Crítica | Missão: Impossível – Acerto de Contas Parte Um mostra sinais de cansaço e repetição

Missão: Impossível – Acerto de Contas Parte Um acende um alerta para a franquia da Paramount

Ao longo de quase 30 anos em atividade, a franquia Missão: Impossível trilhou um caminho curioso para se estabelecer como uma das joias do cinema de ação contemporâneo. Abandonando algumas convenções do século passado, a saga de espionagem agora é ancorada na habilidade impressionante de Tom Cruise em arriscar a própria vida para realizar cenas espetaculares, que empurraram a jornada de Ethan Hunt em seu sétimo capítulo; agora dividido em duas partes, ambas capitaneadas por seu braço direito, o diretor Christopher McQuarrie.

Porém, a ambição e escala de Missão: Impossível – Acerto de Contas Parte Um começa, pela primeira vez, a demonstrar alguns sinais de esgotamento e repetição de fórmula, infelizmente representando um dos pontos menos inspirados da tão consistente franquia.

A trama coloca mais uma vez o agente secreto Ethan Hunt (Cruise) em uma missão perigosa para a IMF, agora pra recuperar duas peças de uma chave misteriosa. O artefato, disputado por agentes do mundo todo, seria crucial para barrar a ameaça exponencial de uma inteligência artificial rebelde, conhecida apenas como a Entidade.

Durante todos os filmes anteriores, a fórmula de Missão: Impossível nunca mudou. Sempre envolveu o implacável Ethan Hunt em busca de um objeto misterioso (o mcguffin) com alguma capacidade de destruição mundial, e geralmente sua jornada acaba indo de encontro com os interesses e protocolos da IMF, forçando o protagonista e sua leal equipe – formada por Simon Pegg, Ving Rhames e agora Rebecca Ferguson – a agirem de forma clandestina. Todos esses elementos se repetem no sétimo filme da franquia, que em Acerto de Contas Parte Um não parece ter nada de muito inovador ou interessante para desenvolver; ainda mais tratando-se de apenas metade da história completa.

A ideia da inteligência artificial é divertida e surpreendentemente contemporânea, mas o roteiro de McQuarrie e do autor Erik Jendrensen é dolorosamente enfadonho. Ao longo de inchados 160 minutos, Acerto de Contas sofre com problemas de exposição, uma enorme quantidade de personagens em cena e até algumas redundâncias narrativas – já que o mistério do que as chaves abrem é mantido para os personagens durante todo o filme, mas revelado para o espectador literalmente na primeira cena. Além da obviedade, ainda há a sobrecarga de subtramas, que além de brincar com a ameaça de IA, ainda aposta em vilões do passado de Ethan, perseguidores independentes da CIA e conexões com antagonistas dos filmes anteriores. Nunca ficou tão evidente quanto neste sétimo filme que a “trama” é um mero pretexto para amarrar as diversas cenas de ação, algo que o próprio McQuarrie já revelou em algumas entrevistas.

No que diz respeito à ação, Acerto de Contas Parte Um segue mantendo o bom padrão de espetáculo da franquia. McQuarrie aposta em mais perseguições de carro, lutas de espada e até mesmo uma longa e complexa sequência envolvendo um trem, onde Tom Cruise ainda realiza o já famoso salto de motocicleta de um penhasco. São todos momentos bem coreografados e fotografados (agora pelo competente Fraser Taggart), mas sem o fator de novidade ou impressão que os superiores Nação Secreta e Efeito Fallout (também de McQuarrie) deixaram com muito mais gosto. Há também, para uma franquia tão orgulhosa de seu uso de efeitos práticos, uma dependência em telas verdes e CGI que certamente saltam aos olhos de forma negativa.

O que garante o investimento positivo aqui é, mais uma vez, o elenco. Tom Cruise mostra-se intenso e carismático como de costume, mas é a britânica Hayley Atwell quem rouba a cena, despejando charme e humor como uma ladra que acaba se envolvendo na missão da IMF. Ainda que a personagem de Atwell também seja uma repetição do mesmo tipo de arquétipo brilhantemente representado por Rebecca Ferguson, é inegável que sua presença garanta uma energia formidável ao projeto. Vale destacar também que Pom Klementieff faz um trabalho divertidíssimo como uma assassina de aluguel que constantemente persegue os heróis, compensando imensamente pelo fraquíssimo vilão principal vivido por Esai Morales.

Ainda que mantenha o nível de entretenimento e grande escala de seus anteriores, Missão: Impossível – Acerto de Contas Parte Um acende um alerta para a franquia da Paramount. Por mais que Tom Cruise permaneça esforçado, o esgotamento de fórmula e repetição de convenções começam a se tornar muito evidentes, e talvez não sobrem lugares altos o suficientes para Ethan Hunt poder saltar mais uma vez.

Missão: Impossível – Acerto de Contas Parte Um (Mission: Impossible – Dead Reckoning Part One, EUA – 2023)

Direção: Christopher McQuarrie
Roteiro: Christopher McQuarrie e Erik Jendresen
Elenco: Tom Cruise, Hayley Atwell, Rebecca Ferguson, Simon Pegg, Ving Rhames, Esai Morales, Pom Klementieff, Vanessa Kirby, Henry Czerny, Shea Whigham, Greg Tarzan Davis
Gênero: Ação
Duração: 163 min

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Sobre o autor

Lucas Nascimento

Estudante de audiovisual e apaixonado por cinema, usa este como grande professor e sonha em tornar seus sonhos realidade ou pelo menos se divertir na longa estrada da vida. De blockbusters a filmes de arte, aprecia o estilo e o trabalho de cineastas, atores e roteiristas, dos quais Stanley Kubrick e Alfred Hitchcock servem como maiores inspirações. Testemunhem, e nos encontramos em Valhalla.

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