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Críticas

Crítica | Uma Dama de Óculos Escuros Com Uma Arma no Carro

Através da linguagem cinematográfica o realizador de um filme pode subverter as expectativas do espectador, transformar o que ele enxerga em algo que não necessariamente é a verdade, como é o caso de Amnésia, de Christopher Nolan, que utiliza da montagem para colocar a história fora de ordem, criando o mistério de sua trama. Em casos como Garota Exemplar e A Garota no Trem é o roteiro que se encarrega disso, ainda que seus diretores, através da decupagem, brinquem com quem assiste a obra, nos fazendo interpretar situações de outra maneira. Uma Dama de Óculos Escuros Com uma Arma no Carro une essas duas escolhas narrativas, nos entregando um thriller psicológico cujo mistério somente desvendamos no fim.

A trama acompanha Dany Dorémus (Freya Mavor), uma secretária que, a pedido de seu chefe, deve levá-lo ao aeroporto e, em seguida, devolver o carro para a sua casa. Subitamente, porém, a protagonista decide fazer uma curta viagem para a praia, onde jamais estivera. Nesse momento, coisas estranhas começam a acontecer, ao passo que pessoas desconhecidas passam a dizer que ela já estivera ali antes. Entrando em uma espiral de confusão, Dany começa a duvidar de sua própria mente, acreditando ter ficado louca, situação que se complica quando ela se envolve com questões perigosas.

Baseado no livro de Sébastien Japrisot, o roteiro de Gilles Marchand e Patrick Godeau logo cedo consegue captar a nossa atenção. Ficamos curiosos para saber o que de fato está acontecendo ali, se é apenas um golpe elaborado dado na mulher ou se ela realmente tem algum problema psicológico. Essa dúvida somente aumenta conforme vemos cenas de Dany conversando consigo mesma, como se tivesse dupla personalidade, com um de seus lados mais impetuoso, enquanto que o outro apresenta uma maior fragilidade. O texto, porém, deixa tudo na dose certa para que encaremos essas conversas como algo normal, como a típica pessoa em um dilema, tentando vencer seus próprios temores.

É aí que entra a excelente montagem e edição de Maryline Monthieux e Christophe Pinel, que avançam alguns detalhes futuros a fim de causar uma maior confusão no espectador, através de inserts ao longo da narrativa. Aliado a isso, temos a imaginação da própria Dany, que é colocada em tela através de curtos trechos os quais não sabemos se é o futuro, passado ou apenas algo imaginário. Tudo isso compõe um quadro de instabilidade quando se trata da mente da personagem, gerando a incerteza no espectador, que não sabe em quem acreditar: na mulher que diz que jamais estivera ali, ou naqueles que a reconhecem nos lugares pelos quais ela passa.

Além disso, em razão dessa montagem mais dinâmica, a obra acelera seu ritmo consideravelmente, tornando tudo uma viagem verdadeiramente frenética. Através de fusões, Monthieux e Pinel avançam determinadas ações, novamente dialogando com o tom de incerteza da obra, criando a sensação de que o tempo em questão é psicológico, mesmo não, necessariamente, o sendo. Freva Mavor, como a protagonista, somente faz toda essa construção ganhar ainda mais vida, desempenhando mais de um papel ao interpretar uma personagem apenas: são os diferentes aspectos da personalidade de qualquer um que ganham vida, são expostas no mundo real.

Infelizmente, a conclusão do longa não chega à altura da engenhosidade de seu desenvolvimento, com o texto saindo pela saída mais fácil, nos explicando minuciosamente tudo o que verdadeiramente aconteceu. Não é deixado qualquer espaço para a interpretação, visto que é tudo tão didático, que chega a parecer como o roteiro fosse um velho vilão de James Bond, explicando todo o seu plano maquiavélico. Em razão disso, tudo ganha um ar maior de irrealidade, transformando essa jornada psicológica crível em algo que tenta se aproximar do realismo, sem verdadeiramente conseguir. O que fora construído antes é jogado fora em um grande anticlímax.

Apesar disso, Uma Dama de Óculos Escuros Com uma Arma no Carro continua sendo um filme instigante, sendo capaz de envolver o espectador nessa espiral de loucura, nos deixando sem saber exatamente no que acreditar. Ao utilizar um falso, ou não, tempo psicológico, nos vemos, a cada instante, tentando desvendar o que acontece em tela – uma pena que o texto tenha privado o espectador de pensar através de seu final, caso contrário, certamente seria uma obra verdadeiramente impecável.

Uma Dama de Óculos Escuros Com Uma Arma no Carro (La Dame dans l'auto avec des Lunettes et un Fusil, Bélgica/França – 2015)

Direção: Joann Sfar
Roteiro: Gilles Marchand, Patrick Godeau
Elenco: Freya Mavor, Benjamin Biolay, Elio Germano, Stacy Martin, Thierry Hancisse, Sandrine Laroche
Gênero: Thriller
Duração: 94 min

https://www.youtube.com/watch?v=2X8jRwB6rro


by Guilherme Coral

Crítica | Prometheus

Com Spoilers

A vida é repleta de ironias. Nunca imaginei que em algum momento escreveria sobre Prometheus, assim como imagino que Ridley Scott não imaginava por um bom tempo que retornaria ao universo de Alien contando uma história anterior aos eventos da franquia principal – algo que, na época, todos diziam que seria uma besteira investir no Space Jockey (o alien morto gigantesco que está dentro de sua nave em Alien – O Oitavo Passageiro).

Explico. Quando vi Prometheus pela primeira vez na vida, lá em 2012, no dia da estreia, admito que sai completamente chocado. Não pela polêmica envolvendo a qualidade do filme – que julgo muito bom, aliás, mas sim pela insanidade apresentada em cenas-marco da obra como a infame sequência da cesariana. Era, para mim, a ficção científica mais pessimista acerca da exploração especial que eu já tinha visto na vida e, provavelmente, continua a ser até hoje.

5 anos depois, através deste nosso especial de Alien, me vi obrigado a revisitar um filme que conseguiu o árduo fato de me chocar. E realmente, há coisas brilhantes Prometheus, mas também existem equívocos tão rasteiros que conseguem quebrar toda a credibilidade de quem se propõe a defender a prequela. É justamente aqui que me encontro em um belo dilema digno do filme: é passível ignorar as idiotices de Damon Lindelof quando, no geral, os temas do filme são extremamente profundos e induzem uma belíssima reflexão para o espectador? Repondo adiante.

Crise Existencial

O texto original de Prometheus foi consideravelmente alterado por Lindelof, roteirista que encontrou seu sucesso na televisão com seriados como Lost. Como estava em seu primeiro auge, virou presença requisitada em diversos filmes dos quais vários partilham a falta de capricho em termos de coesão narrativa, cadência e estrutura de acontecimentos. É interessante o quão discrepante as duas partes conseguem ser bastante opostas uma a outra.

Mesmo assim, a essência filosófica de Jon Spaihts ainda sobrevive às constantes burradas do co-roteirista que seriam resolvidas com facilidade. Na trama, acompanhamos a descoberta de um casal de arqueólogos, Shaw e Holloway, sobre uma constelação que na verdade se trata de um sistema solar com uma lua capaz de abrigar vida – LV 223. Planeta que pode abrigar os seres que participaram ativamente da história da humanidade.

Financiados pelo magnata Peter Weyland, o casal participa de uma missão exploratória com diversos outros cientistas renomados a borda da nave de luxo Prometheus em jornada até o misterioso planeta em busca de respostas sobre o envolvimento desses alienígenas com a nossa história. Porém, ao chegar lá, uma caixa de pandora é aberta e as coisas rapidamente vão de mal a pior.

Prometheus é um filme que te desafia a todo momento. E, justamente por isso, é bem possível que seja falho para muita gente. Quando tinha assistido pela primeira vez, consegui captar muitas coisas propostas na discussão filosófica existencial da obra, porém, para muitos outros Prometheus havia se tornado uma experiência confusa e perdida. Em certo ponto, entendo perfeitamente.

O melhor exemplo dessa confusão é concentrado na sequência de abertura que poderia ter sido resolvida com pouco esforço: inserir uma breve legenda “Terra, 3.2 bilhões de anos a.C.”. Nesse ponto, ficaria mais claro que o Engenheiro, em auto-sacríficio, estivesse criando toda a vida terrestre ao ingerir a gosma e alterar seu DNA – essa sequência é até mesmo revisada na edição em blu-ray adicionando alguns outros anciões deixando evidente que o processo se trata de um ritual daquela raça.

Eu, Robô

Logo após, a narrativa se move rapidamente, nos jogando em um breve apanhado do cotidiano do personagem melhor escrito do filme: o robô David. Ao contrário dos outros longas, já sabemos claramente que o personagem não é humano – algo extremamente necessário para todo o seu desenvolvimento.

Nesse termo, David é bem escrito não somente por suas falas ou ações, mas pelo conjunto total da obra, do atrito de seus pensamentos disfarçados pelo cinismo em diálogos com os humanos que o tratam mal assim que acordam da hibernação. Nessa ligeira rotina, vemos David estudando línguas mortas a fim de se comunicar com os alienígenas – com base nas imagens das antigas civilizações que entraram em contato com os mesmos, aproveitando as regalias da nave, mantendo sua boa aparência revelando sentimentos abstratos de vaidade, assistindo a Lawrence da Arábia (passagem importante que define a motivação dos meios utilizados para David atingir seus fins), entre outras atividades.

Fassbender – excepcional, mantém expressões tranquilas e alegres dando a entender o quanto David gosta de seu tempo sozinho, mantendo a nave em ordem até a chegada ao planeta. Seu olhar para o destino da viagem já revela grandes expectativas em relação a aquilo tudo. Até que, nesse exato momento, a tripulação acorda subjugando novamente David como mero servo dos viajantes. Logo, há esse conflito de um robô cercado de mistério. Nunca sabemos se ele é senciente, já que Fassbender sempre declama suas falas com enorme sarcasmo como se estivesse mentindo ou tirando um sarro cruel com os humanos.

Rapidamente já fica explícito que o personagem se sente superior aos seus criadores, afinal, por que não seria? Além de ser imortal, consegue fazer tudo melhor e mais rápido do que seus colegas humanos. E a aversão destes com David acaba potencializando a criação de um inimigo a bordo.

Mas por que é tão importante sacar a essência de David para entender Prometheus? Simples, Prometheus não se trata apenas de mais uma incursão na franquia para explicar o Space Jockey, mas sim um filme de estudo filosófico da origem da humanidade. A presença do robô junto dos humanos colabora para o impacto da mensagem final coerente com todo o pessimismo apresentado até então.

Eles, humanos

Todo o propósito da trama gira nesse sentimento de descoberta da razão da origem do homem. É através de David que o espectador recebe as catarses da equipe. Mas antes de seguir nessa proeza do roteiro, é hora de falar de suas grandes, enormes inconsistências.

Além de Shaw, todos os personagens restantes são mal escritos que qualquer espectador consegue notar falhas grotescas. A começar por Holloway, o namorado de Shaw. O arqueólogo tem um mini conflito ao se deparar com a tumba em LV-223 cheia de corpos mortos e artefatos que ele nem se preocupa em estudar – já que, né, ele é um arqueólogo. Voltando para a nave, o rapaz encontra alento na bebida apresentando uma crise existencial.

Enquanto essa cena consegue desenvolver muito bem David ao questionar o motivo de sua criação como construto a Holloway e assim sucedendo a permissão involuntária de um experimento doentio do robô, o personagem somente dispara em pesada exposição o quão desolado ele está por não conversar com os Engenheiros.

Isso é tão surreal pelo fato deles terem explorado somente uma câmara da tumba e também por estarem no planeta nem por um dia. Inconsistência completa. Esse também é o único ponto para o “desenvolvimento” de Holloway que ao menos recebe um a esse ponto.

Então há Fifield e Millburn, o geólogo e o biólogo da expedição. No começo, é interessante essa interação de desconhecidos na equipe com ninguém sabendo exatamente que o outro é. Além de eles funcionarem, parcialmente, como alívios cômicos. Mas Lindelof ataca novamente. Até com personagens simples, existem duas inconsistências bizarras que desafiam qualquer lógica. A primeira é o fato dos dois se perderem na tumba sendo que foi Fifield quem mapeou todo o lugar com suas sondas. Já com Millburn, o biólogo, se apavora ao ver um Engenheiro morto, mas é todo amigo de uma cobra mutante claramente perigosa.

É evidente que todos esses personagens mais servem o escopo maior da história em exibir como funciona o mutagênico da gosma preta. Porém, por conta desse completo descaso, o festim de mortes mais choca pela imagem, do que por nossa empatia pelos personagens.

O restante da equipe também mal consegue ser estabelecida direito. Alguns personagens chegam até mesmo no cúmulo de desaparecer depois de serem apresentados formalmente. Outros contam com o carisma dos atores como o piloto Janek interpretado por Idris Elba – seu personagem vai de niilista para altruísta em duas cenas.

Já a única que possui uma outra tentativa de desenvolvimento é a Meredith Vickers, uma empresária megera da Weyland. A única coisa que agrega a revelação totalmente desnecessária dela ser filha de Peter Weyland está na atuação robótica de Charlize Theron criando um paralelo bem-vindo com David, como se fosse uma disputa maior pelo amor não conferido por seu pai para nenhum deles.

Entretanto, mais uma vez, Lindelof ataca no desfecho tragicômico da personagem que rendeu o ótimo meme The Prometheus School of Running Away from Things, já que a personagem morre esmagada ao tentar escapar da nave Juggernaut por correr em linha reta quando bastava correr para o lado para se salvar.

Basicamente, todos os personagens que ele arrisca desenvolver, acaba pecando no desfecho. É como se ele mesmo atentasse contra a própria obra. O engraçado é que isso ocorre com o filme como um todo também. Depois de um começo forte até sua metade, Prometheus é excelente. Mas basta acontecer a cena da cesárea que as coisas saem dos trilhos rapidamente, já que a sucessão de eventos é extremamente apressada atropelando todo o bom ritmo construído até então.

Figuras paternas

Depois de Shaw remover a trilobita e Fifield ressurgir como um maníaco zumbi, Lindelof insere a presença redundante do velhaco Peter Weyland como uma grande plot twist do texto. A justificativa dessa presença consegue cair no pior dos clichês: a busca pela vida eterna. Como raios Weyland presumiu que os Engenheiros tenham desvendado o segredo da imortalidade é outro dos grandes mistérios do roteirista.

O choque da presença do magnata é flácido, mas ajuda a delinear a mensagem do filme e a construção de David. Isso se dá durante o despertar do Engenheiro. Até ali, a sucessão das descobertas e presunções da equipe indicam que LV-223 é uma base militar e que a Juggernaut iria para a Terra a fim de destruir toda a vida do planeta.

Desperto o alienígena, há uma cena mal elaborada em termos textuais, mas que oferecem algumas migalhas para o espectador especular. A abordagem não violenta do Engenheiro no começo corrobora isso, mas ao ver que os humanos continuam pequenos desejando poder e disseminando violência contra os mais fracos, o gigantesco alienígena decide seguir em sua missão de dizimar a vida terrestre.

Novamente, é uma especulação oferecida pelos personagens no filme. Desse modo Prometheus afirma categoricamente pouquíssimas coisas preferindo deixar muitas explicações a cargo do espectador sendo que cada um pode tirar suas próprias conclusões sobre a tumba, das armas químicas, do motivo dos Engenheiros decidirem destruir a humanidade, dos murais com xenomorfos esculpidos, sobre quantos efeitos o mesmo mutagênico pode ter, das tumbas remanescentes do LV 223, do que os Engenheiros estavam correndo e assim por diante. São muitas questões não resolvidas que podem fazer parte da experiência do filme em transpor a frustração dos personagens diretamente no espectador. Algo que é sempre um jogo muito arriscado.

Entretanto, mesmo assim, é inegável que Prometheus seja um filme envolvente. Os mistérios realmente prendem sua atenção e a curiosidade do espectador é representada pela curiosidade dos personagens elaborando uma relação na qual nós nos encontramos como o David: aguardando para ver qual será a próxima desgraça biológica que ocorrerá com a tripulação. Logo, tirando o mérito sádico de lado, o roteiro se torna bastante divertido.

Mas concluindo toda essa discussão sobre David, nos momentos finais de Weyland, o magnata sussurra que “não há nada”. E David responde “eu sei”. Esse breve diálogo infere que o androide tenha consciência e, como um ser criado pelo homem, já sabe que não há propósito algum por essa busca aos ‘deuses’, afinal, a razão de sua criação já exposta em diálogo anterior. Não há significado maior para a vida em Prometheus.

Religião abortada

Há alguns toques que abordam a religião dentro do texto do filme. Novamente, nada é devidamente explorado, mas está lá para nos fazer pensar. Centrar a narrativa durante o Natal é uma jogada inteligente, já que a descoberta da criação humana basicamente desconstrói todo o significado dos feriados religiosos.

É por meio de Shaw, cristã, que o roteirista tenta trabalhar esse tema. Shaw é outra personagem que se sustenta através do talento magnânimo de Noomi Rapace que rouba as cenas em que aparece. A personagem também não é maravilhosamente desenvolvida, mas há questões e pequenos conflitos que rendem bons momentos. O principal é sobre a infertilidade que é revertida para dar origem a criatura monstruosa parida na cena da cesárea. Nisso, novamente há elementos que tocam o tema da criação.

Como uma mulher que caminha com o sagrado, dá origem a uma criatura vulgar e maligna? Seu milagre vem da profanidade da ciência e não da benevolência de um divino. E é justamente por seu espírito e fé não se quebrarem que David demonstra fascínio por humano pela primeira vez (isso é bem breve e ocorre no desfecho do filme).

Para estabelecer essa fé, há um breve flashback mostrando a infância da personagem se deparando com morte e religião. O problema é que isso é abordado tão brevemente que acaba esquecido até o fim do filme. Logo, mais uma vez fica a critério do espectador encher o filme de significados complexos.

Estética extraterrestre

O que todos podem apreciar igualmente em Prometheus é seu visual arrebatador. Sem a menor sombra de dúvida, é um filme mais do que maravilhoso. Isso já fica claro com a abertura aprimorada com Ridley Scott mostrando um verdadeiro estudo geográfico de um planeta sem vida, mas repleto de água (até o áudio das correntezas é mixado para dar destaque aos rios e a potência da cachoeira).

Através desse sentimento de grandeza que Scott dirige seu filme. Ao contrário de Alien, não há muita delineação de espaço claustrofóbicos. A nave é espaçosa, livre de corredores retilíneos, é cheia de cor e parafernalhas tecnológicas de última geração que ajudam a modelar as luzes cheias de bons contrastes de Dariusz Wolski. O espectador realmente sente que aquela é uma nave de luxo de ponta oferecendo o melhor para os personagens.

Nisso, o design de produção do filme começa a brilhar intensamente. As belas cores cheias de elegância e dos formatos de objetos humanos entram em contraste cênico com a desolação mortificante da tumba e suas câmaras acinzentadas, escuras e desprovidas de qualquer sentimento eufórico. Ali há somente morte e caos – algo que é até explicitado quando Scott enquadra uma caveira esculpida no topo da rocha da tumba.

Prometheus foi um desses filmes que esbanjaram a produtividade intensa do realizador – o que resulta na carreira mais que irregular de Ridley. Com o passar dos anos e pelo contato com seu irmão Tony Scott, Ridley foi abandonando a regra da utilização de apenas uma câmera. Para acelerar o tempo de captação, Scott decidiu gravar Prometheus com três câmeras RED em 3D.

É justamente no manejo inteligente dessa decupagem desafiadores que Scott mais se destaca. O diretor não é um maníaco que quer cobrir a cena de diversos ângulos possíveis. É nítido que plano e composição são pensados nos mínimos detalhes incluindo hierarquia de planos e encenação apurada de atores e iluminação.

Por causa do excelente domínio de Ridley sobre a câmera – muito mais descritiva do que poética, no caso – temos vislumbres valiosos que evitam mais exposição de baixa qualidade de Lindelof. De exemplos, temos vários, mas é interessante apontar a maestria da cena na qual o grupo entra pela primeira vez na câmera do “cabeção” – que revela por si que os Engenheiros parecem reverenciar a si mesmos como divindades.

Assim que os cientistas pisam ali, Scott mostra pequenos vermes se debatendo na terra. Para fechar a cena, novamente vemos os vermos, mas dessa vez totalmente imersos na gosma preta que vaza lentamente dos vasos. O mais legal do trabalho de Scott é valorizar tão bem diversos aspectos dos designers. Sua câmera passeia mostrando intrincados detalhes que contam um pouco da cultura dos Engenheiros e também da razão de todos estarem mortos e empilhados em um canto do lugar.

Apesar de eu ter apontado que o uso de sua câmera mais se limita a conta a história e suprir o espectador com estímulos visuais valiosos garantidos pela direção de arte, há dois momentos em particular que o diretor se sobressai muito. O primeiro deles é a descoberta de David no cockpit da Juggernaut ativando o sistema de navegação no qual ele pega uma projeção holográfica da Terra deixando-a em suas mãos enquanto observa tudo com fascínio. A imagem é poderosa. Infere certo desejo dominador de David, ser grande, se tornar o opressor, além de deter o poder de decidir o destino da Terra, afinal ele sabe que a nave está programada para partir e exterminar a vida terrestre nesse ponto da narrativa.

A outra é a famigerada cena da cesariana na qual Scott consegue elevar o grau de nojeira feita para um blockbusters de ficção científica. Assim que Shaw entra na sala na qual o med pod está (aliás, a apresentação prévia do aparato é um dos poucos acertos de Lindelof), gradualmente as luzes se apagam, inclusive as que estão no chão. É uma ligeira animação que concentra todo o jogo de luz para maca futurista – um detalhe rápido, mas valioso.

Assim que a heroína entra e se prepara para a intervenção cirúrgica, Scott não abandona o ponto de vista interno da capsula. Presenciamos o terror na forma mais crua e próxima possível com direito a, inclusive, diversos planos subjetivos nos colocando no ponto de vista de Shaw. É uma cena tão chocante quando a do Chestburster em Alien, ainda que não contenha a potência do elemento surpresa.

Não há muito o que reclamar da direção de Scott em termos visuais e de encenação. Ele apenas colocou as besteiradas de Lindelof em movimento como no caso da corridinha contra a nave. Onde realmente Ridley se equivoca é no ritmo insano que o filme adquire assim que Weyland é reapresentado na narrativa, sem ter um mínimo respiro para a história ser desenvolvida de melhor modo. Além disso, há a péssima escolha de decupagem e encenação para mostrar a “discreta” dedada que David dá ao passar o copo de champanhe infectado para Holloway.

Eram os deuses astronautas?

De certa forma, Prometheus é um 2001 pop que consegue levantar os questionamentos certos para o público refletir durante e após a sessão. Até onde vale a pena explorar o desconhecido? Qual é o motivo da nossa existência e para que precisamos tanto descobrir de onde viemos? Quais as consequências para a humanidade após descobrir vida inteligente no universo?

Mesmo com essas ótimas perguntas que conseguem afetar o espectador e trazendo um visual apurado, bom elenco, ótima cinematografia aliada a um Ridley Scott cada vez mais cruel e visceral com a ficção científica, é possível perdoar tantas inconsistências, furos de roteiro e lógica oferecidos pela narrativa interessante de Lindelof? Bom, para mim, no caso, é um meio termo.

Acho que Prometheus é um bom filme e oferece entretenimento de qualidade. Talvez hoje, já sabendo o que ele oferece, haja uma aceitação maior por parte do público. Esse completo descaso em responder a nossa curiosidade é bem capaz de ser uma grande particularidade desse filme.

Prometheus pode ser um filme totalmente estúpido, bem como pode ser genial. Eu prefiro acreditar que seja a segunda alternativa.

Prometheus (Idem, EUA – 2012)

Direção: Ridley Scott
Roteiro: John Spaihts, Damon Lindelof
Elenco: Noomi Rapace, Michael Fassbender, Charlize Theron, Idris Elba, Guy Pearce, Sean Harris, Rafe Spall, Logan Marshall-Green, Emun Elliot, Benedict Wong
Gênero: ficção científica, horror espacial
Duração: 124 minutos

https://www.youtube.com/watch?v=Z0HacCd0be8

Leia mais sobre Alien


by Matheus Fragata

Crítica | O Dia do Atentado

Usar como ponto de partida para a produção de um filme eventos e personagens reais costuma ser uma via de duas mãos: de um lado, é preciso dosar na medida certa a dramatização com a fidelidade aos fatos; de outro, a inevitável confrontação do material ficcional com a história verdadeira confere familiaridade ao filme e aumenta sua exposição na mídia.

O Dia do Atentado, dirigido e co-roteirizado por Peter Berg, se sai bem ao fazer uma aposta relativamente ousada: em vez de definir claramente um ponto de vista, começa o enredo “atirando para cima”, apresentando pelo menos seis linhas de ação partindo paralelamente até o momento do ato terrorista com mortos e feridos, ocorrido durante a tradicional maratona de Boston no ‘Patriots Day’, em 15 de abril de 2013.

Conhecemos então o policial Tommy Saunders (Mark Wahlberg) e sua esposa Carol (Michelle Monaghan); o jovem casal Jessica Kensky (Rachel Brosnahan) e Patrick Downes (Christopher O'Shea); a estudante do MIT Li e seu interesse romântico; o empreendedor “Manny” (na verdade, Dun Meng), chinês que vive em Cambridge (cidade ao lado de Boston); o Sargento Jeff Pugliese (J.K. Simmons), da também vizinha Watertown; e finalmente o trio de islâmicos que perpetra o atentado e oculta suas intenções.

É evidente que o filme precisará escolher entre quais desses núcleos investirá tempo e situações dramáticas, e ele realmente o faz (o que acaba tornando, é verdade, excessivas algumas conexões que, após apresentadas, revelam-se dispensáveis ao longo da projeção). mesmo porque ainda precisa abrir espaço para outros personagens importantes na trama, como o agente especial do FBI Rick Deslauriers, vivido por Kevin Bacon.

Embora as caras mais conhecidas do filme pareçam interpretar papéis habituais dentro de suas carreiras (Wahlberg é o bostoniano briguento, Bacon o oficial cerebral, Monaghan a esposa carinhosa e engraçada, J.K. Simmons o cinquentão linha dura), o que é uma jogada certeira e até um pouco preguiçosa da produção, tal componente não atrapalha o envolvimento da plateia - ele, provavelmente, serve para aumentar a empatia, de modo que será difícil não estar bastante envolvido com os personagens do meio da projeção até o seu final, num movimento de fôlego único conduzido de forma discreta - mas hábil - pela direção.

Peter Berg ensaia alguma ousadia quando eventualmente alterna imagens reais de câmeras de vigilância, arquivo jornalístico e celulares com planos encenados, mas investe tão pouco no recurso que ele acaba passando despercebido (nada nem perto do balé formal de Moneyball - O Homem que Mudou o Jogo, por exemplo, que usa do mesmo expediente com virtuosismo). Da mesma forma, a questão do “ponto de vista” (talvez desde Rashomon, de Kurosawa, a preocupação inevitável na roteirização do filme “criminal”) arrisca a mostrar a cara (como na cena onde uma planta baixa da avenida do atentado é reproduzida pela equipe de investigação), mas o filme novamente opta por se centrar nos eventos reais, mantendo-se fiel ao espírito dos fatos e sem se arriscar a grandes arroubos estilísticos ou interpretativos.

Os momentos onde o filme “fala” mais alto que os fatos reais concentram-se na rápida cena de “despedida” de um dos terroristas e sua esposa (que o beija amorosamente, revelando sua verdadeira natureza, até então ocultada por conflitos domésticos) e no diálogo de Wahlberg com um colega, quando ambos resumem do que realmente se trata não apenas a produção, mas o problema do terrorismo: no final das contas, um conflito - ao menos momentâneo - entre pulsões de “bem” e “mal”.

A maior parte da plateia deve imaginar - ou mesmo estar informada - de como termina a “história real”: quem eventualmente morre ou é preso. O Dia do Atentado, por sua vez, finaliza com uma emocionante celebração de uma cidade orgulhosa de suas tradições, mas ainda assim tolerante e aberta a imigrantes, cujo espírito coletivo é perfeitamente sintetizado em Fenway Park, o campo de baseball do lendário time da cidade, o Boston Red Sox.

O Dia do Atentado (Patriot's Day, EUA - 2016)

Direção: Peter Berg
Roteiro: Peter Berg, Matt Cook
Elenco: Mark Wahlberg, Michelle Monaghan, J.K. Simmons, John Goodman, Kevin Bacon
Gênero: Drama, thriller
Duração: 133 min

https://www.youtube.com/watch?v=VDoNG61ijdo


by Daniel Moreno

Crítica | Aliens vs. Predador 2

O primeiro AVP era triste de se assistir de tão ruim. Todos imaginavam uma continuação que poderia e deveria ser melhor. Mas não, conseguiram piorar com Alien vs. Predador 2 que é um pesadelo cinematográfico. No anterior tanto Aliens quanto Predadores se digladiavam na Antártica. A ideia era até que interessante o problema é que foi mal explorado. Já nesse retorno às telas tudo se tornou tão banal e ridículo que há de se pensar duas vezes se esse não é o pior filme envolvendo todos os feitos das duas franquias.

Para começar, se é para fazer um vídeo dos dois se matando no planeta Terra que pelo menos seja algo original. Mas não, resolveram pelo mais simples e óbvio que é enviar os dois para uma cidade pequena dos Estados Unidos (sempre lá). E não foi suficiente ter colocado dois ícones pops que já haviam sobrevivido a um primeiro longa péssimo. Agora em AVP2 teriam que novamente batalhar não pelas suas vidas, mas para sobreviverem também nos cinema. 

Dessa vez a história como dito se passa em uma cidadezinha do Colorado. No final do primeiro filme o corpo do Predador vitorioso é levado de volta para seu planeta natal. É a partir desse episódio que AVP2 se inicia. Dentro do corpo desse Predador havia um Alien se formando, ele nasce e dá vida a uma nova espécie: o Predalien. Isso mesmo, eles conseguiram unir as duas raças e isso até que poderia ter sido melhor explorado.

Então, o Alien mata todos Predadores da nave, resultando em sua queda na Terra e na fuga do Predalien, assim como vários muitos espécimes que vão infectar os humanos. Antes do "capitão Predador" da nave morrer, ele envia uma mensagem de socorro para um outro que estava em uma espécie de centro de comandos dos Predadores. Em vez de chamar alguns companheiros para ajudá-lo, ele tem a brilhante ideia de ir sozinho caçar o tal Alien antes que a situação fuja de controle.

Ele até consegue chegar a tempo de implodir a espaçonave antes que a descubram, mas logo irá descobrir que o alienígena saiu e já começou a reproduzir a espécie entre os humanos que lá residem. A partir desse ponto tudo o que acontece é massacre de humanos e embate entre Predadores contra Aliens. Nada de novo em relação ao primeiro, a diferença é que mudaram de um lugar exótico para um local comum. Só que esse segundo consegue superar negativamente o primeiro em muitos aspectos.

Há uma coisa que deve ser dita de imediato antes de começar. Alguém conseguiu enxergar algo nos 94 minutos de AVP2? Se sua resposta foi sim, você merece um prêmio, se foi não você está do lado da grande maioria. A fotografia dessa produção é tão escrota, mal feita que mais parece ter sido realizada por um estudante na área - na verdade, até estudantes fariam um trabalho mais decente. Ok, tem que ser escuro até porque grande maioria dos eventos se passa durante a noite, mas precisa ser uma escuridão no sentido literal da palavra? Provavelmente eles pensaram em deixá-lo mais sombrio, só isso responde o porquê de uma fotografia péssima, que claramente recebeu um tratamento na pós-produção para ter seu brilho diminuido - basta reparar no plano do nascimento do Predalien do primeiro filme, que é reaproveitado aqui, só que assustadoramente mais escuro. As fotos usadas nessa crítica só estão nítidas porque foram tratadas no Photoshop, caso contrário ninguém iria ver nada nelas.

Calma que ainda tem coisa pior: o arco dramático envolvendo os moradores da cidade. No primeiro filme eram aventureiros entrando na nave submersa, já nesse são adolescentes, famílias e muito mais sendo mortos pelas criaturas titulares. A trama envolvendo esse pessoal citado remete a filmes como Halloween e Pânico, em que um assassino mata todos que encontra pela frente (na maioria das vezes são adolescentes), podendo assim configurar-se como um exemplar do slasher. Dos bem ruins, claro. 

São dois os mestres que dirigiram esse épico horrível de terror. Greg Strauese e Colin Strause, dois irmãos sem experiência alguma na função e que caíram abruptamente no projeto. São os mesmos responsáveis do horrível Skyline - A Invasão, o que revela que fazer filmes com alienígenas está na veia dos irmãos; ou melhor, não está. Tanto Greg quanto Colin só haviam trabalhado em direção com curtas-metragens, e em Hollywood a especialidade da dupla é no setor de efeitos visuais, onde já trabalharam em diversos projetos.

A questão é: quem tomou a brilhante ideia de colocar dois diretores sem experiência para dirigir um filme com dois personagens tão icônicos quanto Alien e Predador? Jogaram dinheiro no lixo e não se sabe como ambos conseguiram sobreviver a ele. É o típico pensamento empresarial de se confiar em técnicos de efeitos apenas pelos protagonistas serem duas criaturas que dependem dessa técnica - e por seus realizadores serem consideravelmente mais baratos do que diretores experienciados -, esquecendo-se que o mais importante é a habilidade de se contar histórias

Esse longa não devia existir, o que fizeram com esses dois personagens é um absurdo. Mostraram que não estão nem aí para o conteúdo, só para explosão, morte e caos e nem sempre isso segura um filme. Alien vs. Predador, tanto o primeiro como esse tinham tudo para serem sucesso. São personagens adorados pelo público e tem um lugar cativo entre os principais monstros da cultura pop. Mas não, chamaram diretores péssimos para dirigir, elenco tão fraco que muitos não faria nem papel de figuração, roteiro de chorar. Resta rezar para que não decidam fazer um terceiro episódio dessa péssima duologia.

Alien Vs. Predador 2 (AVPR: Aliens vs Predator - Requiem, 2007)

Direção: Colin Strause, Greg Strause
Roteiro:  Shane Salerno
Elenco: Steven Pasquale, Reiko Aylesworth, John Ortiz, Johnny Lewis, Ariel Gade, Kristen Hager, Robert Joy
Gênero: Terror, Ação, Ficção Cientifíca
Duração: 94 min

https://www.youtube.com/watch?v=LnwJId-r8_w

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by Gabriel Danius

Crítica | Alien vs. Predador

No início dos anos 2000, após o fracasso (em todos os sentidos) de Alien: A Ressurreição, a franquia criada por Ridley Scott estava morta e enterrada e permaneceria assim, até Prometheus, caso Paul W.S. Anderson, responsável pela adaptação cinematográfica de Resident Evil, não tivesse decidido utilizar a ideia dos quadrinhos de juntar os xenomorfos com Predador em Alien vs. Predador. O grande problema é que Anderson, em toda a sua carreira, jamais nos entregou um filme que fosse minimamente bom e, surpreendentemente, mesmo com as expectativas muito baixas, ele consegue nos surpreender negativamente.

O roteiro, também de W.S. Anderson, é um amontoado de clichés e elementos genéricos reciclados de Resident Evil. Quando um dos satélites da Weyland Industries capta uma fonte de calor bem abaixo da superfície em uma região inabitada da Antártica, a companhia contra um grupo de indivíduos para explorar a pirâmide subterrânea que descobrem nesse local. Liderados por Alexa Woods (Sanaa Lathan) a equipe encarregada da exploração descobre que essas ruínas são uma estrutura ritualística, que abriga alienígenas mortais. Para piorar sua situação, outros seres do espaço chegam à Terra para iniciar uma caçada naquele lugar.

Fica bastante claro o quanto o diretor e roteirista se apoiou em Resident Evil para compor essa sua obra. Mais de uma vez vemos os personagens sendo situados dentro dessa grande estrutura subterrânea através do foco em um mapa holográfico vermelho. Anderson repete isso mais de uma vez através de inserções desnecessárias, mostrando o ponto de vista, brevemente, dos Predadores, o que apenas funciona para acabar com qualquer tensão no espectador, já que sabemos exatamente o que está indo em direção ao grupo de exploradores. O texto ainda utiliza o velho elemento dos “deuses astronautas”, criando um plano de fundo que simplesmente não funciona e nos distancia do foco da obra.

Seria injusto colocar a culpa desse grande fracasso apenas nesse deslize, afinal, de início já não nos importamos nem um pouco com os personagens centrais da história, todos rasos, sendo muito mal trabalhados ao longo da trama, servindo apenas como bucha de canhão, feitos para que o longa contasse com algumas mortes antes de seu clímax. Anderson tenta construir um filme de terror, utilizando a clássica linguagem que oculta os alienígenas até que eles estejam prontos para matar os pobres humanos. Qualquer possívelmedo, contudo, é estragado em razão do uso contínuo de clichés que tornam a trama extremamente previsível, chegando ao ponto do ridículo.

Vez por outra, contudo, o diretor abandona o gênero e parte para a ação, o que demonstra ser uma tragédia ainda maior. Primeiro temos o uso excessivo da computação gráfica em alguns trechos, garantindo uma gigantesca artificialidade à imagem, principalmente agora, mais de dez anos desde o lançamento. Para piorar, há o uso desenfreado de cortes e enquadramentos muito fechados, tornando a projeção uma verdadeira bagunça nessas situações, a tal ponto que rezamos para que a ação, enfim, seja interrompida. O único ponto no qual ela chega a funcionar é próximo ao desfecho da obra, mas, quando chegamos lá, já estamos cansados de tudo o que vimos até então.

Alien vs. Predador é mais uma prova de que Paul W.S. Anderson jamais dirigira algo bom. Trata-se de uma amálgama de elementos que apenas cansam o espectador, um verdadeiro desserviço às duas franquias que inspiraram essa união, não servindo como filme de terror, nem de ação. A franquia Alien não deveria ter sido desenterrada ainda (para dizer a verdade, nem com Prometheus isso deveria ter acontecido) e, ironicamente, depois de assistir Alien vs. Predador, nossa vontade é justamente a de enterrar essa tragédia em forma de longa-metragem.

Alien Vs. Predador (AVP:  Alien Vs. Predator, 2004)

Direção: Paul W.S. Anderson
Roteiro:  Paul W.S. Anderson
Elenco: Sanaa Lathan, Raoul Bova, Lance Henriksen,Ewen Bremner, Colin Salmon, Tommy Flanagan, Joseph Rye
Gênero: Terror, Ação, Ficção Cientifíca
Duração: 100 min

https://www.youtube.com/watch?v=jC1ngKr6QA8

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by Guilherme Coral

Crítica | Alien - A Ressurreição

Com Spoilers

Em Alien 3, numa ambientação que refletia o inferno astral da protagonista através da fotografia avermelhada, as fumaças que pareciam soprar do chão e uma ação que se desenrolava no subsolo de uma prisão de segurança máxima, o público pôde presenciar o fim melancólico e tematicamente perfeito do arco dramático da inesquecível heroína Ellen Ripley, interpretada pela talentosa Sigourney Weaver. Foi dessa maneira, em uma nota alta, que a triste história de sobrevivência da icônica personagem se despedia do fiel espectador. Depois desse filme, não existia a menor necessidade de uma sequência ou qualquer obra que retomasse a trama.

No entanto, nunca deve se menosprezar a infinita capacidade que os estúdios hollywoodianos têm de ver potencial de exploração nos lugares em que não há absolutamente nada. Com o relativamente desconhecido Joss Whedon na função de roteirista (ele já tinha criado a série de televisão Buffy), o irregular Jean-Pierre Jeunet no cargo de diretor e uma história risível envolvendo tanto o cruzamento de um clone de Ripley com uma rainha dos xenomorfos quanto um grupo de mercenários tendo de enfrentar os alienígenas numa base espacial, esta sequência, intitulada Alien - A Ressurreição, é uma prova irrefutável de que a história de Ripley realmente devia ter terminado no filme de David Fincher.

É um fato conhecido que a 20th Century Fox se aproveitou da posição de extrema vulnerabilidade de Jean-Pierre Jeunet (é o seu primeiro e único filme em Hollywood) para, assim como fez na pós-produção de Alien 3, montar o filme de acordo com as suas exigências mercadológicas. Porém, mesmo que isso não tivesse acontecido, é muito difícil que o resultado não fosse tão ruim quanto o corte que foi aos cinemas, ou até a própria versão estendida, que tem mais dez minutos de duração. Acima da direção, dos efeitos, das atuações e do ritmo, destaca-se negativamente o roteiro desastroso de Whedon.

Não é uma tarefa fácil ter de assistir à apropriação inconsequente de uma personagem cuja vida foi tão sofrida, repleta de dores e perdas, mas que ainda assim era detentora de uma personalidade forte, independente e perseverante. Nos três primeiros filmes, passamos a admirar Ripley incomensuravelmente. Aliás, não é exagero dizer que heroína é uma das mais fascinantes da história do Cinema. O seu ato de sacrifício no longa de 1992 é o suspiro final de uma alma misericordiosa que, a todo momento, contrastou a destruição e escuridão circundantes com um olhar doce (ah, os olhos da Sigourney Weaver...) e um coração receptivo e amoroso.

Vê-la retornando à vida 200 anos depois de sua morte, na forma de uma super-heroína indestrutível e em coluio com os inimigos que lutou a vida inteira para destruir é um desrespeito com os filmes anteriores, os espectadores e, principalmente, a personagem. Sim, eu sei que a protagonista de Alien - A Ressurreição não é essencialmente a Ripley e sim uma mistura de clone e híbrido recriado em laboratório. Mas, dos pontos de vista imagético e narrativo, para todos os efeitos, quem enxergamos na tela é a personagem original, mesmo que através de resquícios. Na história do Cinema, a imagem de Weaver como a tenente atingiu um patamar sagrado. O que Whedon fez com ela é uma profanidade indesculpável.

Para piorar, a personagem perambula em um ambiente cartunesco no qual a indecisão dos realizadores sobre qual tom adotar termina por recriar uma narrativa completamente esquizofrênica. Já começando com um plano detalhe medonho da boca de um inseto (os efeitos digitais empregados neste início são tão precários quanto os vistos no filme anterior) e uma cena de humor pastelão na qual um piloto age como um completo idiota, o longa vai ficando cada vez mais bizarro e com uma atmosfera diferente da dos primeiros capítulos. Em questão de minutos, há uma profusão de momentos e falas cômicas incabíveis e personagens circenses interpretados por atores com aparência física peculiar, como Ron Perlman, Brad Dourif e Dominique Pinon.

Uma vez estabelecido esse circo de horrores, a história se desenrola da forma mais genérica possível. Mais uma vez, tem-se uma trama que gira em torno de um grupo de pessoas (como se fosse possível chamá-los dessa maneira) presos dentro de um lugar e tentando eliminar definitivamente a raça dos irritantes alienígenas. Entretanto, ao contrário dos filmes anteriores, no qual a dinâmica dos personagens era rica e o medo chegava a ser quase palpável, precisamos acompanhar até o final diálogos vazios proferidos por caricaturas, além da entediante rotina de vê-los ser dizimados um por um. Whedon acha espaço até mesmo para uma revelação nada imprevisível sobre a natureza robótica da personagem de Winona Ryder.

Jeunet, por sua vez, indica em cada frame não ter a mínima intimidade com o material. O próprio diretor admitiu em entrevistas posteriores que aceitou realizar o filme somente porque desejava entrar na maior indústria cinematográfica do Mundo. No fim, ele nem precisava fazer essa confissão. Basta olhar a sua incapacidade de definir uma atmosfera e tom únicos, a falta de noção de como construir o suspense ou dirigir os atores para perceber que o cineasta deve ter se sentido deslocado no set de filmagem. Nos anos seguintes, ele se sairia muito melhor dirigindo filmes mais autorais.

Depois de Alien - A Ressurreição, para alegria dos verdadeiros fãs, a franquia ficaria adormecida por 15 anos. Foi apenas em 2012, quando Ridley Scott decidiu realizar Prometheus, voltando para o universo que ajudou a criar, que o público teve a oportunidade de ver nos cinemas um novo filme sobre o Alien. No entanto, nem o longa de 2012, nem o atual, nomeado Alien: Covenant, são sequências da obra de 1997, mas sim prequels do longa de 1979. Isso não deixa de ser algo a ser comemorado, pois, se tivemos de ver a aura misteriosa de Alien, O Oitavo Passageiro ser destroçada nos dois filmes mais recentes da saga, não fomos obrigados a rever Ripley ser desrespeitada por mãos inábeis. E que fique assim. Os mortos devem continuar onde estão: debaixo da terra. No Cinema, profanar túmulos e corpos é um crime artístico inafiançável.

Alien - A Ressurreição (Alien: Resurrection, EUA – 1997)

Direção: Jean-Pierre Jeunet
Roteiro: Joss Whedon
Elenco: Sigourney Weaver, Winona Ryder, Ron Perlman, Brad Dourif, Dominique Pinon, Gary Dourdan, Michael Wincott, Dan Hedaya, Kim Flowers
Gênero: Suspense, Ficção Científica
Duração: 109 min

https://www.youtube.com/watch?v=ci9nf8uW0uk

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by Redação Bastidores

Crítica | Alien: Covenant (Sem Spoilers)

Clique aqui apra ler nosso texto COM SPOILERS

É fascinante a trajetória que o Alien teve pelos cinemas. Em uma franquia que só pode ser definida como antologia, cada filme trouxe uma visão e abordagem diferente, praticamente reinventando-se a cada novo capítulo graças às visões distintas de seus respectivos diretores, que incluíram o seleto grupo de Ridley Scott, James Cameron, David Fincher e Jean-Pierre Jeunet. Bem, er... Paul W.S. Anderson e os Irmãos Strause com seus AVP, mas vamos deixar esses quietinhos ali no canto.

Scott foi o único do grupo a revisitar seu precioso xenomorfo, iniciando uma nova fase da franquia ao explorar o passado desta com Prometheus. Era um filme diferente, que contava sua própria história dentro do universo apresentado em 1979 e expandia a mitologia da criatura ao trazer fortes discussões sobre deuses, o mito da criação e mortalidade, ao mesmo tempo em que procurava uma história de origem para o Alien. Com a recepção morna e divisiva para o projeto, Scott tentou fazer em Alien: Covenant um longa híbrido, com as questões filosóficas de seu antecessor e também o espetáculo de terror espacial que transformaram o original em um clássico absoluto. Infelizmente, o experimento erra nas dosagens e transforma este Covenant naquele que é um dos piores exemplares da franquia até então.

Iniciando-se cerca de 10 anos após David (Michael Fassbender) e a Dra. Elizabeth Shaw (Noomi Rapace) terem partido para encontrar o planeta dos Engenheiros, somos apresentados à nave Covenant, que carrega uma missão de colonização com mais de 2 mil tripulantes, que seguem para um planeta potencialmente habitável. Ao captarem uma misteriosa transmissão vinda de um planeta nebuloso, a tripulação muda os planos para explorá-lo e encontrar ali algo que talvez possibilite uma nova colônia. Como podem imaginar, o que os membros da Covenant encontram ali é um horror alienígena na forma dos xenomorfos, além de outras revelações curiosas.

Um viajante de uma terra antiga

É um planejamento muito estranho o de Ridley Scott. Além deste Covenant, ele já planeja mais 4 exemplares da franquia, com um suposto Alien: Awakening prometendo cobrir os eventos anteriores a este novo filme. Bem... Não teria sido mais fácil fazer Awakening antes de Covenant, então? A impressão que fica aqui é que Scott fez um filme por obrigação, para tirar do caminho. Todo o instante está tentando nos lembrar de como o primeiro filme foi bom, afinal a grande parte de seu primeiro ato é uma tediosa e sem vida repetição de praticamente todos os incidentes incitantes de Alien e Prometheus, desde o despertar da tripulação, passando pela obrigatória transmissão de uma mensagem, o pouso dramático no planeta e as primeiras infecções. Isso revela como a fórmula de Alien é perigosamente limitada, já que novamente estamos diante de uma repetição que não empolga mais como antes.

Tudo bem que o roteiro de John Logan e Dante Harper acerta ao apostar em um núcleo distinto - formado inteiramente por casais -, mas não vai muito além disso, contando também com o problema extra de ter personagens demais para tentar desenvolver. Todo o apego entre os casais até funciona graças ao trabalho correto do elenco, com um destaque especial para o formidável Danny McBride, mas em sua maioria acabam reduzidos a clichês e piadinhas que talvez tenham sido engraçadas nos anos 90. Mas a verdade é que estamos mesmo diante de meras figuras humanas sem graça e que aguardam para serem trucidadas pelo Alien, e estou particularmente decepcionado com o desperdício de Katherine Waterston, presa a uma personagem fraquíssima e sem o carisma ou arco da fabulosa Ellen Ripley de Sigourney Weaver. Daniels passa metade do filme em um estado de luto, e sua mudança repentina para "grande heroína de ação" é simplesmente risível, já que não houve a menor construção de caráter ou superação, ainda que o filme nos force a aceitá-la como tal, seja através da regata típica de Ripley em Aliens, o Resgate ou por suas ridículas frases do tipo "vamos matar esse puto".

Quando a equipe explora este novo mundo recém-descoberto, eis que temos alguns elementos inéditos na estrutura da franquia, mas que tristemente acabam revelando-se como um dos pontos mais fracos da projeção. O personagem de David é extremamente importante aqui, assim como sua relação com o outro androide, Walter, e confesso que algumas das ideias de Logan e Harper realmente enriquecem o personagem e o transformam em uma figura enigmática e fascinante, beneficiada também pela ótima performance dupla de Michael Fassbender. Porém, o texto acaba indo longe demais em suas ideias e o conceito do personagem começa a transformar-se em uma caricatura, com frases prontas e citações de óperas, poesias e outras obras que parecem querer demonstrar um nível de superioridade intelectual completamente artificial - mesmo para uma máquina - e aqui até o ator revela-se acima da nota em diversos momentos, sendo impossível controlar o riso quando o personagem solta uma fala do tipo "I'll do the fingering".

De forma resumida, daria pra dizer que temos aqui um conteúdo ótimo para Blade Runner. Mas péssimo para Alien.

Nada resta, junto à decadência

Pior é ver como tudo isso se encaixa na mitologia do Alien, que tem seu conceito simples e funcional do longínquo primeiro filme extrapolado para algo muito mais grandiloquente e exagerado, que acaba eliminando toda a essência do conceito de Dan O'Bannon. Algumas coisas simplesmente não precisam de tanto invencionismo para se justificar, e acabam deturpando o próprio sentido de sua criação... Em diversos momentos me peguei lembrando de algumas das ideias "brilhantes" de  O Exterminador do Futuro: Gênesis e Jurassic World, apenas para citar o nível de problema que temos aqui, pois este filme praticamente destrói a imagem do xenomorfo ao lhe trazer as ideias mais estúpidas e pavorosas desde que Jean-Pierre Jeunet inventou de cruzar Sigourney Weaver com um Alien em Ressurreição.

O mais triste é ver como nem mesmo a direção de Ridley Scott é capaz de oferecer algum brilho a este material tão pobre. O homem que um dia chocou todas as plateias com a cena do chestburster em O Oitavo Passageiro ou até mesmo a infame cena da cesariana em Prometheus parece não estar presente, já que nenhum momento da projeção tem metade do impacto que essas duas sequências tiveram em seus respectivos filmes. A única que chega perto de reproduzir esse efeito é quando um dos tripulantes agoniza enquanto um xenomorfo começa a sair de sua coluna vertebral, onde temos uma imagem gráfica e chocante graças à crueza de Scott e sua coragem de apostar no gore. Porém, é uma cena tão rápida e sem o suspense, a antecipação ou o jogo de câmera que tornou o chestburster tão memorável, sem falar que os efeitos digitais da criatura que nasce dali são terrivelmente artificiais, e o design sonoro do bicho é tão agudo que chega ser patética sua tentativa em ser ameaçador.

E pior, Scott está mais genérico do que nunca. Mesmo quando temos sequência mais elaboradas de perseguição, vide o clímax em que dois personagens estão dentro de um espaço fechado procurando o temível Alien escondido através de corredores e portas - um prato cheio, convenhamos - o diretor decepciona com uma decupagem previsível e sem a menor criatividade, além de tomar emprestado praticamente todo o conceito da cena do emprisionamento em Alien³. Mesmo com uma fotografia mais dark de Dariusz Wolski e uma trilha acertada de Jed Kurzel (que é bem feliz ao trazer de volta o icônico tema de Jerry Goldsmith), são decisões ruins atrás de decisões ruins e, novamente, é realmente broxante ver o ameaçador xenomorfo sendo criado através de um péssimo CGI. Poxa, até o Paul W.S. Anderson trabalhou com aliens práticos em seu AVP...

Contemplem minhas realizações

Porém, ao menos a produção geral do projeto merece uma enxurrada de elogios. O brilhante design de produção de Chris Seagers segue expandindo os mundos estranhos e alienígenas desse universo, já nos impressionando logo na ótima cena de abertura onde temos um prólogo com a primeira sessão teste de David, sentado em um ambiente que assusta de tão clean e branco, com os móveis palaciais e as obras de arte aleatórias dando uma forte impressão de 2001: Uma Odisseia no Espaço. Seguindo essa linha, o design da espaçonave Covenant impressiona por seu tamanho e pela engenhosidade de seu sistema de energia, funcionando bem plastica e narrativamente. Por fim, aplausos para todo o visual dos domínios de David, seja pelo desolado "quintal" que traz estátuas petrificadas que imediatamente nos remetem à tragédia do Vesúvio ou à sua sinistra sala de experimentos.

O novo Alien aqui, batizado apropriadamente de Neomorph, também ganha um design muito interessante. Trocando a marcante cor preta por um branco assustador e a boca gigantesca por um tipo de mandíbula circular que muda de tamanho, é um visual ameaçador e criativo para a criatura alienígena, e confesso que até mesmo o efeito visual usado aqui funciona de forma muito mais eficiente do que no xenomorfo clássico. As novas formas de contágio também trazem certa inovação, com o patógeno alienígena sendo transmitido através de minúsculas partículas no ar, e que rendem uma criatura diferente dependendo da via de infecção - vide as formas diferentes do Neomorph ao se hospedar através de um ouvido ou de narinas.

É realmente decepcionante que o mesmo diretor que tenha feito o brilhante Alien, o Oitavo Passageiro tenha feito um desserviço tão grande a uma de suas obras-primas com um filme tão genérico, sem graça e indigno de um dos maiores monstros da História do Cinema. Alien: Covenant demonstra o desgaste da franquia, que insiste em repetir fórmulas batidas e confiar na condução de um diretor que, tal como o Ozymandias de Shelley, agora é apenas a ruína de um gigante enterrado na areia.

Só espero que Alien possa descansar em paz, ou que James Cameron largue Pandora e apareça em um power loader para salvar o xenomorfo das garras de Ridley Scott. 

Alien: Covenant (Idem, EUA - 2017)

Direção: Ridley Scott
Roteiro: John Logan e Dante Harper, argumento de Michael Green e Jack Paglen
Elenco: Katherine Waterston, Michael Fassbender, Danny McBride, Carmen Ejogo, Billy Crudup, Demián Bichir, Callie Hernandez, Tess Haubrich, Amy Seimetz, Nathaniel Dean, James Franco, Noomi Rapace
Gênero: Ficção Científica, Suspense
Duração: 122 min

https://www.youtube.com/watch?v=G2i3QofZDfk

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Salvar


by Lucas Nascimento

Crítica | Alien³ - Assembly Cut

Com Spoilers

A era do blockbuster germinou no fim dos anos 1970. E, desde sempre, absolutamente tudo que envolve muito dinheiro, envolve muitos riscos. O cinema é uma arte de riscos, principalmente naquela época na qual não havia um termômetro certo para sucessos como há nesta década de blockbusters nostalgia e de super-heróis.

Essas constantes ocasiões de liberar 150 a 250 milhões em diversos projetos não era regra e além disso, a computação gráfica para cinema só daria seus primeiros passos em meados de 1990. Apesar do desespero em emplacar uma franquia de ficção científica marcante depois de Star Wars, a Fox nunca apostava financeiramente em extenso com Alien, O Oitavo Passageiro na tentativa de maximizar o lucro. E assim foi feito com Alien e Aliens, O Resgate, dois filmes que renderam quase dez vezes mais o valor de seu orçamento.

Com a franquia enfim abraçando os anos 1990, a Fox foi um pouco mais benevolente e destinou ao menos 40 milhões para a produção de Alien 3. Preservando a característica de convidar diretores novos e muito promissores para comandar o filme, o estúdio chamou David Fincher – hoje, gênio consagrado – para realizar seu primeiro longa-metragem da carreira. Entretanto, as coisas saíram de mão muito rápido criando esta produção que figura entre uma das mais problemáticas da História do Cinema – isso por si só renderá um artigo que farei em breve para o nosso sempre extensivo especial de Alien.

Esclarecido que a situação de produção desse filme foi caótica, o corte do cinema (do produtor) de Alien 3 sempre fora muitíssimo criticado o jogando em completo escanteio e oposição a notória qualidade de seus antecessores. Dizem que o tempo cura tudo. De certa forma, devolveu a noção para o estúdio em lançar um novo corte para Alien 3 baseado nas anotações de como Fincher queria que o longa fosse montado, já que, depois de tão traumática experiência, o diretor se recusava a se envolver novamente.

Nessa justíssima missão, proponho na crítica a seguir explorar o quão valioso é Alien 3 em seu famoso Assembly Cut. A quase meia hora adicional transforma este filme que era medíocre em algo não só ótimo, mas como bastante profundo.

Uma Verdadeira Antologia

Alien 3 realmente comprova que a franquia Alien trata-se de filmes antológicos contando com um único fio de união entre os quatro filmes: Ellen Ripley. Inspirada em um argumento original bastante distinto de Vincent Ward, a narrativa basicamente desconstrói todo o esforço de Ripley em salvar Hicks e Newt em Aliens.

Antes de ser destruída, a Rainha Alien consegue implantar um ovo contendo uma royal facehugger a bordo da ala das câmaras criogênicas da Sulaco. Após contaminar Ripley e causar um incêndio com seu sangue ácido, o alien acaba causando o desprendimento do módulo da nave que entra na gravidade do planeta Fury 161, morada de uma colônia penal para criminosos condenados portadores do mal do duplo cromossomo Y.

Na queda, apenas Ripley sobrevive. Assustada e desconfiando que esteja com um parasita alien, a heroína terá que se familiarizar com os detentos nada simpáticos e também lidar com uma nova espécie de alien que chegou junto com ela no planeta.

Antes de prosseguir, é importante ressaltar que o roteiro de Alien 3 foi pronto conforme as filmagens aconteciam. Os executivos da Fox tinham alterado boa parte de essência do argumento de Ward que recusou tratar o texto. Para essa tarefa inglória, David Giler, Walter Hill e Larry Ferguson tentaram fazer de tudo para extrair uma história juntando as visões discrepantes do argumento original com a da Fox.

Em termos de narrativa, assim como boa parte da franquia, Alien 3 não é nada complexo, mas é uma das incursões mais interessantes. Ainda temos os moldes clássicos de apresentação>situação>apresentação da ameaça>reconhecimento>estratégia de eliminação da ameaça>conflitos>catarse>fim. É algo clássico e funcional. Nesse sentido, não há nem como mexer em uma estrutura tão sólida e eficiente que consegue transgredir as artes.

Talentosa Ripley

Sabendo disso, o que raios os roteiristas poderiam oferecer de novo aqui? Por muita coragem, a franquia se renova a cada filme: um thriller de suspense, um blockbusters explosivo de ação e, aqui, um drama existencial pessimista e denso. Sim, denso. Creio que dos 4 filmes, Alien 3 seja o que mais compreende o drama que Ripley carrega até seu dramático fim – Alien: A Ressureição não conta nessa equação, é outra personagem que mais se assemelha a uma super-heroína.

Assim como nos anteriores, Ripley é um peixe fora d’água. O aborrecimento com os alienígenas e a sua constante miséria da sua vida roubada refletem em seu estado de espírito apagado, mortificado. Perdendo seu propósito de viver pela segunda vez, não há muito mais pelo que Ripley tenha que embarcar em outra luta contra os xenomorfos. Sua motivação é altruísta e busca de uma redenção para a culpa da morte de seus amigos. Um fim também para sua eterna perambulação pelo espaço. Aqui ela é um fantasma do passado.

A relação com os outros personagens nunca deixa de ser interessante que, assim como muitos outros, a tratam como uma pária, um perigo para a ordem vigente ou a responsável pelo surgimento dos xenomorfos – algo sempre muito irônico dado os eventos de Alien – O Oitavo Passageiro. A questão aqui é justamente esse desinteresse lacônico de Ripley em continuar vivendo. O único elo romântico que ela conquista com o simpático médico Clemens é novamente destruído pelo alien. Essas criaturas são a cruz que ela carrega, sempre a impedindo de ter um pingo de alegria na vida. Destruíram tudo que ela amava e o que ela era.

Desse modo, há reflexões leves sobre o destino de Ripley estar ligado com o dos aliens. Sempre surgindo para expurgar o mal do mundo. Isso é exposto de modo bonito por diálogos sutis e da ótima atuação angustiante de Sigourney Weaver – destaque para a frase “Você está em minha vida por tanto tempo que já não me lembro de mais nada. ”.

Questionamentos sobre o tempo de vida anormal de Ripley também aparecem aqui e ali. É importante ressaltar tudo isso para entender esse ótimo drama para a personagem. A evidência do desejo de morte é tamanha que em dois encontros com o antagonista, ela não faz questão de confrontá-lo. O peso da desistência na heroína é transmitido com clareza.

Reconhecendo essa ligação tão forte entre ela e as criaturas, fico emocionado pela clareza e coragem do final do longa. O suicídio de Ripley, negando enfim uma chance completa de recuperação e de ter uma vida normal, conclui sua pavorosa jornada de infortúnio extremo. Seu final é também a conclusão da disseminação dos xenomorfos. Depois de perder tudo tantas vezes, Ripley ganha sua odisseia pessoal.

Novo Mundo, Mesmos Pecados

Uma das grandes peculiaridades de Alien 3 é situar sua narrativa em um planeta presídio para condenados praticamente abandonados à própria sorte. Em termos caracterização, os roteiristas e designers de produção conseguem conferir elementos realmente singulares para Fury 161. Além do clima ingrato, da infestação de piolhos, do visível abandono das instalações do presídio de segurança máxima que, ironicamente, não conta com nenhum armamento, há uma característica que tenta aprofundar os muitos detentos: a profunda ordem religiosa.

Baseado no cristianismo, os presidiários se contentam com a fé aliada ao celibato e a chegada de Ripley, a única mulher, é vista também como uma tentação do diabo – este representado pelo xenomorfo. Essa união prática e simbólica de Ripley com o alien, do diabo e seu emissário, ajudam a delinear os contrastes entre os núcleos.

O texto tão pouco demora para explorar o quão frágil é a fé de alguns homens que já se dispõe a estuprar a protagonista cedendo aos desejos carnais – aliás, esse é uma das péssimas cenas do filme. Como toda narrativa de grupo, a coesão é muito necessária para que os personagens sejam desenvolvidos ainda mais quando temos um drama existencial envolvendo a protagonista.

Se Alien 3 pode ser admirado, é na qualidade dos diálogos muito crus e orgânicos para todo o grupo. Cada personagem fala de uma maneira distinta e se comporta de modo diferente o que é algo excepcional levando em conta como todos podem ser confundidos graças às muitas cabeças carecas. Clemens, o médico, é o segundo personagem mais trabalhado e o choque da sua morte em um momento de revelação surpreende pela coragem.

Os outros seguem caminhos quase similares. Um dos mais interessantes é o louco Golic que elucida as questões do luz e trevas em sua loucura. A grande alteração da Assembly é justamente na função de seu personagem que o torna consideravelmente mais complexo e fiel a esse dilema religioso que paira no texto. Notar que Golic é o membro alienado e estranho ao grupo, assim como é Ripley é importante.

É formidável como os roteiristas delineiam essas semelhanças e a diferença de desenvolvimento entre Golic e Ripley e a relação de ambos com o grupo. Golic é o alienado que acabou com a mente surrupiada cuja identificação se dá justamente com o alienígena o libertando de seu confinamento na busca de encontrar um “similar”. Ripley não cede ao grupo, mas o muda inteiramente mesmo sendo desacreditada quando afirma a existência do alien e ainda visa destruí-lo novamente. São desenvolvimentos perpendiculares que tomam rumos completamente opostos. Golic seria uma representação do “e se” de Ripley caso tivesse desistido de sua sanidade após os eventos dos outros filmes.

O que também distingue esse roteiro é o rápido avanço de transformação do grupo. Em vez de apostar no clichê da inaptidão de um grupo religioso que só esperaria pela providência divina, Ripley consegue erguer a moral dos homens e reacender o instinto de sobrevivência – novamente, um belo contraste de espírito entre os dois lados. É exatamente na metade da obra que acontecem as mortes que acabam unindo os dois lados e firmando a busca pela liderança. Os atritos enfim cessam.

Particularmente, gosto muito mais da relação do conflito de Alien 3 que busca remeter a O Oitavo Passageiro em apostar na astúcia de planos elaborados para se livrarem do bicho. Detalhe que isso ocorre duas vezes nesta versão.

Então nesse jogo bem-disposto, já há a transformação de homens que pouco se relacionavam e somente compartilhavam a “fé” pela união de todos em prol da sobrevivência do grupo. Pequenas pérolas de desenvolvimento surgem aqui e ali com Dillon, Morse e Andrews. Fico impressionado como os roteiristas, mesmo com tantas revisões, conseguiram manter a obra bem aglutinada e coesa.

Entretanto, mesmo tendo tão pouco a reclamar do texto do Alien 3, uma das coisas que muito me incomodam é o tratamento dado para Newt e Hicks no começo do longa. Apesar de gerar a poderosíssima cena da autopsia e da angústia dúbia de Ripley evidentemente mais temerosa pela chance de contágio do que o luto da morte de sua nova “filha”, era possível obter os mesmos resultados buscando modos mais sagazes e de impactos dramáticos ainda maiores.

Muito provavelmente não teríamos o valioso trabalho com Clemens, mas matar Hicks e Newt ao longo da jornada neste planeta prisão teria potencializado ainda mais a impotência da protagonista diante a força natural do xenomorfo. Infelizmente, isso aborda o tema do “e se” que sempre deve ser evitado em um texto analítico. O filme é o que ele é. E de fato, com a interpretação certa, é uma obra grandiosa que finaliza com dignidade o arco de Ellen Ripley.

Batismo de Fogo

Talvez David Fincher tenha uma das estreias mais estressantes em Hollywood que qualquer outro diretor que já tenha pisado por ali. Ainda muito jovem e vindo da indústria dos videoclipes, Fincher era um completo desconhecido. Ninguém fazia ideia de seu gênio e do método de direção que ele desenvolveria para o filme.

Acreditando que poderiam controlar a fera, a Fox o contratou mesmo sem ter o roteiro finalizado em mãos – aliás, igualmente impressionante é o trabalho de Fincher em ter conseguido criar algo totalmente novo e distinto do restante da franquia até então. Já com esse grande problema de trabalhar sem a base de um filme, Fincher pegou o bonde andando já que muita coisa da produção havia iniciado tempos antes dele chegar nos estúdios.

Entretanto, mesmo com tantos percalços, é notório o profissionalismo de Fincher que conseguiu sim imprimir uma atmosfera completamente única para Alien 3. Nunca houve dúvida que ele estava envolvido com o filme, porém o esgotamento provocado pelo stress poderia sim ter causado um desastre cinematográfico de proporções monumentais.

Nesta edição, finalmente vemos como Fincher dedica alguns minutos para mostrar a atmosfera e o ambiente daquele planeta amaldiçoado com ligeira contemplação – destaque para os matte paintings ricos que fornecem a profundidade e riqueza visual em perspectiva. As praias, os vermes, as vestes externas e um pouco da funcionalidade da colônia. Desse modo, os elementos ganham peso maior e se tornam mais críveis para o espectador que deixa de pensar que “ah, é só mais um lugar x para o alien matar umas pessoas estúpidas”.

Além da substancial mudança da captura do alien e sua posterior fuga por Golic, a outra novidade bem recebida é a concepção diferente do Dog Alien que passa a ser o Bambi Alien. Em termos de simbologia, tanto o cachorro e o boi virarem os hospedeiros para o desenvolvimento da larva têm pesos semelhantes e muitíssimos interessantes.

Com o cão no corte de cinema, elabora-se uma grande ironia do melhor amigo do Homem justamente incubar o maior algoz que os personagens encontram na narrativa, os forçando reacender o instinto de sobrevivência – mais interessante ainda é a escolha da raça Rottweiler que geralmente é definida como um cão de guarda que oferece proteção a seus donos.

Já o boi na Assembly Cut tem significados mais profundos e menos óbvios. O boi, desde a idade média, é símbolo de fertilidade e estabilidade, já que provê prole para sustentar uma sociedade. Subvertendo em parte seu significado, Fincher preserva o sentido de fertilidade ao boi dar “à luz” ao novo alien mais mortal e desenvolvido que desestabiliza toda a ordem naquele lugar. Sua função como alimento para os presos também é subvertida com ironia já que esse é justamente o primeiro xenomorfo que apresenta comportamentos de se alimentar das suas vítimas.

A visão de Fincher

Em termos plásticos, Alien 3 é um filme de visual peculiar. Finalmente abandonando toda aquela fumaceira dos dois primeiros, Fincher emplaca sua visão para um mundo árduo, depressivo e estéril. Todo o design, direção de arte e fotografia seguem o padrão amarronzado nauseante que tem seu significado até mesmo exposto por um personagem: "All we got here is shit!"

Mesmo com essa paleta morta, fétida e que deveria ser sem-graça, o diretor elabora planos majestosos e usa a montagem para criar paralelismos nada menos que brilhantes. O exemplo clássico disso é a cena do funeral de Hicks e Newt intercalada com o nascimento do xenomorfo – tudo isso embalado pela trilha excepcional de Elliot Goldenthal que realiza talvez sua obra-prima com as músicas aqui.

Outros lances de encenação bastante inteligentes estão na morte de Clemens na qual Fincher faz uma sequência de penetrações através da montagem – da agulha na pele de Ripley para a língua do xenomorfo quebrando o crânio do personagem. São momentos valiosos que já destacam a autoria de Fincher como um brilhante jovem diretor.

Uma escolha bastante inusitada é a quantia inacreditável de contra-plongées que existem aqui. Fincher opta em filmar com câmera baixa a apontando para o teto quase sempre valorizando as construções enormes da direção de arte conferindo realidade para os ambientes – enquadrar o teto na composição não era o padrão de Hollywood por conta da inexistência dessa parte nos cenários (um dos primeiros a fazer isso foi Orson Welles em Cidadão Kane).

Aliás, por comentar a direção de arte, é legal destacar como o resgate aos elementos egípcios e faraônicos é presente no filme. Os corredores a la catacumbas das pirâmides nunca foram tão presentes como neste, assim como grandes câmaras como a do ventilador gigante.

Pequenas homenagens de Fincher para o trabalho de Ridley Scott também surgem em alguns momentos. Alguns adereços de cenários fazem as referências certas, mas Fincher incorpora a encenação do britânico em alguns momentos como durante o segundo confronto de Ripley com o xenomorfo camuflado entre as tubulações assim como em O Oitavo Passageiro.

O diretor também busca enfatizar melhor a relação de Ripley com o alienígena, oferece contornos mais interessantes para a Weyland Yutani resultando na ótima cena final do auto sacrifício de Ripley.

Apesar de rasgar tantos elogios para o trabalho de Fincher, é evidente que há alguns problemas. Às vezes a encenação torna-se caricata demais destoando da atmosfera proposta – a cena da tentativa do estupro e da trombada de dois presidiários fugindo do alien são exemplos claros. Outro enorme problema é entender a decupagem de ação que Fincher trabalhou aqui – desde então quase nenhum trabalho seu envolve grandes peças de ação, reparem nisto.

As duas grandes sequências para capturar o alien são bastante confusas com planos e movimentos de câmera que sacrificam completamente a lógica geográfica do lugar afetando a credibilidade da captura e destruição do bicho em ambos os momentos. Outros elementos já são inerentes à idade do filme. Enquanto boa parte dos elementos visuais não envelheceram, assim como a decupagem do restante das cenas, os efeitos de rotoscopia, marionetes e até mesmo o único plano com efeitos de computação gráfica acabam escancarando a idade do filme. Como a movimentação desse alien era bastante diferente, os efeitos de rotoscopia e escala, apesar de qualidade para a época, não conseguem superar as máscaras e animações virtuais que foram desenvolvidas em pouquíssimo tempo depois.

A Revolução Herdada

Desde sua concepção, a franquia Alien conseguiu sempre revolucionar o gênero de ficção científica a cada novo filme. Com Alien 3 isso não foi diferente e falo sério quando digo isso. Fincher tratou o gênero com respeito buscando preencher uma lacuna consideravelmente vazia de filmes de horror em geral apostando em dramas emocionantes e narrativa inteligente.

Não se tratava em levar a franquia novamente por um terreno explorado pelo horror profundo e do tiroteio cheio de adrenalina. Alien 3 conseguiu quebrar a expectativa de ver as mesmas coisas de sempre e tentou inovar. Uma pena que na época e também pelo seu corte de cinema, conquistou muito pouco da crítica e do público. Não só por conta disso, sem dúvidas afirmo que se trata de uma obra a frente de seu tempo – talvez, até mesmo para os dias de hoje já que constantemente é um filme covardemente atacado até por fãs que nunca ousaram assisti-lo o encarando como peça fundamental da antologia e como fim para o arco de Ripley.

Alien 3 merece sim figurar entre os grandes filmes da franquia, pois ele é grande e captura o espírito dos filmes com muitíssimo respeito. Sua originalidade, seja no texto, na ótima direção ou na fantástica trilha musical, mostra que, de alguma forma, David Fincher conseguiu vencer o sistema resultando nesse clássico Assembly Cut. No fim das contas, é um ótimo final para uma grande trilogia e uma excelente personagem.

Alien³ - Assembly Cut (Idem, EUA – 1992)

Direção: David Fincher
Roteiro: Vincent Ward, David Giler, Walter Hill, Larry Ferguson
Elenco: Sigourney Weaver, Charles S Dutton, Charles Dance, Paul McGann, Brian Glover, Ralph Brown, Danny Webb
Gênero: ficção científica, horror espacial, ação
Duração: 155 minutos

https://www.youtube.com/watch?v=KUTaNMJJBa8

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by Matheus Fragata

Crítica | A Mulher que se foi

Uma mulher está a trinta anos na prisão. O assassinato que a condenou, porém, quem cometeu foi outra detenta, uma das suas melhores amigas. Agora ciente dos acontecimentos, essa mulher é libertada. Ninguém pode saber da sua soltura, avisa ela à diretora da prisão. A prisioneira, professora de escrita e leitura, é solta dessas obrigações para conseguir olhar para a sua vida pessoal. Entre numa jornada para reencontrar seus filhos e concretizar a vingança contra o ex-namorado que armou sua prisão. A Mulher que se foi, mesmo com as diversas referências e elementos de cunho religioso, é um filme que parte de onde Tolstói parou em seu conto Deus vê, mas custa a revelar, inspiração do roteiro.

O texto de 1872 não é da “fase cristã radical” do russo, é anterior à Anna Karenina, mas dá papel relevante à fé, sendo uma parábola sobre o perdão. A premissa é semelhante, mas vemos os antecedentes, o momento da prisão, a vida na Sibéria, do estabelecimento de sua fé cristã e do seu comportamento “justo”, e o encontro, depois de 26 anos, o culpado do crime original. Esse confessa a autoria, mas o protagonista morre antes de sair da prisão, já sem qualquer ilusão de reencontrar a esposa e os filhos. Lav Diaz mostra uma personagem que tenta escapar das conformidades, mais humana, em dúvida – ainda sim apresentando traços de religiosidade.

Horacia (Charo Santos), a protagonista do filme, livre, encontra sua filha Minerva (Marjorie Lorico) com facilidade. Mas a busca que vai mover o resto da trama será pelo seu filho, Redentor. Seguindo uma pista, Horacia disfarça-se e passa a participar da vida noturna de uma cidade. É lá que encontra o tal ex-namorado, Rodrigo Trinidad. Agora com o nome de Renata, a protagonista se integra com uma população marginal, vira amiga de um corcunda (Nonie Buencamino) vendedor da iguaria balut (ovo de pato fertilizado, com embrião parcialmente desenvolvido, e cozido), e da travesti Hollanda (John Lloyd Cruz), que sofre de epilepsia.

Lav Diaz constrói seu filme com rédea curta. Além de diretor e roteirista, é o montador e diretor de fotografia. Sente-se uma unidade muito clara entre todas as partes, mesmo com algumas falhas que outro par de olhos poderia ter evitado. A filmagem em um belíssimo preto e branco com bastante contraste, funciona nos planos abertos que dominam o filme. A visão de Diaz impregna a tela, mas ele exige também que o espectador passeie pela tela, atente para a disposição dos objetos e das pessoas – justificando a longa extensão das cenas. Destaque para as tomadas externas noturnas, tão misteriosas e surpreendentes como a própria Horacia.

Importante destacar essa ligação entre a forma e o desenvolvimento da personagem: ao mesmo tempo em que sabemos das intenções de Horacia, pelo que ela fala, também deixamos de ver outras ações, que acontecem fora da tela. Os ícones sagrados e igrejas contrastam com o ambiente da pobreza, da desocupação forçada da terra pela polícia filipina (momentos pontuais, quando os tableaux parecem misturar a visão de Apichatpong Weerasethakul e Goya). A ausência de trilha sonora faz que cada anúncio do rádio, as notícias sobre a política nacional, a morte de Madre Teresa de Calcutá (a morte da piedade) repercuta seu significado no filme. O contexto sócio-político se soma às ações, à própria mistura de línguas (filipino, inglês e espanhol) e à própria natureza dos personagens para apresentar um cenário de indefinição.

Da saída da prisão para a reconstrução da identidade, A Mulher que se foi pretende misturar a noção de compaixão, que foca mais no aspecto moral do que bem no religioso, mais estetizante, com a da transmissão dos desejos. Quer dizer, Horácia está definitivamente afastada da sociedade, ela é uma marginal em sua própria vida. Ela acaba não conseguindo concretizar sua vingança pelas próprias mãos. Seu arroubo de violência com Hollanda, personagem de quem mais se aproxima, no intuito de reaver psicologicamente um filho, é a chave humana que concretiza a morte de Trindad.

É uma história com muito potencial e com momentos marcantes, mas Diaz parece perder a mão na decupagem do seu filme. As longas tomadas cumprem seu papel de conectar o espectador às personagens enquanto estas ligam-se entre si, uma dramaturgia movida pelo tempo cronológico, mais do que em momentos de estabelecimento psicológico. Essa incapacidade de Horacia encontrar a seu filho Redentor após o extermínio de Trinidad (a Trindade, isto é, de Deus), e, portanto, do encontro com seu Eu passado (de mãe, esposa, sem antecedentes criminais) não consegue se concretizar senão artificialmente na bondade para com os marginais, como ela. Tão artificialmente quanto Diaz divide e termina seu filme.

Tendo uma visão distanciada, a mesma visão que ele trabalha em seu filme, os defeitos narrativos de A Mulher que se foi ficam muito evidentes. A extensão de três horas e quarenta, infelizmente, não é totalmente justificada em comparação com seu efeito final, que poderia ter sido obtido mesmo com uma duração menor. E afirmo isso tendo em vista que não há nenhum problema idealmente em fazer um filme que não se encaixa no espaço dos 90 a 150 minutos usuais. Prova disso, são as filmografia de nomes importantes como Béla Tarr, Sion Sono, Syberberg, Raúl Ruiz, e de boa parte dos filmes do próprio Lav Diaz.

A Mulher que se foi (Ang Babaeng Humayo, 2016)
Direção: Lav Diaz
Roteiro: Lav Diaz
Elenco: Charo Santos-Concio, John Lloyd Cruz, Michael De Mesa, Nonie Buencamino, Marjorie Lorico
Gênero: Drama
Duração: 226 min

https://www.youtube.com/watch?v=Uc6cLFSb_IQ


by Redação Bastidores

Crítica | Alien, O Oitavo Passageiro

Crítica | Alien, O Oitavo Passageiro

Com Spoilers

O crítico literário Otto Maria Carpeaux, em um dos seus célebres escritos, diz que os clássicos estão cobertos por uma espécie de fumaça histórica que nos impossibilita de enxergar os seus verdadeiros méritos. É como se o peso que a tradição lhes dá fosse pesado demais para que alguém pudesse contrariá-los. Em razão disso, Carpeaux tinha o princípio de analisar uma obra como se ela tivesse acabado de ser lançada. Às vezes, livros intocáveis eram severamente criticados. No entanto, mesmo que essa posição acabasse por gerar alguns inimigos, ele se mantinha fiel ao seu princípio, ao seu próprio mandamento.

Eu, como crítico de Cinema, quando estava construindo o meu repertório de regras a serem seguidas, estabeleci para mim mesmo esse princípio exposto por Carpeaux. Dessa maneira, muitas vezes fui visto nos encontros profissionais como um enfant terrible, um sujeito que gosta de provocar ou causar polêmica. Mas, não há o que fazer. Existem obras de arte superestimadas e isso é um fato. Todavia, do outro lado da moeda, também existem clássicos que merecem completamente os louros que lhes foram dados. Nem mesmo a análise mais escruciante ou o cinismo desprovido de vida é capaz de não reconhecer os devidos méritos.

Na seara do Cinema, Alien, O Oitavo Passageiro é um desses clássicos. Ao longo da minha vida, tive a chance de assistir ao filme inúmeras vezes e em nenhum delas enxerguei um único elemento que pudesse manchar a impressão de que a obra de Ridley Scott é uma das maiores conquistas cinematográficas já testemunhadas na história da Sétima Arte. Não há nada no longa indicando que os detalhes ou algumas das cenas foram um resultado do acaso, uma junção bem sucedida de sorte e casualidade. Tudo é uma prova cristalina de que aquilo que o espectador vê, ouve, sente e pensa foi intencionado e impecavelmente realizado pelo diretor e a sua equipe.

Já começando com uma série de movimentos de câmera e planos que servem tanto como um foreshadowing quanto uma apresentação de cada uma das alas da nave cargueira Nostromo (o roteirista Dan O'Bannon decidiu nomeá-la dessa maneira por causa do romance homônimo de Joseph Conrad), o filme, cuja história gira em torno de um grupo de tripulantes que, na viagem de retorno à Terra, depois de interceptarem uma transmissão de origem desconhecida, entram em contato com um organismo extraterrestre que põe as suas vidas em risco, é um assombro do começo ao fim.

No plano conceitual, uma das coisas que mais chamam atenção é a maneira com que a obra flerta com a noção de protagonismo. Geralmente, existem formas de reconhecer quem é o principal personagem de uma história. Colocar em primeiro lugar nos créditos iniciais o nome do ator/atriz que o interpreta ou mostrá-lo ao público antes de todos os outros são alguns dos códigos de reconhecimento estabelecidos. Em Alien, O Oitavo Passageiro, o primeiro nome que surge é Tom Skerritt e o personagem que aparece antes dos outros é Kane (John Hurt). No entanto, nenhum dos dois é o protagonista. Na verdade, as honras deste papel coube a Sigourney Weaver, que interpreta a personagem Ripley.

Aparecendo desde o começo mas quase nunca sendo filmada como se fosse a pessoa mais importante do filme (ao menos no primeiro ato), aos poucos, em decorrência da morte dos outros tripulantes, ela começar a tomar a dianteira, e é só depois de um tempo que o espectador percebe quem é, de fato, a protagonista. Até essa descoberta, Ridley Scott brinca com as percepções do público. Pois, se não sabemos de quem são os olhos que nos guiam pela jornada, não temos como saber quais serão as vítimas do alienígena assassino. No suspense, deixar o espectador no escuro é essencial.

Porém, essas brincadeiras com as percepções do público não acabam por aqui. Scott sabe que nós estabelecemos padrões e seguimos códigos quando estamos assistindo a um filme. É por isso que na famosa cena da morte de Kane - após criá-la brilhantemente servindo-se apenas de um plano geral que também serve como establishing shot, um olhar incisivo do personagem interpretado por Ian Holm e um movimento de câmera que nos aproxima do rosto de Hurt -, Scott indica o iminente nascimento do alienígena através de batidas cardíacas que o espectador ouve graças ao trabalho do desenho de som.

Depois dessa cena, quase sempre que o vilão do filme está à espreita, escutamos as batidas do seu coração. Assim, o suspense é criado, pois sabemos que em breve algo acontecerá. Porém, um dos motivos mais fascinantes que levaram Scott recorrer a esse recurso fica evidente na sequência em que vemos, através de uma montagem paralela, Ripley em um local e Parker (Yaphet Kotto) e Lambert (Veronica Cartwright) numa outra ala. Quando a protagonista começa a procurar pelo gato, começamos a ouvir as infames batidas. Logo, deduzimos que ela será atacada. No entanto, como estamos acompanhando ao mesmo tempo os outros dois personagens, somos surpreendidos com o fato de que as vidas que correm risco não é a de Ripley e sim as de Parker e Lambert, pois o alienígena está próximo destes. Fomos induzidos pelo diretor a pensar algo, quando, na verdade, era outra coisa diferente.

Parte dessa lógica também aparecerá na construção daquele que é o maior plot twist do filme, embora em uma dose menor. Como descobrimos no final da história, Ash (Ian Holm) é um androide. Mas, para olhos atentos, essa descoberta não deve causar muita estranheza. É claro que poucas pessoas supurariam o conteúdo dessa reviravolta, mas Scott ressalta em vários momentos a frieza do personagem. Através de close ups do seu rosto, podemos ver como em momentos de desespero, nos quais todos os outros reagem irracionalmente, ele mantém um interesse científico desumano. Sendo assim, é extremamente curioso que, apesar de as pistas serem dadas, o choque da revelação é sempre eficiente. Neste filme, Scott manipula o espectador como poucos diretores chegaram a fazer.

Contudo, os méritos de Alien, O Oitavo Passageiro não se restringem somente ao suspense. Partindo de um roteiro simples mas perfeitamente estruturado, cada um dos responsáveis pela realização do filme atinge resultados excepcionais. Se o desenho do alienígena, feito pelo artista plástico H. G. Riger, é sempre louvado, é preciso fazer justiça ao design de produção, à direção de arte e de fotografia, que, juntos, constroem um mundo sombrio, assustador (a paleta de cores varia entre diferentes tons de cinza, preto, verde e azul escuros) e que influenciou inúmeros filmes que vieram posteriormente.

Já a montagem de Terry Hawlings e David Crowder, por sua vez, contrariando as expectativas comuns, é muito mais lenta e compassada do que se esperaria em um filme de suspense. Mas, em vez de alienar o espectador, ela é essencial na construção do sentimento de antecipação. Além disso, a lentidão com que os acontecimentos vão sendo revelados é enervante e perturbadora. Quem também contraria as expectativas é Jerry Goldsmith. Durante o filme, os acordes grandiosos e as notas altas são raros. No lugar, o compositor colocou trechos mais intimistas que, juntamente com o já mencionado desenho de som, embalam o espectador sem que este perceba que está sendo embalado. Chamo atenção também para que vejam como, no terceiro ato, no momento em que Ripley desacopla o ônibus espacial da Nostromo e nós pensamos que ela se livrou do monstro, os acordes, além de serem imperceptíveis, não são gratificantes. Isso é importante para indicar aquilo que logo depois descobriremos: o alienígena ainda não foi morto. É somente no instante em que temos certeza que ele morreu que a música se torna mais edificante.

Por fim, além dos méritos que já foram citados, o trabalho de Ridley Scott ainda tem mais um aspecto a ser destacado. Não há como não elogiar o fato de que o cineasta revela muito pouco do monstro. Não vemos quase nada da criatura. Através de planos seletos (e cortes precisos da montagem), o alienígena é um mistério completo. Se não tivessem existido outros filmes da franquia, teríamos um dos vilões mais enigmáticos do Cinema. Quem é? De onde veio? Há quanto tempo ele existe? No que consiste o seu organismo? Tem algum propósito? O filme acaba e não temos quase nenhuma resposta. Do ponto de vista narrativo, isso é fascinante.

Feita esta análise e elencadas as incontáveis qualidades do longa, se lembrarmos do que disse nos dois primeiros parágrafos, podemos afirmar que a fumaça foi dissipada e, por detrás dela, estava exatamente aquilo que esperávamos. Nem mais, nem menos, simplesmente o que era imaginado, o que, quando se trata de Alien, O Oitavo Passageiro, significa "tudo". Responsável por transformar o suspense cru em obra de arte do mais alto nível, o filme de Ridley Scott é, sem sombra de dúvida, um clássico que, como poucos, merece com todas as honras essa alcunha.

Alien, O Oitavo Passageiro (Alien, EUA – 1979)

Direção: Ridley Scott
Roteiro: Dan O'Bannon
Elenco: Sigourney Weaver, Tom Skerritt, John Hurt, Harry Dean Stanton, Veronica Cartwright, Ian Holm, Yaphet Kotto
Gênero: Suspense, Ficção Científica
Duração: 116 min

https://www.youtube.com/watch?v=LjLamj-b0I8

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by Redação Bastidores

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