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Crítica | A Nona Vida de Louis Drax

A Nona Vida de Louis Drax é um daqueles ambiciosos filmes com viradas espetaculares que prometem muito, conseguem cumprir razoavelmente suas metas, mas perde o brilho e a identidade no meio do caminho. O diretor francês Alexandre Aja nos entrega uma narrativa um tanto quanto metafórica, seguindo o mesmo formato de predecessores do gênero e utilizando a fantasia para discorrer sobre temas sociais e psíquicos. De certa forma, a perspectiva infantil adotada no filme funciona, mas não é recorrente de forma completa – sendo este o principal motivo da disparidade que afeta seu fechamento.

O protagonista é o personagem-título Louis (interpretado pelo novato Aiden Longworth), o qual é dotado de uma característica incomum: a de ser um chamariz para desastres. O longa abre com uma sequência dele caindo do penhasco e logo nos transporta em um flashback dinâmico no qual vemos os acontecimentos sombrios e estranhamente cômicos que o acompanham, como o fato de um ventilador cair sobre ele quando ainda bebê, suas dezenas de intoxicações alimentares e sua infortuna aventura envolvendo um garfo e uma tomada.

Voltamos para o penhasco. Em uma narração muito bem detalhada e metafórica, Louis vê sua vida passar diante dos seus olhos antes de finalmente cair do penhasco e entrar num súbito coma. Ao que tudo indica, o garoto foi empurrado pelo pai (Aaron Paul) e todos os detalhes da tragédia estão sendo relatados por uma mãe superprotetora e aparente mocinha da história (Sarah Gadon). Enquanto isso, numa realidade onírica paralela própria da psique infantil e bombardeada com narrativas de ficção, ele conversa com um monstro intangível e dotado de características subaquáticas – pedras, mariscos e algas que se fundem com uma pele murcha e enrugada – sobre… A vida.

Além disso, temos a presença de outros personagens importantes para as tramas e as subtramas, incluindo o psiquiatra de Louis (Oliver Platt), que foi contratado para cuidar da antissociabilidade do protagonista, e o pediatra Allan Pascal (Jamie Dornan), que monitora a possível evolução corporal do menino em coma enquanto tenta lidar com uma desesperada Natalie (Gadon) e com a chefe da polícia local, a Detetive Dalton (Molly Parker), cujo time ainda procura pelo pai desaparecido, apontado como principal suspeito, mas sem qualquer evidência concreta além do depoimento da mãe.

Sim, as linhas narrativas são muitas – e eu nem cheguei na melhor parte: depois de longas investigações, descobrimos que na verdade Peter (Paul) também sofreu o acidente no penhasco e foi encontrado boiando num dos canais do rio, completamente castigado pelas intempéries naturais e possivelmente concluindo o crime. Mas conforme as conversas metafísicas e intimistas se desenvolvem, somos apresentados a um ramo na neurociência que se mistura de forma híbrida com as possíveis conexões do além-vida e… Bem, a coisa fica ainda mais complexa e saturada.

O grande problema de A Nona Vida é justamente este: querer contar muitas coisas sem saber como. A obra perpassa por diversos gêneros, oscilando entre o thriller psicológico para o dramalhão conjugal para a aventura fantástica, sem saber onde se fixar. O que começou como uma narrativa contada a partir dos olhos de uma criança “incomum” aos olhos da sociedade – dotada de um amadurecimento notável e com um potencial exploratório incrível – terminou com uma mixórdia desequilibrada pontuada com cenas de sexo à la Cinquenta Tons de Cinza (sim, Dornan de novo) e diálogos extremamente mal-estruturados e clichês.

A estética assemelha-se a produções anacrônicas e com uma cronologia não-linear, como O Fabuloso Destino de Amélie Poulain, mas sem o mesmo refinamento estético. A própria cenografia contraria as normas do bom senso – e apesar disso, nossa atenção é um pouco desviada destes deslizes pela tétrica trilha sonora que combina com o “tom” do filme e pela direção de arte, cujos tons de verde, marrom e azul-escuro fazem parte da paleta de cores. A justaposição de cores complementares também é presente e funciona brevemente, ao colocar Gadon dentro de um arco místico cujo figurino preza pelo vermelho em contraposição ao verde.

A fotografia confusa e a montagem em cortes bruscos não contribui em nada para desviar a atenção de um roteiro cheio de furos. Talvez um dos únicos pontos altos é a chegada da Violet, avó de Louis, interpretada pela sempre ótima Barbara Hershey. Sua presença traz peso à cena e ajuda a elevar um pouco o nível do filme. O clímax principal, apesar de não explorado, vem sem precedentes e consegue arrancar alguns suspiros de surpresa dos espectadores.

Em suma, A Nona Vida de Louis Drax é um filme com potencial desperdiçado, principalmente no tocante ao elenco. Nem mesmo os visuais de Paul como o monstro (spoiler alert) são capazes de satisfazer um público que anseia pelo fantástico e pelo novo.

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Publicado por Thiago Nolla

Thiago Nolla faz um pouco de tudo: é ator, escritor, dançarino e faz audiovisual por ter uma paixão indescritível pela arte. É um inveterado fã de contos de fadas e histórias de suspense e tem como maiores inspirações a estética expressionista de Fritz Lang e a narrativa dinâmica de Aaron Sorkin. Um de seus maiores sonhos é interpretar o Gênio da Lâmpada de Aladdin no musical da Broadway.

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