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“Ed & Lorraine Warren: Lugar Sombrio” traz relato mais visceral sobre o Exorcismo de Connecticut

Todos nós amamos uma boa história de fantasma, não é? Felizmente, vivemos uma nova era de resgate do horror elevando o gênero com obras de muita qualidade, principalmente no cinema. Com a “descoberta” da Warner com o casal Warren em Invocação do Mal, rapidamente os casos da carreira dos demonologistas viraram uma mina de ouro aguardando pacientemente ser descoberta.

Ainda sem uma adaptação na franquia cinematográfica da Warner (é especulado que o terceiro filme adapte essa história), a Editora Darkside trouxe um dos casos mais terríveis que os Warren já encaram em suas carreiras: o famigerado Exorcismo de Connecticut.

Previamente, a história fora adaptada pelo longa Evocando Espíritos, mas com diversas convenções narrativas para abrandar levemente a história triste da família Snedeker em sua maldita residência em Southington, Connecticut. Evidentemente, muita coisa foi alterada incluindo a completa remoção do envolvimento dos Warren.

Porém, com Ed & Lorraine Warren: Lugar Sombrio, finalmente temos um dos relatos mais fiéis aos acontecimentos que importunaram a vida família Snedeker por mais de um ano. Apesar de bem escrito com leitura muito fluída, Ray Garton, o romancista responsável em adaptar a história para os moldes da narrativa clássica da literatura, parece ignorar a curiosidade do leitor sobre o quanto daquilo que é descrito é realmente verídico.

Garton não se preocupa nem em estabelecer que o conteúdo do livro se trata de uma história real e tampouco oferece apêndices para explorar melhor certas passagens atribuladas. Porém, verdade seja dita, o livro é ótimo e um dos mais aterrorizantes que já li na vida. O autor tem um talento e estilo muito eficientes para contar a história. Ao contrário de 1977: Enfield, temos um livro com abordagem de romance. Ou seja, ele é e não é biográfico ao mesmo tempo, pois Garton escolhe trazer a história sob uma escrita convencional de ficção.

Logo, os acontecimentos se desenrolam com naturalidade, há arcos fechados, diferentes pontos de vista com protagonistas distintos entre os capítulos, além uma riqueza de detalhes e sentimentos que tornam o horror extremamente palpável para o leitor. Logo, a estrutura oferece um nítido desenvolvimento da história para que sintamos o escalonamento das atividades e da opressão que a família experimentou.

Além disso, o fator que mais elogio da escrita de Garton é que ela não é nada repetitiva – algo que infelizmente acontece com frequência no outro livro 1977: Enfield. Cada capítulo traz acontecimentos distintos e novas formas de assombrações. Apesar de detalhar bem as atividades, o autor decide resumir grandes passagens de tempo que não contaram com atividades distintas ou acontecimentos que já não são do conhecimento do leitor.

Enter the Devil

Somos apresentados à família Snedeker em um de seus piores momentos: a descoberta do linfoma de Hodgkin, um câncer de garganta, no filho mais velho do casal, Stephen, um pré-adolescente de 13 anos – é curioso notar que o nome de todos os menores de idade (na época) foram alterados no relato do livro (no total, são 6 alterações). Obrigados a viajar 270km diariamente para tratar a doença do menino, a família Snedeker decide se mudar para a cidade na qual estava o hospital do tratamento. Porém, na pressa e desespero, Carmen, matriarca da família, decide alugar o apartamento superior de uma casa colonial restaurada.

Ao visitar o lugar, Carmen se maravilhou com o tamanho e disposição dos quartos. Era um lugar perfeito e na faixa de preço que estava procurando. Ao ligar para o senhorio, porém, uma reviravolta acontece. O homem oferece apenas o apartamento inferior da casa que ela não tinha visitado na época. Desconfiada, mas também desesperada pela situação, acaba aceitando a oferta, afinal, o quão pior poderia ser?

E realmente era pior. Carmen e Al, seu marido, no dia da mudança, decidem dar uma inspecionada mais apurada no lugar visitando o gigantesco porão da casa. Ali, descobrem um fato desconcertante. No porão há diversos cômodos perturbadores, paredes manchadas de sangue, uma rampa de propósito nada agradável, além de uma maca presa a correntes com mecanismo de elevador… Sim, a casa que eles acabaram de alugar era uma antiga funerária. Bom, somente um detalhe meio mórbido, não é? Foi o que os Snedeker também pensaram. Até a vida deles se tornar um inferno.

Como esse é o melhor relato sobre o caso até então, fica difícil definir onde a imaginação de Ray Garton começa a interferir na veracidade dos fatos. Porém, a história dos Snedeker não poderia ser mais cinematográfica: uma mudança motivada por uma tragédia, uma família com diversas crianças e, ainda por cima, um pai ausente na maior parte da semana por conta do trabalho ainda ser em Nova Iorque. Logo, temos o cenário vulnerável perfeito.

No livro, os protagonistas mais importantes são Carmen e Stephen que, pelo menos até 2/3 da obra, representam lados contrastantes. Stephen é o menino mais sensitivo às assombrações desde o início da mudança, se sentindo desconfortável na casa, a taxando de maligna. Já Carmen e Al acham tudo aquilo uma instabilidade psicológica do filho por causa do tratamento do câncer.

Logo, rapidamente temos perfis irritantes e um ciclo de acontecimentos que enervam o leitor. Mesmo que os fatos não sejam repetitivos, o conflito é. Mesmo com diversas experimentações sobrenaturais que Stephen relata, Carmen e Al ignoram, além tratarem o garoto como um completo imbecil. Mesmo que a mãe também vivencie experiências desconcertantes como o chão sangrento da cozinha, a mulher não dá o braço a torcer e permanece desacreditando do menino.

Obviamente que isso gera uma ruptura profunda na relação familiar entre eles na qual Stephen sofre uma transformação radical e perfeitamente compreensível. Nos tornamos íntimos do menino conforme as assombrações se tornam mais invasivas, além do temperamento abusivo dos pais do garoto que passam a se tornar vilões da história. Digamos que o clichê da descrença dos adultos é levado ao extremo aqui, pois os dois presenciam elementos que já deveriam trazer atitudes para resolver o problema.

Porém, mesmo assim, os trechos sob o ponto de vista dos outros personagens também conseguem prender a leitura – principalmente os de Al. Obviamente, não cabe aqui mencionar tudo o que acontece, pois estragaria a maior graça do livro, mas há alguns problemas severos no meio do divertimento do texto.

Primeiro, Stephen acaba sumindo na metade do livro e nunca mais é mencionado apropriadamente de novo. Não há conclusão para ele nem mesmo em um epílogo – a verdade é que, 24 anos depois, o câncer retorna e ele morre. Com sua ausência, as assombrações se tornam ainda mais presentes e terríveis com diversas aparições e atos profanos que realmente assustam. O acontecimento mais famoso dessa história são os estupros e abusos sexuais que diversos membros da família sofreram na mão dos fantasmas e demônios. Então o interesse do leitor fica tão desperto que não sentimos um decréscimo na qualidade da narrativa.

Com isso, já estamos com apenas pouco mais de setenta páginas restantes do livro. E é somente aí que os Warren finalmente surgem na narrativa com seus pesquisadores e começam os trabalhos para enfim exorcizar a casa. Novamente, o relato é fascinante e muito poderoso, porém, assim que o clímax termina, o livro acaba.

Não há um epílogo, uma seção de entrevistas, uma contextualização, um apêndice com as informações sobre o que aconteceu com a família e a casa depois da nova mudança. Nada. O que certamente é decepcionante para o leitor depois de investir algumas horas na leitura. Também não existem registros fotográficos de nenhuma forma espalhados nas páginas, o que é uma verdadeira pena. Também é curioso notar que Garton falha miseravelmente em conseguir explicar a geografia da casa – algo compreensível já que ele só esteve uma vez no lugar. Isso acaba, porém, deixando a experiência ainda mais assustadora, pois não há como prever ou antecipar um refúgio naquela casa que se torna um verdadeiro labirinto.

Um Lugar Sombrio

Porém, mesmo com problemas tão aparentes e um final que deixe a desejar, a leitura de Ed & Lorraine Warren: Lugar Sombrio é uma das melhores para leitores ávidos por histórias de assombração e caos fantasmagórico. É um dos maiores casos dos Warren e Ray Garton torna toda a leitura extremamente fluida e rica para todos nós. É possível devorar o livro em apenas uma tarde de tão eficiente que é sua estrutura.

O curioso é que, na vida real, Ray Garton se tornou um grande inimigo da família Snedeker (também o modo que retrata Carmen e Al é realmente cruel) e até mesmo de Lorraine Warren. Você pode conferir o motivo no documentário abaixo que traz mais informações que Garton falhou em trazer no livro. Nessa grande guerra de versões e extrema confusão em trazer verdadeira luz aos acontecimentos, cabe apenas a crença do leitor decidir o que realmente é fantasia e realidade.

Mas uma coisa é certa: essa história te provocará calafrios.

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Publicado por Matheus Fragata

Editor-geral do Bastidores, formado em Cinema seguindo o sonho de me tornar Diretor de Fotografia. Sou apaixonado por filmes desde que nasci, além de ser fã inveterado do cinema silencioso e do grande mestre Hitchcock. Acredito no cinema contemporâneo, tenho fé em remakes e reboots, aposto em David Fincher e me divirto com as bobagens hollywoodianas.

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