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Crítica – Barbie é uma jornada existencialista e fora da caixa

Após anos mergulhado no longo inferno de desenvolvimento de Hollywood, finalmente chega a hora da Barbie ganhar as telas do cinema em live-action. Certamente um dos brinquedos mais famosos do mundo, a boneca da Mattel ganhou uma infinitude de longas animados ao longo das décadas passadas, mas foi preciso o star power de Margot Robbie e a escolha nada óbvia de Greta Gerwig para dar vida ao projeto – que certamente é fora da caixa.

A história do filme começa na mítica Barbielandia, quando Barbie a vivida por Margot Robbie começa a questionar a artificialidade de seu mundo plástico, levando a uma série de acontecimentos estranhos. Para encontrar a verdade, ela embarca em uma viagem para o mundo real, acompanhada do atrapalhado Ken, vivido por Ryan Gosling.

Desde o início, o projeto de Barbie é literalmente fora da caixa. A ideia de recrutar Greta Gerwig, saída de um início promissor de carreira como diretora após os premiados Lady Bird e Adoráveis Mulheres, e seu marido Noah Baumbach, também elogiado e premiado por obras como História de um Casamento, desde já indica que Barbie não é um filme qualquer; ou uma mera peça publicitária para encher os cofres da Mattel – ainda que essa consequência seja inevitável.

O roteiro assinado por Gerwig e Baumbach é criativo e ousado, trilhando pelo caminho mais sábio ao abordar produtos famosos: a metalinguagem, praticamente seguindo a fórmula brilhantemente aperfeiçoada pela animação Uma Aventura LEGO. Todas as Barbies e Kens são versões reais de suas contrapartidas de brinquedo, garantindo uma imersão na artificialidade proposital de sua terra – garantindo um trabalho fenomenal de design de produção e a fotografia de Rodrigo Prieto – e as performances de seus intérpretes que contribui para o bem pontuado tom de humor do longa – que constantemente está quebrando a quarta parede, fazendo referências a si próprio e até mesmo comentando a indústria cinematográfica; mérito da hilária narração onisciente de Helen Mirren.

Gerwig também bebe da fonte de obras como O Show de Truman e Matrix, ao trazer sua protagonista questionando a realidade e apontando falhas na “perfeição” de seu pequeno mundinho. A referência logo joga Barbie em uma jornada de peixe fora da água, com a protagonista e Ken conhecendo os abusos e contradições do mundo real, com consequências surpreendentes em especial para o personagem de Gosling – que passa por uma reviravolta inusitada ao descobrir que os homens têm poder fora da Barbielândia.

Evitando entrar em spoilers, é uma reviravolta que certamente contribui para os temas abordados em Barbie, mas que podem soar repetitivos e até redundantes em sua abordagem; certamente evidenciando o quão livre Gerwig foi durante o processo de roteiro. Dentro desse núcleo, o humor excessivamente cartunesco também pode incomodar aqueles que não embarcarem 100% na galhofa, já que números musicais exageradamente cafonas podem cansar com o tempo.

Dito isso, Barbie consegue triunfar graças a uma jornada emocional forte e catártica com sua personagem principal. Ainda que dependa de arcos humanos pouco desenvolvidos com a personagem de America Ferrera, a Barbie de Margot Robbie atinge níveis de Toy Story ao atingir sua reta final, garantindo uma excepcional performance da atriz australiana – que combina o melhor de seu carisma explosivo e radiante com uma inesperada carga dramática.

Ainda que imperfeito, Barbie garante uma abordagem original e audaciosa para lidar com bonecos inanimados. Injetando boas referências e uma surpreendente dose de existencialismo, o filme de Greta Gerwig consegue o raro feito de apresentar uma obra absolutamente autoral em meio à maquina de produção hollywoodiana – e financiada por uma empresa de vender brinquedos, ainda por cima.

Barbie (EUA, 2023)

Direção: Greta Gerwig
Roteiro: Greta Gerwig e Noah Baumbach
Elenco: Margot Robbie, Ryan Gosling, America Ferrera,Will Ferrell, Simu Liu, Issa Rae, Emma Mackey, Michael Cera, Kate McKinnon, Kingsley Ben-Adir, Alexandra Shipp, Ncuti Gatwa, Helen Mirren e Rhea Perlman
Gênero: Comédia
Duração: 114 min

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Publicado por Lucas Nascimento

Estudante de audiovisual e apaixonado por cinema, usa este como grande professor e sonha em tornar seus sonhos realidade ou pelo menos se divertir na longa estrada da vida. De blockbusters a filmes de arte, aprecia o estilo e o trabalho de cineastas, atores e roteiristas, dos quais Stanley Kubrick e Alfred Hitchcock servem como maiores inspirações. Testemunhem, e nos encontramos em Valhalla.

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