da franquia Halloween, matando seus inimigos com requintes de crueldade e, muitas vezes, de forma banal. O problema não é apenas a violência excessiva e desnecessária, mas também a maneira como esse elemento é inserido na trama.

A diferença em relação aos filmes anteriores, nos quais Robert McCall tinha uma motivação clara em busca de vingança, com um lado dramático sendo bem explorado, é que Fuqua aborda o drama na vida pessoal de McCall como se o personagem estivesse perdido em meio a tanta violência, como se ele tivesse saído do controle. No entanto, isso não é bem estruturado pelo roteiro e não se mostra aprofundado nem tão bem desenvolvido ao longo da narrativa.

Fim de um ciclo

Por ter sido forjado em torno da ação, é natural que os fãs queiram presenciar o elemento que fez desta produção o que ela é: ação pura e simples, sem rodeios ou piruetas acrobáticas. McCall é um homem de poucas palavras, avisa o que irá fazer e quando menos se espera, cria o caos. Tirando a cena inicial, que é uma ação mais contida, porém violenta, durante todo o filme o que se viu foi bastante drama e apenas duas sequências de ação boas. No entanto, essas cenas são tão rápidas e a forma como McCall acaba com tudo é tão impressionante que chega a ser decepcionante como os vilões não são páreos para o protagonista.

A falta de ação diz muito sobre a história que o roteiro deseja contar. Neste caso, optou-se por explorar mais o lado dramático de Robert, mas não um drama pessoal, nada relacionado à família ou amigos; é mais uma questão existencial mesmo. O teor dramático do personagem não é explorado a fundo, o que é uma grande oportunidade perdida em trazer mais da história pessoal de McCall. Além de ter ação insuficiente para uma franquia cujo ponto forte são as cenas de ação, por esse motivo, seu ritmo é bastante maçante, em alguns momentos, bastante sonolento.

O Protetor: Capítulo Final surge com a promessa de ser o último filme da franquia, se realmente será o último capítulo, isso é outra história. Denzel Washington é um reconhecido astro de cinema, atuando tanto em obras que disputam o Oscar quanto em longas de ação que servem apenas para agradar e divertir os espectadores. O melhor de tudo é que Denzel não se importa se os roteiros que lhe são concedidos entregam o máximo de si, pois ele encara isso como seu trabalho, e o resultado é que ele cria papéis memoráveis em produções que são puro entretenimento.

O Protetor: Capítulo Final (The Equalizer 3, EUA – 2023)

Direção: Antoine Fuqua
Roteiro: Richard Wenk, Baseada na série de Televisão criada por Michael Sloan, Richard Lindheim
Elenco: Denzel Washington, Dakota Fanning, Eugenio Mastrandrea, David Denman, Gaia Scodellaro, Remo Girone, Andrea Scarduzio
Gênero: Ação, Policial, Suspense
Duração: 109 min


Crítica | Ruim pra cachorro - Uma comédia sem limites

Quem pensa que Ruim pra cachorro (Josh Greenbaum) é um filme inocente e voltado exclusivamente para o público infantojuvenil está enganado. Nos primeiros minutos, o longa parece apresentar uma história adorável e fofa, com o cachorro protagonista Reggie, um Border Terrier que acredita estar divertindo seu dono e que esse o ama, porém, este o ignora e faz de tudo para se livrar dele.

No entanto, ocorre uma reviravolta rápida logo no primeiro ato, revelando o verdadeiro rumo que a trama seguirá, quando Reggie é abandonado e se encontra pela primeira vez com Bug. É nesse momento que começam os inúmeros diálogos pesados e provocativos entre os cães. A maioria dessas conversas são desnecessárias e completamente ridículas.

O roteiro de Dan Perrault ultrapassa todos os limites possíveis do humor escrachado com a finalidade de transformar a obra em um produto politicamente incorreto. Filmes como Deadpool e até mesmo Ted (que, por sinal, é da mesma produtora de Ruim pra Cachorro) são conhecidos pelo tipo de humor pesado que adotaram, mas com a diferença de que não foram tão apelativos e até conseguem ser engraçados em alguns momentos.

Com Strays (nome original), ocorre o contrário. Não é engraçado e é apelativo em vários momentos, tanto em suas piadas e diálogos quanto nas situações apresentadas, que inserem os cachorrinhos em situações constrangedoras e escatológicas. Fica bem claro que o diretor ultrapassou os limites com a intenção de chocar o público, relegando o humor e até mesmo a própria história para um segundo plano.

Há tantas frases com conotações sexuais explícitas que o diretor consegue provocar uma reação oposta àquela que se imaginava ter no público. Em vez de fazer os espectadores rirem e refletirem sobre a mensagem da trama, na realidade, ocorre o efeito contrário: gera repulsa pelos eventos retratados na tela e um alívio quando finalmente termina a torturante sessão de vulgaridades.

A ideia de criar uma produção politicamente incorreta com cachorros é louvável, especialmente considerando que a maioria dos últimos filmes lançados com cães como protagonistas tem sido comédias dramáticas que mais fazem o espectador chorar do que sorrir, como foi o caso de Juntos Para Sempre (2019) e O Chamado da Floresta (2020). No entanto, essa ideia desanda quando o filme passa a enfocar mais a sexualidade e o uso excessivo de xingamentos, em detrimento do próprio roteiro.

A dublagem brasileira se destaca como sendo uma das melhores do mundo e em Strays mostra o porquê disso, sendo um diferencial ao adaptar algumas piadas e por dar maior entonação em determinados diálogos. Tanto a versão nacional quanto a original investiram em personalidades consagradas do mundo pop para dar voz aos personagens. Enquanto na versão original Reggie e Bug são dublados por Will Ferrell e Jamie Foxx, na brasileira, também contamos com a dublagem de nomes conhecidos. Reggie é dublado por Wendel Bezerra e Bug pelo humorista Fábio Rabin.

Ruim Pra Cachorro é indiscutivelmente de mau gosto. No entanto, tem um público cativo e deve agradar àqueles que apreciam produções politicamente incorretas e cheias de palavrões. Seu humor se assemelha ao de uma animação que, à primeira vista, parecia inocente quando foi lançada - a infame Festa da Salsicha (2016). A diferença é que a versão animada é consideravelmente mais divertida de assistir do que esta obra com personagens caninos.

Ruim pra Cachorro (Strays 3, EUA – 2023)

Direção: Josh Greenbaum
Roteiro: Dan Perrault
Elenco (vozes): Will Ferrell, Jamie Foxx, Isla Fisher, Randall Park, Will Forte, Brett Gelman, Rob Riggle, Josh Gad, Sofia Vergara
Gênero: aventura, comédia
Duração: 93 min


Crítica | Nosso Sonho - Filme acerta ao abordar a vida de Claudinho e Buchecha

Crítica | Nosso Sonho - Filme acerta ao abordar a vida de Claudinho e Buchecha

Nos anos 1990 e início dos anos 2000 uma dupla de funk brasileira fazia muito sucesso no país. Composta por Cláudio Rodrigues e Cláudio Buarque, conhecidos como Claudinho e Buchecha, e que criaram grandes clássicos no cenário musical. Canções como Quero te encontrar, Só Love e Nosso Sonho marcaram época, essa última por sinal dá nome à cinebiografia que conta a trajetória de sucesso dos músicos.

Claudinho e Buchecha marcaram época sendo eles mesmos e criando músicas atemporais e com letras insinuantes. Antes do Funk ostentação tomar conta no mercado nacional de música, muito antes disso, Claudinho e Buchecha se destacavam como uma dupla de funk de sucesso com letras que não eram apelativas e que acabou por se separar de uma maneira trágica, com a morte de Claudinho no ano de 2002.

A cinebiografia Nosso Sonho, dirigida por Eduardo Albergaria, é um bom entretenimento e agrada ao apresentar, mesmo que de forma genérica, a jornada de sucesso da dupla. O filme segue a estrutura da maioria das produções do gênero, principalmente aquelas concebidas em território nacional. Nele são apresentados os dois protagonistas, a amizade entre Claudinho (Lucas Penteado) e Buchecha (Juan Paiva) na infância, o reencontro na adolescência e a trajetória até se tornarem um sucesso no país.

Devido a essa estrutura narrativa, o longa expõe algumas deficiências que se tornam evidentes no segundo ato. Há uma passagem rápida pela infância de Claudinho e Buchecha, uma fase bastante interessante da vida dos dois, para depois se concentrar rapidamente na adolescência e na fase adulta. Há muita história, e a tentativa de abordar toda a vida dos cantores, mesmo que de forma resumida, mostrou-se ineficaz. O diretor precisava fazer uma escolha, e essa escolha resultou em uma obra que se tornou uma versão genérica sobre a dupla.

O roteiro não é necessariamente ruim, mas apresenta problemas de construção e planejamento. É claro que mostrar o caminho de sucesso dos músicos era importante para o público, porém, deveríamos questionar se era realmente necessário detalhar toda a vida deles, incluindo informações irrelevantes. O que torna a trama cativante é, na verdade, a relação entre Buchecha e seu pai, assim como a conexão entre Claudinho e Buchecha. No entanto, esta última relação fica em segundo plano após o segundo ato, quando a dinâmica entre Buchecha e seu pai se torna mais proeminente na narrativa. A relação entre pai e filho é o principal elemento dramático da obra, sendo explorada de forma intensa e tornando esse conflito o fator central da narrativa.

Por se tratar de um filme e pela necessidade de ser “conciso” ao abordar os temas relacionados à vida da dupla, é por esse motivo que o final deixa muito a desejar. No ato final, que envolve a morte de Claudinho, a cena é apresentada de maneira apressada. Não há um esforço em mostrar o ponto de vista de Claudinho momentos antes do acidente; tudo é apresentado do ponto de vista de Buchecha. Além disso, a cena do acidente carece de emoção. Pode gerar comoção devido ao acontecimento, mas, em si, não evoca muita emoção.

Uma cinebiografia sobre uma renomada dupla de cantores precisa contar com intérpretes competentes para as cenas ao vivo, que não apenas dominem a entonação musical, mas também tenham presença de palco capaz de cativar o público. A escolha dos atores Lucas Penteado e Juan Paiva foi acertada no que diz respeito ao aspecto dramático, pois ambos demonstram uma conexão em cena e conseguem atrair a atenção dos espectadores para as situações em que estão envolvidos. Por outro lado, as partes mais críticas, que envolvem as performances musicais, não foram tão bem executadas, com algumas desafinações que destoaram das canções originais.

Nosso Sonho é apenas mais uma das tantas cinebiografias sobre a vida de artistas que têm tomado conta do mercado audiovisual nacional. É, de fato, um nicho a ser explorado, porém, surge a questão de se a quantidade de produções desse gênero não está se tornando saturada, sem mencionar a qualidade dessas obras. O filme é bom e se destaca da média, sendo capaz de cativar a atenção de muitos fãs e reavivar as lembranças de uma época que passou e deixou saudades.

Nosso Sonho (idem, Brasil – 2023)

Direção: Eduardo Albergaria
Roteiro: Eduardo Albergaria, Daniel Dias, Mauricio Lissovsky, Fernando Velasco
Elenco: Juan Paiva, Lucas Penteado, Isabela Garcia, Marcio Vito, Gustavo Coelho
Gênero: Biografia, Comédia, Drama
Duração: 117 min


Crítica | A Última Rainha - Uma forte reflexão da realidade

No período de 1517, a Argélia estava sob cerco espanhol e sob domínio do Império Otomano. A luta contra os espanhóis é um aspecto importante na história da Argélia, assim como sucessivos embates que ocorreram ao longo do tempo. No entanto, esse não é o foco principal de A Última Rainha (Adila Bendimerad, Damien Ounouri), uma produção que aborda uma situação específica em Argel (atualmente a Argélia) durante esse período em particular.

O longa conta a história de Zaphira, esposa do último rei de Argel, Salim Toumi, conhecida por confrontar o pirata Barbarossa. É verdade que a ideia era contar esse momento da Argélia, no qual a Princesa Zaphira é apresentada como uma mulher destemida, enquanto Aruj (Barbarossa) é retratado quase como se fosse um tirano com atitudes megalomaníacas.

Ao longo da história, há certos eventos que envolvem a vida de Zaphira e são muito debatidos até hoje, muitas vezes rejeitados por historiadores, que acreditam que a narrativa sobre a Princesa Zaphira foi aumentada. Sendo um fato verídico ou não, o filme aborda com bastante fidelidade o que é de conhecimento público sobre essa figura histórica, evitando assim um dos maiores problemas quando se trata de dramas de época, que é a incongruência com os fatos históricos.

O que impressiona em A Última Rainha, além do belo figurino e dos cenários deslumbrantes, é a mensagem que é transmitida. Zaphira é representada como uma mulher de opinião e determinada quanto aos rumos que deseja tomar. É de conhecimento público que naquela época as mulheres eram tratadas como cidadãs de segunda classe. Porém, mesmo assim é importante que tal tema seja retratado de maneira mais aprofundada, e isso é algo que o filme não contextualiza de forma precisa, mostrando de maneira superficial, com algumas situações apresentadas, como era esse período.

Atualmente, assuntos como os direitos das mulheres e outros temas relacionados são amplamente debatidos pela sociedade. Por isso, é um grande acerto da dupla de cineastas Adila Bendimerad e Damien Ounouri trazer essa discussão para os dias atuais, utilizando uma figura histórica e inserindo-a em uma época em que as mulheres eram repreendidas, trazendo essa questão para os dias atuais.

No entanto, a questão histórica fica um tanto confusa em algumas situações, principalmente para aqueles que não estão familiarizados com a história da Argélia ou com os acontecimentos que cercavam aquele período. Os próprios espanhóis servem como ponto de partida para o arco narrativo de Aruj, mas depois desaparecem da trama. Quanto ao Império Otomano, este sequer é mencionado, o que é incompreensível, dado que os Otomanos dominavam uma grande parte do território africano naquela época.

Como qualquer obra histórica, é importante ressaltar que os diretores fazem uma tentativa de trazer à tona uma figura desconhecida do grande público, colocando-a em evidência e apresentando as situações pelas quais passou durante o golpe concedido por Aruj. O final é marcante e poderoso, com doses dramáticas e com uma mensagem impactante sendo transmitida.

A Última Rainha é um drama de época que não apenas oferece entretenimento, mas proporciona um aprendizado sobre como o mundo mudou (embora não muito) desde aquele período até os dias atuais e como a história tende a se repetir ao longo dos anos.

A Última Rainha (La dernière reine, Argélia, França – 2022)

Direção: Adila Bendimerad, Damien Ounouri
Roteiro: Adila Bendimerad, Damien Ounouri
Elenco: Adila Bendimerad, Dali Benssalah, Mohamed Tahar Zaoui, Imen Nouel
Gênero: Aventura, Drama, História
Duração: 110 min


Crítica | A Freira 2 por pouco é melhor do que o primeiro

Marcando dez anos desde o lançamento de seu filme original, a franquia Invocação do Mal se transformou em uma das marcas mais valiosas e empolgantes da Hollywood contemporânea. Com um primeiro filme dirigido por James Wan para a New Line Cinema e Warner Bros, a saga sobrenatural sobre o casal Ed e Lorraine Warren também gerou uma série de derivados sobre o infinito leque de criaturas e espíritos - fictícios ou não.

Um dos mais icônicos nasceu no segundo filme de 2016, quando a freira demoníaca de Bonnie Aarons rapidamente roubou a cena. Um derivado sobre a criatura foi anunciado, e Corin Hardy dirigiu o prelúdio de 2018, que apesar de ser um dos piores exemplares da franquia, garantiu um sucesso comercial estrondoso - o que garantiu o tardio, mas inevitável, A Freira 2.

A trama do filme se passa alguns anos após os eventos do original, voltando a seguir a Irmã Irene (Taissa Farmiga), que é novamente convocada pela Igreja quando uma série de assassinatos envolvendo freiras e padres começa a assolar a Europa. Em sua investigação, Irene descobre que o espírito demoníaco Valak (Bonnie Aarons) está de volta, agora usando o corpo de seu amigo Maurice (Jonas Bloquet) em um internato na França.

Com um primeiro filme que desperdiça o grande potencial iconográfico de sua antagonista, A Freira 2 aposta em uma narrativa radicalmente diferente. Escrito por Akela Cooper, Richard Naing e Ian Goldberg, o roteiro do novo filme coloca a Irene de Farmiga em uma trama muito mais derivativa dos suspenses de Robert Langdon do que um exemplar da franquia Invocação do Mal, inventando até mesmo um artefato de grande poder que despertaria o interesse do próprio Indiana Jones. É uma narrativa divertida, mas que exige muito da capacidade de suspensão de descrença do espectador, especialmente de uma franquia que por anos se vendeu no "baseado em uma história real".

Mas o real problema consiste na sobrecarga de personagens e núcleos narrativos da trama, que equilibra sua caçada ao tesouro sagrado com uma inchada subtrama com Maurice e as garotas do colégio interno francês. Há todo um microcosmo dramático ali, que infelizmente o texto e o elenco são incapazes de tornar interessante - definitivamente não há o mesmo envolvimento emocional poderoso que circula o casal Warren de Patrick Wilson e Vera Farmiga nos filmes originais.

Não bastasse a composição dramática enfadonha, A Freira 2 ainda decepciona no principal elemento de um filme de terror: a direção. Michael Chaves nunca chega a ser desastroso, mas sua condução carece de boa atmosfera e construção, apelando para sustos baratos e jump scares previsíveis. O próprio clímax deixa a figura de Bonnie Aarons de lado para apostar em novas (e ridículas) invenções monstruosas para a mitologia da franquia.

A única grande ideia de Chaves como diretor vem em uma sequência totalmente explorada pelo material promocional. Absolutamente inspirado, o momento mostra Irene vendo a silhueta da Freira se formando através de revistas e papéis em uma banca de jornal francesa, resultando em uma das concepções visuais mais originais e inventivas que o gênero de terror hollywoodiano viu em anos.

No mais, A Freira 2 traz uma esquisita combinação de caçada ao tesouro, assombração em colégio e até mesmo um grande clímax de ação. Apesar de ambiciosa, a trama se torna enfadonha, e sobram poucas ideias realmente inspiradas para Michael Chaves explorar. Mas ao menos... é melhor do que o primeiro.

A Freira 2 (The Nun II, EUA - 2023)

Direção: Michael Chaves
Roteiro: Akela Cooper, Richard Naing e Ian Goldberg
Elenco: Taissa Farmiga, Storm Reid, Jonas Bloquet, Bonnie Aarons, Anna Popplewell, Katelyn Rose Dawson, Suzanne Bertish, Léontine d'Oncieu, Peter Hudson
Gênero: Terror
Duração: 111 min

https://www.youtube.com/watch?v=yyUmpkGR7gs&t


Crítica | Fale Comigo - É um dos grandes filmes de terror do ano

Havia muito entusiasmo por parte do público para assistir à produção Fale Comigo, da produtora queridinha dos fãs de filmes de terror, a A24. Tal euforia faz sentido, já que a A24 se notabilizou nos últimos anos por criar obras excelentes e com tramas assustadoras e inteligentes. Em Fale Comigo, dos diretores iniciantes Danny Philippou e Michael Philippou, a produtora acerta novamente ao conceber uma história intrigante e que deve se transformar em um verdadeiro clássico em alguns anos.

A história se desenrola em Adelaide, Austrália, onde um grupo de adolescentes compartilha uma fascinação pelo sobrenatural. Eles se reúnem para jogar um game que permite a eles que se comuniquem com o mundo dos mortos. É necessário sentar em frente a uma mão bizarra e dar um aperto de mão para que o contato com o desconhecido ocorra.

Mia (interpretada por Sophie Wilde), é uma adolescente atormentada por tragédias pessoais. Após a morte de sua mãe por suicídio, Mia decide deixar sua residência e morar por um tempo na casa de sua melhor amiga, Jade (Alexandra Jensen).

Falando com os Mortos

O roteiro não foge ao clichê, uma vez que não é o primeiro filme a tratar de adolescentes sendo perseguidos por um perigo sobrenatural. Produções como Verdade ou Desafio (2018) e Corrente do Mal (2014) são exemplos mais recentes. A narrativa de Talk to me (título original) explora diversos temas, incluindo o trauma, o luto, suicídio e o medo do desconhecido.

Mesmo seguindo o mesmo caminho de outras produções do gênero, o longa consegue trabalhar de maneira eficaz com a conhecida fórmula dos filmes de terror. Talk to me tenta ir além da maldição, ao dialogar sobre as perdas que sofremos em nossas vidas, algo que é feito de maneira interessante e sem muita enrolação. A protagonista, Mia, acaba desenvolvendo um vício em entrar em contato com os mortos, pois busca uma conexão com sua mãe morta. Ou seja, mesmo dois anos após a morte de sua mãe, ela ainda não conseguiu superar o luto e continua a enfrentar esse trauma pessoal.

Há um grande furo que pode passar despercebido por parte do público, que está relacionado à mão amaldiçoada, não sabemos de onde ela veio, porque possui todo aquele poder, quem são os espíritos que aparecem ao ser apertada e porque os espíritos estão lá. São muitas perguntas que não são respondidas, deixando no ar o principal: o que seria aquela maldição que envolve a mão. O final reserva uma grande reviravolta, surpreendendo e intrigando, mas ainda assim não é o suficiente para tirar da cabeça os questionamentos feitos a respeito do artefato.

Terror Australiano de qualidade

Se há algo que provoca temor no imaginário coletivo, é o conceito de entrar em contato com os mortos. Essa noção foi amplamente explorada em diversas produções audiovisuais, sendo O Sexto Sentido (1999) uma das mais famosas. O ato de falar com os mortos ou estabelecer contato através de um tabuleiro ouija ou de um artefato amaldiçoado é um elemento clássico do gênero. Esse elemento frequentemente serve para desencadear a narrativa, servindo de ponto de partida para a criação de toda a atmosfera de terror.

Por falar nisso, Talk to me não é um longa tão assustador quanto todos imaginavam, não se assemelha a Invocação do Mal (2013) e muito menos à A Morte do Demônio: A Ascensão (2023). Há momentos impactantes e que chocam, mas não isso não é o foco do longa, o é bastante frustrante, pois quando havia oportunidade para ir além, o filme se mantém na mesma repetição de eventos que já sabemos como vão se desenrolar.

Fale Comigo é uma aposta que deu certo da A24. É original por trazer personagens cativantes e surpreende por ter uma história que foge do lugar-comum, é sim, um dos grandes filmes do ano dentro do gênero e que deve receber uma merecida sequência em breve.

Fale Comigo (Talk to me, AUS, 2022)

Direção: Danny Philippou, Michael Philippou
Roteiro: Danny Philippou, Bill Hinzman, Daley Pearson
Elenco: Sophie Wilde, Miranda Otto, Alexandra Jensen, Zoe Terakes, Jude Turner, Joe Bird
Gênero: Terror, Suspense
Duração: 95 min


Crítica | Drácula: A Última Viagem do Deméter perde o potencial

Publicado originalmente em 1897, Drácula, do autor Bram Stoker, lançou um dos maiores personagens da história da cultura pop. Séculos depois, o grande vampiro foi adaptado e interpretado das mais diferentes formas possíveis no cinema e na TV. Só em 2023, o Conde Drácula foi até imaginado como parte de um relacionamento tóxico, na comédia Renfield: Dando Sangue Pelo Chefe.

Ainda sob o selo da Universal Pictures, a criatura de Stoker ganha uma adaptação diferente com Drácula: A Última Viagem do Deméter, que opta por levar para as telas apenas um capítulo do livro de Stoker, que serve como epístola para uma passagem de eventos. Uma ideia absolutamente inspirada, mas que infelizmente só é aproveitada pela metade no filme de André Øvredal.

A trama acompanha o médico Clemens (Corey Hawkins), que se junta à tripulação do navio Deméter, programado para transportar uma carga valiosa da Romênia para Londres. Ao longo da viagem, mortes estranhas começam a acontecer na embarcação, e a tripulação descobre estar transportando o mortal vampiro Drácula (Javier Botet).

Com mais de 30 anos em desenvolvimento, a ideia de adaptar apenas um capítulo de Drácula é formidável. Não só oferece um escape interessante para uma passagem do livro que nunca foi especificada nos cinemas (sendo literalmente uma transição no filme de Francis Ford Coppola), mas também o potencial de um filme de terror claustrofóbico e ambientado em alto mar; com os realizadores comparando o projeto com Alien: O Oitavo Passageiro. A ideia também garante uma visão radicalmente diferente de Drácula, aqui inteiramente em sua forma bestial e monstruosa, bem representada pelo porte físico único do ator Javier Botet; cuja performance e caracterização miram bem mais em Max Schreck do que Bela Lugosi.

Durante a primeira metade, o cineasta André Øvredal compreende e aproveita seu grande potencial de terror. O Deméter é atmosférico e bem valorizado pelas sombras, e Øvredal é inteligente em constantemente enquadrar seus personagens em planos plongée opressores e em close, sempre dando a impressão de que a tripulação está sendo constantemente vigiada por uma força superior - sustentando a incômoda noção de que todos se tornarão vítimas em breve, algo que o assustador prólogo do longa deixa bem claro.

Infelizmente, A Última Viagem do Deméter se transforma em um filme completamente diferente a partir de sua segunda metade. O terror cautelosamente construído dá espaço a um projeto de ação e espetáculo CGI que simplesmente não empolga, descartando a presença física arrepiante de Botet por um Drácula borrachudo e voador, que parece mais adequado no Van Helsing de Stephen Sommers. E por mais habilidoso que seja com o terror, Øvredal não consegue tornar o espetáculo tão interessante, deixando suas batalhas e confrontos perdidos em uma fotografia escura e sem graça - culminando em um desfecho absurdo que ousa promover uma continuação, e não estou me referindo aos capítulos restantes de Bram Stoker.

A gênese de Drácula: A Última Viagem do Deméter é inspirada e compreende suas ambições, limitando-se a apenas um capítulo do livro. O resultado seria melhor se a produção estivesse na mesma página, apostando em uma duração menor e definitivamente um orçamento mais controlado.

Drácula: A Última Viagem do Deméter (The Last Voyage of the Demeter, EUA) - 2023

Direção: André Øvredal
Roteiro: Bragi Schut Jr. e Zak Olkewicz, baseado na obra de Bram Stoker
Elenco: Corey Hawkins, Liam Cunningham, Aisling Franciosi, David Dastmalchian, Woody Norman, Chris Walley, Jon Jon Briones, Stefan Kapicic, Javier Botet
Gênero: Terror
Duração: 118 min

https://youtu.be/Ehs8cr2HKhY