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Crítica | Napoleão – É um épico vazio com a marca de Ridley Scott

A vida de Napoleão Bonaparte já foi objeto de inúmeras adaptações para a TV e o cinema. Sempre intrigou o público, e diretores como Stanley Kubrick tentaram abordar o tema em seus projetos. Entretanto, quem realmente se aventurou a levar a vida do líder francês para as telonas foi Ridley Scott, com o seu eficiente Napoleão.

No entanto, é válido afirmar que retratar a vida do líder militar francês no formato de um longa-metragem não é uma tarefa fácil. Bonaparte emergiu durante a Revolução Francesa, liderando uma intensa repressão durante as Guerras Revolucionárias Francesas, que clamavam pelo retorno da Monarquia à França. Esse é o principal desafio encontrado pela produção: contar uma história imensa de batalhas e política em poucas horas.

Contar a história completa de Napoleão em um filme de duas horas e meia é um feito árduo. Seria mais adequado trabalhar com uma duração superior a três horas ou concentrar-se em um período específico da vida de Bonaparte, como foi feito em A Queda! As Últimas Horas de Hitler (2004), que se concentra nos momentos finais antes da derrota de Hitler. No entanto, Ridley Scott optou por uma abordagem diferente, tentando abranger quase toda a vida militar de Napoleão e suas principais batalhas em um curto intervalo de tempo.

Um Bonaparte frio e sem carisma

A questão do tempo torna-se evidente em diversos momentos, como na passagem de Bonaparte pelo Egito, um período de grande destaque na história que, no filme, é apresentado em menos de dez minutos. O mesmo ocorre com a Batalha de Waterloo e sua ida à Ilha de Santa Helena, momentos marcantes em sua vida, mas que aqui parecem situações de curta duração. Isso, sem mencionar os cortes que evidenciam alterações na edição do longa, campanhas que claramente foram reduzidas a pequenos detalhes. Por ser uma co-produção entre a Sony e o serviço de streaming Apple TV+, é bem provável que tenha uma versão mais longa e que fique disponível no streaming.

Joaquin Phoenix dá vida a um Napoleão vazio, com o roteiro necessitando constantemente reforçar que aquele homem de estatura média era poderoso e ambicioso. O problema reside no fato de que Ridley Scott idealizou um personagem que não transmite a imagem de um homem cheio de poder. É difícil para o público aceitar a ideia de que aquele era o Napoleão que influenciou significativamente a Europa e almejava dominar todo o território por onde passava. Apesar de Joaquin Phoenix apresentar uma ótima atuação, não é, de longe, sua melhor performance, e isso não é culpa do ator, mas sim da direção frágil de Scott.

Quando jovem, Ridley Scott demonstrava muito mais ambição e criatividade do que na fase atual de sua carreira. Sua trajetória no audiovisual é marcada por altos e baixos, apresentando obras fantásticas como Gladiador (2000) e O Último Duelo (2021), mas também produzindo obras medíocres como Êxodo: Deuses e Reis (2014) e Casa Gucci (2021). Embora seja compreensível que o diretor desejasse criar um filme à altura do imperador francês, acabou se perdendo em sua própria ambição, incapaz de transmitir a ideia de que Bonaparte era um homem com uma loucura pessoal e uma busca incansável pelo poder.

Entre o amor e o poder

O roteiro, assinado por David Scarpa (Todo o Dinheiro do Mundo), opta por contar a história de Napoleão não a partir do ponto de vista do líder francês nos campos de batalha ou de sua rotina política, mas sim com foco no relacionamento de Bonaparte com Josephine Bonaparte (Vanessa Kirby). A ideia parece ser construir uma trama com teor dramático, onde Napoleão luta para manter acesa a paixão por Josephine, mesmo diante das traições da imperatriz. O casamento chega ao fim principalmente porque ela não lhe concede um herdeiro. A decisão de centralizar a narrativa no relacionamento entre os dois revela-se um equívoco, com Ridley Scott aparentemente sem saber qual caminho seguir, entre destacar o relacionamento ou as batalhas.

Cada vez que o filme parece abordar as batalhas do imperador francês ou mergulhar nas complexidades políticas do período, o retorno ao romance entre Napoleão e Josephine interrompe o ritmo, desconectando o espectador das sequências de ação e do contexto histórico. Essa alternância constante entre dois focos principais não apenas quebra a coesão narrativa, mas também pode diluir o impacto tanto das relações interpessoais quanto dos eventos históricos, deixando a audiência dividida entre as tramas. Essa falta de clareza na direção da narrativa prejudica a experiência do espectador, tornando a conexão emocional e a compreensão histórica mais desafiadoras.

Ao contrário de outros épicos dirigidos por Ridley Scott, como Gladiador, neste caso, o diretor opta por não destacar as grandes façanhas do imperador. Embora algumas batalhas e conflitos sejam apresentados, há uma distância entre a visão do diretor para o personagem e o que realmente é explorado na tela. Parece que Scott se interessa mais por questões secundárias do que pela profundidade do retrato do homem Napoleão, resultando em uma abordagem que subestima as conquistas épicas que poderiam ter sido mais enfaticamente representadas.

Napoleão de Ridley Scott funciona mais como uma caricatura do poder do que uma representação convincente e envolvente do líder francês. O filme se perde ao tentar ser mais um livro de história visualizado do que uma obra cinematográfica cativante. Com uma atmosfera sem graça e uma fotografia quase apática, a produção se torna um retrato desnecessário de Napoleão, que carece do impacto e da vitalidade necessários para destacar a complexidade do personagem. Em comparação com o épico de Abel Gance (1927), que é amplamente reconhecido como uma cinebiografia de qualidade sobre Napoleão, algo que não irá ocorrer com o Napoleão de Ridley Scott.

Napoleão (Napoleon, EUA – 2023)

Direção: Ridley Scott
Roteiro: David Scarpa
Elenco: Joaquin Phoenix, Vanessa Kirby, Tahar Rahim, Rupert Everett, Mark Bonnar, Paul Rhys, Ben Miles, Riana Duce, Ludivine Sagnier
Gênero: Ação, Aventura, Drama
Duração: 158 min

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Publicado por Gabriel Danius

Jornalista e cinéfilo de carteirinha amo nas horas vagas ler, jogar e assistir a jogos de futebol. Amo filmes que acrescentem algo de relevante e tragam uma mensagem interessante.

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