Há pelo menos três clássicos do terror que representam a síntese da indústria para o gênero: O Exorcista, O Iluminado e O Bebê de Rosemary (e aqui fica uma menção honrosa para A Profecia original). Além dos valores intrínsecos a cada um, o trio tem sido referência desde o final da década de 1960, sendo inumeráveis vezes referenciado, imitado e homenageado (como depois seriam Sexta-Feira 13, Halloween e A Hora do Pesadelo, em nova fase dessa mesma indústria).
Indo além do que se viu até hoje em termos de ampliação dos universos de O Iluminado e O Exorcista, Apartamento 7A, original da Paramount Plus dirigido por Natalie Erika James, transita entre o que seria uma antecipação e quase uma refilmagem do original de Roman Polanski, com resultados, entretanto, originais.
Na trama, Terry Gionoffrio (Julia Garner) é uma aspirante a estrela de musicais que sofre um acidente e tem dificuldades para se manter na Nova York dos anos 1960 e conseguir um novo papel. Desassistida, ela acaba sendo convencida a ir morar no prédio da produção original, onde é acolhida por um casal de idosos sem filhos (Dianne Wiest e Kevin McNally). A partir daí, o desenrolar segue uma sucessão de eventos que lembra bastante o romance de Ira Levin.
O Bebê de Rosemary: um clássico cercado por controvérsias
O original de 1968 ficou tragicamente relacionado no imaginário popular ao assassinato da esposa do diretor, Sharon Tate, um episódio modificado pela ficção de Quentin Tarantino em Era uma Vez em Hollywood. Independente da mitologia que se criou a partir disso em torno do filme, esta é ainda hoje uma verdadeira aula de direção e roteiro, um espetáculo cinematográfico onde se mostra quase nada, tudo é clima e preparação para o final cinicamente apoteótico.
Se Polanski mostra muito pouco, Erika James escolhe um caminho mais exuberante do ponto de vista visual, não se contendo em oferecer os sustos e truques que o público atual parece esperar de todo novo filme de terror. Se carece da sutileza do original, por outro lado nos brinda com cenas de impacto visual e filmagem elegante, o que nem de longe representa pouco no cinema de hoje em dia.
O maior acerto do filme está na presença de duas atrizes de gerações diferentes, porém igualmente excepcionais. Garner é uma artista completa e consegue com sua versatilidade parecer ora a “mocinha” do filme, ora a “feiosa” solitária. Wiest, por sua vez, num papel contido, mas recheado de sutilezas e reveladores tons de voz, empilha mais um desempenho digno de uma das grandes atrizes de Hollywood em todos os tempos.
Entre a originalidade e a fidelidade, o filme segue a linha do meio
A partir de determinado ponto, o enredo opta por ser rigorosamente fiel ao universo do filme original para que seu desfecho se encaixe com o início da versão de 1968. Mas a diretora deixa sua marca autoral ao introduzir, de forma altamente criativa, um elemento que no filme de Polanski permanece ocultado: a contracultura. É quando 1968 e 2024 se encontram e se espelham, e o individualismo trágico e solitário de Terry vence, a seu modo, a convenção social diabólica que até então silenciosamente a oprimia.