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Crítica | A Freira – O capítulo mais fraco da franquia Invocação do Mal

Iniciado abruptamente em 2013, o universo cinematográfico de Invocação do Mal logo converteu-se em uma das franquias mais interessantes e distintas da Hollywood contemporânea. Usando uma fórmula de filmes compartilhados que apenas a Marvel Studios havia acertado em seus filme de super-heróis, James Wan capitaneou um universo concentrado inteiramente no terror, e não em ação; tudo o que a Universal tanto queria com o fracassado A Múmia e o plano do Dark Universe.

Após dois filmes do selo Invocação do Mal e duas “aventuras” solo da boneca demoníaca Annabelle, Wan aposta em outra figura sinistra para ganhar sua história de origem: A Freira. Baseando-se em um dos antagonistas do casal Ed e Lorraine Warren, Wan mantém sua tática habitual de encontrar um jovem prodígio para contar uma história original e com estilo distinto, algo que funcionou com David F. Sandberg em Annabelle 2: A Criação do Mal, mas que infelizmente não se repete aqui. O filme de Corin Hardy é facilmente o mais fraco da franquia até agora.

Assim como os dois filmes de Annabelle, a trama deste novo capítulo serve como prelúdio dos filmes de Invocação Mal, nos levando para um convento romeno em 1952. Após o misterioso suicídio de uma freira, o Vaticano envia o Padre Anthony Burke (Demian Bichir) e a noviça Irene (Taissa Farmiga) para investigar a situação e averiguar se o local “ainda é sagrado”. Ao chegar lá, eles descobrem a presença demoníaca de Valak, que se manifesta na forma de uma assustadora freira (Bonnie Aarons).

Um roteiro profano

A princípio, a ideia de explorar as origens da Freira é das mais empolgantes. Movido pela ambientação de época em um cenário radicalmente distinto para a franquia, que fora mais baseada em casas e famílias, o roteiro de Gary Dauberman (que também escreveu os filmes de Annabelle) acerta ao partir da premissa de um filme de investigação dentro do convento na Romênia, algo que por si só já é capaz de causar arrepios pela atmosfera aterradora. Infelizmente, trata-se do pior texto que Dauberman já trouxe até então, com uma sucessão de erros e oportunidades terrivelmente perdidas.

Como filmes de terror são produzidos em um tempo mais curto do que grandes blockbusters de efeitos visuais, é de se imaginar que a Warner Bros e James Wan tenham apressado a produção do longa, o que talvez explique porque a narrativa de Dauberman é tão debilitada. Percebemos a preguiça criativa logo no começo, quando o Padre Burke recruta Irene por sua experiência em campo na Romênia, mas a jovem noviça diz que nunca viajou ao país, e que a Igreja deve ter recomendado a pessoa errada – a clássica relutância da Jornada do Herói, de Joseph Campbell. Burke simplesmente assume que “ela foi recomendada por algum propósito”, e ficamos por aí. Mandar uma noviça para uma missão secreta e altamente perigosa, e é apenas o começo dos erros.

Ao longo da enxuta duração de 96 minutos, o texto de Dauberman oferece exposições sofríveis, uma mitologia aprofundada por flashbacks intrusivos e um trabalho praticamente nulo de seus personagens. Nenhuma das figuras aqui traz o charme ou carisma do casal Warren de Invocação do Mal, ou mesmo das órfãs simpáticas de Annabelle 2; que também foi escrito por Dauberman, o que só torna seu tropeço aqui ainda mais preocupante. Há tentativas furadas de criar arcos com Irene e Burke, com a primeira passando por um “questionamento de fé” que jamais ganha algum tipo de análise, visto que a personagem aparentemente só não fez seus votos perpétuos como freira por falta de tempo, ou a descartável experiência traumática do padre com um exorcismo fracassado – algo que só está no filme para garantir alguns sustos quando o passado se manifesta para assombrá-lo. Não há catarse ou resolução satisfatória em nenhum desses arcos.

O único agrado fica com o belga Jones Boquet, que consegue arrancar algumas risadinhas no óbvio papel do alívio cômico. Mas justamente pelo texto ser tão ruim, o fato de que seu personagem Frenchie esteja constantemente questionando e ridicularizando as ações do protagonista acaba surgindo como uma forma de auto-depreciação não planejada. A conexão de seu personagem com o universo da franquia também representa o outro ponto alto da projeção.

Direção nada abençoada

Com um roteiro péssimo, ao menos um diretor criativo conseguiria salvar o navio e oferecer algumas sequências assustadoras. Não acontece isso com Corin Hardy. Saído de A Maldição da Floresta, a técnica do diretor é previsível e sem imaginação, recorrendo constantemente aos jump scares (algo que a franquia sempre usou com inteligência) e o mesmíssimo movimento de câmera que envolve duas panorâmicas em 180 graus para revelar alguma ameaça oculta em cena – praticamente todas as revelações de entidades se dão dessa forma.

Não provocar medo talvez seja o maior pecado que um filme de terror pode cometer, especialmente quando Hardy tem em mãos uma das figuras mais sinistras e icônicas de toda a franquia Invocação do Mal. Bonnie Aarons surge tão bem caracterizada quanto sua participação anterior na franquia, mas o diretor peca ao mantê-la ausente durante boa parte do longa, e apostando em sombras que cobrem sua presença quando de fato está em cena. Apenas uma seção do filme aposta em todo o poder da Freira, mas é tão capenga e vergonhosa que acaba por desmistificar o trabalho que Wan havia feito em Invocação do Mal 2. Resta dizer que, se a intenção era trazer Valak falando, as falas poderiam ser mais bem elaboradas. O que temos aqui é digno de um Resident Evil de Paul W.S. Anderson, se tanto.

Infelizmente, A Freira representa o primeiro grande tropeço da franquia Invocação do Mal nos cinemas, ficando abaixo até mesmo do primeiro derivado centrado em Annabelle. É um exemplo de grande potencial desperdiçado em um roteiro defeituoso e uma direção pouco inspirada, e que requer um carinho maior do produtor James Wan na hora de aprovar seus projetos, já que este aqui representa pura preguiça.

Resta rezar para que este seja apenas um tropeço, e que os Warren retornem para abençoar a franquia novamente.

A Freira (The Nun, EUA – 2018)

Direção: Corin Hardy
Roteiro: Gary Dauberman, baseado em seu argumento com James Wan
Elenco: Taissa Farmiga, Demian Bichir, Bonnie Aarons, Jones Bloquet, Ingrid Bisu, Charlotte Hope, Sandra Tales, August Maturo, Jack Falk
Gênero: Terror
Duração: 96 min

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Publicado por Lucas Nascimento

Estudante de audiovisual e apaixonado por cinema, usa este como grande professor e sonha em tornar seus sonhos realidade ou pelo menos se divertir na longa estrada da vida. De blockbusters a filmes de arte, aprecia o estilo e o trabalho de cineastas, atores e roteiristas, dos quais Stanley Kubrick e Alfred Hitchcock servem como maiores inspirações. Testemunhem, e nos encontramos em Valhalla.

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