Crítica | The Fame Monster - A Rendição ao Caos e ao Medo

Quando a década de 2000 estava chegando ao seu fim, o mundo desejava saber quem era Lady Gaga. Afinal, depois de marcar uma grande presença em 2008 com o lançamento de The Fame, a qual tornou-se uma das maiores estreias da história da música contemporânea, a crítica e o público estavam doidos para conhecer mais sobre seu background - afinal, tudo o que se dizia a respeito da cantora estadunidense não tinha base sólida: sabia-se sobre suas influências artísticas dos movimentos avant-garde, como Andy Warhol e a instauração do vigor pop art e o estilo transgressor da haute couture de Thierry Mougler. Mas era apenas isso. E seu primeiro álbum de estúdio apenas reforçou a assegurada imagem que tínhamos da artista, uma celebridade sedenta por suas próprias ambições e que tinha a capacidade de compreender as consequências de suas escolhas.

Entretanto, o que realmente podemos pensar de alguém que, repentinamente, abandona esses desejos para mergulhar nos mais profundos medos? Em uma terra governada pela saturação da autopreservação e da segurança, enfrentar aquilo que se mais teme é uma jogada perigosa, mas que requer coragem e equilíbrio psicológico. E é exatamente isso o que Gaga propõe com seu segundo disco, intitulado The Fame Monster - uma expansão muito bem arquitetada em relação ao primeiro, visto que a tradução “monstro” normalmente se refere àquilo que desconhecemos e que receamos.

O álbum se inicia com o medo mais puro e mais conhecido do ser humano - o medo do amor. Em Bad Romance, lead single do disco que recebeu inúmeros prêmios, a artista discorre sobre seus receios e seus anseios para um sentimento que lhe corrói cada vez mais. Conforme a narrativa segue, Gaga fala que ela quer se sentir amada, seja na tristeza ou na alegria, seja com todos os defeitos que seu par romântico tenha. Inclusive, é interessante notar como a letra da canção é visceral a ponto de chegar ao escatológico: desde que o interlocutor a quem se dirige mostre-se nu e cru, ela não se importa. Ela deseja amar, incondicionalmente, aquele que estiver disposto a aceitar uma relação de reciprocidade. Em uma batida que relembra os primórdios do synthpop, ainda acompanhado com a marca do electro de sua obra anterior, a composição musical atravessa uma progressão notável até explodir numa estrofe genialmente bem articulada.

Bad Romance é, sem dúvida, a faixa mais relembrada do disco, não apenas pela majestuosidade com a qual é composta, mas sim por suas referências. The Fame Monster é, muito mais que The Fame, uma jornada pelas fases da obsessão, agora do eu lírico por aqueles que lhe fascinam e lhe causam temor ao mesmo tempo. Suas alusões aos filmes de Alfred Hitchock, Psicose, Janela Indiscreta e Um Corpo que Cai (“I want your Psycho, your Vertigo shtick; while you’re on my Rear Window, baby it’s sick”), deixam claro que essa necessidade e essa fixação para com o outro é viciante e envolvente ao ponto de até mesmo funcionar como droga. E sua explicitação, ainda que choque, tem a capacidade de dialogar com qualquer pessoa que tenha passado pela mesma situação.

O frenético ritmo sofre uma brusca freada com Alejandro, uma continuação não-convencional e ao mesmo tempo compreensiva a compulsão amorosa: em uma arquitetura clássica, permeada ainda pelos acordes bruscos do teclado sintético, violinos surgem como pano de fundo para uma relação bem mais carnal. “Sei que somos jovens, e sei que você me amar. Mas não posso mais viver assim com você, Alejandro”: essa é a frase que abre uma poderosa canção sobre castidade, sexo, dominação e submissão. Aqui, Gaga é influenciada pelos homens que passaram pela sua vida, incluindo o personagem-título, que parecem forçá-la a entrar no inescapável círculo do prazer - e isso não apenas a deixa desconfortável, como ativa um gatilho de um passado conturbado e traumático envolvendo seu pai e sua inocência.

Monster, um título muito pertinente para a conjuntura do disco, é uma via de duas mãos e uma construção controversa interessante de ser analisada. Apesar da melodia suave e por vezes alegre, a narrativa fala sobre o medo dos homens. Constantemente referindo-se ao jovem pelo qual está apaixonada como “monstro”, Gaga compreende que ele tem um apetite voraz por seu corpo e até mesmo por sua mente (“Ele comeu meu coração, e comeu meu cérebro”). Uma associação que à prima vista parece boba, mas que esconde um desejo de controle acerca de uma pessoa: tê-la para si a qualquer custo, mesmo que isso signifique deixar as máscaras cair. Aqui, a batida techno permanece em um looping quase não perceptível e que, com os poderosos e ecoantes vocais da cantora, tornam-se agradáveis.

Apesar das investidas pessoais, a cantora conversa de forma generalizada com um público cuja principal característica é a fragmentação; uma personalidade marcada pelo bombardeio de tantas informações audiovisuais e literárias que fica difícil defini-lo com uma essência. E talvez essa construção, fruto de anos de experiências, seja ameaçada pelo medo à morte, reverenciada de forma trágica e melodiosa com Speechless, uma música que nos arremessa de volta para os anos 1980 e nos deixa presos em uma pequena cidade, solitários e à mercê de nossa própria ruína. E que melhor saída para a solidão que embriagar-se? Aparentemente nenhuma, visto que a suposta sequência para esse abandono emerge na deliciosa faixa So Happy I Could Die.

O segundo ápice do álbum vem com Telephone. A música é tão épica em seu sentido mais amplo que consegue transpassar por todos os acordes ao mesmo tempo em que traz uma história progressiva que acompanha todos os instrumentos e culmina em uma conclusão ainda mais emocionante e definitivamente satisfatória. A improvável continuação de Paparazzi não apenas remonta Gaga como a figura criminosa que faria de tudo para alcançar seus objetivos, mas também demonstra como ser controlada não é uma opção: ela deseja ser livre para fazer o que quiser, e não está sozinha para reafirmar seus ideias, visto que seu contralto mescla-se perfeitamente com a harmônica voz de Beyoncé.

Muitos podem considerar Teeth como a conclusão do álbum. Mas pessoalmente, digo que essa canção, apesar de envolvente nas primeiras batidas muito bem demarcadas, torna-se monótona - o que realmente a salva é sua letra, a qual gira ao redor de um momento de revelação e que conversa diretamente com o medo da verdade. Dance in the Dark, ao contrário, tem uma construção etérea, quase transcendental, adornada com os melhores componentes do synthpop e do techno house, bem como alguns despontes do glam: tudo para construir uma atmosfera emocionante caso prestemos atenção à narrativa, que tem como foco uma mulher que teme sua própria expressividade perante um relacionamento abusivo e controlador com alguém sem brilho e sem personalidade.

É inegável dizer que a persona por trás de Lady Gaga começa a dar às caras nesse corajoso retrato de seus traumas e receios. The Fame Monster é um claro avanço em sua carreira, que eleva seu nome para um patamar consideravelmente alto, além de dar abertura para novas e arriscadas tentativas que se provam dignas de aplausos.

Notas por faixa:

  • Bad Romance - 5/5
  • Alejandro - 4/5
  • Monster - 4/5
  • Speechless - 4,5/5
  • Dance in the Dark - 5/5
  • Telephone - 5/5
  • So Happy I Could Die - 4/5
  • Teeth - 3,5/5

The Fame Monster (Idem, EUA – 2009)

Gravadora: Interscope
Lead: Lady Gaga
Composição: Stefani Germanotta, Nadir Khayat, Nicolas Dresti, Beyoncé Knowles, Lazonate Franklin, Rodney Jenkins, LaShawn Daniels, Taja Riley, Fernando Garibay
Gênero: Pop, Electro Rock, Techno, Dance
Faixas: 08
Duração: 34 min.


Crítica | Fuller House - 3ª Temporada: Parte 1

Crítica | Fuller House - 3ª Temporada: Parte 1

Full House (ou como foi chamada no Brasil, Três É Demais) tornou-se uma sitcom de grande sucesso entre as décadas de 1980 e 1990, levando para casa alguns prêmios e lançando no mercado nomes que hoje são bem conhecidos - como por exemplo as gêmeas Mary-Kate e Ashley Olsen. Desse modo, o anúncio de que a maior parte do elenco original retornaria para um revival nem um pouco premeditado e que continuaria um legado de mais de trinta anos nas telinhas chamou a atenção de muita gente, incluindo as novas gerações, apaixonadas por séries de comédia, e fãs do seriado original - que definitivamente se tornaram os primeiros a correrem para a Netflix e sentirem um gostinho de nostalgia fantástico.

Já em seu terceiro ano, Fuller House não teve suas iterações anteriores recebidas de forma agradável pela crítica, principalmente por se apoiar muito nesse resgate narrativo e atmosférico em detrimento de uma construção realmente satisfatória e com um propósito. Felizmente, a nova temporada da série parece, ainda que em passos lentos, caminhar para um acerto tonal e que agrade até mesmo os mais céticos - ainda que haja alguns tropeços na primeira metade.

Depois de atravessar o ano letivo e passar pelas comemorações de fim ano, a família Fuller-Tanner-Gibbler finalmente encontra uma paz com a chegada das férias de verão. O primeiro capítulo, intitulado Best Summer Ever, parece ter sido extraído propositalmente de um rip-off de High School Musical 2, trazendo os personagens principais em um prólogo musical um tanto quanto assustador à prima vista, mas que se torna fofo e pelo menos assistível. A sequência na verdade parte dos sonhos do pequeno Max (Elias Harger), cuja personalidade culta dá margem para um relaxamento quase utópico, dentro do qual sua família está em perfeita harmonia e todos se divertem. E levando em consideração que ele é filho do meio da protagonista Donna Jo (a.k.a. DJ), interpretada pela veterana Candace Cameron Bure, a coisa fica um pouco mais cômica, visto que esse é um desejo que não vai se realizar.

A casa está cheia novamente, e parece que as relações um tanto quanto duvidosas dos anos anteriores foram reformuladas, endossadas e trabalhadas ao extremo. Agora, DJ e Stephanie (Jodie Sweetin) conseguiram resgatar os laços fraternais que carregaram na série original, transportando uma maturidade imprescindível para a conexão entre as personagens e o público às telinhas - e isso também emerge graças à reformulação estética do criador Jeff Franklin. Afinal, o padrão televisivo para as sitcoms fornecia uma estrutura imagética quase errada para a série, que tentava ser algo além de seu potencial; após perceber que Fuller House é, na verdade, bem semelhante a outras do gênero, o retorno para as origens foi uma jogada certeira, e os diretores por trás dos episódios resolveram basear-se no jogo de campo e contracampo como montagem, com leves inclinações para o diálogo entre planos gerais, médios e alguns raros close-ups.

O ponto alto da temporada é sem sombra de dúvida as tiradas cômicas, os punch lines e o desenvolvimento das subtramas entre os personagens. Diferentemente dos anos anteriores, os quais se preocuparam muito em criar uma explicação autossuficiente e nada sutil sobre o que aconteceu nesses últimos trinta anos, a série retornou com diálogos mais limpos e mais sarcásticos que adicionaram momentos de puro prazer, tanto para os atores e atrizes quanto para o público em si. DJ, Stephanie e Kimmy (Andrea Barber) mais uma vez roubam a cena em diversos momentos como o “trio lupino” e seus bordões e personalidades contraditórias. De uma forma bem mais agradável e com uma competência chocante, por falta de outro adjetivo, o modo metódico da personagem de Bure entra em constante choque com os outros dois extremos de sua casa: Sweetin é a encarnação da rebeldia e da “vida mansa”, enquanto Kimmy mostra-se criativa, avoada e pueril.

Não posso dizer que o show tem uma grande complexidade, ainda mais porque este não é o foco. Diferente de outras comédias e dramédias da televisão contemporânea - como Master of None, Orange is the New Black e até mesmo BoJack Horseman -, a preocupação não reside na arquitetura de irônicas políticas ou sociais que permitam a quem assista refletir sobre ações e consequências; partindo da premissa da iteração original, Fuller House tem como único objetivo o entretenimento barato e agradável aos olhos, transportando-nos para uma perspectiva não muito original sobre o subúrbio de São Francisco, entrando como uma mimésis para as inúmeras outras séries que seguem o mesmo padrão narrativo.

Entretanto, é preciso fazer uma menção à entrada de Landry Bender como a nova colega de estudos de Jackson (Michael Campion), Rocki. Filha de Gia (Marla Sokoloff), antiga “amiga” de DJ, a personagem é um estereótipo escolar visto em diversas obras cinematográficas e seriadas ambientadas num colégio, mas passa por uma transformação interessante de ser acompanhada ao conviver com a família Fuller e ser contagiada por sua constante alegria - uma “alegoria”, se é que podemos chamar assim, de como nós nos sentimos ao assistir aos novos episódios e acompanhar, sem quaisquer pretensões, uma série que pode ser caracterizada como fofa.

Apesar de sua superficialidade, os capítulos não são totalmente pautados no vazio narrativo. Em alguns poucos momentos, temos diálogos que merecem ser acompanhados e que dissertam, ainda que brevemente, sobre a passagem da infância para a adolescência, sobre o relacionamento conturbado entre pais e filhos e sobre a superação de obstáculos que antes pareciam intransponíveis - e aqui gostaria de fazer uma menção ao arco narrativo que fez parte da jornada de Ramona (Soni Bringas), que não apenas teve sua primeira desilusão amorosa, mas também foi a que entrou em um mundo completamente diferente do qual estava acostumado ao deixar-se levar pela própria vontade de crescer e se aproximar dos frágeis laços entre os pais separados.

Entre trancos e barrancos, a primeira parte da nova temporada de Fuller House finalmente abraça sua nostalgia de forma a não ser totalmente dependente dela, criando mais ramificações para seus personagens e entregando o que promete sem cair em pretensões criativas: episódios fofos, consistentes e que deixam um certo gostinho de quero mais - que pode ser muito bem saciado com outras séries medianas do gêneor.

Fuller House – 3ª Temporada: Parte 1 (Idem, 2017 – EUA)

Criado por: Jeff Franklin
Direção: Rich Correll, Jean Sagal, Jody Margolin Hahn
Roteiro: Jeff Franklin, Boyd Hale, Kellie Griffin, Maria A. Brown, Jerry Collins, Kate Spurgeon, Alisha Ketry, Bryan Behar
Elenco: Candace Cameron Bure, Jodie Sweetin, Andrea Barber, Michael Campion, Elias Harger, Soni Bringas, Dashiell Messitt, Fox Messitt, Juan Pablo di Pace, John Brotherton
Emissora: Netflix
Gênero: Comédia
Duração: 27 minutos

https://www.youtube.com/watch?v=446dbFQEFJU


Crítica | Orange Is the New Black - 5ª Temporada

Crítica | Orange Is the New Black - 5ª Temporada

CUIDADO: spoilers à frente. Siga à própria risca.

Desde sua estreia em 2013, Orange Is the New Black veio para ficar. A dramédia criada por Jenji Kohan tornou-se, em pouco tempo, uma das séries mais famosas da Netflix, principalmente por seu incrível, versátil e gigantesco elenco e por sua ousadia em se tratando de narrativa; afinal, a trama principal gira em torno de detentas da penitenciária de Litchfield e de suas não ortodoxas rotinas, as quais envolvem agressões físicas, advertências verbais - e agora rebeliões.

É um fato dizer que o quarto ano da série foi um dos mais impactantes na vida de todas as presidiárias, principalmente se levarmos em conta a morte de uma das personagens principais, Poussey Washington (Samira Wiley), pelas mãos de um dos guardas, indicando a clara rivalidade entre as duas “castas sociais” existentes naquele recinto e mostrando, de forma construtivamente delatora e reflexiva, a precariedade do sistema carcerário dos Estados Unidos - estendendo-se de forma antropológica para outros países. Com a emersão da violência policial frente às mulheres de Litchfield, as personagens decidem se unir em um motim que culmina em uma das maiores rebeliões do microcosmos seriado - e inclina-se para diversas referências da vida real.

Desde os primeiros anos de OITNB, fez-se necessário criar uma narrativa convincente e emocionante o suficiente para ofuscar a saturação de seus personagens, cujas subtramas e backstories fundiam-se em metáforas e simbologias muito interessantes para a conexão entre o público e as criações televisivas. Com os deslizes das temporadas anteriores, as quais tinham um enfoque desequilibrado em detrimento da contextualização geral que seguisse os passos de um arco bem delineado, a equipe criativa da série conseguiu juntar as peças faltantes e orquestrou uma ária à la Tiros em Columbine (1999), com direito à exploração do potencial faltante às mulheres protagonistas e à cronologia dos eventos, além da dosagem perfeita entre drama, suspense, comédia e ação.

A VINGANÇA É MINHA

Dê poder ao homem e verás quem ele é. Coloque-se no lugar de um grupo de prisioneiras cujos direitos humanos mais básicos são negados para a entrada de uma política muito mais dura e inadmissível. Agora, pense em todas as tensões raciais e sociais que ocorrem entre gangues dentro de uma penitenciária; misture tudo isso a um homicídio culposo que prova a impetuosidade com a qual os “superiores” tratam pessoas em reabilitação e o resultado é um barril de pólvora que já deveria ter explodido há muito tempo.

É exatamente isso o que acontece em Litchfield. Poussey tornou-se uma mártir, um símbolo para a revolução cujos ideais já maturavam nas mentes de algumas detentas. Em outras palavras, a imagem da personagem encarnada por Wiley é a principal engrenagem que move os clãs da prisão a se unirem contra uma força opressora e a organizar uma reviravolta no jogo tão grande que tem a capacidade de alcançar os mais altos patamares da mídia - seja ela sensacionalista ou não. É incrível como as nuances de roteiro conseguem transpassar os níveis essencialmente antropológicos para algo muito mais arquetípico, seja no funcionamento entre os diferentes núcleos da prisão, seja no que isso representa para o futuro de cada uma das personagens. Portanto, não é com bastante surpresa que Daya (Dascha Polanco) seja a primeira a se postar para tomar o revólver em mãos e marca o ápice de mudança da vida de todas. O que se torna inesperado é que ela realmente puxa o gatilho e atinge Humphrey (Michael Torpey) na perna.

A ação não poderia ser mais explícita ou clara: o modo como são tratadas culminou em um desespero por mudanças. É claro que a violência nunca é a melhor solução numa situação dessas, mas a complexidade da psique humana muitas vezes coloca as pessoas em uma queda livre em direção a instintos primitivos que negam o próprio conceito de sociedade, esquecendo-se de que estão lidando com outros seres humanos. E aqui não faço menção apenas à primeira sequência da quinta temporada, e sim a tudo a que as detentas de Litchfield foram submetidas pela crueldade e pela reafirmação constante de superioridade por parte de seus “comandantes”.

A partir daí, as cartas do jogo foram dadas e a única coisa que podemos fazer é aguardar o desenrolar da história. Os guardas são feitos de reféns e Caputo (Nick Sandow), apesar de ser o único a compartilhar do sentimento revoltante de abandono das prisioneiras, é levado junto como representação máxima das coercitivas atitudes de uma instituição falida frente aos considerados “estorvos da sociedade”. E o sentimento de união logo se dilui, à medida em que grupos específicos tentam tomar o controle para si, impondo métodos que consideram mais eficazes para manter a estruturação da rebelião e obrigar as autoridades responsáveis - ou seja, o governo - a concordar com as demandas exigidas.

Em suma, temos alguns lados da história nos sendo apresentados através dos treze episódios da quinta temporada: o primeiro, e talvez o mais importante, vem na figura de Taystee (Danielle Brooks), a principal organizadora do motim e uma das personagens mais bem construídas da gama de OITNB. Suas nuances de personalidade invadem os campos racionais e emocionais do ser humano em momentos eximiamente estruturados, começando com o crescente ódio e a vontade pela mudança que lhe invade com a morte da melhor amiga. Depois da tempestade, a calmaria vem com suas sutis inclinações diplomáticas, permitindo que ela e outras detentas - Cindy (Adrienne C. Moore), Alison (Amanda Stephen) e Janae (Vicky Jeudy) - organizem uma lista de melhorias dentro de Litchfield e vá ao encontro da própria Constituição dos direitos humanos.

O embate entre o que é certo e o que é justo é constante neste novo ano, e seja de modo hilário ou trágico, cada um dos beats é de extrema importância para a continuação e a evolução tanto da trama quanto do cenário que nos é apresentado. É um fato dizer que a penitenciária já teve seus dias de glória e agora não passa de um complexo rural para contenção de corpos. Não, não podemos nem dizer que essa ambiência comporta humanos, justamente por seus responsáveis deixarem-na chegar ao ponto que enxergamos. Conforma os episódios vão seguindo, percebemos que o anseio pelas melhoras deixa a maioria das prisioneiras à beira de um ataque de nervos - e isso é evidenciado principalmente com Red (Kate Mulgrew) e Blanca (Laura Gómez), as quais buscam nas drogas um refúgio da situação em que vivem para fazer justiça com as próprias mãos.

Apesar do tom irônico e sarcástico das personagens, cuja caracterização visual contrasta com sua rebuscada mentalidade e diálogos tão cômicos quanto metafóricos, percebemos que OITNB tem uma grande inspiração em clássicos da literatura e do cinema para entregar à crescente gama de fãs um produto satisfatório e estimulante. Conforme a prisão se transforma em uma versão modernizada de O Senhor das Moscas (1954), seja com o retorno de seres humanos ao primitivismo e à barbárie, seja com a constante segregação justiceira que se apossa das gangues - e isso também é “engraçado” de certa forma, visto que a união de brancos e latinos ascende apenas para separá-los do que consideram inferiores ou indignos.

ATTICA 2.0

A revolta na penitenciária de Attica foi um dos eventos de maior importância e emergência social que ocorreu em solo estadunidense na década de 1970, equiparando-se até mesmo ao massacre do complexo de Carandiru aqui no Brasil. A rebelião se iniciou dentro dos guetos da prisão e espalhou-se para todos os detentos, os quais uniram forças para exigir melhor tratamento, melhores cuidados médicos, reestruturação da equipe de segurança e melhores condições de vida para os presidiários negros e latinos, os quais eram tratados como animais. Apesar da pacificidade do motim e a inclusão de reféns para que suas propostas fossem analisadas com maior cuidado, Attica durou apenas quatro dias e foi brutalmente contida pela força policial, com um resultado de 43 mortos (sendo 32 deles detentos) e uma comoção generalizada sobre a lastimável conclusão.

Em Litchfield, as coisas seguem pelo mesmo caminho. Natalie Figueroa (Alysia Reiner), ex-diretora, acaba fazendo sua incrível reentrada na série como porta-voz do governador para iniciar as negociações com as detentas, representando a camada superficial e capitalista da organicidade econômico-social, enquanto Taystee e Caputo são encarnações defensoras daquilo que é melhor para não apenas a sobrevivência, e sim a vivência em comunidade dos que sofrem. Apesar dos breves momentos de pacificidade, as demandas das prisioneiras incluem a punição do responsável pela morte de Poussey e parecem ofuscar todas as outras necessidades básicas - educação, saúde, trabalho e afins -, e, após a libertação dos reféns, não se vê mais a necessidade de estender o contrato de paz.

Desse modo, é claro perceber o desfecho das presidiárias: a equipe da SWAT invade Litchfield, leva todas presas sem um pingo de compaixão e traz um futuro ainda mais incerto para personagens com as quais nos conectamos nesses últimos quatro anos, separando duplas que traziam tanta química para a cena que não podemos deixar de sentir o coração apertar ao vê-las se afastando. A queda da prisão é o símbolo mais ativo da decadência do sistema carcerário, e até mesmo o incêndio que se inicia nos minutos finais discorre sobre como nada será como antes e que não se sabe mais o que esperar: não há esperança, não há conclusões; só podemos nos apoiar no fato de que elas ainda estão vivas.

O brilho de OITNB vem justamente com sua capacidade de oscilar entre uma configuração mais ampla e uma perspectiva mais intimista e pessoal. Para tanto, em contraposição ao motim de Litchfield, temos os desenvolvimentos de relações afetivas entre outras detentas, e aqui faço um parêntese para as protagonistas mais constantes da série, Alex (Laura Prepon) e Piper (Taylor Schilling). Neste ponto, o público está familiarizado com suas histórias conturbadas e uma irritante indecisão sobre como proceder, ou seja, se elas devem ficar juntas ou separadas. Após entrarem numa montanha-russa de sentimentos, o casal se firma como um dos mais promissores e, juntas, passam por um processo de amadurecimento que viola as leis das comédias românticas para a adição de camadas mais complexas e interessantes, incluindo a participação direta na revolta e a oposição de ideais e valores que ora as afastam, ora as aglutina.

Nicky (Natasha Lyonne) e Lorna (Yael Stone) também fazem parte de um círculo mais fechado, e suas personalidades muito distintas criam um microcosmo a ser ovacionado de diversos ângulos. Nicky está em uma luta interminável contra sua inclinação para as drogas ao mesmo tempo em que tenta esconder seus crescentes sentimentos pela colega. Enquanto isso, Lorna cria em sua cabeça uma visão perfeita de sua vida quando finalmente sair de Litchfield, apesar de deixar sua fluidez levar-lhe para outros lugares - inclusive para os braços de uma de suas amigas mais antigas lá dentro. As coisas atingem uma tensão preocupante quando descobre estar grávida de seu marido Vince (John Magaro) e ser tachada de louca pela impossibilidade daquilo ter acontecido. Junte tudo com o fato de que as duas “trabalham” na enfermaria da penitenciária e... Bom, já podemos imaginar que a relação entre ambas é baseada tanto em momentos cômicos quanto em trágicos.

Sem sombra de dúvida, o maior mérito vem com a capacidade do roteiro e da montagem da série deixarem um pequeno espaço de tempo entre os acontecimentos se transformar em uma jornada quase transcendental para as personagens principais. Primeiro, precisamos entender que a quinta temporada tem o grande diferencial de ser cronologicamente menor que as outras, estendendo-se ao longo de apenas três dias. Sim, exatamente isso: os episódios abrangem uma trinca de vinte e quatro horas justamente para poder explorar mais as relações entre as detentas, o desenvolvimento das arquitramas e até mesmo como a mídia e as forças-armadas lidaram com uma situação caótica. O potencial da série é explorado em seu máximo, principalmente se levarmos em consideração o uso de flashbacks para explanar atitudes um tanto quanto estranhas, a priori.

PROBLEMAS NO JARDIM DO ÉDEN

Um dos melhores episódios da temporada é intitulado The Reverse Midas Touch, dirigido por Prepon. Neste momento da narrativa, temos o combate físico entre Red e Piscatella (Brad William Henke). Esse guarda sempre foi um dos personagens mais antagônicos de toda a série, desde sua entrada no ano passado, e emergiu como a personalidade mais dura e impiedosa de todas. Seus métodos de controle variavam desde tortura psicológica até física, colocando as presidiárias em patamares de subjugação para reafirmar a superioridade social entre os diferentes grupos. Após a tomada de Litchfield, Piscatella ficou longe da situação e transformou-se em um corpo impotente, mostrando um lado frágil.

Mas assim que consegue encontrar um modo de entrar na prisão, vai em busca da velha ruiva que ousou lhe desrespeitar, raptando sua família e colocando todas como a audiência para as atrocidades que tinha em mente, as quais se estenderam para humilhação e descaso extremos. A contextualização fica ainda mais dramática e pesada para alguns telespectadores justamente por harmonizar, em termos narrativos, com o passado deste personagem tão irreverente às concepções humanas, mas ainda assim tão verdadeiro para com seus valores autoritários. Descobrimos que Piscatella é, na verdade, gay, e teve um breve caso com um dos presidiários de outro complexo carcerário no qual trabalhou até que outros detentos estupraram-no e o deixaram em um estado de deterioração inenarrável. A partir daí, o guarda tornou-se um ser essencialmente formado pelo ódio, buscando a justiça que não encontrou para aquele que amava e canalizando suas frustrações para as mulheres de Litchfield.

O episódio é tão sensível e simbólico que facilmente entra para um dos grandes momentos de toda a série, arquitetando uma belíssima análise do comportamento humano e como alguém pode se tornar cego pelos traumas que outrora teve - e menciono apenas Piscatella, e sim todas as participantes dessa sequência de tortura que nos puxa memórias de obras audiovisuais ambientadas na II Guerra Mundial e até em narrativas mais contemporâneas.

UNIDAS VENCEREMOS

Orange Is the New Black não se tornou uma das melhores e mais populares séries da Netflix por qualquer razão. Além de quebrar padrões de gênero e de narrativa com seus incríveis e muito bem estruturados personagens, suas histórias emocionantes e sua capacidade de colocar detalhes pontuais que permita a um público diferenciado se conectar nos mais diferentes níveis com o que lhes é apresentado.

Afinal, este show é sobre pessoas. É essencialmente humano e não se resvale de artifícios fantasiosos ou científicos como base para os acontecimentos, e sim finca-se nas relações humanas, ainda que num ambiente inesperado, e como elas se tornam imprescindíveis para o amadurecimento não só individual, como também comunitário.

Orange Is the New Black – 5ª Temporada (Idem, 2017 – EUA)

Criado por: Jenji Kohan
Baseado em: Orange is the New Black: My Year in a Women's Prison, de Piper Kerman

Direção: Andrew McCarthy, Phil Abraham, Constantine Makris, Uta Briesewitz, Mark A. Burley, Jesse Peretz, Erin Feeley, Laura Prepon, Nick Sandow
Roteiro: Jordan Harrison, Tara Herrmann, Anthony Natoli, Josh Koenigsberg, Rebecca Angelo, Lauren Schuker Blum
Elenco: Taylor Schilling, Laura Prepon, Nick Sandow, Kate Mulgrew, Taryn Manning, Uzo Aduba, Danielle Brooks, Adrienne C. Moore, Dascha Polanco, Selenis Levya, Lea DeLaria, Natasha Lyonne, Yael Stone
Emissora: Netflix
Gênero: Comédia
Duração: 60 minutos


Crítica | Unbreakable Kimmy Schmidt - 3ª Temporada

Crítica | Unbreakable Kimmy Schmidt - 3ª Temporada

A crescente demanda por obras originais colocou a gigante do serviço de streaming Netflix à mercê de preencher seu catálogo com produções muito parecidas e definitivamente fora do padrão que costumava entregar há alguns anos. Dentre suas recentes adições, podemos citar a emersão de comédias escrachadas como Santa Clarita Diet ou autobiografias livremente adaptadas como Girlboss - e ambas deram indícios de uma possível decadência da companhia. Felizmente, Tina FeyRobert Carlock, resgatando sua grande experiência nos meios cômicos, conseguiram resgatar esse potencial perdido ao nos entregar uma ótima temporada da série Unbreakable Kimmy Schmidt.

Primeiramente, preciso falar de como Fey e Carlock possuem uma mão quase endeusada para criar personagens adoráveis e que perpassem por todas as facetas do ser humano, oscilando entre escolher o que é certo e o que é justo, ou então divagando sobre as angústias do que poderia ser ou ter sido. Aqui, a protagonista é a personagem-título Kimmy, interpretada pela amável Ellie Kemper, e sua importância não poderia estar mais clara: desde a temporada de estreia, ela encarna e se deixa levar pelas irreverências que todos nós gostaríamos de ter, mas que é martirizada pelos valores tradicionalistas da sociedade em que vivemos. Seu arquétipo é baseado justamente naquilo que a maioria das pessoas condena: uma personalidade questionadora, otimista e autossuficiente das maneiras menos convencionais possíveis.

E no terceiro ano da série, Kimmy continua sua jornada de autodescobrimento dentro da comunidade nova-iorquina, tentando se encaixar em algum nicho urbano à medida em que percebe que não precisa deste respaldo para continuar autêntica. Afinal, como já sabemos, ela passou quinze anos encarcerada em um bunker pelo Reverendo Richard Wayne Gary Wayner (Jon Hamm), como parte de um culto religioso que visava à salvação pós-apocalíptica. Desse modo, ela foi extremamente influenciada por uma ética submissiva e que até hoje traz corolários para sua compreensão do mundo: muitos podem pensar que ela permanece no âmbito pueril da construção identitária, mas, na verdade, sua "ignorância" provém de uma plasticidade abstrata que, contraditoriamente, é o que a torna independente de qualquer um.

Já no primeiro capítulo, Kimmy Gets Divorced?!, a protagonista se vê num dilema entre fechar ou não o acordo de divórcio entre ela e o Reverendo - um dos ganchos da temporada anterior e que nos fez entrar num choque catártico. A partir daí, percebemos o desenrolar da história enquanto outros personagens começam a influenciá-la a fazer a coisa "certa" - cuja perspectiva subjetiva varia de um para outro. Jacqueline (Jane Krakowski) é a primeira a fazer sua jogada, mostrando a Kimmy que ela deve estar no controle e fazê-lo pagar por tudo o que passou no bunker - e o resultado não poderia ter sido outro: sequência extremamente cômicas perduram durante os trinta minutos de episódio e que culminam numa virada um tanto quanto maniqueísta, mas com uma funcionalidade incrível.

Unbreakable Kimmy Schmidt traz, numa análise mais profunda, arquétipos e estereótipos da própria commedia dell'arte, surgida na Itália no início do século XVI. Inicialmente emergindo como apenas uma delimitação entre o teatro amador e o profissional, a commedia é base ainda para a criação de diversos produtos audiovisuais contemporâneos - e aqui temos um claro exemplo de como vertentes históricas ainda têm muito a contar para nós, mesmo que de forma transgredida. Kimmy é a personificação multidimensional do chamado arlecchino, ou seja, o escape de toda a obra cujo arco tragicômico é pautado na impossibilidade narrativa. Mas ao mesmo tempo, esse cru conceito da Renascença europeia é adornada com elementos da jornada do herói que a colocam em diversos momentos de ressurreição e epifania, contribuindo para a complexidade de sua própria presença.

Jacqueline, inicialmente fincada às raízes dos pantalones, ou seja, da personificação do avarento e do pão-duro que se preocupa apenas com o dinheiro, é uma das personagens que mais evoluiu na série inteira: antes, era vista como a grande vilã da história, responsável por tudo aquilo que Kimmy sempre repudiou, mas que estaria constantemente marcando sua vida; em meados da segunda temporada, ela passa por uma transição e mergulha em um âmbito cultural que a permite retornar às raízes indígenas, renegando o próprio afastamento da família e permitindo-lhe criar um vínculo com a militância preservativa. Ela é sim uma socialite e diversas vezes entra em um embate existencialista e cômico com uma de suas arqui-inimigas, Deirdre Robespierre (Anna Camp), mas, diferente de outros ao seu redor, traz nuances muito bem delineadas para a telinha.

Entretanto, várias vezes o foco da cena é roubado pela simples presença calada de Titus Andromedon. Tituss Burgess, o ator que dá vida a tal personagem, é, sem sombra de dúvida, uma das personalidades mais versáteis do mundo do entretenimento nos dias de hoje. Resgatando elementos de sua criação teatral e expondo seu alcance vocal com inúmeras referências musicais, Titus se tornou o arquétipo de guardião imperfeito que, ao mesmo tempo em que cuida de Kimmy, não pode deixar de cair nos próprios erros e defeitos - como o egoísmo e a megalomania -, trazendo ainda mais graça para as sequências. Em Kimmy's Roommate Lemonades, o personagem se vê num crescente arco de tensão originado pela descoberta da traição de Mike (Mike Carlsen), seu namorado, enquanto ele esteve trabalhando em um cruzeiro - e, para se vingar, ele traz à tona uma versão inconvencional e apaixonante de Beyoncé, reproduzindo, ao seu estilo, vários dos clipes que a cantora fez para seu mais recente álbum, Lemonade.

Aproveitando o comentário, é necessário dizer que as referências em Unbreakable são pertinentes aos assuntos tratados e transformam as narrativas e suas subtramas em algo atemporal e que atravessa a barreira cronológica imposta por nós mesmos. Seja realizando um breve crossover entre esta série e Orange is the New Black (outra comédia original Netflix) ou então fazendo uma breve homenagem à trilogia de ficção científica De Volta para o Futuro, tudo funciona perfeitamente, como as engrenagens de um relógio: a irreverência é o principal material com o qual se brinca aqui, e o time criativo da série faz questão de, através de diálogos autoexplicativos, exteriorizar monólogos interiores para mostrar a inconstância da psique humana.

Cada capítulo traz sua própria mensagem para ser passada, como se as iterações fossem pequenas fábulas: carregadas de metáforas cômicas e, quando compiladas, transformadas em um manual de morais a serem teoricamente seguidas para aqueles "perdidos na vida". E é claro que isso não poderia acontecer sem um elenco de apoio - e as aparições nesta terceira temporada são simplesmente fantásticas. Temos, como exemplo, Laura Dern interpretando uma advogada psicótica e iludida que surge como a arma do Reverendo para que Kimmy ceda à assinatura do divórcio, permitindo que os dois se casam; Maya Rudolph, abandonando seus trejeitos escrachados das comédias pastelões, entra num círculo back to basics para dar vida a uma versão demoníaca da cantora Dionne Warwick, cuja relação com Titus é inimaginável.

Definitivamente os ápices de convidados especiais se concentram nas cenas entre Artie (Peter Riegert) e Lilian (Carol Kane). Artie Goodman é um empresário símbolo do capitalismo da "gentrificação" tão odiada por Lilian desde a primeira temporada - e, como bem diz o ditado, os opostos se atraem. Após passarem diversos capítulos em um embate político sobre o que é melhor e o que é certo para a comunidade em que vivem, os dois desenvolvem laços românticos que ultrapassam os próprios conceitos amorosos que tanto vemos em obras audiovisuais; em outras palavras, a relação entre ambos é tudo, menos clichê.

Os temas-base encontram um caminho de grande exploração em Unbreakable. Os episódios convergem para uma arquitrama principal, mas à medida em que novos personagens vão surgindo, outras vertentes são exploradas com objetivo da autorreflexão - e, ao contrário do que poderíamos imaginar, nada é infantilizado ou escrachado, e sim elevado a um nível de transgressão que transforma os acontecimentos em situações inverossímeis e, ao mesmo tempo, passíveis de maior compreensão pelo público.

A terceira temporada de uma das melhores séries do serviço de streaming é um presente entregue a tempo de salvar seu catálogo original. Oscilando entre drama e comédia com grande maestria, não podemos deixar de nos emocionar com as viradas - e esperar quietamente para o retorno de Kimmy, Titus, Jacqueline, Lilian e os outros.

Unbreakable Kimmy Schmidt – 3ª Temporada (Idem, 2017 - EUA)

Criado por: Tina Fey, Robert Carlock
Direção: Tristram Shapeero, Michael Engler, Beth McCarthy-Miller, Jeff Richmond, Ken Whittingham e outros
Roteiro: Robert Carlock, Tina Fey, Sam Means, Dan Rubin, Meredith Scardino, Allison Silverman e outros
Elenco: Ellie Kemper, Tituss Burgess, Jane Krakowski, Carol Kane, Sara Chase, Lauren Adams, Sol Miranda, Jon Hamm, Laura Dern, Amy Sedaris, Anna Camp, Mike Carlsen
Emissora: Netflix
Gênero: Comédia
Duração: 30 minutos


Crítica | House of Cards - 5ª Temporada

Crítica | House of Cards - 5ª Temporada

CUIDADO: spoilers no texto.

Há algo de brilhante e de duvidoso sobre a nova temporada de House of Cards.

Desde seu terceiro ano, uma das séries mais densas e mais emocionantes da plataforma de streaming Netflix começou a depender demais da situação política contemporânea para criar uma base narrativa para seus personagens. É claro que, para uma produção audiovisual deste porte, a fidelidade para com o mundo real é essencialmente necessária a se atingir a verossimilhança e manter o público conectado, ainda que seja da maneira mais ínfima, com suas criações. Entretanto, é um fato dizer que o brilho do show começou a desgastar e a ser apagado gradativamente, mesmo que seu incrível roteiro continuasse extraindo reações condizentes à atmosfera criada.

E agora, depois de uma quarta temporada relativamente monótona e que colocou em cheque a premissa de House of CardsBeau Willimon e seu time criativo conseguiu resgatar quase completamente o motivo instigador e exploratório que permitiu nos apaixonarmos pela simples feição dúbia e demoníaca do casal Underwood. Logo no primeiro episódio, percebemos que o clima na Casa Branca vai de mal a pior: a guerra contra o terrorismo - mais precisamente contra o grupo ICO -, e cujo tema sempre teve grande presença contraditório na Câmara e no Senado norte-americanos, transformou-se em um debate caloroso e individualista que se alastrou para a clara disputa de poder das duas chapas, a republicana e a democrática.

Frank Underwood não poderia estar fora dos holofotes. E durante uma sequência caótica, cuja construção amorfa gradativamente ganhou uma identidade belíssima composta por planos assiduamente simétricos, deixa que seus colegas e inimigos mantenham o tenso clima até que ganhe a possibilidade da retórica para mais uma vez entregar-se aos seus princípios irrevogáveis. O protagonista é encarnado por Kevin Spacey, e sua notoriedade e versatilidade tanto no cinema quanto na televisão mais uma vez se provam indiscutíveis: as sutilezas nas feições e nos gestos "patrióticos" sugerem uma inclinação para a compreensão social, mas seus solilóquios traduzem o que ele realmente deseja.

Seus objetivos e aspirações já são conhecidos desde o episódio piloto: ele foi traído, então se vê na total liberdade deliberativa de destruir aqueles que se opuseram à linearidade do destino para fazer exatamente a mesma coisa. Mas a construção de tal personagem o torna cego frente aos obstáculos, colocando-o num patamar de superioridade que é constantemente ratificado por seus trajes e pela imponência superficial de seus bens materiais - seja a casa de governador, o carro que usa ou até mesmo a quantidade absurda de seguranças que cercam seus conhecidos para mantê-lo longe do perigo (ainda que o perigo seja ele mesmo).

O quinto ano de House of Cards tem grandes referências a acontecimentos políticos tanto dos Estados Unidos quanto de outros países. A proposta de marketing para esta temporada criou uma dialética metalinguística para a situação brasileira no ano de 2016, além de conseguir casar harmonicamente diversas vertentes governamentais para um mesmo canal: as pessoas são cruéis e não se limitam aos próprios valores para conseguirem o que querem. Frank deixou isso bem claro em diversos momentos da trama - quando matou um cachorro para "livrá-lo do sofrimento", quando trouxe a vida de Zoe (Kate Mara) ao fim para "impedi-la de cometer erros" ou quando permitiu que o grupo terrorista supracitado tirasse a vida de um soldado americano para "um bem maior". Este é o incidente incitante do Chapter 53, o qual assombrará as decisões do presidente e de seu concorrente até os momentos finais.

O pano de fundo são as eleições presidenciais de 2016. Após a tentativa acobertada de golpe feita pelo casal principal, a qual tirou Garrett Walker (Michael Gill) do "posto supremo", outros disputantes emergiram - agora nas feições de Will e Hannah Conway (Joel KinnamanDominique McElligott, respectivamente), representantes do partido republicano. Apesar de constantemente ofuscados pela química dos Underwood, os dois trazem consigo uma ameaça endossada e muito bem arquitetada, seja no carisma do concorrente a presidência dos Estados Unidos ou na ingenuidade forjada da "futura" primeira-dama. Com os ataques reveladores sobre as ações de Frank e seu próprio partido virando-lhe as costas, a primeira metade da temporada pode ser considerada quase previsível. Quase.

O grande lance da disputa entre dois candidatos diferentes busca elementos de luta até mesmo em se tratando de idade. Durante várias sequências, personagens secundários discorrem sobre Will representar a modernidade e Francis ainda carregar ideais conservadores, ainda que dentro de um partido considerado liberal, para a teoria e a prática. Já aqui percebemos os primeiros deslizes da série, os quais, como supracitado, vêm acontecendo há algum tempo: o drama político, passível de reverenciar ironicamente o modo de agir dos próprios governantes estadunidenses, deixou-se levar por uma vertente tresloucada e impossível.

Em Chapter 57, marcando a divisão entre os períodos abordados na narrativa, é quase egocêntrico, por assim dizer, por se levar tão a sério. Há tempos que House of Cards tornou-se uma brincadeira entre trâmites e acontecimentos surreais para garantir a profundidade de seus personagens - e não estou fazendo uma crítica negativa para a série, muito pelo contrário. É necessário que o público, ou parte dele, perca a ignorância de que está vendo uma recontação da realidade. Disse alguns parágrafos acima que a verossimilhança é a base, mas só; as perscrutações, as relações coadjuvantes e os tramas paralelas mantém-se no mundo ficcional e criam um microcosmos digno de ovações, justamente por parecer real.

Ora, Frank consegue fechar uma zona eleitoral inteira e adia o resultado das eleições presidenciais para benefício partidário, incitando a população aos ares de uma nova "guerra civil". Not My President (Não É o Meu Presidente) é a frase que mais vemos em tela - e em alguns momentos, o protagonista decide enfrentá-los de forma pacífica. Isso não é nenhuma novidade, principalmente para aqueles que já conhecem os métodos não-ortodoxos da figura política para tratar seus oponentes, deixando-os sem reação e garantindo-lhe mais poder - ainda que seja o mais subjetivo possível. E é claro que não podemos deixar de lado a responsável por tudo isso acontecer: a sórdida e extremamente eficaz mente de Claire Underwood (personificada pela perfeita delineação de Robin Wright).

Claire é uma peça a ser examinada com cuidado. Sua inexpressividade blasé pode ser confundida, a priori, com uma falta de personalidade, submetendo-se ao poder masculino que há séculos controla o governo estadunidense. Mas por trás da fidelidade ao seu marido e às roupas impecáveis - constantemente adornadas por tons neutros ou mais escuros, provocando-lhe uma sensação de ambiguidade -, ela possui suas próprias aspirações. Ainda que não verbalize com frequência, principalmente se levarmos em consideração que a série parte da perspectiva de Frank, Claire tem um apreço pela política que vai além da de seu marido: em Chapter 58, após tensões políticas mais uma vez tomarem conta do cenário principal, ela sobe ao cargo de presidente interina.

Nem mesmo a imparcialidade mais dura poderia tirar o brilho de seus olhos ao ter o controle de uma nação inteira nas mãos. E já posso adiantar que esse gostinho pelo poder a tira dos trilhos, fazendo menção aos dois capítulos finais. Wright faz um incrível trabalho como a personagem e mostra seu tato impecável para a direção tomando a cadeira principal de Chapter 6465. Seguindo o padrão dos capítulos anteriores, ela opta por planos centralizados, entrando em uma divergência idealista com os diálogos entre personagens - todos fincados em barris de pólvora prestes a explodir. E é então que, nos momentos finais de um dos melhores arcos do ano, ela resolve mostrar sua onipotência e quebrar a quarta parede, roubando o protagonismo de Spacey de modo inefável.

House of Cards, ainda que tenha entregue uma temporada melhor que suas anteriores, ainda traz alguns deslizes complicados. Além da sobrenaturalidade de eventos, explanada anteriormente, as criações secundárias a habitarem as paredes da Casa Branca mantém-se num nível de submissão um tanto quanto monótono: até mesmo Doug Stamper (Michael Kelly) e Leann Harvey (Neve Campbell), braços-direito dos Underwood, são peões trabalhando em função de outros. Eles não são lineares, mas beiram uma desenvoltura quase ínfima, se compararmos seus arcos atuais com a do quarto ano, por exemplo: apesar dos poucos momentos de glória e de autoaceitação, eles continuam temendo a implacabilidade de seus "chefes", principalmente se levarmos em conta o passado sangrento que têm.

Até mesmo os "vilões" dos protagonistas abandonam seus postos de seriedade e se tornam cômicos. Will definitivamente é o escape a encarnação dos momentos mais pueris da quinta temporada. Não pude deixar de soltar alguns risos ao vê-lo perder a eleição e transformar-se num adolescente mimado que tinha como único objetivo atacar seus adversários. Em uma das sequências mais cruas, o personagem de Kinnaman participa de uma reunião com a Black Caucus, tentando convencê-los a apoiá-los com argumentos mais rasos que um prato de comida vazio. Sua personalidade mais robusta e severa entra em choque com os participantes afro-americanos do caucus e o tacham como racista - e com razão. A relação com a mulher Hannah passa de utópica para desastrosa em questão de pouquíssimo tempo, e mesmo assim traz mais comicidade para um ambiente essencialmente dramático.

Ainda não se sabe se House of Cards terá seu legado interrompido ou se a jornada dos Underwood terá um fim digno. Os deslizes ainda existem, mas conseguem ser ofuscados brevemente pela competência surreal de seu elenco; o que precisamos fazer é manter a consciência de que a série não é um espelho da sociedade, e sim uma convergência de estilos narrativos que tangem a ficção, entregando-a de forma convincente e satisfatória e com um season finale que, apesar de ser esperado, consegue nos manter deliberantes quanto ao que pode acontecer agora.

House of Cards – 5ª Temporada (Idem, 2017 – EUA)

Criado por: Beau Willimon
Baseado em: House of Cards, de Michael Dobbs

Direção: Robin Wright, Agnieszka Holland, Alik Shakarov, Roxann Dawson, Daniel Minahan, Michael Morris
Roteiro: Andrew Davies, Michael Dobbs, Laura Eason, Bill Kennedy, Tian Jun Gu, John Mankiewicz, Melissa James Gibson, Frank Pugliese, Kenneth Lin
Elenco: Kevin Spacey, Robin Wright, Michael Kelly, Derek Cecil, Neve Campbell, Jayne Atkinson, Joel Kinnaman, Dominique McElligott
Emissora: Netflix
Gênero: Drama político
Duração: 60 minutos


Crítica | Sense8 - 1ª Temporada

Crítica | Sense8 - 1ª Temporada

Definitivamente Sense8 é o trabalho de um esteta. Seja em sua criação, na paleta de cores, na narrativa e na composição das cenas. As irmãs Wachowski, desde trabalhos predecessores como o clássico neo-noir Matrix ou a épica jornada contemplativa A Viagem, sempre valorizaram originalidade na indústria do audiovisual e, apesar de alguns trabalhos deixarem a desejar, não podemos negar que os conceitos com os quais mexem oscilam entre o mundano e o profano, entre o socialmente aceito e o tabu.

A história gira em torno de oito estranhos, vivendo vidas diferentes em cidades diferentes, com dramas pessoais diferentes. Eles nunca se viram - e provavelmente nem sabem da existência um do outro. Mas de repente, após sermos apresentados a uma sequência muito bem construída onde uma mulher,  no centro de uma igreja, decide finalmente puxar o gatilho da arma que carrega e acabar com um sofrimento visível, aparece para todos (não sabemos se ela se teletransporta ou se ela se conecta). E a partir do incidente incitante da série, as coisas ficam mais interessantes.

Acontece que esta mulher, chamada Angelica (Daryl Hannah) se matou por causa de uma corporação vilanesca que desejava entrar em sua mente e conseguir dominá-la, bem como encontrar estas oito pessoas. Todos estão correndo um grave perigo desde o momento em que nasceram, mas não sabem disso. Nem nós sabemos. À medida em que conhecemos cada um dos protagonistas, vamos absorvendo seus dilemas existenciais e nos surpreendemos quando, por exemplo, um astro do cinema mexicano pisca e se vê cara a cara com uma empresária sul-coreana, ou quando um policial do gueto de Chicago se apaixona por uma DJ islandesa. E esse é apenas o princípio. Estes indivíduos são conhecidos como sensates, justamente pela capacidade psíquica de se conectarem a outros semelhantes.

Este parágrafo talvez seja o melhor que posso escrever para explicar a característica principal da série. Primeiramente, deve-se entender que Sense8 cria uma mitologia do nada - e este é um trabalho deliberadamente complicado; pois além do fato de se vincular à verossimilhança de outros trabalhos que explorem as capacidades sobre-humanas de um indivíduo, ela tem que ser construída de forma a envolver o público, sem cansá-lo ou deixá-lo confuso. É claro que, no início, dúvidas surgem para todos os lados. Esta é uma temporada, em seu cerne, de apresentação: há muito a ser explicado, a escolha de divagar sobre cada uma das subtramas num ritmo não tão acelerado, mas dinâmico, foi um acerto em cheio tanto por parte das irmãs quanto por parte de J. Michael Straczynski (Babylon 5), também criador do show.

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O cenário é imersível, disso não posso discordar. A simples decisão de criar uma vasta mitologia que envolve a arquitetação de regras e mundos novos é animadora. Até mesmo a transgressão dessas leis é algo a ser planejado com cuidado. Mas a série é tão crua - no sentido de faltar algumas lapidações principalmente para o entendimento de conceitos próprios - que alguns de seus fundamentos são complexos de digerir. Leva tempo até os detalhes serem apreendidos, sobre o que está acontecendo e o que isso significa para as pessoas envolvidas. 

Esta crueza da qual falei vem também das técnicas utilizadas para a concretização da série. O roteiro de cada um dos doze episódios foi escrito antes mesmo das gravações começarem para que possíveis furos fossem ajeitados e varridos para debaixo do tapete. Mas estamos falando aqui de oito subtramas individuais e uma arquitrama principal, e nem todos os deslizes poderiam ter sido impedidos, principalmente no tocante de comunicação entre os personagens e suas ambientações existirem em cenários remotos. A maioria destas sequências se resume aos atores aparecendo em cenas, sem realmente entender quem mais pode vê-los e até que ponto eles conseguem interagir com outras pessoas. A priori, podemos entender estes acontecimentos como arquétipos da consciência que tanto vemos em obras de animação, por exemplo, mas o simbolismo e a ideia vai muito além disso. Eventualmente as regras se mostram detalhadas, mas isso também dá margem para a série cair nos próprios erros.

A compreensão não é fácil - fator que eleva o nível da série bastante. Sense8 traz muitos ideais metafísicos e psicológicos para criar um cenário entendível, estando em aversão constante a diálogos superexpositivos e sequências banais, a ponto de suspeitarmos que a série se baseia em intrigas e confusões para nos envolver. Jonas (uma muito bem-vinda presença de Naveen Andrews) é a embocadura primária que explica o que é ser um sensate, mas o personagem poderia ter sido melhor explorado. Seu potencial é inefável e, depois de um breve momento de insight no segundo episódio - coisa que, dentro deste mundo, ocorre de forma rápida - temos uma explosão narrativa que culmina em What's Going On? (Episódio 04).

O que realmente funciona e ofusca os deslizes é que, neste ponto da história, os personagens constroem uma conexão muito forte com o público, mostrando-se tão confusos quanto nós e se perguntando o porquê de tudo aquilo estar acontecendo.

A série é essencialmente verborrágica. Como primeira temporada, creio que esta saída tenha sido a mais coerente. Somos primeiramente apresentados a todos os backgrounds possíveis, aos protagonistas e antagonistas, aos heróis e vilões - livres do maniqueísmo que costuma acompanhar narrativas deste tipo - às viradas e aos beats, para enfim culminar no clímax principal. Os futuros anos de Sense8 terão mais tempo para se adaptar ao que promete, mas isso não significa que não seja emocionante. Temos algumas sequências de ação que realmente usam e abusam da premissa principal, principalmente a que ocorre no oitavo capítulo, intitulado We Will All Be Judged by the Courage of Our Hearts. A cena é construída quase perfeitamente, trazendo-nos surpresa e felicidade ao mesmo tempo: dado ao que está acontecendo - uma fuga em alta velocidade - não é possível considerá-la uma obra-prima do gênero quando comparada a outras, mas este não é o foco. A catarse ocorre pelo fato dos personagens sensates estarem em harmonia, todos cooperando e trabalhando junto, colocando em prática suas habilidades e trazendo, pela primeira vez, equilíbrio a um cenário caótico.

O ritmo aqui é um problema, infelizmente. E por vezes, os episódios destoam entre si e podem causar um cansaço no público. Mas como o tempo aqui é destinado para os personagens e para diálogos existencialistas sobre seus temores, seus pesadelos e seus sonhos, tudo - ou pelo menos a maior parte - é justificável. Os protagonistas têm o tempo necessário para se relacionarem e para criarem laços inquebrantáveis com o público e entre si, tudo pincelado com temas de cunho social, alguns até considerados tabus. É interessante citar que Sense8 é uma das poucas séries cujo elenco é diversificado ao extremo, principalmente no tocante à comunidade LGBTQ, a qual entre em peso na série.

Sense8 é uma série com um incrível potencial. Talvez sua primeira temporada tenha pecado quanto ao tempo de duração de apresentação dos personagens e de sua mitologia, mas, como supracitado, os deslizes são justificáveis. Assim como os protagonistas, estamos gradativamente absorvendo as brechas e as tramas que envolvem cada um deles. E só podemos esperar que todo este material bruto encontre uma lapidação digna daquilo que promete - quem sabe no próximo ano as coisas não atinjam o ápice?


Crítica | Scream Queens - 1ª Temporada

Crítica | Scream Queens - 1ª Temporada

A ideia inicial da série surgiu a partir de uma encomenda feito pelo próprio canal FX. Ryan Murphy, criador e roteirista de American Horror Story (2011), decidiu estruturar a história nos moldes da antologia em questão, mas não transformando-a em uma. Desse modo, da mistura satírica de Meninas Malvadas (2004) e Sexta-Feira Treze (1980), surgiu Scream Queens (2015).

Ambientando em um cenário propício para "atividades de serial killers" - a Wallace University -, cujas instalações ficam na cidade conhecida pela ocorrência extrema de eventos sobrenaturais, Nova Orleans, Scream Queens conta uma história além do tempo: inicia em um aposento claustrofóbico, no qual Sophia está dando a luz a um bebê. Logo depois, quatro de suas amigas - Amy, Coco, Mandy e Bethany - aparecem. Mas ao invés de ajudá-la, a culpam por estragar a festa. Sophia, por sua vez, permanece dentro de uma banheira, esperando o evento acabar, mas acaba morrendo de hemorragia.

Vinte anos depois, um grupo de patricinhas está para escolher as novas calouras de sua irmandade - Kappa Kappa Tau. A gangue é liderada pela impiedosa Chanel Oberlin (Emma Roberts) e suas "minions" - Chanel #2, Chanel #3 e Chanel #5. Através de uma intervenção da reitora Cathy Munsch (Jamie Lee Curtis), são obrigadas a aceitar quaisquer novos membros que desejarem aderir aos ideais infernais propagados pela irmandade. Vale lembrar que Munsch estava presente no trágico evento que culminou com a morte de Sophie e, por essa razão, culpa a própria existência da KKT por todos os males que existem no mundo. Nesse meio-tempo, um serial killer que traja o uniforme do mascote da universidade arquiteta um plano de vingança que tem como objetivo principal destruir toda e qualquer existência da irmandade em questão.

Além dos personagens já apresentados, temos também a presença de Grace Gardner (Skyler Samuels), Zayday Williams (Keke Palmer) e Hester Ulrich (Lea Michele), além das outras pledges. Todas as suas personagens representam a quebra do paradigma fútil e "cor-de-rosa" que toma conta da KKT. Representam, a priori, as alegorias do benfazer - mas a "sacada" da série é oscilar entre essas duas ideias antagônicas.

A série em si vincula-se à ideia de sátira justamente por trazer ao patamar do ridículo e do grotesco as vertentes em que se fixaram nos gêneros de terror e perseguição: o roteiro de cada um dos episódios é propositalmente escancarado. Clichês como "uma garota morreu aqui. Agora a casa é assombrada" e diálogos autoexplicativos são a base para que a série torne-se uma divertida aventura à la Agatha Christie - obviamente com um toque de ironia.

Murphy diz que desejava trabalhar em algo que se parecesse com a história O Caso dos Dez Negrinhos, em que ao menos um membro do elenco seria assassinado pelo Demônio Vermelho por episódio, além de fornecer pistas ao público que o levariam a decifrar os mistérios envolvidos na universidades antes da season finale.

A homenagem à antologia que criou é claramente perceptível: ângulos ambíguos, cortes bruscos e uma trilha sonora angustiante adornam o ambiente de Scream Queens do mesmo modo que American Horror Story. Em diversos momentos de epifania dos personagens, as técnicas de slow motion contribuem para o entendimento da série e como cada uma das tramas se entrelaçam umas às outras, favorecendo a ideia satírica - como por exemplo o passado sombrio de Munsch, os segredos obscuros de Chanel #3 e as mentiras que se escondem por trás da "vida perfeita" de Grace.

O entrosamento do elenco é outro aspecto a ser analisado. Roberts e Samuels já haviam trabalhado com Murphy em American Horror Story - esta apenas na quarta temporada (Freakshow) e aquela a partir da terceira (Coven). Desse modo, aceitaram logo de cara a proposta feita pelo diretor. Além disso, Roberts provou na quarta continuação da franquia Pânico (2011) que lida bem com papéis de vilã - Chanel, apesar de não fazer parte de nenhum dos extremos, é a perfeita simbologia da "falsa redenção". Seu arco se desenvolve em reconhecimentos de seus atos humilhantes para com as colegas, pedidos de perdão e retorno ao zero.

Curtis, filha da scream queen original - Janet Leigh (Psicose) - e protagonista na série de filmes Halloween (1978), tornou-se a atriz perfeita para viver o papel da sociopata reitora, cujo passado transparece em suas feições e cujo significado faz-se entendível desde o primeiro episódio: Munsch está lá para acabar com as meninas da KKT e manter sua reputação - e nada, nem ninguém ficará em seu caminho. Todas as pessoas com as quais se relaciona possuem um objetivo, senão de glorificá-la, então de fornecer a ela informações cruciais para que coloque seu plano em prática.

A escolha do restante do elenco foi bem peculiar e a princípio duvidosa, principalmente pelas aparições especiais de Ariana Grande - estrela das séries infanto-juvenis Sam e Cat e Victorious, da Nickelodeon - e Nick Jonas - ex-astro popstar da Disney e ator da franquia Camp Rock e da série Jonas. Entretanto, as personalidades de seus personagens e suas próprias caricaturas contribuíram para a criação de personalidade da série. Grande é protagonista do primeiro assassinato, e escancara de forma tragicômica os clichês do gênero de horror. Jonas parece infantilizado à primeira vista, mas está envolvido em um plot twist digno de Murphy e suas criações bizarras.

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Palmer e Michele também caem como uma luva nos trâmites desenvolvidos na série. Palmer - também estrela da Nickelodeon pela série "True Jackson - representa uma personificação de personagens literários como Hercule Poirot, Miss Marple e Sherlock Holmes. Trabalhando ao lado de Grace, têm o objetivo de transformar a irmandade em um ambiente melhor e mais acolhedor e carregam consigo a premissa do "justiça antes de tudo". Entretanto, oscilam entre o bem e o mal quando se deparam frente a frente com seus ideais trazendo aquilo contra o que lutaram para suas vidas.

Michele, conhecida pelo papel de Rachel Berry na série Glee - criada também por Ryan Murphy - entrega-se no papel da psicótica Hester, a qual transita o tempo todo entre a sanidade e a loucura, trazendo para a irmandade um estado paradoxal de caos e liberdade.

Apesar do título fazer alusão às eternas personagens das "donzelas em perigo" de filmes de terror e aos serial killers imortalizados como Jason Vorhees, Freddy Krueger e Michael Myers, optar pela ideia tragicômica foi o que me interessou mais a continuar acompanhando a série. Easter eggs de cenas famosas - como a cena do banheiro no filme supracitado Psicose - são recorrentes.

Logo, espere sim uma ideia no estilo American Horror Story. Mas completamente às avessas.


Crítica | The Crown - 1ª Temporada

Crítica | The Crown - 1ª Temporada

A história da realeza britânica sempre foi alvo da dramatização, tanto televisiva quanto cinematográfica - quando falamos da indústria audiovisual, obviamente. Em O Discurso do Rei, filme ganhador do Oscar em 2011, fomos apresentados à história de vida do Rei George VI, cuja gagueira foi um dos fatores principais que o deixaram perturbados quanto ao exercimento de sua função, levando-o a contratar um terapeuta australiano para ajudá-lo. Em Downton Abbey, série ganhadora do Emmy, o foco é transferido para a fictícia família aristocrata de Yorkshire, perpassando por diversas épocas. Mas garanto que nenhuma produção equiparou-se à qualidade da produção mais cara do serviço de streaming Netflix, The Crown.

"Pesada sempre se encontra a frente coroada", já dizia William Shakespeare em sua obra, Henrique IV - Parte II. E é justamente isso que o criador Peter Morgan faz ao relatar as duas primeiras décadas do reinado de uma das monarcas mais contraditórias da história da família real inglesa, Elizabeth II. Funcionando como um retrato detalhista da vida da rainha, a série se inicia com uma cena de densidade e construção impecáveis: o rei George II (aqui interpretado por Jared Harris) cuspindo sangue dentro de um vaso, à beira de deixar uma tuberculosa sem precedentes agravar as condições de sua saúde.

Os dez primeiros episódios de um total de seis temporadas - cujo elenco irá mudar para acompanhar o envelhecimento das personagens reais - foca sempre pressa em como a súbita morte do pai afetou drasticamente a vida da outrora conhecida como Princesa Elizabeth (vivida pela incrível Claire Foy). O foco aqui não é a história e o decoro de nomes de cidades, palácios, emendas constitucionais e leis jurídicas. O retrato intimista da família Windsor vem com o objetivo de humanizá-los e mostrar como até entre quatro paredes fortificadas de mármore as coisas não vão sempre como o esperado. Claro, muitos podem classificar os dilemas dos protagonistas como "problemas de primeiro mundo", mas tal constatação seria errônea: a análise percorre os reais acontecimentos dentro do Palácio de Buckingham em correlação exata aos eventos da própria Inglaterra - nada mais que a apresentação de uma história biográfica qualquer.

E por que a escolha de Elizabeth como protagonista? Bom, porque o seu reinado transpassou entre um dos momentos mais delicados e espinhosos da história britânica, com mudanças sociais e um progresso absurdo cujos alvos permaneceram sobre o casamento e o divórcio, dois assuntos considerados tabus e de importância inefável principalmente para a Igreja, cuja relação com o Estado já estava sofrendo com divergência de opiniões. E para nos aproximar dos reais participantes de tais acontecimentos, a montagem, cuja estilização foi feita principalmente por Stephen Daldry, um dos showrunners e produtor executivo de The Crown, optando por planos mais fechados e íntimos, aproximando o público das reais pessoas e nos fazendo nos apaixonar pelos arcos e pelas backstories de cada um.

Considerando a imponência das paisagens das ilhas do Reino Unido, obviamente os episódios não perderiam chance de divagar entre as tênues linhas da arquitetura gótica, que se estendem até as planícies litorâneas e misturam-se com um mar cinzento e pincelado por nuvens tão bem delineadas que chegam a ser artísticas. Mas diferentemente da representação publicitária de tais cenários, os diretores optam pela metáfora e pelo principal objetivo de transmitir ao público a pequenez de indivíduos idolatrados frente à majestosidade natural e artificial do progresso.

O ponto de maior sucesso aqui é o elenco, sem sombra de dúvida. Enquanto Foy porta-se como uma sósia da própria monarca, seu comportamento tanto na vida profissional quanto na pessoal a forçam a assumir uma vertente, colocando-a dentro de responsabilidades reais e que não deixam margem em nenhum momento para a fraqueza. Entretanto, através de seus olhos, é possível notarmos que ela não queria ser Rainha, e que as consequências dessa brusca mudança estão apenas começando. Matt Smith, interpretando Phillip, o Duque de Edimburgo e marido de Elizabeth, oscila de forma aplausível entre o par compreensível e o marinheiro sonhador, lutando para aceitar seu papel subserviente dentro de uma vida de subjugamento feminino e de uma sociedade machista. O ator recusa-se a mergulhar totalmente no âmbito antagonista, permitindo que seja amado e odiado com a mesma frequência. John Lithgow também se excede no papel de Winston Churchill, encarnando-se de forma tão exímia que podemos dizer que ele esteve presente dentro do Palácio e foi o jovem aprendiz do Primeiro-Ministro. Sua performance, talvez, seja a melhor da série ao roubar o conceito mecanizado atribuído à figura público e tornando-o apaixonadamente humano.

Tudo isso é combinado com uma direção de arte impecável, que preza pela riqueza e pela ostentação e que sutilmente transforma uma paleta de cores duras por uma mais pastel, mostrando que Elizabeth gradativamente cedeu ao cargo de monarca absoluta e agora faz parte de uma geração inteira de reis e rainhas, os quais reafirmam um conceito milenar. Sua condição como Princesa brilha, enquanto seu "fardo" como Rainha chama tons mais azulados e arroxeados. A trilha sonora, composta por Hans Zimmer, casa perfeitamente com as escolhas estilísticas ao entrar com um papel catalisador - apesar de nos forçar a tomar certar posições em alguns momentos.

É interessante notar aqui que os dez episódios da primeira temporada foram assinador por Morgan, prevenindo assim quaisquer furos e garantindo uma fluidez maior de diálogos e viradas. Como o criador já estava acostumado à ambientação e aos acontecimentos da família real - presente em trabalhos anteriores como A Rainha The Audience -, as sequências mais densas foram atenuadas de forma a prender a atenção do público e garantir uma fidelidade para o próximo episódio. 

The Crown é uma relíquia a ser admirada - e mal posso esperar para os próximos acontecimentos do reinado de Elizabeth II


Primeiras Impressões | WandaVision é uma audaciosa e irreverente aventura da Marvel

Depois de meses de espera, WandaVision estreou na plataforma do Disney+ e entregou tudo o que os fãs mais queriam. Elizabeth Olsen e Paul Bettany, reprisando seus papéis como Wanda Maximoff/Feiticeira Escarlate e Visão, respectivamente, expandem o Universo Cinemático Marvel através de uma produção diferente de tudo o que imaginávamos e que foge às calcadas fórmulas dos filmes de super-heróis da companhia – que já vinham dando ares de cansaço há algum tempo, sendo revitalizadas com brevidade pelo grandioso evento de Vingadores: Ultimato.

A série carrega uma importância gigantesca para o futuro do panteão do entretenimento, por insurgir como o capítulo inicial da quarta fase do MCU e preparar o terreno para o aguardado Doutor Estranho no Multiverso da Loucura. O show, carregado com maestria pela química dos dois protagonistas, não é apenas uma ode às clássicas sitcoms televisivas dos anos 1950 e 1960, mas uma proposital amálgama anacrônica que não vê diferença entre as épocas e constrói um cosmos único, guiado por mistérios que se escondem nas sombras e por quebras de expectativa dinâmicas e hilárias. Os dois primeiros capítulos definitivamente dão o tom do que pode vir a ser uma das melhores produções do ano, seja por sua irreverência, seja por sua nostalgia distorcida que condiz com a própria personalidade de seus personagens.

A verdade é que Wanda sempre foi uma construção diferente das meras incursões maniqueístas do gênero mencionado acima. Fazendo sua estreia em Vingadores: Era de Ultron através de aparições interessantes, ainda que superficiais demais, a poderosa heroína, dotada de capacidades destrutivas e remodeladoras inenarráveis, passou por profundos traumas que culminaram na perda do amor de sua vida, Visão, e em uma explosão de energia que viria a descarrilar a cronologia dos múltiplos universos como a conhecemos hoje. É por isso motivo que o show vem com grande surpresa: Visão nos deu adeus ainda em Ultimato e, ao que tudo indica, está de volta. Mas como? E por quanto tempo? Wanda tem noção de que aquilo que presencia não é a realidade? Ou será que precisará de uma forcinha para perceber que algumas coisas estão bem erradas?

A atmosfera híbrida de comédia e suspense é um dos grandes pontos altos dos dois primeiros episódios. A direção de Matt Shakman se afasta da epilepsia de ação de obras similares e aposta em uma simples e funcionou característica já vista em I Love Lucy ou A Feiticeira, que servem de principal inspiração para o decorrer dos capítulos. A caracterização multifacetada dos protagonistas e dos coadjuvantes é primorosa por suas bem-vindas desavenças: Olsen, Bettany e Kathryn Hahn (aqui interpretando a espalhafatosa vizinha Agnes), são as forças que guiam o funcionamento estranho e convidativo de Westview, uma cidade suburbana aportada em tradições sociais que estão prestes a mudar. Afinal, Wanda e Visão não são “mundanos”, por assim dizer, mas criaturas evoluídas que desejam, mais que tudo, se misturar àqueles que farão parte de seu convívio.

É interessante e engraçado ver de que forma dois personagens desse calibre se contentam com a normalidade de tarefas como cozinhar um jantar ou ir ao trabalho ou participar de um concurso de talentos para arrecadar fundos à escola local. As ideias por trás da mente de Jac Schaeffer, criador e showrunner, são traduzidas em um panorama nostálgico ao extremo, que faz ótimo uso das afetações cinquentistas da televisão hollywoodiana, como a redundante trilha sonora, os diálogos supervalorizados e as cândidas e simplistas sacadas cômicas que exigem o protagonismo de uma plateia invisível. O flerte com a quebra da quarta parede é um momentâneo sopro de originalidade que pavimenta o caminho trilhado pelos heróis e que prevê um gigantesco obstáculo antagônico surgindo no horizonte – e que começa a dar suas caras através de “falhas” da matriz (como um rádio dessintonizado, um helicóptero de brinquedo caindo no jardim do casal ou a presença de cores em um espaço preto e branco).

A elegância artística da série é reafirmada pelos exageros obrigatórios do gênero que resolve emular. Eventualmente, a progressão familiar e previsível é atenuada com certas sequências bizarras, que provavelmente dialogam com o desequilíbrio mental de Wanda, que rege os fundamentos básicos de algo que criou do princípio e que talhou como refúgio axiomático. Nos momentos finais do segundo episódio, por exemplo, em face a uma ameaça que a levaria de volta para a realidade, ela retoma controle e diz para si mesma que nada poderá tirar o que lhe pertence por direito: uma chance de ter o que lhe foi negado por muito tempo.

É certo dizer que as escolhas para WandaVision não devem agradar parte do público, ainda mais para aqueles que esperavam mais um produto simplório da Marvel Studios. Estamos lidando com uma exploração metafísica e relativamente reflexiva de uma psique em desordem, em um estado caótico que prenuncia o fim do universo como o conhecemos; a coesão e a coerência narrativas existem em certo âmbito, mas são pinceladas por uma loucura inexplicável - e intrínseca à personalidade de seus carismáticos personagens. Wanda é a rainha de sua própria verdade, seja para o bem ou para o mal – e não importando quais serão as consequências disso tudo.

WandaVision (Idem, Estados Unidos – 2021)

Criado por: Jay Schaeffer
Direção: Matt Shakman
Roteiro: Jay Schaeffer, Gretchen Enders
Elenco: Elizabeth Olsen, Paul Bettany, Kathryn Hahn, Teyonah Parris, Debra Jo Rupp, Fred Melamed, Emma Caulfield Ford
Emissora: Disney+
Episódios: 09
Gênero: Comédia, Suspense
Duração: 30 min.

https://www.youtube.com/watch?v=sj9J2ecsSpo