Lydia Tár (Cate Blanchett) é uma maestrina reconhecida mundialmente no meio da música erudita e está em seu auge em Tár. A regente se transforma ao segurar sua batuta, torna-se poderosa e onipotente, ditando com exatidão o ritmo da orquestra. Lydia leva para sua vida pessoal essa seriedade profissional em que dita as regras do jogo.
Escrito e dirigido por Todd Field, Tár, é sem dúvidas o melhor trabalho por trás das câmeras de Field, já que seus dois filmes anteriores, Pecados Íntimos (2006), que é bom dentro das possibilidades apresentadas, e Entre Quatro Paredes (2001), um drama maçante e bastante esquecível, em que Field já mostrava algumas qualidades que iria expor em Tár alguns anos adiante, como a fotografia fria e as boas técnicas de enquadramento.
Pode-se dizer que Tár é o grande trabalho da carreira de cineasta de Field, que volta a direção após 16 anos de um longo hiato. Um retorno um tanto quanto triunfante, em que traz uma história sobre obsessão e poder, em que a cada cena somos absorvidos mais e mais na rotina dos personagens, seus dramas particulares e no panorama que se encontram em suas carreiras e vidas pessoais, e principalmente, na trajetória sombria em que Lydia Tár vai caminhando e se inserindo rumo a uma trilha sem saída, em que apenas a música será a sua companhia.
O Declínio de Tár
É verdade que é um desafio acompanhar Tár em seus 158 min e também é uma realidade dizer que não é um longa para todos, pois, há algumas mensagens no longa que são complexas de serem compreendidas, isso além de contar com planos longos e diálogos extensos e exaustivos. Porém, Tár como produção surpreende ao fugir completamente do padrão hollywoodiano, e isso acontece justamente por não contar com as conhecidas reviravoltas manjadas que geralmente surgem no seu ato final das produções. Por isso, gera uma quebra de expectativas por parte do roteiro e que provavelmente o público não estivesse esperando que iria ocorrer.
Essa quebra de expectativa que com o roteiro de Field, fazendo com que Tár não necessite de plot twists para finalizar sua história, como, por exemplo, ocorre com os filmes sul-coreanos, é algo bastante elogiável. Tár em seu ato final, quando a protagonista cai em total desgraça pessoal, o roteiro permite que a personagem pegue o seu rumo sem que a trama crie um plano mirabolante para que Lydia saia daquela situação e recupere-se repentinamente, algo que certamente iria deixar parte do público até com a reação de pensar que aquilo fosse algo natural, já que usualmente essa virada na narrativa ocorre com frequência em diversas produções de vários gêneros distintos.
Esse toque de realidade que o roteiro nos proporciona espelha situações que se destacam na mídia e nas redes sociais atualmente, como a cultura do assédio e do cancelamento. Os personagens e as situações que estão envolvidos, principalmente Lydia Tár, e os sucessivos escândalos que vão surgindo, dão esse tom, primeiro com as descobertas de que Lydia estaria usando sua posição como regente para assediar outras alunas, e depois com o cancelamento pelas redes sociais com um vídeo que foi divulgado na “internet”, em que Tár confronta um aluno que não quer tocar Bach por achá-lo um velho branco e a artista tenta fazê-lo mudar de opinião. O roteiro de Field quer nos deixar claro nesses e em outros diálogos fascinantes como que ocorre o poder no mundo e quem o detém está no comando.
Cate Blanchett novamente magnífica
Falar de Cate Blanchett é uma tarefa fácil, isso porquê em sua carreira há muitos trabalhos que beiram a perfeição. Em O Aviador (2004) recebeu o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante por sua performance como Katharine Hepburn, enquanto que em Blue Jasmine (2013) convenceu a todos com outra elogiada interpretação e ganhou seu segundo Oscar, dessa vez na categoria de Melhor Atriz. É muito provável que Blanchett repita tal feito com seu papel em Tár e receba outro Oscar de Melhor Atriz.
A atuação de Blanchett se não é a melhor de sua carreira, pode-se dizer que é uma das mais imponentes. Lydia é uma mulher dura, em alguns momentos podem ser considerada até como uma pessoa severa, tem seu lado romântico, mas nada tira a sua força exterior, e Blanchett transpassa isso para o público em uma performance profunda e sincera e que deve lhe render seu terceiro Oscar.
Tár nos é levado a imaginar que é um thriller em alguns momentos, devido ao jeito que Field trabalha a trama. A fotografia é algo igualmente a ser elogiável, com um tom gelado que reflete a solidão da protagonista em um trabalho de composição magnífico do diretor de fotografia Florian Hoffmeister. Tár é uma produção deslumbrante, com seus altos e baixos e que não empolga na primeira hora de filme, mas que tem suas mensagens e com o andar da narrativa vão ganhando sentido e também vão ganhando o espectador.
Tár (Tár, EUA – 2022)
Direção: Todd Field
Roteiro: Todd Field
Elenco: Cate Blanchett, Noémie Merlant, Nina Hoss, Sophie Kauer, Adam Gopnik, Mark Strong, Sylvia Flote, Alec Baldwin
Gênero: Drama, Musical
Duração: 158 min