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Crítica com Spoiler | Rebel Moon – Parte 1: A Menina do Fogo – Uma Bela Frustrante Promessa

Sinceramente, estou confuso sobre em qual pé de guerra que o usual conflito em volta do fatídico nome Zack Snyder, nos encontramos no momento

Uma rápida visita online revela o de sempre: Seus fãs são a rebelião defendendo cegamente seu pobre mal tratado visionário da crueza egocêntrica dos críticos incapazes de enxergar valor na sua obra e estilo.

Enquanto que os críticos que adoram tirar sarro desses fãs, indo perder seu tempo fazendo críticas aos filmes que eles já declaradamente entram prontos para desgostar pois desde sei lá quando decidiram que tudo que sai desse nome e sua fan base ‘não é cinema’. Ironicamente estes são sempre os primeiros a irem debater um novo filme podre de premiações e festivas onde suas críticas de juízo de valor feitas ao Snyder simplesmente não encaixam justamente quando deveriam.

Nisso, o caos sociológico se afunda em um amargo âmago de ódio. Não há clareza. Subjetividade crítica é substituída por zombaria em meio aos gritos de defesa e clamor. Isso poderia ser a definição do mapa político em volta do domínio imposto pelo Motherworld – o Imperium do mal que Snyder criou em seu Rebel Moon, e talvez explorar os diferentes níveis de ramificações sociológicas efeitos do genocídio que um império maligno elitista impera sobre uma galáxia dividia em bolhas de argumentação cada vez mais fechadas e de visão oca em seus próprios problemas e visões de mundo, incapazes de enxergar o verdadeiro mal / inimigo que as divide

Mas não, eles se resumem a Nazis Galácticos, ok.

‘Mas pera lá um minutinho, por que você tá levantando e levando temas tão a sério em um blockbuster de streaming genérico?!’ – como bem ouço você questionando. Bem, não é isso o traço do Snyder?! Uma das coisas que continua sendo uma de suas qualidades mais admiráveis. Ele é talvez o único ‘autor’ de blockbuster atual com aquele ‘Q’ de vulgar que leva seu material cem por cento a sério. Não tão prestigiado e aclamado como um James Cameron ou Peter Jackson da vida, nem com um grande grupo de admiradores dentro de alguns círculos críticos como as Wachowski ou Paul W. S. Anderson.

Snyder está exatamente bem ali no meio, com apenas o apoio de suas estrelas e colegas como Christopher Nolan, e claro, o ‘Snyder cult’ – sua legião de fãs que são um legítimo público muito apaixonado que o cara criou para si mesmo depois de ser progressivamente maltratado pelos executivos do estúdio desde o fatídico dia em que ele decidiu abordar marcas queridas como a DC, que só serviu para propagar o diretor que ele se tornou hoje, com total controle de sua obra e agora com a Netflix pronta para investir em tudo o que o homem inventar, e seu público fiel irá devorar sem fazer perguntas.

É deveras compreensível, Snyder é um cara fácil de se gostar. Totalmente honesto e sincero sobre os seus filmes e gostos, quanto sua admirável imaginação ambiciosa e a latente ousadia com que ele lida com suas idéias e conceitos, sempre levando a construção de mundo, lore e mitos em níveis 100% sérios de comprometimento onde, em mais de uma ocasião, serviram para criar filmes de gênero bastante únicos, com o impacto criativo e assinatura autoral que a maioria dos blockbusters de franquia hoje sonharia em ter sequer metade.

No entanto, devo (infelizmente) concordar com o discurso em volta de versão estendida / corte do diretor – como você quiser chamar – que está se criando certa “fadiga”. Não que eu seja hipócrita e declare sumamente que isso é uma abominação de marketing e ainda assim vou ano que vem assistir a versão do diretor e provavelmente gostar muito mais e declará-la como a versão definitiva do filme – o que provavelmente é o que vai acabar acontecendo.

Porém isso não é desculpa pela flagrante bagunça tão desarticulada que foi lançada aqui nessa primeira versão de Rebel Moon, e dizer que devemos aceitá-la pelo que é, mesmo sabendo que esse não é o produto final da visão do diretor. E a defesa dos fãs em cima disso está atuando diretamente como um autodetrimento da imagem de Snyder neste ciclo interminável e ininterrupto de ódio online!

Podia jurar que esses dias haviam ficado para trás e o que teríamos daqui pra frente seria Snyder entregando os filmes que ele quer. Dando a cara ao tapa; ame ou odeie, como ele sempre foi, mas agora com sua essência deixada intacta! Mas não, Rebel Moon foi vendido em torno de um marketing baseada em um produto incompleto que admite abertamente ser apenas um aperitivo, enquanto a eventual ‘versão do diretor’ será “seu próprio filme”, como os defensores e o próprio Snyder o chamaram.

Afinal, o propósito de tais versões de diretor não é exatamente para ser a versão que o cineasta originalmente queria?! É por isso que os fãs imploraram para que a ‘Snydercut’ de Liga da Justiça viesse à vida para que fosse dada justiça à sua visão e integridade artística!

Mas agora a Netflix está propositalmente tomando proveito desse suposto trem do hype e mal concebendo seu significado original apenas para promover esses filmes de Rebel Moon o maior tempo possível para garantir uma boa leva de visualizações e cliques em sua plataforma, porque é assim que sua renda funciona. O triste é que Snyder está se levando junto a isso. É um ato de pura picaretagem de marketing tão flagrante que as pessoas estão ignorando diretamente, às custas de toda a qualidade potencial do filme!

Isso poderia até ter sido perdoável se o que tivéssemos aqui realmente funcionasse o suficiente por si só, e até parece assim em seus primeiros trinta minutos ou mais, com o estabelecimento do conflito em torno de nosso grupo de protagonistas vivendo sua vida tranquila, humilde e pacífica em sua pequena fazenda no mundo de Veldt, até que o poder fascista do ‘Motherworld’ decide aparecer para saquear seus grãos e explorar seu labor.

É o cenário tradicional Sete Samurais sendo novamente trabalhando e funcionando em seu charme antiquado, apesar de alguns diálogos de exposição bastante descartáveis. Mas definitivamente mostra a intenção clara de Snyder em dedicar tempo para deixar a história e os personagens construírem seu próprio ritmo e progressivamente ganhando escala por meio de interações bem instrumentadas.

Que vão desde as conexões espirituais feitas em torno de sentimentos genuínos de admiração e intriga –  as primeiras cenas com o androide Jimmy funcionam muito bem com esse propósito; junto à tensões de violência iminentes prestes a explodir a qualquer momento, com os soldados do ‘Motherworld’ agindo como os mais perversos predadores sexuais caucasianos que você já viu na tela (ou nos últimos dez anos de filmes de Hollwyood).

É por isso que é um tanto desconcertante como depois de sua primeira meia hora, o resto do filme se alopra em pulos estruturais que se tornam uma amalgama de seções de recrutamento e pulando entre diferentes planetas lindamente renderizados, com pausas para backstory da personagem de Sofia Boutella ou cenas de Ed Skrein interpretando o arquétipo britânico mal – o papel que ele nasceu para interpretar.

Com 80% do filme servindo para apresentar nosso elenco de guerreiros lendários prestes a se impor contra o poder e opressão, mas todos eles são um monte de vácuos de vazio simbólico colocados em cena, atuando mais como diferentes action figures no tabuleiro de RPG de ópera espacial criado por Snyder aqui.

Todos ótimos atores cujos personagens mostram potencial, mas se sentem amênicos em meio a tantas oportunidades perdidas e conflitos dramáticos forçados que quase nunca funcionam. A pobre Sofia Boutella, quando mal brilha em cenas de ação desconjuntadas, ela é colocada em uma posição de puxar peso dramático que ela claramente não é capaz, e cuja tradicional personagem da guerreira em conflito com passado nebuloso tem funções de história bem óbvias.

Enquanto o resto da gangue, Djimon Hounsou, Bae Doona, Staz Nair; todos parecem legais e só. Tudo poderia ter sido resolvido com interações bem pontuais entre os personagens que poderiam ter definido o caráter de suas personalidades e construído afabilidade com o público com cada um deles, mas não, não há vínculo, nem conexão. O filme está sempre com pressa para pular para o próximo planeta e estabelecer o próximo grande confronto que só vai rolar no próximo filme.

Isso é porque o roteiro parece não confiar na interação humana além do que você vê na tela, e NOVAMENTE, se o que você vê aqui é o produto inacabado, é claro que ele terá dificuldade em transmitir algo verdadeiramente significativo além de idéias expressadas em voz alta em volta de personalidades vazias.

E nossa, fez-se história em ver Charlie Hunnam sendo tão desperdiçado. Tanto por estar interpretando um Han Solo 2.0, quanto por ser revelado no clímax como parte da escória caucasiana da galáxia, simplesmente porque seu arquétipo de branco heterossexual tóxico simplesmente não pertence à liga da diversidade que são os protagonistas, afinal eles já possuem o arquétipo de masculinidade saudável no personagem de Michiel Huisman: a exceção, a alma sensível fazendo a dama em perigo versão masculina do grupo.

Eu deveria ter suspeitado quando Army of the Dead já estava mostrando sinais disso com elementos descartáveis, como a metáfora de controle de fronteiras cutucando a era Trump. Mas ainda é decepcionante ver como Snyder, um cara que construiu uma carreira fazendo heroínas femininas fortes sem nunca ter que chamar a atenção para isso; tratando seus personagens masculinos e femininos com igual quantidade de camadas dimensionais de caracterização, contrapostas em torno da ação que ele os encenava.

Agora tendo que se enquadrar no modelo moderno de agendas progressistas que rondam o cinema Norte-Americano e vem se alastrando por outras partes (Brasil incluso). Onde todo o mal faz parte do círculo masculino branco opressor, potenciais abusadores sexuais, que precisam ser denunciados na tela porque é exatamente assim que a realidade funciona na mentalidade moderna de Hollywood. Onde valores morais são concebidos por raça e gênero, definindo idéias pútridas de ‘justiça histórica’ que colocam um grupo demográfico contra outro, que a essa altura do ponto do desgaste da indústria, apenas soa como infantilidade!

É triste, porém, ter que apontar tudo isso em um filme onde ainda posso ver o espírito de Snyder florescendo. O dinheiro está definitivamente na tela! O som, a escala e efeitos são todos de qualidade de lançamento no cinema. Criando sua tão sonhada ópera espacial de toque Heavy-Metal.

100% original, com uma vasta gama de influências e inspirações que vão desde cenários de efeito desenhado que evocam uma vibe Flash Gordon dos anos 70/80; design de anime; arquétipos de aventura heróica que vão desde Tolkien à Kurosawa; E alguns ecos bem óbvios à Uma Nova Esperança que revelam as sobras de Star Wars de onde o material original veio – um Sete Samurais com Jedis, um pitch feito por Snyder que fora recusado pela Lucasfilm.

Porém na melhor das hipóteses, Rebel Moon parece menos um derivado de Star Wars e mais se assemelha à A Batalha de Riddick se fosse dirigido por Albert Pyun, o esnobado visionário trash por trás de clássicos de Van Damme como Cyborg – O Dragão do Futuro e pérolas como Nemesis – O Exterminador de Andróides, e isso é um elogio!

É uma obra cujas origens claramente vêm dos cadernos de monstros e naves espaciais de um jovem adolescente, reunindo um conglomerado de elementos RPGs e ficção científica que vê aqui o diretor criando sua própria mitologia novelística em grande escala, cujo primeiro capítulo aqui é claramente toda a configuração de elementos e fios de trama que só mais tarde serão retomados. É derivativo, com certeza, mas feito com clara paixão!

Snyder tem um fascínio genuíno pelos aspectos essenciais e sentimentais dos mundos que cria. Onde as habilidades de Snyder em formar momentum imagético potencializando os elementos da imagem em cena são, como sempre, inegáveis de se deslumbrar. Criando o efeito pictórico ou o enquadramento quadrinhesco que ainda são divertidos de ter como experiência. Embora que desde que Snyder tomou controle da cinematografia em seus filmes, eles ficaram com falta do glamour visual que seus filmes passados tinham.

O uso de lentes anamórficas tem um efeito estranho e nebuloso em alguns frames que não se sabe se foi proposital para dar um peso de realidade fundamentada na filmagem, ou parte da sempre louvável experimentação técnica de Snyder. Onde até mesmo o uso excessivo de câmera lenta é a menor das reclamações a se ter aqui, porque ele bem mais contido aqui do que em Liga da Justiça, enquanto que a trilha sonora de Tom Holkenborg parece tristemente reciclada daquele filme!

Em meio a isso, a jornada que se desenrola no filma tem lá seus bons momentos isolados. A domesticação do grifo por Tarak e a cena de luta da Mulher-Aranha com Nemesis de Bae Dona são bem legais, embora a coreografia pareça truncada e lenta. A ação em geral é repleta de soluços indesculpáveis ​​com cortes abruptos bizarros, claramente tentando esconder os segundos de cena onde o alerta R-rated teria apitado, para então que tudo se encaixe no PG-13 higienizado mantendo seu domínio inescrutável. Estranho que se isso tenha sido uma decisão executiva vinda de um streaming que geralmente evita essas bobagens – de novo, cliques, eu sei.

É um tanto irônico como em meio a um elenco tão vazio, são os seres alienígenas demoníacos e bizarros ou andróides sem rosto que conseguem ser os personagens mais interessantes do filme inteiro. Talvez porque, novamente, as idéias de Snyder funcionem melhor ao dar vida a conceitos cerebrais ao invés vez de lidar com elementos dramáticos tradicionais! É por isso que numa cena onde um inseto alienígena se comunica através de um cadáver, ou vemos outro cadáver tem sua alma sugada para uma realidade virtual, são mais cativantes e instigantes; do que ver o personagem de Ray Fisher se sacrificando tentando extrair alguma emoção, que sai completamente como perda de tempo.

Creio que alguns chamariam atenção para críticas talvez injustas em torno da estrutura da história, assumindo que o que você está assistindo é claramente a primeira metade de uma história longa. E sim, é exatamente assim que o filme aqui se parece e poderia ter sido exatamente isso sem problemas, se fosse eficaz em nos vender esse universo e a história que está tentando contar dentro dele!

Rebel Moon é literalmente os primeiros 40 minutos de recrutamento dos Sete Samurais sendo estendidos para uma aventura intergaláctica de duas horas que parece totalmente anticlimática, carregada por uma conjunção de promessas vazias que não levam a lugar nenhum particularmente interessante, a não ser por uma diversão mediana. Seja por suas ambições pirotécnicas em torno de conceitos bem aplicados, mas que infelizmente parecem mal acabados

Eu te amo, Zack, mas sei que você pode fazer muito melhor do que isso. Só posso esperar engolir minhas palavras na eventual versão diretor ou na Parte 2 que podem até salvar o que é feito aqui. Mas até o momento, essa Rebelião ainda não me convenceu de seu propósito!

Rebel Moon – Parte 1: A Menina do Fogo (Rebel Moon – Part One: A Child of Fire)

Direção: Zack Snyder
Roteiro: Zack Snyder, Kurt Johnstad, Shay Hatten
Elenco: Sofia Boutella, Ed Skrein, Djimon Hounsou, Michiel Huisman, Charlie Hunnam, Bae Doona, Ray Fisher, Staz Nair, Anthony Hopkins, Fra Fee, Cleopatra Coleman
Gênero: Ação, Aventura, Sci-Fi, Fantasia
Duração: 134 min

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Publicado por Raphael Klopper

Estudante de Jornalismo e amante de filmes desde o berço, que evoluiu ao longo dos anos para ser também um possível nerd amante de quadrinhos, games, livros, de todos os gêneros e tipos possíveis. E devido a isso, não tem um gosto particular, apenas busca apreciar todas as grandes qualidades que as obras que tanto admira.

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