Crítica | Guerra Civil 2 #5
Aviso: Esta crítica contém spoilers
Como previsto, a edição 5 é uma batalha em proporções gigantescas entre os dois lados da Guerra Civil. Até o momento não consigo entender como qualquer herói defenda a Capitã Marvel. Talvez o motivo para Brian Michael Bendis não se preocupar em apresentar uma justificativa em se posicionar juntamente à Carol Danvers é porque realmente não exista uma. Como defender o abuso de autoridade que beira à quebrar a lei para prender pessoas que têm uma possibilidade de cometer um crime?
Sem Desenvolvimento
Lembra na última edição onde vimos o Pantera Negra e Capitão América na mesa com os outros vingadores para conversar com a Carol e decidir essa guerra de forma diplomática? Eles aparecem nessa edição lutando um contra o outro. Capitão ao lado de Tony e Pantera (inexplicavelmente) ao lado de Carol Danvers. Pra finalizar a participação de T'Challa, ele segura o Homem de Ferro e pede para ele "Parar essa luta!", sendo que na edição anterior foi mostrado claramente que Tony está tentando justamente isso.
Pantera Negra mal utilizadoE esse é o grande problema da maior parte dessas super sagas. Como você precisa colocar absolutamente todos os heróis dentro da mesma história, não dá tempo pra desenvolver de verdade qualquer um deles. Exigindo do leitor que ele acompanhe todas as edições solo pra ajudar a dar sentido na saga principal, como é o caso de T'Challa. Absolutamente nada na saga inteira explica o posicionamento do rei de Wakanda.
Personalidades Alteradas
O maior problema do quadrinho é justamente que muitas personalidades de heróis diferentes precisam ser significativamente alteradas para que a Guerra anunciada realmente aconteça. Em muitos casos, o personagem em si é totalmente ignorado. O importante é que ele apareça fazendo alguma coisa legal e falando alguma frase que é sua assinatura. Doutor Estranho trancando Tempestade com poderes de magia? É um deleite visual. Mas porque ele realmente está fazendo isso e porque ele decidiu esse lado? Ninguém sabe.
Caos
Adicione a este mix várias outras batalhas e lutas pessoais ausentes de qualquer peso emocional. Rocket Racoon levando um chute do Miles Morales, Sam Wilson enfrentando Magika, Doutor Estranho contra os X-Men... Tudo não passa de barulho e de um espetáculo beirando estupidez. Em dado momento da luta, Tony Stark entra no capacete de Peter Quill para tentar racionalizar com ele, enquanto Quill o consola pela morte de Rhodes. O Visão erra um tiro (de novo!) e destrói a nave dos Guardiões. Chega a ser risível. Não existe nenhuma carga dramática.
Muitos personagens, pouco desenvolvimentoA edição acaba com uma nova visão de Ulysses que interrompe a guerra. Nessa visão vemos o Homem Aranha de Miles Morales matando o Capitão América. Mesmo que Tony saiba que a visão não é algo que realmente acontecerá, todos juntos param de lutar. A edição finaliza com Capitã Marvel se aproximando de Miles e anunciando sua prisão, com todos os heróis somente olhando.
Arte
David Marquez e Justin Ponsor continuam seu bom trabalho para desenhar ação. A confusão das batalhas fica reservada somente para as motivações, não para as lutas. Sempre com bastante dinâmica e belamente feitas, temos explosões e raios de poder para todos os lados, sem perder de vista os ângulos da ação. Existe um painel em específico que me chamou muito a atenção e é justamente o único em que Clint Barton aparece. Na terceira edição tínhamos o painel onde ele se entrega, com muita luz sobre seu corpo em posição de rendição. Nesta, temos ele em isolamento, caminhando por uma floresta com seu arco preso às costas. Agora seu rosto está virado para baixo com sombras e linhas mais rústicas. A cena denota um tom sombrio para o herói.
A única ressalva para o trabalho do desenhista desta edição é que o cenário onde eles estão lutando é desprovido de grandes detalhes. Existem cenas que nos fazem pensar que eles estão lutando dentro da sala de treinamento da Mansão X. Não existem veículos, objetos, paredes... Somente o chão do terraço que é muito pouco detalhado. Grande destaque para os heróis, pouca atenção para o plano de fundo.
Conclusão
A falta de carga dramática tem o efeito de justamente alienar o leitor. Nós acabamos lendo o quadrinho como se estivéssemos vendo um jornal. Sabemos quem está envolvido, sabemos quem matou quem e quem destruiu o quê. Mas não fazemos ideia das motivações pessoais. A história se torna desinteressante.
E o pior é que já estamos na edição 5 e certa profundidade já deveria ter sido conquistada. O leitor já deveria estar mais envolvido com os personagens e familiarizado com o que eles defendem.
Apesar de um início interessante, Guerra Civil continua dando sinais de fraqueza e Bendis entrega um trabalho muito inferior ao que já vimos em seu currículo e extremamente comercial.
Crítica | Guerra Civil 2 #4
Aviso: Esta crítica contém spoilers
E após uma edição que nos mostra que Guerra Civil 2 pode ser uma saga interessante, acordamos dessa ilusão com a edição 4. Guerra Civil 2 será somente mais uma saga.
O que realmente é uma pena, apesar de longe de ser surpresa. Poucas super sagas Marvel têm realmente sido um ponto fora da curva, como Guerras Secretas de 2015. Elas passaram a ser somente algo comercial, caça níquel. Com o lançamento do filme Capitão América: Guerra Civil , é claro que a Marvel não perderia a oportunidade de lucrar em cima da marca.
E isso fica explícito na edição 4. Temos ameaça de uma batalha com praticamente todos os heróis, entrada dos Guardiões da Galáxia, revelações sobre o Ulysses... Mas comecemos pela ponta solta da última edição.
Gavião Arqueiro
Na última edição, o veredito sobre o julgamento de Clint Barton, o Gavião Arqueiro, referente o assassinato de Bruce Banner, o Hulk, estava para sair. Essa edição se inicia com Carol Danvers visitando a Mulher Hulk no hospital, para dar a notícia do que houve. Como era de se esperar, aqui já encontramos ela saindo do coma e pronta pro combate. Algo diferente do fim da edição 1 onde parecia que ela morreria. Carol a informa sobre o assassinato de seu primo e a decisão do julgamento: Clint Barton é inocente. Notícia esta que enche Jennifer Walter de raiva:
Clint Barton tem problemas pela frenteProfiling
Como estamos acompanhando desde a primeira edição deste evento, Tony Stark procura entender o funcionamento dos poderes do personagem Ulysses. Este, por sua vez, é o pivô de Guerra Civil 2 com seus poderes de clarividência. Tony descobre que seu poder não é de fato prever o futuro, mas sim, enxergar o cenário com possibilidade de ser realidade. Ou seja, tudo o que ele viu até o momento poderia acontecer, mas não com certeza. Jogando outro tema atual para dentro da história: o famoso profiling. Profiling é calcular as chances de uma pessoa agir de certa forma, baseado em estatísticas do grupo ao qual ela pertence. Este é um assunto em voga na eleição americana e em muitos noticiários. Ao passo que a idéia de calcular se um refugiado sírio (por exemplo) tem chances de ser um terrorista parece segura, ela também possui uma face racista. E é esse o ponto que o quadrinho quer abordar.
Kamala Khan já escolheu seu ladoAo passo que eu acho interessante o tema ser discutido dentro dos gibis usando uma ameaça real, o Hulk, para ilustrar o assunto e criar um paralelo, eu penso que não existe mais uma dúvida sobre qual lado estar. É válido prender alguém por um crime que essa pessoa possa cometer? Fico imaginando um julgamento de alguém nesse caso. E o pior, Capitã Marvel já está prendendo pessoas com a ajuda de Ulysses a semanas, dentro da história.
Heróis com cabeça dura Ideais
Tony, com as novas informações sobre o funcionamento dos poderes do inumano, junta uma parte dos heróis, dentre eles Steve Rogers, para uma última tentativa de conversa com Carol Danvers. Nessa conversa, Stark explica que na verdade as previsões do futuro não irão de fato acontecer. São somente possibilidades. Dentro do quarto temos figuras como Dr. Estranho, o Fera, Pantera Negra e Medusa, juntamente com Raio Negro. Todos como mera decoração, diga-se de passagem. Esqueça os diálogos inteligentes de Illuminati. A discussão é entre Tony e Carol, que continua agindo como cabeça dura e sai da reunião no meio da conversa, deixando os heróis para trás boquiabertos. Assim como o leitor, que vai ficar sem entender o porque de tanta dificuldade de comunicação. Mesmo sabendo que as visões de Ulysses são duvidosas, ela parece não se importar. Novamente, para que uma história de briga de heróis funcione, eles precisam estar se comportando como adolescentes de ego super crescido. Mesmo assim, gostaria de ver uma defesa melhor do lado dela. É impossível, por lógica, ficar dividido nessa guerra civil.
Após sair da reunião, Carol começa a interrogar a mais nova prisioneira por algo que pode cometer relacionado à Hydra. Uma simples civil, presa pessoalmente pela Capitã Marvel ao sair de seu trabalho em um banco e colocada dentro de uma cela de um prédio da SHIELD. Esse é mais um exemplo de como a Capitã está agindo de forma irresponsável e exagerada.
Enquanto a interrogação se desenvolve, Noturno tira a civil da cela com seus poderes de teletransporte. Ao mesmo tempo, é dado um alerta de intrusos no terraço do prédio. No topo, está Tony Stark e um contingente de heróis ao seu lado. A mensagem é clara: Carol Danvers e seus aliados precisam ser parados. Apesar de parecer em grande desvantagem, a Capitã possui uma carta em sua manga; por um milagre, os Guardiões da Galáxia.
Eu digo milagre porque não faz nenhum sentido que Peter Quill e seu bando tenham interesse em uma confusão na Terra. Além, é claro, do motivo comercial: o Rocket Racoon na capa da edição 4 .
Conclusão
Por fim, a conclusão é que Guerra Civil 2 chegou ao ponto que queria chegar, uma enorme luta entre vários heróis que vai gerar as consequências duradouras nas edições solo de cada herói (duradouras até a próxima saga que deve chegar em Maio do ano que vem com novas promessas de mudanças e etc...). A idéia de que Ulysses conseguia de fato prever o futuro era a única coisa que poderia deixar alguém indeciso sobre que lado defender. Essa indecisão, infelizmente, foi removida nessa edição com a notícia de que não, Ulysses não prevê o futuro. Carol Danvers está literalmente prendendo pessoas com base em ilusões.
Uma pena. Guerra Civil 2 poderia mesmo ser um ponto fora da curva, mas eu admito que seria um pouco de ingenuidade esperar isso desta saga e de seu roterista, Brian Michael Bendis.
Crítica | Capitão América: O Primeiro Vingador - Aventura matinê e à moda antiga
O Capitão América foi o maior super-herói criado para encorajar os jovens americanos a lutar pelos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial. O personagem feito por Joe Simon e Jack Kirby em 1941 e cumpriu sua função até o fim da guerra, depois caiu no esquecimento – aparentemente, os comunistas não eram adversários preocupantes para o público alvo. Somente em 1964, o Capitão ressurgiu para liderar o grupo dos Vingadores e continua ativo até então. Ele morreu durante a Guerra Civil da Marvel, mas depois ressuscitou como todo bom personagem patriótico. Visando o projeto ambicioso de reunir vários heróis em um filme só, a Marvel permitiu a produção de vários filmes solos desses personagens para servir de introdução ao filme dos Vingadores. O Incrível Hulk, Homem de Ferro e Thor já cumpriram seu papel. E agora o “bandeiroso” chega com força total aos cinemas entregando um ótimo entretenimento.
Steve Rogers, um garoto do Brooklyn, sonha lutar e defender sua pátria na Segunda Guerra. Entretanto, o físico do garoto não acompanha a grandeza de seu caráter. Rogers era reprovado em todos os exames graças ao seu porte – magricela, fraco, tampinha e doente. Quando já tinha perdido as esperanças em se alistar para o exército, acontece uma reviravolta na vida do menino. Subitamente, Dr. Erskine convida Rogers para participar em um experimento inédito feito sob medida para a Guerra. Tratava-se do “soro do supersoldado”.
Após a cirurgia, Rogers não acredita nas habilidades sobre-humanas de seu novo corpo. Mas os nazistas também tem suas cartas na manga. Fanático por poder, Johann Schimidt encontra uma arma poderosíssima capaz de aniquilar tudo em seu caminho. Aliado a esta nova fonte de destruição, Schimidt separa o órgão nazista da H.I.D.R.A. do poder controlador de Hitler a fim de dominar o mundo. Somente o recém-criado Capitão América será capaz de impedir a ameaça nuclear de atingir os Estados Unidos. Salve-nos, Capitão América!
Maniqueísmo ufanista
Os fãs legítimos do Capitão podem ficar tranquilos. O roteiro de Christopher Markus e Stephen McFeely é bem fiel à história dos quadrinhos e mantém uma unidade narrativa muito boa para o filme. Finalmente, um herói integrante dos Vingadores, recebe um filme que não é um trailer estendido para Os Vingadores. Houve, sim, algumas alterações do enredo original dos quadrinhos para adaptar a história aos cinemas. Peggy Carter não está na resistência francesa, mas sim no serviço militar norte-americano e o cientista ajudante de Caveira Vermelha, Arnin Zola, deixa sua forma de “televisor ambulante”. Fora isso, a deformidade da face do antagonista tem uma origem diferente no filme. Enfim, as leves alterações se adequaram muito bem a universo prospectado do longa metragem.
Acredite ou não, o roteiro não exacerba exageradamente o patriotismo americano. Ele é evidente, porém em uma escala muito menor – pouco comum para os quadrinhos originais do “bandeiroso” (para quem não sabe, esse era o apelido do Capitão América). Os roteiristas compreendem o fortíssimo sentimento antiamericano que abrange a população mundial atualmente. O primeiro sinal disto é a ausência das incrivelmente irritantes frases de efeito do Capitão. Todos que já leram uma HQ do herói conhecem seu psicológico “feliz até o apocalipse” ou “prefiro morrer a me render”. Exemplos disto são os clássicos “Eu forjo meu próprio legado”, “Eu sou um Vingador”, “Eu não sou leal a ninguém, General, exceto aos meus sonhos!” e “Me render? RENDER-ME? Você pensa que esse “A” que tenho na testa defende a França?!”. Certamente um herói de classe, didático, egocêntrico e chato. Eu detesto o Capitão América, mas o filme conseguiu deixar o herói carismático e suportável.
Isso acontece por um simples motivo: o espectador conhece o passado de Steve Rogers e, finalmente, consegue se identificar com seu conflito. A construção do perfil psicológico do protagonista é fantástica. Rogers é um homem sozinho, desacreditado, subestimado, aparentemente depressivo e muito ingênuo, porém tem caráter, coragem, é ambicioso, inteligente e altruísta. Os roteiristas conseguem deixar estas características muito evidentes somente com as atitudes inspiradas e persistentes do protagonista – assim as frases idiotas, origem de 50% de nacionalismo, são excluídas. Outra característica que ajuda a diminuir o nacionalismo é a inserção de personagens integrantes do Howling Commandos (Dum Dum Dugan, Gabriel Jones, Jim Morita, etc.) de diversas etnias para batalhar ao lado do protagonista. Eles deixam claro que Rogers aspira defender sua pátria em qualquer situação, seja no cinema ou em campo de batalha, apesar de sua forma física franzina.
Mesmo depois de sua transformação física, Rogers continua desacreditado e é utilizado como cobaia comercial para a guerra vendendo bônus em diversas cidades. Assim, o herói tarda ao aparecer batalhando. É interessante observar como os roteiristas removem a pose heroica inalcançável do Capitão. O lado emocional do personagem é vulnerável e atingido diversas vezes forçando-o a amadurecer rapidamente após a injeção do “soro do supersoldado”. Entretanto, nenhum adversário oferece uma ameaça real ao personagem tornando as cenas de ação, quando estas aparecem, bem enfadonhas.
Um dos aspectos mais criticados do roteiro de Thor foi o romance inverossímil e estranho entre Thor e Jane Foster. Felizmente, o sub-plot romântico de Capitão é muito bem desenvolvido. Rogers e Carter tem um romance instável que se normaliza no decorrer do filme. Steve é infantil demais para encarar e compreender o amor, já Peggy é extremamente orgulhosa para admitir sua paixão. O mais interessante desse conflito secundário é o seu desfecho ousado – trata-se de um anticlímax.
A ambientação na Segunda Guerra permite desdobramentos expandindo o universo da história. O espectador tem a oportunidade de conhecer a genialidade de Mr. Howard Stark, além do histórico das Indústrias Stark. O roteiro revela que mesmo envolvido em assuntos de guerra, Mr. Stark empenhava-se com outros ramos industriais. Howard também tem uma personalidade ímpar assim como seu filho, Tony. A história também sugere uma ligação científica com o universo fantasioso de Thor através do Cubo Cósmico. Os roteiristas não deixam de explorar tópicos verdadeiros da 2a Guerra como os artifícios de espionagem. A moto e o escudo do Capitão são, obviamente, presentes.
Todavia, os aspectos positivos do roteiro param por aí. O maior problema da escrita de Markus e McFeely foi à evolução do personagem antagonista, Caveira Vermelha. Ele é, de longe, um dos piores vilões da Marvel adaptados para o cinema. Isso, no entanto, é uma grande ironia – o Caveira Vermelha tinha tudo para ser um dos melhores. Primeiramente, o vilão carece de um motivo para sua raiva megalomaníaca. O roteiro dá ênfase no clichê de “dominar o mundo”, mas esta ideia está tão ultrapassada quanto o desenho Pinky e o Cérebro. Os roteiristas também dão outra desculpa para tamanha frivolidade: o Caveira Vermelha sonha com um mundo sem fronteiras. Porém isto é apontado em apenas uma cena botando em cheque o estímulo da crueldade do personagem. Teria sido interessante se eles tivessem explorado um pouco mais o passado de Red Skull.
Nas HQs, a história de Caveira, alterego de Johann Schmidt, é extremamente sombria, rica e detalhada, tornando compreensível a complexidade de sua ira para com a humanidade. Além disto, o roteiro passa uma imagem acovardada e fraca do antagonista – completamente o oposto dos quadrinhos. Os embates entre Capitão e Caveira também são decepcionantes. Até mesmo o desfecho do protagonista é ruim servindo apenas como adiamento de um confronto final para a futura sequência solo do filme.
Aliás, o arco narrativo inteiro dos antagonistas é o mais fraco do filme. Diálogos inexplicáveis entre o protagonista e Red Skull são uma válvula de escape constante para os escritores inserirem reviravoltas previsíveis, afinal é sempre bom bater um papo poético com seu arqui-inimigo antes de aniquilá-lo.
Ainda é difícil acreditar na incrível falta de mira dos capangas da H.I.D.R.A. Mas é inútil contestar atos tão clichês do cinema que ainda persistem em aparecer. Outra falha do roteiro é o desenvolvimento da amizade de Rogers com Bucky Barnes. Novamente, os roteiristas perdem a oportunidade de criar um conflito mais profundo com a reviravolta de papéis entre as amizades. Bucky passa de herói que protege o protagonista de valentões a refém para ser resgatado por Rogers. Por esses motivos acima, os lados do bem e do mal acabam caricatos numa relação de perseguição maniqueísta. Obviamente, o espectador acaba cansando em algum momento.
Por trás do escudo
As atuações não comprometem o divertimento. São boas, mas não fogem do comum. Chris Evans evitou transfigurar a personalidade de Johnny Storm para o Capitão. O ator consegue contar histórias sobre a vida do personagem apenas com suas expressões. No início, Evans mantém feições infelizes, cansadas e fracas acompanhadas de olhares melancólicos e impacientes. O ator transforma sua atuação assim que o personagem se torna Capitão América. Corrige sua postura curvada e frágil para uma confiante e cheia de vida. Seus olhares ficam mais concentrados e heroicos. As expressões esbanjam autoconfiança e coragem. Até o modo de andar foi repensado pelo ator. Outro ponto notável de Evans é seu condicionamento físico. É impressionante ver alguém com um porte tão invejável como o dele. Felizmente, o ator não opta pela extravagância do personagem. Na realidade, sua atuação é bem contida. Destaques de sua atuação se encontram nas cenas do treinamento militar e no epílogo.
O fantástico Stanley Tucci encarna o simpático Dr. Erskine. Assim como Evans, Tucci também apresenta uma atuação contida. Fazia um bom tempo que não via um ator modelar suas expressões com tanta facilidade, rapidez e naturalidade para a câmera. São expressões muito sucintas que podem escapar aos olhos desatentos. Tucci cria um semblante de visível cansaço e bondade para Erskine. Infelizmente, o ator conta com poucos minutos em tela. Dominic Cooper vive o espirituoso Howard Stark, mas não chega nem perto ao carisma proporcionado por Downey Jr. a Tony Stark. Suas expressões revelam uma sugestiva canalhice para o personagem. O ator consegue deixar o personagem interessante, carismático e cômico, porém fica difícil acreditar que o personagem realmente se trata do pai frio e compenetrado de Tony.
A fotogênica Hayley Atwell deixa a figura de Peggy Carter apática e chata. A personagem não empolga em momento algum. Ao menos, Atwell constrói o perfil “linha dura” da personagem. Sua atuação também é elegante e cheia de classe, porém isso não salva o péssimo carisma da personagem. O ator de um papel Tommy Lee Jones garante os alívios cômicos do longa. Novamente, Jones assume as feições rabugentas habituais e não inova em nada. Até mesmo a dicção grave de papéis passados é mantida. Quem salva o dia é Hugo Weaving. Se não fosse por sua atuação, Caveira Vermelha teria ficado pior do que já é. Com sua movimentação pesada e suas expressões frias lotadas de raiva, o ator evidencia a personalidade intolerante e totalitária do personagem instável.
A maquiagem também ajuda o ator a melhorar suas feições de ódio ao longo do filme. Entretanto, Weaving acaba exagerando em algumas cenas em que tende levemente para um lado caricato. Toby Jones é outro coadjuvante de ouro. Sua interpretação de Arnin Zola revela o psicológico do interessante do personagem.
Sebastian Stan, Samuel L. Jackson, Derek Luke, Neal McDonough, Kenneth June e Richard Armitage – este merece destaque – completam o elenco.
Nem tão vermelha, azul e branca
Os melhores aspectos artísticos de Capitão América estão em dois departamentos – na fotografia e na direção de arte. O diretor de fotografia Shelly Johnson transmite muito bem a atmosfera triste, pesada e completamente sem esperança da realidade dura da Segunda Guerra. A forte iluminação sépia amarelada prevalece durante a maioria da projeção garantindo um charme vintage ao filme, mas os tons acinzentados condizentes com a atmosfera tenebrosa e sombria também são presentes. Johnson também usa recursos físicos para deixar o ambiente ainda mais depressivo com os tons acinzentados. Exemplos disto são a chuva, a neblina e a lama.
As imagens têm suas cores saturadas em pouquíssimas cenas. Apesar dos tons monocromáticos do exército, os segmentos que acompanham Rogers em seu treinamento militar, são as mais iluminadas e coloridas.
O cinegrafista deixa sua marca por apresentar uma fotografia inteligente. Em diversas cenas, arquiteta estrategicamente a iluminação. Assim, em apenas uma tomada, o diretor consegue modelar a iluminação em tempo real. Isso acontece nos segmentos em que a steadicam acompanha o movimento dos personagens em corredores. Johnson também permite que os atores utilizem lanternas em uma cena. Com isso, a modelagem torna-se imprevisível, pois a luz vai depender do lugar os atores apontem suas lanternas. O resultado é belo e garante uma atmosfera de suspense muito boa. Os feixes de luz são outra característica que o fotógrafo utiliza diversas vezes.
Também gosta de trabalhar com a superexposição de luz. Uma jogada muito inteligente de sua iluminação é a de ocultar a figura deformada de Caveira Vermelha na minoria de suas cenas. Realiza o efeito com o uso inteligente da contraluz. Assim, a belíssima criação de silhuetas negras torna-se possível. Recentemente, na crítica de Harry Potter e as Relíquias da Morte Parte 2, comentei que Eduardo Serra utilizava uma técnica peculiar ao simular flashes de luz. Surpreendentemente, Johnson também faz uso deste recurso. Novamente, o espectador encontrará flashes rápidos e suaves em algumas cenas. A incidência da luz também varia tornando-se forte e ás vezes, delicada e leve proporcionando um cuidado mais atento às sombras. O cinegrafista marca outra característica quando modela sua luz com muita rapidez. Isso acontece uma única vez no filme, mas seu significado impregnado de esperança ao redor da figura do Capitão é recompensador.
Porém, existe uma cena que o resultado de seu trabalho é estonteante. Durante oshow do bônus de guerra. Johnson assume descaradamente o tom patriótico tornando as cores azul, vermelha e branca da bandeira do país fortemente saturadas. Com isso, deixa claro o enorme êxtase e ufania perante a entrada dos USA na Segunda Guerra. Entretanto, todo o nacionalismo revela-se ser uma grande piada com o contraste fantástico que o cinegrafista realiza quando Capitão faz seu show para os soldados no meio da Guerra. Ali, evidencia toda a mentira gerada em torno do evento a fim de garantir lucros para o governo e faturar novos recrutas para o exército. A fantasia vendida é desmascarada pela sobriedade e frieza dos tons verdadeiros da guerra.
Mas espere! O show visual continua com a direção de arte. Os cenários recebem um toque retrô futurista deliciosamente criativo. Nunca vi tanta criatividade na composição de cenários e seus itens em apenas um filme só. O espectador precisa estar muito atento para enxergar todos os detalhes minuciosos das imagens. As placas e cartazes publicitários da época impressionam, sendo que alguns possuem o traço pesado do desenho semelhante às ilustrações de James Flagg – ilustrador do pôster mítico do “Uncle Sam” –, vide os maravilhosos créditos finais do filme.
Os cenários são grandiloquentes e majestosos. O melhor exemplo disto é o da Feira Stark que recebe outro tratamento igualmente fantástico da fotografia de Johnson. Como de praxe, a devastação da guerra é fielmente retratada. Os designs dos objetos que os atores interagem são muito inspirados. O carro do Caveira Vermelha é, de longe, um dos melhores que já vi. Aliás, a maioria dos meios de transporte do antagonista é inacreditável.
O figurino também não decepciona. O uniforme clássico do Capitão ficou muito legal, além disto, as cores da bandeira são levemente ofuscadas. O escudo do herói tem um detalhamento interessante também. Até mesmo as roupas do Caveira tem um estilo único. Os efeitos visuais devem ser o único aspecto pouco surpreendente do longa. A equipe de CG conseguiu deixar Evans raquítico e baixinho com competência, porém uma versão mais detalhada do efeito já foi conferida em O Curioso Caso de Benjamin Button. O movimento do escudo voando para cima dos inimigos do Capitão também é bem realizado.
O Homem Estrelado
A música é do desaparecido Alan Silvestri, mas antes de comentar sua trilha, é preciso escrever sobre a faixa orquestrada por Alan Menken. O compositor da Disney conquista o ouvido do espectador na cena do bônus de guerra. “Star Sprangled Man” poderia ser facilmente indicada ao Oscar por melhor música original. A rápida composição é épica e faz todo o cinema se sentir americano enquanto toca. Ela é lotada de trombones, trompetes, sininhos, escalas alegres e rápidas do violino e tambores. Todo o toque ufanista da cena toca o sentimento do espectador graças a brilhante música. A letra de David Zippel também é criativa e completamente descarada. Ele não disfarça que a música foi feita para os americanos – em determinado momento, as “bandeiretes” gritam “Who’s gonna save the American Way?”. A composição lembra muito as marchinhas clássicas dos anos 40/50.
Já a trilha de Alan Silvestri é um pouco menos empolgante, mas sua música também é inspirada e cheia de sentimento – várias assumem um tom de hino patriótico. Silvestri já orquestrou a trilha de diversos filmes de ação, então, já sabe bem como animar seu público. E também não deixa de emocionar, vide a bela trilha de Forrest Gump. Logo a trilha do filme é um misto dessas duas características. As composições são grandes e regidas com maestria em sua orquestra sólida. Inúmeras vezes, Silvestri utiliza trombones para construir suas músicas. Esse instrumento peculiar deixou as músicas bem parecidas com as composições menos famosas de Indiana Jones. Algumas têm tons bem ameaçadores enquanto outras são pacíficas. Uma coisa é certa na trilha de Silvestri, energia é o que não falta. O espectador certamente sairá satisfeito com a música do filme após o término da sessão. Claro, não posso esquecer o tema principal do longa. É muito bom, esbanja esperança assim como a figura do herói e tem uma sinfonia memorável.
A sombra que toma forma
Joe Johnston é um exemplo de oportunidade profissional. Começou sua carreira como designer de efeitos visuais na ILM de George Lucas chegando, inclusive, a faturar um Oscar por seu trabalho em Caçadores da Arca Perdida. Além do Oscar, Johnston conquistou uma amizade de ouro, Steven Spielberg. Os dois viraram amigos íntimos sendo que Spielberg tinha tanta afeição ao cara que permitiu que ele dirigisse o terceiro Jurassic Park – todos conhecem o resultado desastroso.
Johnston é um diretor marcado pelos seus trabalhos cinematográficos medíocres. Jumanji e O Lobisomem são exemplos claros disto. Entretanto, Capitão América deve ter inspirado o âmago adormecido do diretor. Pasme, Capitão América é o melhor filme de Johnston até agora. Talvez por conviver com Spielberg, o cineasta se inspirou em seu amigo. O filme tem um “quê” de Indiana Jones em diversas partes e, obviamente, a atmosfera é encantadora. Um dos maiores méritos da direção de Johnston foi abaixar o sentimento nacionalista inevitável do filme. Sua supervisão no roteiro certamente teve influência nesta decisão.
O diretor deu um detalhamento único à história de Rogers principalmente pela padronização da altura da câmera. De início, a câmera sempre captura Evans em um ângulo que o deixa o menor que os demais personagens. O diretor usa ângulos baixos quando enquadra o Caveira a fim de garantir a superioridade ameaçadora do personagem. No entanto, isso é revertido progressivamente a partir da transformação de Rogers.
O cineasta também tem sacadas inteligentes. Sua simplicidade é provada ao encaixar um plano importantíssimo de dois segundos que apresenta soldados lendo os quadrinhos originais do Capitão. Existem referências aos quadrinhos do Capitão – fique atento na forma que Arnin Zola aparece pela primeira vez – e ao universo Marvel. Stan Lee também marca presença.
O ponto mais alto de sua direção e, aparentemente, do filme inteiro, é a cena do bônus de guerra que não me canso de citar. Conta com uma coreografia bem planejada, além de possuir truques de edição do cinema clássico dos anos 20, 30 e 40. A cineasta também aposta em um grau de violência acima da média para os filmes inspirados em heróis da Marvel. O protagonista, deliberadamente, mata tudo e a todos que ficarem em seu caminho.
Fora isso, Johnston sabe aproveitar sacadas de humor apenas com a construção de algumas de suas imagens – um belo exemplo de usar o cinema como um ótimo meio de expressão para com a plateia. E encaixa alguns slow motions em cenas deixando as com muito estilo estético. O final abrupto e seco do longa também é muito legal – o “choque de épocas” presente em algumas cenas é dos pontos altos do filme, isso sem falar nos toques de humor negro.
Infelizmente, existem dois defeitos gravíssimos em sua direção. Aparentemente, o diretor não tem o toque “humano” para transformar as mortes dos personagens em algo emocionante. Todas carecem de impacto emocional sobre o espectador. Outro defeito foi o ritmo irregular do filme. Durante a primeira metade do longa, tudo anda bem com um ritmo agradável, porém o resto do filme se arrasta até o final. As seletas cenas de ação não empolgam, são pouco inspiradas e beiram a chatice. Existem outras escolhas infelizes em sua direção. Johnston utiliza recursos visualmente bregas e ultrapassado na concepção de algumas cenas, vide a explicação da face do antagonista. Certamente, queria aumentar a atmosfera “retrô” do longa, mas não era preciso exagerar.
Captain America will return in The Avengers
Visualmente estupendo e incrivelmente inspirado, Capitão América: O Primeiro Vingador peca justamente nas fracas cenas de ação, no ritmo arrastado de seu ato final e em alguns tropeços do roteiro. Entretanto, isto não compromete a ótima diversão que o filme oferece. Ele é puro entretenimento que deve agradar até os espectadores que não gostam de super-heróis. A história é interessante, as atuações são boas e a música é soberba. E, apesar de ser bem melhor que Thor, ainda espero o dia que os heróis terão seu dia de glória cinematográfica novamente. Isto aconteceu com X-Men: Primeira Classe. Ao lado dele, estão Homem-Aranha 2 e Homem de Ferro.
Capitão América: O Primeiro Vingador (Captain America: The First Avenger, EUA - 2011)
Direção: Joe Johnston
Roteiro: Christopher Markus e Stephen McFeely
Elenco: Chris Evans, Hugo Weaving, Hayley Atwell, Sebastian Stan, Toby Jones, Stanley Tucci, Tommy Lee Jones, Samuel L. Jackson, Derek Luke, Neal McDonough, Kenneth June, Richard Armitage, Natalie Dormer
Gênero: Aventura, Ação, Guerra
Duração: 124 min
https://www.youtube.com/watch?v=RfJrn8QcHdA
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Crítica | A Garota no Trem
De tanto resenharem sobre a adaptação de A Garota no Trem, já afirmaram inúmeras vezes que é impossível não escrever sobre o filme sem citar ao menos uma única vez o sucesso de David Fincher e Gillian Flynn, Garota Exemplar. Então, por que já não quebrar a banca na terceira linha do meu texto? De fato, A Garota no Trem e Garota Exemplar são filmes muito parecidos em seu conteúdo e até mesmo na forma – dessa vez, descaradamente, assimilando o trabalho que Fincher apresentou há dois anos.
Na verdade, desde seu lançamento como obra literária, A Garota no Trem já era comparada com Garota Exemplar. Paula Hawkins já sabia muito bem o que queria e também previa o sucesso de seu livro – os direitos cinematográficos foram vendidos em 2014, um ano antes da publicação do livro. Depois de lançado, ficou por semanas no topo da lista de mais vendidos tendo vendido mais de três milhões de cópias somente nos EUA.
O motivo de todo o sucesso? A boa e velha história de assassinato com o toque “moderno”: narradores nada confiáveis aumentando o grau do suspense. Felizmente, o filme é bastante fiel à paranoia crescente do livro.
Acompanhamos as idas e vindas de Rachel, uma alcoólatra deprimida que viaja de trem para a cidade todos os dias. Sentada no assento da janela, a mulher flerta com a vida dos outros, espionando o pouco que consegue. Mas uma casa em particular chama mais sua atenção graças a vida amorosa aparentemente harmoniosa de um casal “felicíssimo”. Porém, um dia, em sua bisbilhotagem, ela vê a mulher da “vida perfeita” com outro homem na varanda da casa. Em sua vida vazia, Rachel não consegue compreender como tal pessoa poderia jogar no lixo um relacionamento dos sonhos.
Incrédula e bêbada, ela abandona o trem e parte para confrontar a mulher espionada. Porém, no meio do caminho, algo acontece e ela desmaia. Quando acorda, não consegue se lembrar de nada do que havia feito naquela tarde e, para o seu azar, aquela mesma mulher desaparece e a polícia local acredita que ela esteja envolvida no sumiço.
Basicamente o roteiro de Erin Cressida Wilson tem apenas o trabalho de cortar trechos do livro em sua adaptação para as telonas, pois as coisas se desenrolam de modo muitíssimo similar. Porém, a narrativa já bastante peculiar e curiosa que Paula Hawkins utiliza na escrita, já é escancarada em questão de poucos minutos. A Garota no Trem não é um filme ordinário e, portanto, te causará muita estranheza no começo.
Wilson e o diretor Tate Taylor – muito elogiado pelo trabalho em Histórias Cruzadas, resolvem iniciar sua trama de modo audacioso, denotando o tom fragmentado da narrativa. Então acompanhamos os fatos do cotidiano perverso de Rachel, uma alcoólatra refém de si mesma graças a um término mal acabado de relacionamento, que passa seus dias espionando e desejando a vida dos outros, tendo pena de si mesma enquanto narra em voz over os eventos sob uma ótica dúbia e distorcida.
Já mostrando bom entendimento de seu material, Taylor corta a narrativa de Rachel assim que ela passa a se envolver com a história de Megan, a mulher espionada pela primeira protagonista. Então, passamos a conhecer a vida “perfeita” da moça, também refém de si mesma e dos abusos do noivo que a enxerga somente como propriedade sexual. Estabelecido seu drama principal e sua relação com a outra protagonista, acompanhamos um dia na pele de Anna, a nova esposa do ex-marido de Rachel, Tom.
O conflito majoritário de Anna é sua relação de medo com Rachel, já que a alcoólatra não dá folga ao novo casal, importunando a rotina deles sempre que possível. Rachel ainda sonha com a vida que teria com Tom e projeta seu passado romântico na vida de Megan. Logo, todas as três protagonistas têm sua merecida profundidade e seus pequenos dramas que se transformam diante da situação atípica do desaparecimento de uma delas.
Para quem não leu ou viu ao filme, com certeza tudo que descrevi acima é meio confuso (muitas críticas ao filme o condenaram por sua “confusão narrativa”). E realmente é. A narrativa é toda fragmentada com esses diversos pontos de vista que também possuem seus respectivos trechos de flashbacks – e não são poucos. Então se prepare, pois o filme exige muita atenção para colar as peças do quebra-cabeça e entender de fato a dor das personagens. É algo rico e pouco habitual, já que são elementos muito distintos e genuínos, mas sempre circundam o tema da traição.
Se a atmosfera do longa te prender, é muito difícil se perder na trama. Porém, mesmo contando com um ótimo mistério e personagens competentes, o roteiro tem suas fraquezas. A principal delas é o núcleo da investigação que se torna excessivamente burro e caricato. A opinião da investigadora é tão enviesada que corta o suspeito mais óbvio, além de Rachel, que é o sujeito assassino de fato. A roteirista é feliz em mudar constantemente o foco da investigação, nos levando a crer na culpa de outros suspeitos. Porém é relativamente fácil deduzir o grande vilão da história ao perceber esses vícios no texto.
Também há dois modos de encarar o tópico do desenvolvimento dos personagens: levando em conta de que o espaço narrativo do longa concentra uma passagem curta na vida dos personagens ou simplesmente por inaptidão da roteirista ao cortar justamente trechos que são dedicados a isso. Eu encarei pela primeira opção, pois as personagens são repletas de substância e personalidade, além de todas serem presas devido a traumas passados e pelo alcoolismo, uma condição limitante. Porém, as famosas sessões com o terapeuta são bastante restritas aqui e no livro eram as passagens que possibilitava o crescimento das protagonistas.
A Garota no Trem, na verdade, tem uma das direções mais interessantes do ano graças ao trabalho de Tate Taylor que busca se distanciar da inspiração óbvia de Garota Exemplar. Isso se dá bastante pelo jeito que ele conduz seu filme, tentando torná-lo uma representação perfeita do estado psicológico conturbado e convulsionado da protagonista Rachel. São muitas idas e vindas, muitos flashbacks, muitos encontros e desencontros até o final da trama dando a ilusão do filme estar completamente perdido e à deriva.
Isso é proposital. Oras, até mesmo o trem é uma brilhante metáfora da vida de Rachel, restrita a trilhos encarcerados que só permitem sua ida e volta no mesmo percurso. Eis aí uma grande metáfora para todo o alcoolismo e depressão que incapacitam a moça. Aliás, Taylor também trabalha em núcleos restritivos com as duas outras protagonistas, tão apegadas ao passado e presas em suas vidas miseráveis quanto a de Rachel.
A técnica de mise én scene também conversa diretamente com essa atmosfera incapacitante. Taylor condiciona boa parte dos vinte minutos iniciais do longa com muito estimulo narrativo via voz over, já deixando claro o nível de proximidade representativa que a forma do filme terá com suas personagens. Ali, já é possível sacar todo o trabalho de câmera que será utilizado para transmitir essa história.
Temos muitos planos claustrofóbicos, próximos aos atores. Na verdade, colados a eles e, por consequência, valorizando muito o trabalho do elenco. A câmera é a confidente dessas pessoas nada saudáveis. Durante os monólogos mais reveladores, Taylor trabalha com ela trêmula, desnorteada... bêbada, dialogando diretamente com o que é mostrado em tela. Logo, há muita encenação com câmera nos ombros para transmitir toda a instabilidade emocional que cerca a obra. Desfoques, alto nível de ruído, profundidade de campo baixa, luzes pálidas e suaves de paleta de cor dessaturada para darem lugar à iluminação dura de amarelo saturado para conferir os contrastes da depressão e das ressacas nauseantes de Rachel, são apenas algumas das técnicas que Taylor usa para ilustrar A Garota no Trem.
Taylor, tentando se distanciar do trabalho de Fincher, anda na contramão no sentido das composições visuais sendo muitas delas bastante vazias ou sem-graça. Pode-se considerar novamente a metáfora, mas era esperado um trabalho mais apelativo visualmente mesmo se comportando dentro da proposta autoral do filme.
Já valorizando na encenação o trabalho de seus atores, Taylor também brilha na direção deles conseguindo arrancar uma performance digna de Oscar no caso de Emily Blunt que vive a Rachel de olhares perdidos, cansados, de passos trôpegos e fala embargada mantendo-se no limite para nunca pender ao caricato cômico. Ela realmente está deplorável, frágil, deprimida e assustada. É o melhor papel que Blunt encarnou nos últimos anos.
Até mesmo com Haley Bennett, atriz um tanto desconhecida que esteve presente no fraco Sete Homens e um Destino, o trabalho é fenomenal. Ela interpreta Megan, a segunda personagem mais sofrida do filme e não tem nenhum problema em desempenhar as dificuldades impostas pelo roteiro. Bennett também investe na depressão de sua personagem que se comporta como uma femme fatale, guardiã de um segredo terrível. Bennett e Blunt são os destaques de A Garota no Trem e merecem todos os elogios.
No que Taylor tenta divergir na estética e um pouco da atmosfera tensa de seu filme ante Garota Exemplar, a trilha musical de Danny Elfman realmente copia, em algumas músicas, os sintetizadores de Trent Reznor e Atticus Ross. Quando não são os instrumentos similares, as melodias tornam-se idênticas. O ritmo irregular, de tons modais cíclicos e repetitivos de temas para acompanhar a rotina podre da protagonista é fantástico. A produção é inteiramente pensada para enfatizar, visual e sonoramente, esse aspecto bêbado e perdido de Rachel. Mesmo muito similar, a música casa perfeitamente com diversas composições funcionais e interessantes.
A Garota no Trem é um filme incômodo. Ele foge da fórmula dos blockbusters atuais ao apostar em uma narrativa complexa que exige sim muita participação do espectador para que ela faça sentido. Logo, caso não tenha paciência para uma proposta dessas, passe longe. Esse filme só te trará aborrecimento e frustração. Porém, lhes afirmo que seria um belo desperdício não conferir essa história nas telonas. Raramente vemos uma produção tão bem pensada para a sinestesia de sua forma que visa representar perfeitamente os dramas das personagens.
O mistério hitchcokiano envolta numa atmosfera kafkaesca é um presente para os fãs do bom suspense. Neste caso, um suspense regado a litros e litros de álcool e testemunhos de verdades embaçadas.
Crítica | Doutor Estranho (Sem Spoilers) - O Misticismo da Marvel
Já faz quase uma década desde que o Homem de Ferro alçou voo pela primeira vez, com a inauguração da nova fase de blockbusters e filmes de super-heróis, em 2008. De lá para cá, é inevitável que a Marvel Studios precisa inventar novas fórmulas e apostar em novos personagens para manter o interesse do público e manter a roda da indústria girando, e o universo cinematográfico seguindo em frente. Bem, isso em teoria. Ainda que Doutor Estranho seja de fato um personagem desconhecido e que busque novos caminhos dentro do gênero, é mais uma reciclagem de história e temas já explorados.
A trama nos apresenta ao doutor Stephen Strange (Benedict Cumberbatch), um neurocirurgião de prestígio, porém arrogante, na cidade de Nova York. Após um acidente de carro brutal, suas mãos acabam severamente danificadas e que o impedem de continuar o ofício. À procura de literalmente qualquer tratamento medicinal, Strange acaba buscando ajuda no mundo oriental, onde é levado a conhecer a misteriosa Anciã (Tilda Swinton), que lhe abre as portas para um mundo místico onde a magia pode lhe dar poderes e curar suas mãos.
É a clássica história de origem 101. Aliás, é curioso como o arco dramático de Stephen Strange é gritantemente similar com o de Tony Stark, partindo da premissa de um sujeito brilhante e arrogante que sofre um acidente que lhe prejudica imensamente, levando-o então para uma jornada de redescobrimento e poderes sobrenaturais. Dito isso, é possível prever as escolhas do roteiro de Jon Spaiths, C. Robert Cargill e do diretor Scott Derrickson, assim como todas as viradas que ensinarão um caminho mais nobre para o protagonista. Isso já nos deixa claro novamente como a fórmula Marvel é imutável e já demonstra sinais de esgotamento, com uma sequência de treinamento, um interesse amoroso descartável e um vilão unidimensional que falha em impressionar.
Para não falar também dos maiores problemas que o estúdio vem enfrentando desde sua gênese: os alívios cômicos insuportáveis. É evidente que um trabalho de revisão passou pelo roteiro, dando entrada para as piadinhas toscas que impedem qualquer criação de atmosfera ou uma catarse intimista para os personagens – não podemos ver Strange finalmente sendo capaz de realizar uma habilidade nova sem que tenhamos um comentário sarcástico e anacrônico, vide a tenebrosa piada recorrente sobre o nome único de um dos personagens. É como se a Marvel tivesse medo de ser levada a sério ou que desejasse criar algo mais profundo, sacrificando também a construção do ritmo. Enquanto a DC erra a mão por ser demasiada “séria”, a Marvel é simplesmente incapaz de tratar algo como se não fosse piada.
Outro problema fica com o estabelecimento do universo. O que exatamente é o grupo de feiticeiros comandado pela Anciã? Como exatamente é a ordem dessas pessoas nesse universo estabelecido pela Marvel? De que forma posso levar isso a sério sendo que feiticeiros acessam internet via Wi-Fi? São ideias incongruentes e modernas demais, que também não casam com o design de produção de Charles Wood ou o figurino da sempre competente Alex Byrne (ainda que seja estranhíssimo que alguns dos personagens sejam vistos calçando tênis esportivos com seus quimonos orientais).
Porém, um aspecto que definitivamente merece aplausos pela inovação é o visual. A direção de Scott Derrickson aposta em uma abordagem psicodélica e impressionante para as manifestações de magia dos personagens. É como se tudo o que havíamos visto com os prédios dobrando em A Origem fossem multiplicados em escala e profundidade, rendendo empolgantes cenas de ação onde os personagens atravessam portais, prédios se desdobrando em forma de caleidoscópios e ações que transitam em diferentes dimensões. É um trabalho primoroso de efeitos visuais e movimento de câmera, tanto prático quanto virtual, e que certamente merece ser conferido em uma tela de IMAX 3D – ainda mais considerando a mudança de razão de aspecto durante cenas específicas. A fotografia de Ben Davis também faz bom uso de uma paleta de cores diversificada e que garantem dinamismo à cena, especialmente durante as sequências psicodélicas.
Nesse quesito, também fico feliz que o filme tenha sido capaz de pelo menos desviar de alguns clichês da fórmula, principalmente em termos de clímax. Não temos a grande cacofonia de personagens digitais e explosões irritantes, apostando dessa vez em elementos mais sobrenaturais e que brincam habilidosamente com as regras desse universo; há algo feito com o Tempo que é realmente impressionante, e que toma emprestado elementos que não víamos sendo usados desde o Superman de Richard Donner.
Outro elemento que também marca uma boa introdução ao universo da Marvel é Benedict Cumberbatch. Praticamente capaz de fazer qualquer coisa bem feita, o ator traz muito carisma e ironia para Strange, sendo bem sucedido ao construir um personagem tridimensional mesmo com pouco tempo de apresentação, tornando o primeiro ato de apresentação muito divertido e envolvente. Cumberbatch é o grande acerto, mas infelizmente não temos muitos outros destaques. Tilda Swinton tem uma presença interessante como a Anciã, mas nada que torne a personagem tão memorável, enquanto Chiwetel Ejiofor é prejudicado pelo arco confuso e de nota única de seu Barão Mordo – e que inevitavelmente cai no estereótipo do “sidekick”. Por fim, temos Mads Mikkelsen entregando mais um vilão decepcionante para a Marvel, ainda que o ator se garanta com seu carisma habitual.
Ah, e Rachel McAdams aparece de vez em quando por algum motivo.
Doutor Estranho é mais um exemplar do grande miojo da Marvel Studios, agora com um tempero místico que provoca alucinações. O visual é lindo e Benedict Cumberbatch se garante como mais um carismático herói da Marvel Studios. Porém, é só uma questão de tempo até o gênero se esgotar por repetição de fórmulas e clichês.
Obs: Há duas cenas pós créditas que trazem uma inesperada participação especial.
Doutor Estranho (Doctor Strange, EUA - 2016)
Direção: Scott Derrickson
Roteiro: Jon Spaihts, C. Robert Cargill, Scott Derrickson
Elenco: Benedict Cumberbatch, Chiwetel Ejiofor, Tilda Swinton, Rachel McAdams, Mads Mikkelsen, Benedict Wong
Gênero: Aventura
Duração: 115 min
https://www.youtube.com/watch?v=YUfWrIcX4zw
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Crítica | O Incrível Hulk (2008) - A segunda chance do Gigante Esmeralda
Sem dúvidas, quando falamos em adaptação de um herói para os cinemas, Hulk é uma figura problemática. No final dos anos 70, estreava nas televisão a famosa série protagonizada por Bill Bixbye e Lou Ferrigno, este cumprindo aquilo que os efeitos de CGI fazem hoje. Mesmo tendo uma produção escassa, certamente marcou toda uma geração oitentista. Em 2003, somos bombardeados pela primeira grande adaptação do gigante verde às telas grandes, dirigida por Ang Lee. Apesar do bom elenco, o roteiro, aparentemente complexo, passa muito longe do objetivo proposto.
Mas em 2008, mesmo ano que fomos presenteados com Homem de Ferro, a Marvel Studios nos apresenta uma nova roupagem do herói. Infelizmente, o resultado final é uma mínima diferença de qualidade entre as adaptações antecessoras.
Na Universidade de Culver, na Virgínia, General Ross convida Dr. Bruce Banner a participar de uma experiência secreta. Parte de um programa da Segunda Guerra Mundial, conhecido como Super Soldado, o experimento, que transforma homens simples em seres super resistentes, é usado por Ross objetivando o combate à radiação gama. Quando o procedimento é executado, ocorre uma falha, transformando Banner no Hulk, que acaba destruindo todo o laboratório deixando pessoas feridas, incluindo sua namorada Betty. É um bom plot, aliás, mas tudo isso é apresentado em créditos iniciais de apenas 3 minutos, aproximadamente. Um punhado de cenas fragmentadas, enquadramentos fechados em rostos preocupados, páginas de jornais... tudo muito rápido e mau aproveitado.
Refugiado no Brasil, Bruce Banner procura uma cura à sua condição. A fim de ficar longe de vista das autoridades, vive de maneira pacífica, há 5 meses sem incidentes - sem transformações. Mesmo possuindo toda sua inteligência e formação, o especialista em radiação gama trabalha como um simples operário em uma fábrica de refrigerantes. Em seu laboratório caseiro, Banner tenta evoluir em sua procura. No entanto, falhando mais uma vez, é obrigado a enviar amostras de seu sangue ao Dr. Blue, um "colega" com quem conversa pela internet por meio de pseudônimos. O sangue de Banner, cuja essência está repleta do perigo da radiação, é o responsável para que a trama se inicie. Cortando-se durante o expediente, pequenas gotas de Bruce caem sobre as garrafas industrializadas, onde uma delas acaba perdendo-se indo para as mãos de um consumidor. Coberto de inocência ao tomar justamente o vasilhame contaminado pela radioatividade, um senhor de idade (interpretado por Stan Lee em um de seus melhores cameos) acaba morrendo. Logo, General Ross sabendo da atividade suspeita, envia agentes de segurança liderados pelo obstinado Emil Blonsky com o objetivo de capturar o cientista.
Já aqui o diretor Louis Leterrier apresenta seu maior problema ao decorrer do filme: o diretor não sabe aproveitar o momento, seja ele de ação ou drama. A cena de perseguição é até competente, apesar de uma edição cheia de cortes, buscando uma imersão ao expectador. Sendo falha, acaba causando desconforto ao trocar de câmeras de forma tão brusca, oscilando entre Ross no comando da operação e Banner correndo entre becos. Já após a sequência, o diretor cria uma expectativa na primeira aparição de Hulk. Com um cenário totalmente escuro, repleto de objetos no espaço, Leterrier esconde o Golias Esmeralda. Aqui, somos obrigados a assistir toda ação sobre uma perspectiva cega, devido ao estado caótico da cena. Após um bom tempo, eis que o rosto do personagem aparece em meio as sombras. Se por um lado ficamos tristes com a ausência do monstro verde, também ficamos enojados nas cenas que o personagem aparece por completo.
Aqui abro minha deixa para comentar os efeitos visuais do longa, dignos de um belo prêmio Framboesa de Ouro. A qualidade de CGI deste filme lembra muito alguns filmes de animação que são lançados direto para DVD. Me pergunto se o mesmo passou pela fase de pós-produção. Se o longa de Ang Lee apresentava um Hulk parecendo um objeto de brinquedo de borracha, Leterrier fica no mesmo nível apresentando uma animação não convincente e finalizada.
Vejo como um comentário repentino de que a luta do Harlem entre Abominável e Hulk, reproduzida no terceiro ato do filme, é a mais brutal do Universo Marvel. Eu, particularmente, não concordo em vangloriar isso como um ponto de qualidade (há cenas muito melhores, como exemplo várias de O Soldado Invernal), pois a cena todo é uma lástima. Os momentos finais é uma omelete de péssimo trabalho em equipe, envolvendo os quesitos mais técnicos. Não duvido que a decisão de filmá-los durante a noite foi tomada de última hora devido ao baixo orçamento de produção. Para completar, a fotografia também não colabora, apostando em tons totalmente escuros combinando com o visual noturno, obviamente tentando mascarar o péssimo trabalho de efeitos visuais. A direção superficial de Leterrier também não nos empolga.
Diferente do filme de Ang Lee, o qual apelava para uma trama mais psíquica, aqui o material é mais leve. O roteiro de Zak Penn dedica pouco tempo a reflexões sobre o drama que Banner vive, e quando o faz, é de uma maneira mal aprofundada. Por exemplo, a cena de Hulk e Betty na caverna poderia proporcionar um ótimo momento ao filme, deixando a donzela demonstrar sua habilidade de acalmar o monstro, demonstrar também que dentro daquela criatura havia um ser humano. Nada disso acontece. A falta de criatividade de Leterrier também é um empecilho, transformando a cena esquecível como tantas outras do filme.
Edward Norton cumpre seu papel como Banner decentemente. Infelizmente, seu talento é ignorado, já que em nenhum momento o filme presenteia-o com uma oportunidade de brilho. Liv Tyler não passa de belos olhos em tela, tendo uma performance esquecível. Tim Blake Nelson, como o biólogo celular Samuel Sterns, o Dr Blue, é o ator com o personagem mais inconveniente em tela. Uma performance totalmente caricata, exagerada, incômoda até aos personagens alheios. Ty Burrell não há muito o que dizer. Seu personagem, o psiquiatra Leonard Samson, apenas preenche espaço como namoradinho de fim de semana de Betty Ross.
William Hurt é o único que vale a pena ser lembrado deste elenco. Bem caracterizado, convence como General Ross possuindo uma ótima postura em cena. Não é à toa que o ator garantiu-se com o personagem, retomando-o em Capitão América: Guerra Civil. Já Tim Roth... O ator até tenta, podemos ver sua boa vontade frente as câmeras, porém o resultado de seu trabalho é vergonhoso. Blonsky não passa de mais um vilão esquecível; suas falas resumem-se a "Vou acabar com o Banner!", tornando sua presença insuportável e irritante. Enfim, um elenco desperdiçado devido a um roteiro e direção incompetentes.
O Incrível Hulk é mais um péssimo filme desse personagem querido por tantos fãs. É lamentável o descuido dos preguiçosos estúdios, com um vasto material fonte de qualidade para ser aproveitado. Mas uma pergunta fica nas nuvens: seria um problema do personagem em si? Afinal, ele funciona nas telonas em uma aventura solo? Particularmente, acredito que sim. Mas sem um carinho melhor dos produtores acho difícil sair uma aventura solo decente do Golias Esmeralda tão cedo. As questões de direitos autorais do personagem é um dos motivos dessa falta de capricho. Enfim, contentemos-nos com suas participações em outros filmes da Marvel - por sinal, muito divertidas.
Escrito por Kevin Castro
O Incrível Hulk (The Incredible Hulk, EUA - 2008)
Direção: Louis Leterrier
Roteiro: Zak Penn, baseado nos personagens da Marvel
Elenco: Edward Norton, Liv Tyler, Tim Roth, William Hurt, Tim Blake Nelson, Ty Burrell, Lou Ferrigno
Gênero: Ação
Duração: 112 min
https://www.youtube.com/watch?v=xbqNb2PFKKA
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Crítica | Trolls - Um acerto da DreamWorks
Na mitologia escandinava os trolls são seres sádicos e maldosos, além de lhes serem atribuídas várias formas. Alguns dizem que são parecidos com goblins outros parecidos com ogros. Mas não é dessa forma que são apresentados os personagens do novo lançamento da DreamWorks, Trolls.
Na animação Trolls, os personagens são seres pequeninos, bondosos, coloridos e alegres. Por serem tão felizes são caçados pelos vilões chamados de Bergens que são maus e tristes. Eles descobriram que ao comer um troll eles ficam alegres e desde então decidiram criar um dia especial chamado de “trollstício” em que os Bergens se reuniam para devorar os seres pequeninos e assim terem um dia de felicidade.
Um dia todos os trolls conseguem escapar inclusive seu rei e a princesa Poppy (Anna Kendrick). O filme dá um salto e a personagem aparece maior. Poppy junto com seu amigo Tronco (Justin Timberlake) partem para uma aventura tentando liberar seus amigos trolls de serem mortos pelos Bergens.
Os bergens são seres solitários e por isso vivem tristes, já os trolls vivem em grupo, um ajuda o outro e assim vivem seus dias cantando alegremente. O único troll que não é “alegre” e nem colorido é o personagem Tronco no qual é preto e branco por um motivo traumático que será apresentado durante a história.
Ele e Poppy são tão contrários em seu jeito de ser, mas isso acaba por unir os dois. Enquanto ele é realista e sério ela é divertida e feliz. Tronco é sozinho e só descobre a felicidade depois de conhecer e gostar de Poppy e por conseqüência volta a ser colorido.
O que dá tom a história e realmente nos deixa muito empolgados durante o filme é a trilha sonora. Composta por cantores como Justin Timberlake e Gwen Stefani e pelas atrizes Anna Kendrick e Zooey Deschanel a trilha empolga e dificilmente você não sairá do cinema sem cantar “can´t stop the feelling” ou “Move Your Feet”.
Anna Kendrick já havia cantado no filme a Escolha Perfeita (2012) e agora mais uma vez mostra que tem voz para ser cantora. Ela e Justin Timberlake além de cantarem na trilha dublaram os personagens principais na versão original.
Algumas músicas foram dubladas para a versão em português, talvez para ter maior alcance e conseguir uma melhor bilheteria. Poderiam ter deixado a versão original em algumas canções, pois Justin Timberlake e Anna Kendrick são perfeitos e os dois têm voz suficiente para prender a atenção do público.
Quanto à direção de Walt Dohrn e Mike Mitchell é competente e define desde o início o objetivo do filme. Os personagens são um acerto, mas acho que eles erram ao dar toda atenção para a personagem Poppy, os personagens secundários perderam espaço durante a produção. Já o personagem Tronco se tornou chato depois que ficou colorido.
Ele fazia o papel de zangado e do idealista que tinha certeza do grupo ser atacado a qualquer momento. Algo que lembre o mito de Cassandra em que ela sonhou com a destruição de Tróia, mas ninguém a ouviu. As cenas em que Tronco aparece são as mais engraçadas, mas depois de se tornar colorido ficou cansativo e sem sentido.
Já Os Bergens são tiranos, eles têm um rei que decide tudo por eles e uma cozinheira louca que prepara os trolls para serem devorados. Eles são tristes e solitários e por não se apaixonarem os torna mais individualistas e solitários.
A principal mensagem da produção é que a “Felicidade está em cada um de nós”, ou seja, devemos antes de tudo encontrar a alegria dentro de nós para depois encontrar a felicidade no outro. Trolls ensina que com amizade e união podemos mudar a história.
Trolls é uma produção para toda família, tanto adultos quanto crianças irão gostar do resultado final. Filme não enjoa e não cansa em nenhum momento. Conta uma história universal e é um acerto da DreamWorks no meio de tantos resultados adversos.
Trolls (Idem – EUA, 2016)
Direção: Mike Mitchell, Walt Dohrn
Roteiro:Jonathan Aibel, Glenn Berger, Erica Rivinoja
Elenco: Anna Kendrick, Justin Timberlake, Zooey Deschanel, Christopher Mintz-Plasse, Christine Baranski, Russell Brand, Gwen Stefani, John Cleese, James Corden, Jeffrey Tambor
Gênero: Animação, Aventura, Comédia
Duração: 90 min.
https://www.youtube.com/watch?v=yP86-TR6IME
Crítica | Pitanga
Seria fácil fazer um documentário sobre o ator Antonio Pitanga, mostrando apenas a sua história como ator. Mas o objetivo do documentário dirigido por Beto Brant (O Invasor) e pela atriz Camila Pitanga não se trata apenas em mostrar a trajetória do veterano profissional, mas também mostrar ao público a personalidade magnética e carismática de Pitanga.
Durante 90 minutos, vemos Pitanga conversando com vários amigos como Othon Bastos, Zé Celso, Maria Bethânia, Lázaro Ramos, Selma Egrei, Tônico Pereira, Ney Latorraca, Gilberto Gil, entre outros grandes nomes da cultura brasileira. Essas conversas ressaltam personalidade forte e bem humorada de Pitanga, além de mostrar a importância do ator em vários momentos: em ser um negro dando discursos politizados em filmes de Glauber Rocha; um homem de origem humilde e que venceu na vida; em ser uma figura muito querida e reconhecida; em ser um símbolo da luta contra o preconceito; um pai amoroso. Mostra como ele é uma pessoa querida, sem soar maniqueísta.
Enfim, o longa mostra que Pitanga é mais que um ator que foi símbolo do Cinema Novo e a maneira em que os diretores encontraram para representar isso é o que faz o longa ser muito gostoso de assistir. Realmente, Antonio conversa com os seus amigos de maneira bem descontraída, não parecendo uma entrevista típica de documentários. E é difícil não se ficar apaixonado pelo protagonista, pois Pitanga sempre mostra humildade, inteligência e muito bom humor. Mesmo o longa tendo uma decupagem bem simples de plano e contraplano, não se torna tedioso por conta da ótima presença do protagonista.
A dupla de direção que faz a sua estreia de documentários se sai muito bem. Mesmo Brant sendo um cineasta experiente, em “Pitanga” ele faz o seu longa mais leve e otimista, fazendo um documentário bem direto e com um ótimo ritmo. Além do cuidado estético, como já visto nos seus longas de ficção, pois mesmo com essa decupagem bem simples, os enquadramentos são bem pensados. A presença de Camila Pitanga na direção ajuda a humanizar Pitanga ainda mais, mesmo em alguns momentos percebemos que algumas cenas é a atriz fazendo uma homenagem ao pai e que pode atrapalhar um pouco o ritmo.
Outro problema do longa é que em certos momentos ele se alonga mais que o necessário, mas não chega a cansar, mas como já foi dito por conta do protagonista.
“Pitanga” se mostra um retrato muito bonito ao um nome que merece ser lembrado pelas novas gerações. Não só pela sua trajetória, mas vemos que Antonio Pitanga tem uma personalidade muito brasileira. E o documentário mostra e nos faz admirar essa personalidade apaixonante.
Crítica | A Nona Vida de Louis Drax
A Nona Vida de Louis Drax é um daqueles ambiciosos filmes com viradas espetaculares que prometem muito, conseguem cumprir razoavelmente suas metas, mas perde o brilho e a identidade no meio do caminho. O diretor francês Alexandre Aja nos entrega uma narrativa um tanto quanto metafórica, seguindo o mesmo formato de predecessores do gênero e utilizando a fantasia para discorrer sobre temas sociais e psíquicos. De certa forma, a perspectiva infantil adotada no filme funciona, mas não é recorrente de forma completa - sendo este o principal motivo da disparidade que afeta seu fechamento.
O protagonista é o personagem-título Louis (interpretado pelo novato Aiden Longworth), o qual é dotado de uma característica incomum: a de ser um chamariz para desastres. O longa abre com uma sequência dele caindo do penhasco e logo nos transporta em um flashback dinâmico no qual vemos os acontecimentos sombrios e estranhamente cômicos que o acompanham, como o fato de um ventilador cair sobre ele quando ainda bebê, suas dezenas de intoxicações alimentares e sua infortuna aventura envolvendo um garfo e uma tomada.
Voltamos para o penhasco. Em uma narração muito bem detalhada e metafórica, Louis vê sua vida passar diante dos seus olhos antes de finalmente cair do penhasco e entrar num súbito coma. Ao que tudo indica, o garoto foi empurrado pelo pai (Aaron Paul) e todos os detalhes da tragédia estão sendo relatados por uma mãe superprotetora e aparente mocinha da história (Sarah Gadon). Enquanto isso, numa realidade onírica paralela própria da psique infantil e bombardeada com narrativas de ficção, ele conversa com um monstro intangível e dotado de características subaquáticas - pedras, mariscos e algas que se fundem com uma pele murcha e enrugada - sobre... A vida.
Além disso, temos a presença de outros personagens importantes para as tramas e as subtramas, incluindo o psiquiatra de Louis (Oliver Platt), que foi contratado para cuidar da antissociabilidade do protagonista, e o pediatra Allan Pascal (Jamie Dornan), que monitora a possível evolução corporal do menino em coma enquanto tenta lidar com uma desesperada Natalie (Gadon) e com a chefe da polícia local, a Detetive Dalton (Molly Parker), cujo time ainda procura pelo pai desaparecido, apontado como principal suspeito, mas sem qualquer evidência concreta além do depoimento da mãe.
Sim, as linhas narrativas são muitas - e eu nem cheguei na melhor parte: depois de longas investigações, descobrimos que na verdade Peter (Paul) também sofreu o acidente no penhasco e foi encontrado boiando num dos canais do rio, completamente castigado pelas intempéries naturais e possivelmente concluindo o crime. Mas conforme as conversas metafísicas e intimistas se desenvolvem, somos apresentados a um ramo na neurociência que se mistura de forma híbrida com as possíveis conexões do além-vida e... Bem, a coisa fica ainda mais complexa e saturada.
O grande problema de A Nona Vida é justamente este: querer contar muitas coisas sem saber como. A obra perpassa por diversos gêneros, oscilando entre o thriller psicológico para o dramalhão conjugal para a aventura fantástica, sem saber onde se fixar. O que começou como uma narrativa contada a partir dos olhos de uma criança "incomum" aos olhos da sociedade - dotada de um amadurecimento notável e com um potencial exploratório incrível - terminou com uma mixórdia desequilibrada pontuada com cenas de sexo à la Cinquenta Tons de Cinza (sim, Dornan de novo) e diálogos extremamente mal-estruturados e clichês.
A estética assemelha-se a produções anacrônicas e com uma cronologia não-linear, como O Fabuloso Destino de Amélie Poulain, mas sem o mesmo refinamento estético. A própria cenografia contraria as normas do bom senso - e apesar disso, nossa atenção é um pouco desviada destes deslizes pela tétrica trilha sonora que combina com o "tom" do filme e pela direção de arte, cujos tons de verde, marrom e azul-escuro fazem parte da paleta de cores. A justaposição de cores complementares também é presente e funciona brevemente, ao colocar Gadon dentro de um arco místico cujo figurino preza pelo vermelho em contraposição ao verde.
A fotografia confusa e a montagem em cortes bruscos não contribui em nada para desviar a atenção de um roteiro cheio de furos. Talvez um dos únicos pontos altos é a chegada da Violet, avó de Louis, interpretada pela sempre ótima Barbara Hershey. Sua presença traz peso à cena e ajuda a elevar um pouco o nível do filme. O clímax principal, apesar de não explorado, vem sem precedentes e consegue arrancar alguns suspiros de surpresa dos espectadores.
Em suma, A Nona Vida de Louis Drax é um filme com potencial desperdiçado, principalmente no tocante ao elenco. Nem mesmo os visuais de Paul como o monstro (spoiler alert) são capazes de satisfazer um público que anseia pelo fantástico e pelo novo.
Crítica | Sala Verde
Merda é a primeira palavra dita. É também a situação em que os protagonistas de “SalaVerde” vão se encontrar logo logo, no decorrer da trama, mas segundo a lógica do diretor Jeremy Saulnier, primeiro precisam ter algum pecado para pagar. São quatro jovens que formam uma autêntica banda punk e viajam de carro pelos país de show em show. Começam o filme sem gasolina – e xingando “merda!” – e perdidos no meio do nada, até que vão, então, atrás de algum estabelecimento próximo para roubar combustível dos automóveis estacionados. Antes da história seguir, acontecem alguns minutos de ambientação punk como tiradas sarcásticas, drunk pranks, piadas escatológicas, cervejas bebidas em latas amassadas, cigarros, coturnos, couro, mosh etc. Autenticação punk garantida. Pecados também.
O quarteto toca para uma plateia composta por skinheads neo-nazistas e escolhem, como primeira canção, um cover de “Nazis Punks Fuck Off” dos Dead Kennedys. Os garotos são provocadores, faz parte da ideologia que pregam – e seguem –, eles tiram sarro e dão risada. Eles são punks. Buscam subversão. Gostam de adrenalina, caos, violência, gritaria, último volume, quebradeira, dão e levam facadas. Eles praticamente conquistam (ainda que não mereçam) a merda em que vão se meter. Taí o que torna “Sala Verde” tão especial. Eles são recompensados com a violência que, em breve, será inserida e o telespectador, por tabela, se sente recompensado também.
Voltando à trama, após o show, um dos membros do grupo, Pat (Anton Yelchin), entra numa porta errada e testemunha uma garota morta com uma faca cravada no crânio enquanto três pessoas (os prováveis assassinos) a cercam e encaram Pat. O garoto corre desesperadamente, tenta ligar para a polícia, mas o gerente da boate, Gabe, o pega no ato e interrompe. A banda, que testemunhou o homicídio, agora tem que ficar presa no tal “quarto verde” com um segurança enorme apontando uma arma para eles. Nessa hora percebem que, finalmente, estão na bosta.
O diretor e roteirista, Jeremy Saulnier, foi muitíssimo bem recebido pela crítica com “Ruína Azul” (Blue Ruin, 2013) e sabia que o momento de fazer um longa-metragem tão violento quanto “Green Room” teria que ser naquela hora. Há muito gore em “Quarto Verde”, a ação é incrível e as mortes brutais. Há tiro na cabeça, mata-leão, lâmina no pescoço e mordida de cachorro. Não são cenas para qualquer estômago, mas um fato peculiar elas é que não são gratuitas.
A seriedade de cada uma das mortes – não são poucas – no filme é respeitada pelos personagens. Ninguém na trama é um sanguinário frio e treinado. Alguns parecem já ter lidado com óbitos, mas nenhum dos tipos se sente plenamente confortável com tirar a vida de alguém ou mesmo com toda a situação. Cada um dos falecimentos gera algum tipo de consequência moral para o resto dos vivos e mós, como público, somos permitidos a sentir cada deles. Nem mesmo o perverso vilão e dono da boate, Darcy, vivido pelo irreconhecível Patrick Stewart, está livre de tensões. “Isso é um pesadelo”, comenta Amber (Imogen Poots) em algum momento. “Para todos nós”, responde Darcy. A desgraça é democrática.
As armas – brancas, de fogo ou improvisadas – também são respeitadas. São quase personagens. O brilhantismo do roteiro se certifica que cada uma cumpra seu papel e em seu determinado momento, mostrando uma grande variação de ferir ou matar alguém. Lembra um videogame difícil em algumas circunstâncias, pois os equipamentos são escassos – valiosos, portanto –, mudam de mãos em mãos e as munições acabam. O uso das pistolas e escopetas, portanto, não é exagerado. Pelo contrário, é respeitado.
A fotografia é linda e mantém uma paleta de cor verde escura que ambienta bem a história, além de harmonizar com o título. O elenco é outro ponto alto o que dá uma certa sensação melancólica, já que esse foi o penúltimo filme lançado antes da morte do promissor Anton Yelchin (o Checov de Star Trek) num trágico acidente em junho de 2016. Patrick Stewart, o nome de maior peso contou, em entrevista, que decidiu aceitar o papel pois ao terminar de ler o roteiro em sua casa, estava tão assustado que trancou toda a sua casa, ativou o sistema de segurança e se serviu de um copo de uísque.
“Sala Verde” é feroz, mas não exagerado nem explícito. Como dito antes, cada truculência é calculada e relevante para o desenvolvimento da trama. Não há excesso de personagens e todos as informações e arcos apresentados são bem amarrados. Por exemplo, no começo do filme, Pat é questionado se ficasse preso numa ilha deserta e pudesse ter a discografia de uma só banda para escutar eternamente, qual seria. Ele não responde e, ao longo do filme, é interrogado em outras ocasiões. Ao final, ensanguentado, cansado e corrompido, ele finalmente tem uma resposta. Mas não importa, ele viveu o maior terror de sua vida e, assim como o longa começa, também termina com merda.
Escrito por Rodrigo de Assis