Volta e meia temos mais e mais inovações tecnológicas sendo lançadas por diversas empresas. Os celulares foram os aparelhos que tiveram maior salto em relação a qualidade de inovação até chegar a seu auge com a possibilidade de filmar vídeos em alta resolução. Dessa forma Steven Soderbergh (Contágio) decidiu filmar Distúrbio inteiramente com um Iphone Plus. Foi uma ótima ideia usar um celular para fazer o filme, já que o processo de filmagem fica muito mais ágil dando maior mobilidade sem precisar usar câmeras pesadas, além de ter maior facilidade para trabalhar enquadramentos e jogadas de câmeras.
Em Distúrbio acompanhamos a protagonista Sawyer Valentini (Claire Foy), uma mulher que convive com o trauma de ser perseguida por um assediador. Sem querer, em uma sessão com sua psicoterapeuta e sem perceber acaba assinando papéis sem ler e é trancafiada em uma clínica de reabilitação contra sua vontade. Lá seus pesadelos mal começaram, descobre que o homem (Joshua Leonard) que a assedia começou a trabalhar na mesma clínica que está sendo tratada.
Steven Soderbergh toca no tema do assédio sem precisar forçar nas ações do homem para nos mostrar como tal ato é sim bastante cruel para quem é vítima dele. Joshua Leonard é um rapaz calmo e que ninguém imaginaria ser capaz de perseguir uma mulher até as últimas consequências, seja na casa de Sawyer, em seu local de trabalho, ou nesse caso conseguindo um emprego na clínica apenas para continuar a assediando. É angustiante a situação da protagonista e esse é o principal mérito do filme, em nos apresentar esta situação problemática em que Sawyer se envolve com a perversão de seu assediador. Lembra bastante Um Estranho no Ninho com Jack Nicholson, em que um homem normal é levado a um hospício por praticar atos que a sociedade considerava errados.
Além de debater o tema do assédio Soderbergh também trata do sistema de saúde americano. Sawyer ao ser presa na clínica de reabilitação contra sua vontade, sem acesso a um advogado e sem ter como escapar. A clínica faz isso com o intuito de receber mais dinheiro do seguro-saúde da empresa empregadora de cada paciente. Não há aprofundamento sobre o tema, ele é apenas jogado para dar uma justificativa do porque ela sofre tantos abusos lá e do porque está presa.
Há uma tentativa em dar um tom dramático e tenso para a produção, mas essa tentativa se esvai com o tempo em que o homem está na clínica, o diretor demora em nos mostrar do que ele é capaz e vai criando a situação de forma lenta, construindo o terror e o suspense que virá pela frente. Até o homem começar a agir há um trabalho bem feito sobre quem seria ele e porque fazia tudo aquilo.
Matt Damon faz uma ponta como personagem secundário e está ótimo, uma pena não ter sido usado em outras cenas. Igualmente bem está Joshua Leonard (Se Eu Ficar) como o psicopata perturbado que ama desesperadamente Sawyer. Joshua recebeu um personagem feito sob medida para um ator que a cada produção só cresce em interpretação. Para não dizer da própria Claire Foy (The Crown) que mostra por que é uma atriz de grande futuro. Sua interpretação é carregada de desespero, ódio e força de vontade, algo que a personagem demandava, passa todos estes sentimentos sem forçar na interpretação.
A fotografia bem montada nos dá um ar de claustrofobia dentro da clínica e nos faz parecer que ali é uma prisão sombria. Essa luz escura dá um tom mais realista e em outros momentos há uma luz azul feita para dar uma perturbação maior na situação que a protagonista se encontra. E claro que com o uso do Iphone há uma praticidade já mencionada e uma maior imersão nos planos abertos, não há quase nenhum plano e os planos detalhes quando feitos são abertos. Não há um zoom feito com o celular, já que poderia acarretar no estouro dos pixels e faria o vídeo perder qualidade.
Soderbergh tem em sua cinematografia uma vasta experiência em filmes com a temática da saúde. Em Contágio apresentava uma pandemia que devastava o planeta, na série The Knick fala sobre a medicina na primeira metade do século XX e ainda há Terapia de Risco que se passa na área da psicofarmacologia. Toda essa experiência na área da saúde fez com que o diretor não cometesse erros do passado como o alongamento de cenas desnecessárias ou diálogos sem sentido. Tudo em Distúrbio é na medida certa e ele cria uma atmosfera de medo e perturbação real que poderia acontecer com qualquer pessoa.
Distúrbio (Unsane – EUA, 2018)
Direção: Steven Soderbergh
Roteiro: James Greer, Jonathan Bernstein
Elenco: Joshua Leonard, Claire Foy, Sarah Stiles, Marc Kudisch, Amy Irving, Colin Woodell, Jay Pharoah
Gênero: Horror, Thriller
Duração: 97 min.